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PARTE I – AGLOMERAÇÕES DE EMPRESAS: EXTERNALIDADES, AÇÕES CONJUNTAS E VÍNCULOS

Capítulo 2 – Eficiência coletiva e aprendizado local

2.5. A abordagem da economia regional

2.5.1. Os pólos de crescimento

A preocupação com a importância da aglomeração de empresas é um tema que há tempo

pauta os trabalhos dos principais autores ligados à Economia Regional. Um atestado disso são os

trabalhos clássicos de Perroux (1955) e de Hirschman (1958), que procuraram estabelecer os

nexos relevantes entre a aglomeração de empresas e as possibilidades de desenvolvimento

econômico.

Isso significa que a principal preocupação desses autores não estava relacionada

diretamente com as vantagens competitivas das aglomerações de produtores, mas sim com a

questão do desenvolvimento econômico e seus condicionantes. Na verdade, os autores partem do

reconhecimento de que o desenvolvimento econômico não ocorre de modo semelhante entre as

diversas regiões que compõem o sistema. Ao contrário, verificaram que o desenvolvimento

ocorria de modo mais intensivo em regiões que apresentavam uma certa concentração espacial

de produtores. Com base em tal constatação, passaram a investigar mais detidamente as

características das aglomerações de produtores e seu papel na promoção do desenvolvimento

econômico local.

É nesse contexto que Perroux (1995) apresentou o conceito de pólo de crescimento,

partindo do pressuposto de que o crescimento não ocorre por toda parte ao mesmo tempo, mas

manifesta-se em pontos ou pólos de crescimento específicos (Igliori, 2000). Dessa forma,

Perroux (1955) reconhece dois fatores fundamentais para a investigação das aglomerações de

produtores. Primeiro, o autor reconhece a importância das economias externas que são geradas

localmente com a concentração de empresas. Em segundo lugar, reconhece também que o

sistema é essencialmente dinâmico, já que as estruturas da economia são freqüentemente

transformadas e as posições dos agentes relevantes são constantemente contestadas e

modificadas.

Com base nesses dois pressupostos, Perroux (1955) organiza sua análise sobre três

conceitos principais. Primeiro, o autor apresenta a noção de indústria motriz, que é aquela que

apresenta características modernas no que se refere à organização do processo de produção, o

que a permite a geração de economias externas de escala, de processos inovativos e de uma

“atmosfera” apropriada ao crescimento. Desse modo, o aumento da produção da indústria motriz,

que exerce o papel de indústria-chave dentro do pólo de crescimento, é capaz de provocar um

aumento na produção em outras indústrias.

Fica claro, portanto, que a investigação de Perroux (1955) reconhece a existência de

forças endógenas à aglomeração (no caso, aos pólos de crescimento) capazes de impulsionar o

desenvolvimento econômico local. Outras indústrias participantes do sistema são beneficiadas

pela existência dessas forças endógenas impulsionadoras do crescimento.

Esse conceito de indústria motriz, conforme apresentado por Perroux (1955), difere

ligeiramente das abordagens recentes acerca do desenvolvimento de clusters industriais. Em

algumas das experiências empíricas já investigadas, notadamente, no caso dos distritos

industriais italianos, percebe-se certa dificuldade em identificar uma indústria motriz. Nesse

caso, tudo indica que a expansão e o desenvolvimento do sistema parece estar mais ligado às

interações que ocorrem entre os agentes, dado o extenso processo de divisão do trabalho entre os

produtores especializados.

Dessa forma, conclui-se que a existência de uma indústria motriz não é condição

necessária, nem suficiente para a promoção do desenvolvimento econômico local. Mesmo com

essa ressalva, devem ser ressaltados alguns méritos do trabalho de Perroux (1955), como o

reconhecimento de que existem forças internas que impulsionam o desenvolvimento local e a

existência de uma “atmosfera” propícia ao crescimento

37

.

O segundo tópico apresentado pelo autor é a noção de complexo de indústrias, que

consiste na presença de outras estruturas, não-competitivas, presentes nos pólos de crescimento.

Esses produtores, a partir dos efeitos positivos da aglomeração espacial dos produtores e da

presença da indústria motriz, também são levados ao crescimento econômico. Verifica-se, então,

uma estrutura imperfeita de mercado que favorece o aparecimento de líderes, que exercem papel

importante na mediação de conflitos e na promoção de eventuais acordos entre os atores

participantes do sistema. Além do mais, a presença de líderes nessa estrutura imperfeita de

37 Vale lembrar que Marshall (1920) já havia identificado e ressaltado a existência de uma “atmosfera industrial”

mercado pode ainda demandar uma maior participação do governo no processo, o que reforça os

ganhos de produtividade e os resultados em termos de crescimento econômico (Igliori, 2000).

O terceiro tópico apresentado por Perroux (1955), decorrente dos anteriores, é justamente

o surgimento dos pólos de crescimento, resultado de uma combinação específica entre a presença

de uma indústria motriz, a estrutura imperfeita de mercado e a aglomeração espacial dos

produtores. A presença integrada desses elementos é capaz de promover modificações

importantes na estrutura industrial da região, levando-a ao crescimento econômico.

Fica clara, portanto, a heterogeneidade característica dos espaços econômicos analisados

pelo autor. Essa heterogeneidade, por sua vez, faz com que as relações internas à aglomeração

apresentem um importante elemento de assimetria, fazendo com que os resultados do processo

de crescimento sejam apropriados de forma desigual entre os atores participantes. De todo modo,

mesmo aqueles produtores com poder de barganha mais reduzido também serão capazes de se

beneficiar com o crescimento da região, o que a configura como um pólo de crescimento.

A experiência empírica das aglomerações de empresas mostra que esse fenômeno é

recorrente. Um exemplo disso, ocorreu recentemente na aglomeração de produtores de calçados

de Franca no interior do estado de São Paulo. As empresas maiores decidiram estabelecer uma

forma de ação conjunta deliberada no sentido de promover uma marca local, comum a todos os

produtores locais que contribuíssem com o processo. O resultado dessa ação foi, ao menos

durante certo período, bastante satisfatório, não apenas para as empresas participantes do

processo, mas também entre as empresas menores, que foram beneficiadas por ações que se

deram fora delas, porém endógenas à aglomeração.

Por fim, outro mérito importante do trabalho de Perroux (1955) é o desenvolvimento de

um conceito de espaço econômico que abarca a investigação das relações de interdependência

entre os diversos agentes, a partir da formação de nexos que se dão de modo endógeno à

aglomeração dos produtores. De acordo com o autor, os espaços econômicos são constituídos, e

por isso devem assim ser tratados, por um conjunto de relações que se referem aos diversos

fenômenos econômicos, sociais, institucionais e políticos interdependentes (Ferreira, 1989).

O arcabouço dos pólos de crescimento foi amplamente utilizado pelos formuladores de

planos de desenvolvimento regional nas décadas de 60 e 70, a despeito do fato de que a

abordagem original de Perroux não tinha a intenção de sugerir implicações de políticas públicas.

Porém, tal arcabouço foi abandonado até por causa dos resultados bastante modestos dessas

iniciativas (Igliori, 2000).

Já a análise de Hirschman (1958) da teoria do crescimento não-equilibrado, por sua vez,

não apresenta distinções fundamentais, mas sim diversas convergências, à noção de pólo de

crescimento apontada por Perroux (1955). Hirschman (1958) também parte da importância das

economias externas locais para explicar a importância do crescimento espacialmente

concentrado, apontando as formas de investimento induzido pela possibilidade de apropriação de

desenvolvimentos que ocorrem fora da firma. Assim como Perroux, o autor apresenta uma

análise de cunho dinâmico, em que são ressaltadas as formas de desequilíbrio no sistema

econômico que levam ao seu desenvolvimento. Neste ponto, faz referência ao processo de

destruição criadora apontado por Schumpeter (1959), incorporando as implicações desse

fenômeno sobre o âmbito local.

De todo modo, a despeito do distinto enfoque da análise dos autores ligados à abordagem

de Economia Regional, em especial Perroux e Hirschman, é possível incorporar alguns

elementos à análise das aglomerações de empresas. Além do mais, um claro desdobramento

dessa abordagem pode ser verificado entre os autores ligados à Geografia Econômica, para quem

a questão da concentração espacial das empresas passou a ocupar posição central.

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