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2.5 TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

2.5.3 Barreiras para a transferência de tecnologia

A Lei de Inovação brasileira, já em 2004, trouxe a possibilidade de os laboratórios acadêmicos serem utilizados por empresas, fazendo com que um grupo de pesquisa acadêmica e uma empresa de negócios possam produzir resultados de pesquisa, artigos científicos e produtos comercializáveis ao mesmo tempo em uma unidade comum dentro da universidade (BRASIL, 2004; ETZKOWITZ, 2013). Porém, essa facilidade não é muito utilizada pelas universidades e empresas brasileiras

(RODRIGUES; GAVA, 2016). A partir de pesquisa com coordenadores de universidades e institutos federais, esses autores relatam que "a maior dificuldade para sinergia no modelo da hélice tripla é o excesso de regulamentos e a diferenciação das dinâmicas do setor público e privado." (RODRIGUES; GAVA, 2016, p. 44). Os coordenadores dessas ICTs pesquisadas também relatam que as instituições não estão preparadas para apoiar o surgimento de inovações nesses ambientes, e apresentam muitos inconvenientes em captar demandas externas de desenvolvimento tecnológico e realizar transferência de tecnologia (RODRIGUES; GAVA, 2016).

Empresários da área biotecnológica da Espanha citam igualmente o excesso de burocracia existente no setor público e a resposta lenta dos pesquisadores como principais empecilhos para a realização de parcerias. A resposta lenta se deve muitas vezes a falta de interesse dos pesquisadores em colaborar com a empresa por excessiva mentalidade acadêmica voltada aos resultados pelos quais são cobrados, como publicações, muitas vezes proibida devido a cláusulas de confidencialidade dos acordos de parceria (GARCÍA-CARPINTERO et al., 2014).

A maioria dos professores, por sua vez, observa que a demora nas respostas se deve ao fato de restrições de tempo devido às inúmeras atividades que possuem (SHEN, 2017). Esse mesmo autor fez um levantamento na literatura sobre todas as barreiras encontradas pelas universidades para a cooperação com empresas como o receio do pesquisador em perder sua autonomia e independência nas pesquisas. Ainda assim, é possível listar os desafios mais costumeiramente enfrentados ao longo do processo, que se encontram nesta seção. Várias dessas barreiras já foram comentadas em especial por Bruneel, D'este e Salter (2010), Galán-Muros e Plewa (2016), Shen (2017), Siegel et al. (2004) e Villani, Rasmussen e Grimaldi (2017).

A primeira barreira começa na dificuldade em encontrar o parceiro apropriado (GALÁN-MUROS; PLEWA, 2016), sendo tanto mais difícil quanto menor for a rede de contato pessoal dos professores - fato comum, pois pesquisadores em geral não constroem a rede de contatos sociais necessária para um processo de transferência bem-sucedido (BRADLEY; HAYTER; LINK, 2013). Siegel et al. (2004) já apontavam a importância da rede entre pesquisadores acadêmicos e de empresas e que estes relacionamentos muitas vezes são mais efetivos para a TT que os contratos. Categoricamente, relações pessoais é o fator mais importante para facilitar a cooperação U-E, conforme resultado do trabalho de Galán-Muros e Plewa (2016) com

pesquisadores da Comunidade Europeia sobre as barreiras para a interação entre universidades e empresas, corroborado por Müller (2018), mais recentemente.

Pesquisadores não estão sempre dispostos a redirecionar suas pesquisas teóricas a pesquisas com fins práticos e que tenham maior chance de serem transferidas (BRADLEY; HAYTER; LINK, 2013). Neste caso, a prospecção de demandas das empresas é uma ótima fonte de conhecimento que pode ser aplicada a pesquisas a fim de melhorar o processo de transferência de tecnologia e assegurar uma interação U-E que seja adequada para ambas as partes (BENEDETTI; TORKOMIAN, 2010; CLOSS et al., 2012; MATEI et al., 2012; SILVA, 2018). Porém, políticas universitárias de promoções, cargos vitalícios, financiamento e propriedade intelectual geralmente não reconhecem atividades de cooperação com empresas, o que acaba por desmotivar este tipo de interação (SHEN, 2017). Estas políticas, portanto, não proveem incentivos suficientes para que seus professores pesquisadores invistam na transferência de tecnologia conforme já mencionado por

Berbegal-Mirabent, Lafuente e Solé (2013) e Closs e Ferreira (2012) e mais recentemente por Galán-Muros e Davey (2019) e Kempton (2018).

As diferenças culturais entre a academia e a indústria como motivações, formas de comunicação, prazos e níveis de burocracia diferentes, assim como a falta de compreensão dificultam a interação entre as partes, conforme apontam Galán-Muros e Plewa (2016). Dentro dessas diferenças, ainda há a necessidade de confidencialidade por parte das empresas, enquanto os pesquisadores necessitam de publicação, havendo o risco de vazamento de informações aos concorrentes (GALÁN- MUROS; PLEWA, 2016; SHEN, 2017), conforme já citado. Para evitar essas barreiras, é necessária confiança mútua, assim como o desejo de manter um relacionamento que pode ser benéfico tanto para a universidade quanto para as empresas (DO NASCIMENTO; LABIAK JUNIOR, 2011; GALÁN-MUROS; DAVEY, 2019; GALÁN- MUROS; PLEWA, 2016).

Outra dificuldade para a transferência de tecnologia é a falta de autonomia nas universidades para conseguir financiamento e contratação de pessoal e a existência de um ambiente acadêmico que desencoraja pesquisadores a comercializar suas ideias (BASTOS; FRENKEL, 2017; GALÁN-MUROS; DAVEY, 2019).

Professores empreendedores que trabalham nas universidades tendem a ser mais velhos e geralmente não são muito habilidosos com negócios (BRADLEY; HAYTER; LINK, 2013; D’ESTE; PERKMANN, 2011). Quando há pesquisadores mais

jovens a chance de interação U-E é mais alta (GIUNTA; PERICOLI; PIERUSSI, 2016). O mesmo acontece com as pessoas que trabalha nos NITs: faltam conhecimentos e habilidades em negociação e marketing, fundamentais para uma exitosa transferência de tecnologia (PIRES, 2018; SHEN, 2017). Ademais, o excesso de burocracia e a pouca flexibilidade da administração pública são apontados por Shen (2017) como obstáculos para a cooperação U-E. Estas amarras institucionais também foram verificadas por Müller (2018) em sua tese sobre as redes de cooperação U-E no Brasil. A falta de recursos financeiros, acesso à capital de risco e a dificuldade em levantar verbas externas para o desenvolvimento de invenções e para a criação de startups também dificulta o processo (BRADLEY; HAYTER; LINK, 2013; GALÁN- MUROS; PLEWA, 2016; SWAMIDASS, 2013). Porém, conforme apresentado por Swamidass (2013, p. 789, tradução nossa), "uma startup pode ser a melhor ou a única opção para comercializar quase 75% das invenções universitárias que nunca serão licenciadas para entidades comerciais". Neste aspecto, deve haver um esforço por parte da universidade em realizar a última etapa do modelo de transferência de tecnologia proposto por Bradley, Hayter e Link (2013), exposto na Figura 7, pois a história mostra que se não houver estímulo à criação de startups para comercializar as patentes geradas, dificilmente ocorrerá a transferência de tecnologia, não beneficiando ninguém (SWAMIDASS, 2013).

É nesse contexto que está inserida a transferência de tecnologia, considerada como um meio favorável para o desenvolvimento e o crescimento de capacitação tecnológica, principalmente para pequenas e médias empresas (ŠVARC; DABIĆ, 2019). Este assunto é tratado na próxima seção.