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Benefícios e limites: entre o ter e o poder ter

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 53-57)

2.2 E GOVERNMENT : OPORTUNIDADE PARA REDESENHAR OS SERVIÇOS PÚBLICOS

2.2.2 Benefícios e limites: entre o ter e o poder ter

O nível de concretização do e-government está intimamente ancorado a uma nova geração de gestores públicos generalistas, detentores de uma visão holística, orientados para a integração, afastados de um posicionamento tecnocrata e tem subjacente 4 grandes promessas, nomeadamente acesso, redução de custos, privacidade e democracia (Garson, 2004).

Hansen e Reinau (2006) entendem ainda que a melhoria da tomada de decisão é o elemento mais promissor no e-government, se este reforçar a aceitação das decisões por parte dos cidadãos.

Tais promessas requerem um olhar atento. No entendimento do Pacific Council on International Policy, num documento intitulado Roadmap for E-government in the Developing World (2001), é feito um desafio aos governos e à sociedade em geral, centrado em dez questões no âmbito do e-government, nomeadamente:

1. Porque se compra e-government?

2. Existe uma clara visão das prioridades do governo? 3. Para que tipo de e-government estamos preparados?

4. Existe suficiente vontade política para implementar e-government? 5. Estamos a seleccionar os melhores projectos de e-government? 6. Como podemos planear e gerir os projectos de e-government? 7. Como esperamos ultrapassar a resistência à mudança?

8. Como vamos medir o progresso?

9. Que relações queremos ter com o sector privado?

10. Como pode o e-government melhorar as relações com os cidadãos no domínio público?

O Roadmap for E-government in the Developing World (2001, p. 7), alertou para alguns elementos que devem estar subjacentes a estas respostas e que ainda hoje se mantêm actuais. Em primeiro lugar e antes de se tentar responder à primeira questão, deve ter-se em conta que “(...)

realize it won’t be simple (...)” dado o entendimento que o e-government não é nem fácil, nem

barato, não é um atalho para o desenvolvimento, nem é, nem pode ser, sinónimo de redução de custos. É apenas um elemento que, se bem usado, permitirá isso. Por outro lado, é feito um alerta claro “(...) Computers ≠ Reform (…)”, logo não se pode esperar muito do e-government se o reduzirmos a uma dimensão estritamente tecnológica. Neste contexto o e-government não se compra, constrói-se.

No âmbito da reflexão que deve estar subjacente à segunda questão, enunciam um pressuposto “(...) e-government must be a shared vision. Encourage stakeholders to participate

in defining the vision (…)" e deixam um aviso “(...) saving money should not be the broad vision that motivates e-government. E-government should not solely be a strategy for reducing the cost of government, though this can be one valuable result. Saving money is an easy way to “sell” e- government to political leaders and the public. However, with few exceptions, e-government applications do not lower costs in the short term for government itself, though they may reduce costs for citizens and business. (…)” Advertem ainda que o e-government obriga a um

posicionamento claro relativamente à corrupção, na medida em que pode expor situações que de outra forma tinham menos visibilidade, situação que também acontece com a hipocrisia, dada uma maior facilidade em constatar as diferenças entre as acções e o discurso (Roadmap for E- government in the Developing World, 2001, p. 8).

No que respeita à terceira questão é frisado que “(...) readiness for e-government is not

only a governmental issue, starts with political will. Readiness also rests on information policy (...)”. Assim, é assumido que a disponibilidade de TICs, hardware, software e redes, bem como

de capital humano, a baixa resistência à mudança, entre outros elementos, devem estar sempre presentes no e-government, embora tais requisitos sejam sempre insuficientes. O principal elemento que deve estar presente no e-government deve ser a vontade de partilhar informação e a capacidade de análise para o que daí resulta. Em último caso, sem que exista vontade de partilhar informação e sem que exista um nível de patrocínio político efectivo, os objectivos que o e-

government se propõe alcançar não serão cumpridos (Roadmap for E-government in the

Developing World, 2001, p. 8). Aqui o reforço à necessidade de assegurar a interoperabilidade é vincado de forma extrema.

Já no que se relaciona com a preparação da resposta à quinta questão são feitas várias advertências “(...) see e-government from the user’s perspective... Do not re-invent the wheel...

think big, start small, scale fast (...)”. Basicamente, é frisado que de pouco serve apostar em

sistemas que ninguém usa, ou usa incorrectamente. A simplicidade e a usuabilidade são condições fundamentais para se poder afirmar que a perspectiva dos utilizadores é considerada.

Não vale a pena reinventar a roda (Roadmap for E-government in the Developing World, 2001, p. 15).

Entre os tópicos apontados para as questões 6 e 7, encontram-se a formação e os incentivos. Para as questões 9 e 10, a forma como são desenvolvidas as parcerias assume particular relevo. Além disso, a abertura do governo, no sentido de uma participação efectiva dos cidadãos afigura-se complexa, requer a consideração de alguns alertas, nomeadamente "(...) Be

prepared for the flood. When e-government enables the public to communicate with government, public participation often turns into a flood of communications, and often complaints. Managing public participation and processing government-to-public contacts are big challenges for e- government. (...)". Aceitar a participação implica assumir a possibilidade da existência de um

dilúvio de queixumes, muitos deles impossíveis de atender que, por sua vez, poderão gerar ainda mais queixumes. A automatização de procedimentos, com a fixação de critérios de decisão concretos, claros, são condição para permitir a transparência e conseguir a aceitação das decisões. Tal é fundamental para reforço da democracia e não se compadece com respostas aleatórias ou com ausência de respostas (Roadmap for E-government in the Developing World, 2001, p. 25).

A utilização intensiva de TICs na disponibilização dos serviços impõe um nível de estruturação de processos incomparavelmente maior que o imposto no modelo tradicional, independentemente da consagração de princípios transversais às diferentes possibilidades de prestação dos serviços públicos, nomeadamente o princípio da igualdade.

Por outro lado, quanto maior for o nível de estruturação de dado processo maior será a curva da experiência e maiores as economias de escala. Tais situações, como já se referiu, tenderão a traduzir uma redução de custos, particularmente no longo prazo, constituindo uma das grandes promessas do e-government (Garson, 2004).

No entanto Bertot e Jaeger (2008) reforçam vincadamente a ideia que o e-government não tem necessariamente que custar menos, especialmente se tivermos efectivamente em conta as necessidades do cidadão. Por outro lado, os autores reforçam ainda a ideia que um serviço que tiver difícil utilização é um serviço que não será usado. Tal situação reforça também a ideia que o e-government só representa uma forma de acesso efectivo se apostar na simplicidade, nunca renegando a facilidade de uso percebida, sistematicamente reforçada pelos modelos de aceitação da tecnologia.

Essa facilidade de uso e utilidade deve ser considerada não só para os trabalhadores públicos como para o cidadão utilizador. É nessa linha de raciocínio que também o UN E- Government Survey (2008) conclui que transformar as formas tradicionais de trabalho das organizações públicas e desenvolver culturas organizacionais que reconheçam e premeiem aqueles que abraçam a mudança e respondem positivamente às exigências do novo ambiente,

consiste num factor preponderante do sucesso. O e-government configura assim um quadro abrangente de suporte à governação que os autores deste relatório indicam seguir a linha de trabalho da PricewaterhouseCooopers e que deve colocar cada organização pública, numa primeira fase, a obter resposta a outras dez questões que entendem ser fundamentais e cuja resposta deve ser previamente dada pelos dirigentes:

1. Conhece com clareza as necessidades dos seus clientes/utentes? 2. O acesso à sua organização e informação é franco, transparente?

3. O utente está enredado em múltiplos serviços/áreas funcionais ou outras organizações para resolver um só problema?

4. A sua organização está a dar efectivo suporte aos seus utentes? 5. Os utentes com necessidades especiais estão a ser considerados? 6. Qual a taxa de resolução de um problema num primeiro contacto? 7. A sua organização procura aumentar a eficiência?

8. Os seus trabalhadores estão motivados e possuem as ferramentas necessárias para desenvolver as suas tarefas?

9. O seu serviço ao cliente está preparado para o futuro?

10. Tem capacidade para localizar e controlar os benefícios da mudança?

Estas respostas afiguram-se fundamentais porque, em última análise, o cidadão comum está bastante habituado à complexidade gerada pelas disfunções da burocracia presente na Administração Pública tradicional, pelo que dificilmente será receptivo ao desenvolvimento do e-government se ele projectar as limitações da burocracia para uma plataforma electrónica (UN E-Government Survey, 2008). Numa situação limite, as disfunções da burocracia, presentes na Administração Publica tradicional, sempre têm a vantagem de apresentar uma maior interacção humana. Nesta situação existirá alguém que se sabe que, num dado momento, com responsabilidade, ou não, houve os queixumes relativamente a um dado problema. Independentemente de alguma vez chegar a resolver esse problema, ou não.

Por outro lado, um funcionário público confrontado como solicitações múltiplas e em presença de tecnologia complexa, mesmo que lhe seja imposta através de um dado diploma legal, será renitente em utilizá-la se não lhe perspectivar utilidade e facilidade de uso.

Face ao exposto, o e-government, para ter sucesso, terá que se centrar nas pessoas. Neste domínio, a maioria dos estudos, centra-se na disponibilidade do serviço, na capacitação técnica e no uso da informação (Jaeger, 2005). Os objectivos governamentais e os impactos sociais do e-

government permanecem relativamente inexplorados, comparativamente aos elementos antes

Segundo Jaeger (2005) a utilização da informação e a eventual violação das liberdades e garantias individuais é um dos aspectos mais relevantes no e-government, dado que um governo, independentemente da forma que assumir, não é neutro nem livre de opinião.

O papel dos governos suporta-se num equilíbrio difícil face aos múltiplos interesses divergentes dos seus stakeholders, em que muitas vezes a solução óptima no curto prazo está longe de ser óptima no longo prazo e vice-versa.

Em qualquer caso a promessa de democracia não se pode dissociar da participação e da igualdade de tratamento. O reforço das liberdades e garantias decorrente do tratamento uniformizado dos cidadãos incluirá a salvaguarda da sua privacidade, sob pena de ser considerado inaceitável. Tal elemento impõe ao e-government a promessa que a privacidade deve ser sempre colocada em primeiro plano (Garson, 2004).

Em última análise a privacidade não pode ser dissociada da segurança (Nikkhahan et al., 2009). O nível de aceitação do e-government é influenciado pelas implicações sociais e culturais percebidas, nomeadamente nos domínios segurança da informação, privacidade e automatização de processos e criação de workplaces (Asgarkhani, 2005).

A adaptação e reestruturação de processos nas organizações públicas são também condição prévia para a maturação do e-government e, por isso, tal condição é uma das suas principais ameaças (Salhofer e Ferbas, 2007).

O e-government está dependente do conceito de tecnologia. Em sentido lato, tecnologia, traduz a metodologia utilizada por uma qualquer organização para transformar os seus inputs em

outputs (Camara, 1996). Tal facto impõe uma procura exaustiva de todos os estrangulamentos

que possam esbater ou eliminar o seu potencial.

A atribuição de diferentes valorações relativamente às várias variáveis abordadas constitui a base do posicionamento do e-government em diversos modelos de maturidade.

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 53-57)