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Estrutura política

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 119-124)

2.3 DESENHO ORGANIZACIONAL

2.3.3 Estrutura política

Segundo Sarmento (2002) a dimensão política é aquela que diz respeito ao poder, à forma como é exercido e aos condicionalismos que apresenta. Aqui a investigadora perspectiva o poder enquanto capacidade de influência, ou seja, enquanto forma de exercício da liderança, na medida em que implica condicionamento comportamental do indivíduo ou grupo sobre o qual é exercido.

Caupers (2002, p. 27) define ciência política como “(...) actividade humana tendente à

conquista, manutenção e exercício do poder no Estado (...)”.

Na estrutura política a manutenção do poder, entendido em sentido amplo, está dependente de uma contagem sistemática do número de apoiantes, particularmente eleitores, situação que pode até acarretar uma enorme pressão para nortear a acção para resultados em detrimento de processos (Sarmento, 2002).

Mintzberg (1995, p. 66) atribui particular relevo ao poder e à estrutura política reforçando que “(...) existem centros de poder que não são oficialmente reconhecidos... redes complexas e

ricas de comunicações informais, que por vezes complementam e contornam os canais estabelecidos (...)”. O argumento acentua a dimensão informal.

Também para Bilhim (2005, p. 303) as organizações “(...) além de serem constituídas por

indivíduos são, também, constituídas por alianças de interesses... as alianças são, assim, formadas para conciliar os interesses envolvidos..., existem devido à ambiguidade que rodeia os objectivos a atingir..., podem ser de curto ou longo prazo, e podem, ainda, envolver um assunto ou vários assuntos (...)“.

Os decisores serão obrigados a fazer alianças e lidar com a resistência à mudança, a fim de formular e executar as suas opções (Ferrary, 2009).

Já Teixeira (2005) refere que a estrutura política proposta por Mintezberg caracteriza-se essencialmente por aquilo que não tem. A figura seguinte apresenta o modelo de organização política proposto por Mintzberg.

Figura 27 – Organização política segundo Mintzberg

Fonte: Teixeira (2005).

A estrutura política possui uma dimensão mais informal do que formal, quando comparada com as estruturas enunciadas nos pontos precedentes. Por outro lado, a estrutura política “(...)

não tem componente dominante, mecanismo de coordenação fundamental, nem forma estável de centralização e descentralização.” Caracteriza-se ainda pelo comportamento de desencontro das diferentes forças que se exercem em quase todos os sentidos, traduzindo a dificuldade em moderar os conflitos internos existentes (...)” (Teixeira, 2005, p. 103).

O e-government pode modificar a estrutura política ao reforçar a obrigação de tornar formal, escrito, documentado, aquilo que no passado dificilmente ultrapassava os domínios da oralidade, possuía apenas uma dimensão informal. Dessa forma redesenha as relações com

stakeholders internos e externos, amplificando não só os fluxos de comunicação entre eles, como

aumentando o registo digital desses mesmos fluxos, disponibilizando mais meios de prova, sempre que tal se afigure necessário (Homburg, 2004).

A instabilidade da estrutura política tem ainda em conta os elementos enunciados na figura seguinte.

Figura 28 – Elementos centrais da organização política

Confiança

Política

Compromissos

Informalidade

Poder, confiança, informalidade e compromissos são elementos indissociáveis da estrutura política. Em última análise, escreve-se, logo formaliza-se, porque alguém poderá não confiar. Tal não significa que quem formaliza não confie ou que quem não formaliza, confie. Significa apenas que os limites entre formalidade e informalidade nem sempre são lineares para todos.

Neste sentido a confiança deve ser entendida como um fenómeno multidimensional e multideterminado (Freire, 2007; Seppänen, Blomqvist e Sundqvist, 2007).

Os diferentes prismas que perspectivam a confiança são normalmente agregados em dois grandes blocos, um que analisa a confiança enquanto estado psicológico, outro que a analisa enquanto resultado de uma escolha racional (Freire, 2007).

A estrutura política e a confiança dificilmente poderão ser dissociadas. A confiança é o resultado de um processo gradual no domínio das relações humanas (Blomqvist, 1997; Antunes, 2002).

Em qualquer caso, a confiança é essencialmente um conjunto de crenças, um vector de expectativas. Traduz um mecanismo através do qual os stakeholders podem responder de acordo com a sua percepção de risco e incerteza, face a um contexto de distribuição desigual do poder (Bovaird, 2005).

Numa perspectiva semântica, a credibilidade, enquanto crença de concretização de uma acção e a sinceridade, como resultado de um histórico de confrontação entre palavras e acções, não é dissociável do conceito de confiança, bem como as noções de fé e esperança (Blomqvist, 1997).

O conceito de confiança impõe a aceitação de um facto como verdadeiro, não questionável no momento, suportado na entrega da análise da informação à sua fonte. Não pode ser dissociado do acto de acreditar que se consegue prever o comportamento de alguém, que numa dada situação existirá uma actuação que é dada como certa. A confiança entende-se como algo que não é dissociável da partilha de valores, da previsibilidade do comportamento e da inexistência de negociação (Levi, 2000; Jones, 2002; Lundasen, 2002). Numa situação de limite, a intensificação da negociação implica perda de confiança (Antunes, 2002).

Por um lado a negociação representa um indício de uma democracia efectiva, igualitária. Por outro lado quanto mais intensa e em maior número forem as negociações, maior será a falta de confiança, na medida em que quem confia, renuncia à negociação. Tendencialmente, os interesses divergentes minam a confiança, na medida em que intensificam a negociação e, além disso, tendem a forçar a adopção de posições estremadas, incentivando a uma menor abertura entre os interlocutores. Quanto menor a abertura entre os diferentes interlocutores mais tempo é necessário para ultrapassar um impasse e gerar uma decisão (Blomqvist, 1997; Levi, 2000; Jones, 2002; Lundasen, 2002).

O reconhecimento de integridade e competência são fundamentais para possibilitar perspectivar a consistência nos comportamentos, situação que, por sua vez, é decisiva para permitir a previsibilidade das acções e aumentar a confiança (Freire, 2007).

No domínio da ciência política Mishler e Richard (2005) referem que as teorias institucionais e culturais discordam acerca da importância atribuída à confiança para os regimes democráticos, embora a maioria reconheça ser fundamental ao funcionamento dessa democracia. Numa perspectiva cultural, a confiança é fundamental para a aceitação dos valores e ideais democráticos (Mishler e Richard, 2005). A confiança política e social é entendida como um elemento central dentro de uma teia de relações causais que envolvem a socialização, o desempenho organizacional, o apoio político e o envolvimento dos cidadãos na vida política.

A escolha política é alicerçada numa estratégia de confiança que impõe complacência, lealdade e desejo de proteger e salvaguardar os interesses dos outros (Freire, 2007).

No entanto a relação entre confiança interpessoal e institucional é controversa (Mishler e Richard, 2005). Pode existir confiança numa pessoa isolada e não num grupo, mesmo que essa pessoa faça parte desse grupo, assim como é possível ter confiança num grupo e não ter confiança interpessoal num dos seus membros. Tal não significa que não possa existir afectação recíproca. Essa afectação será tanto maior quanto maior for o reconhecimento da impossibilidade atribuída aos detentores da confiança para afastar aqueles que não a têm (Lundasen, 2002).

A estrutura política vivencia a necessidade de uma negociação permanente, situação que enuncia desconfiança e tem, simultaneamente, a necessidade de acentuar a confiança como instrumento passível de atenuar os efeitos da negociação (Levi, 2000; Antunes, 2002).

A confiança, embora seja um elemento determinante da estrutura política, não garante que em qualquer relação os diferentes interesses em competição ganhem, pelo contrário. Tal como quando dois amigos decidem sair à noite e um idealizou uma ida a um bar e o outro uma ida a um centro comercial, o que confiou foi obrigado a sacrificar o seu interesse, tornando-se seguidor. Esta situação leva a que a existência de mecanismos de compensação seja uma necessidade, sob pena da confiança ser esbatida ou possa mesmo desaparecer (Antunes, 2002).

A informação, por si só, já representa um mecanismo de compensação. É neste contexto que Tomkins (2001) coloca a confiança enquanto elemento central das necessidades de informação. Se a confiança impõe previsibilidade, então requer informação como catalisador do conhecimento, sendo este último elemento um derradeiro instrumento da redução da falta de previsibilidade.

Por outro lado o conhecimento é condição para alcançar a sabedoria enunciada na aritmética de valor proposta por Zorrinho (2003). Este factor torna necessária a reiterada emissão de informação por parte do depositário da confiança, sem que exista a necessidade do depositante a solicitar. A relação entre governança e transparência já pressupõe uma disponibilidade para prestar informação, mesmo que não solicitada de forma directa.

Na interacção humana a confiança, no seu sentido pleno, é um acto com uma natureza eminentemente emocional e não racional. O acreditar reiteradamente em tudo o que dito, sem nunca questionar, limita a possibilidade de salvaguardar os próprios interesses, levando a que seja aceite como verdadeiro tanto situações que são concretizáveis como aquelas que não o são (Jones, 2002).

O depósito da confiança comporta sempre risco, logo requer retorno. A ocorrência do factor de risco, que mais não será que a violação de um compromisso, acarreta insegurança, reforçando a necessidade de controlo (Lundasen, 2002).

Por exemplo, o elevar de expectativas a partir da promessa de algo que não depende directamente de quem promete, feito a alguém racional, independentemente da eventual concretização, poderá minar a confiança na medida em que pode ser entendido como aproveitamento e um atentado à inteligência do interlocutor. Por outro lado, o incumprimento de uma promessa feita a alguém que a aceitou, numa perspectiva eminentemente emocional, é também um elemento que corrompe a confiança e que projecta instabilidade na estrutura política. Os compromissos resultam da promessa, explícita ou implícita, que origina a percepção de atribuição de um dado benefício. A não concretização do benefício esperado traduzirá um estímulo à negociação, na medida em que poderá representar uma redução da confiança. Desta forma estabelece-se uma relação de dependência bidimensional entre confiança e compromissos.

Por último, no que respeita à informalidade, surge potencialmente como reflexo da dinâmica de interesses em permanente ebulição dentro da estrutura política, da rapidez na dinâmica entre actores e interesses, bem como do facto de tornar admissível, ou pelo menos de facilitar, o incumprimento de compromissos assumidos, face à sua heterogeneidade e até oposição.

Em presença de tudo o que se referiu a confiança é um conceito dinâmico, uma construção permanentemente inacabada, determinante do desempenho organizacional que, numa perspectiva empírica se entende que afecta a implementação do e-government e cuja optimização passa por uma adequada atenção aos stakeholders, enquanto elemento decisivo para poder compreender a sua dinâmica e a forma como essa dinâmica contribui para potenciar ou inibir o desenvolvimento do e-government.

Reforça-se que o e-government não é algo passível de ser exclusivamente implementado através da emissão de diploma legal, independentemente de poder ser legalmente imposto.

Também não é expectável que aconteça num momento temporal delimitado, entre o momento “x” e o momento “y”, será algo progressivo que irá conviver com um conjunto de modelos em ebulição, com características dispares, nomeadamente os que resultam do desenho funcional e respectivas características herdadas do modelo burocrático, com o desenho em rede ancorado às premissas da NGP, com a organização política, entre outras.

A dependência da informação como elemento aglutinador de um desenho em rede, a horizontalização do controlo e a sua deslocação, ainda que parcial, dos níveis de hierarquia superiores para entidades externas independentes, terá consequências na forma como os diferentes stakeholders perspectivam a satisfação dos seus interesses, acarretando também alterações nas estruturas de poder, logo modificando a estrutura política.

A necessidade de convivência mútua entre diferentes estruturas releva o papel da informação e da comunicação entre subsistemas diferentes e impõe, por isso, um olhar atento à interoperabilidade.

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 119-124)