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E-government versus e-business

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 63-68)

2.2 E GOVERNMENT : OPORTUNIDADE PARA REDESENHAR OS SERVIÇOS PÚBLICOS

2.2.4 E-government versus e-business

O modelo de negócio característico do sector privado apresenta o seu suporte estratégico no mercado, enquanto no sector público o modelo de negócio decorre da estratégia de cada governo. Essa estratégia assume-se dever ser indissociável dos cidadãos, logo envolvente de um número bastante maior de actores, facto que torna o e-government bastante mais complexo, quando comparado com o e-business (Garson, 2004).

O e-business, enquanto uma nova forma de potenciar a realização de negócios por via electrónica, é mais amplo que o e-commerce, na medida em que reforça o serviço ao cliente além do mero suporte electrónico comercial e estritamente transaccional. No entanto, o aumento da amplitude do conceito de e-business, comparativamente ao e-commerce, aproxima-o de forma ligeira ao conceito de e-government, mas sem nunca o sobrepor.

Quer os conceitos de e-business, quer de e-commerce, são anteriores à massificação da Internet, começando por ser suportados por software Electronic Data Interchange – EDI. Tal não significa que não tenha sido a Internet que os desenvolveu em larga escala, conferindo-lhe um potencial de expansão improvável antes do recurso a essa tecnologia (Rodrigues, 2002).

Barzilai-Nahon e Scholl (2007) referem que tradicionalmente as grandes diferenças entre organizações públicas e organizações privadas decorrem de constrangimentos ambientais, extensão dos mandatos organizacionais e, finalmente, processos internos e incentivos. No que respeita aos constrangimentos ambientais eles reflectem o entendimento da necessidade das organizações públicas terem em conta a totalidade dos cidadãos, quer aqueles que contribuem positivamente para o seu negócio quer aqueles que apenas contribuem negativamente. Quanto à extensão dos mandatos organizacionais, muitas vezes quem toma uma decisão numa

determinada data, tem plena consciência que já não estará nessa organização num futuro próximo, pelo que mais dificilmente pode ser responsabilizado pela decisão. Relativamente aos processos internos e incentivos, acabam por reflectir as duas primeiras características, na medida em que retiram agilidade e desenvoltura, face a uma burocracia penosa, ancorada à necessidade de responsabilização.

Os SI, quer nas organizações públicas, quer nas organizações privadas, não são alheios às preocupações centrais dos decisores. Assim, deve considerar-se o facto dos primeiros terem como preocupações centrais não só a eficiência económica como também política, contrariamente aos segundos, cuja preocupação nuclear é de natureza eminentemente económica, centrada na rentabilidade (Barzilai-Nahon e Scholl, 2007).

A consideração destas preocupações não é dissociável do desempenho e até mesmo da sobrevivência das organizações. Pelo que facilmente se percebe que a complexidade associada ao e-government será bastante maior quando comparada à complexidade associada ao e-

business.

Tal não significa que o e-government possa ser dissociado do e-business, na medida em que um incentiva o desenvolvimento do outro. A figura seguinte enuncia a espiral de desenvolvimento que envolve os dois conceitos.

Figura 9 – Espiral de desenvolvimento

E-business Globalização

E-government Internet

Fonte: Adaptado de Rodrigues (2002).

A implementação e desenvolvimento do e-business estão amplamente relacionados com o elevado nível de patrocínio da gestão de topo. Embora tal necessidade seja igualmente pertinente e decisiva no e-government, é também mais difícil de concretizar, face à multiplicidade de interesses dos diferentes stakeholders e à necessidade de fragmentação do poder da própria estrutura política (Barzilai-Nahon e Scholl, 2007).

No que concerne ao impacto dos stakeholders, quer no e-commerce quer no e-government, verificam-se similares constrangimentos, ainda que em escalas diferentes. A simetria da

informação é preocupação comum, face aos efeitos potencialmente nefastos da exposição às contradições (Barzilai-Nahon e Scholl, 2007).

A aplicação de regras dos modelos de e-business aplicáveis ao sector privado tem apenas uma aplicação parcial no e-government (Garson, 2004). Um dos propósitos do e-business passa pela redução do número de intermediários no processo de negócio, numa tentativa de passar de um modelo de distribuição indirecta para um modelo de distribuição directa – produtor a consumidor. Tal situação não tem aplicação no e-government na medida em que na maioria das actividades do sector público não existem intermediários a eliminar.

Um outro dos elementos fulcrais do e-business passa por estimular o lucro através do aumento do volume de vendas ou pela redução de custos. Garson (2004) defende também que tal situação não ocorre integralmente no e-government, na medida em que o objectivo passa em primeiro lugar pela redução de custos. Refere ainda que, no que respeita à utilização dos portais e no caso do e-business, o leque de possibilidades de exploração é bastante mais alargado que no e-government, dado que elementos como comissões, publicidade, entre outras formas de gerar proveitos, não têm uma significativa aceitação social nas iniciativas de e-government.

Quanto às similaridades e diferenças entre e-commerce e e-government Barzilai-Nahon e Scholl (2007) concentram-se nos seguintes aspectos:

 Gestão da informação – o sector público acentua em primeiro lugar a importância

da facilidade de uso, das aplicações acedidas a partir da Internet e enuncia a actualização da informação e ciclo de vida dessas aplicações como os maiores desafios. Já no e-commerce a credibilidade constitui o maior desafio a ter em conta. Para o e-government a responsabilidade legal e seriação da quantidade de dados a tratar assumem maior relevo quando comparado com o e-commerce. As formas de entrega e respectivos canais traduzem idênticas preocupações nos dois contextos. A informação em tempo real e disponibilidade do serviço 24*7, e a partilha de informação são também elementos comuns;

 Gestão de processos – os volumes de processos e a sua heterogeneidade é

incomparavelmente maior no sector público, traduzindo a reconhecida obrigação do redesenho desses processos. Já a celeridade das transacções representa um problema comum aos dois contextos;

 Foco de atenção – cliente versus cidadão, logo verifica-se a necessidade de

orientar a acção para o cliente, assumindo o e-government a necessidade de perspectivar o cidadão como um cliente. Contudo o e-government repudia o tratamento desigual mesmo em situações de lucratividade nula, ou negativa. O cidadão perspectivado como cliente amplia significativamente os perfis de contacto e os fluxos gerados;

Divisão digital – no e-government a preocupação com a literacia digital e com a exclusão leva à procura sistemática de alternativas para incentivar o acesso, quer através do desenvolvimento de novas soluções tecnológicas, quer através da capacitação dos cidadãos;

 Segurança – ambos os contextos enunciam a segurança como determinante do seu

sucesso mas a níveis diferentes. Enquanto no e-commerce ela se centra numa dimensão eminentemente individual, já no e-government é assumida uma dimensão individual e colectiva, facto que impõe a atribuição de particular importância a problemáticas como o terrorismo, por exemplo;

 Uniformização – apresenta elevada importância nos dois contextos;

Recursos – a aplicação do e-government, face à sua dimensão e heterogeneidade,

implica um maior consumo de recursos.

A grande maioria dos aspectos apontados ao e-commerce está presente no e-business, no qual se inclui.

Em todo o caso as diferenças não se esgotam na listagem enunciada. Segundo Garson (2004) o e-government apresenta ainda um conjunto adicional de limitações, conforme seguidamente se enunciam:

O e-government não é condição suficiente para completar a equação da

prosperidade, na medida em que é problemática a existência de relação directa entre investimentos em TICs e produtividade. Pode não ser possível assumir que os investimentos em TIC farão pelos governos, na década actual, aquilo que esses mesmos investimentos poderão não ter feito na década passada pelo sector privado;

A filosofia do just-in-time – JIT – tem menor aplicabilidade no e-government do

que aquela que tem no e-business. No e-government a obtenção de recursos depende mais da dotação disponível que da procura. Além disso, a maioria do custo das organizações públicas está concentrado em pessoal e não em matérias, ou menos ainda, em mercadorias;

 A orientação para o cliente, ou para o utente, embora seja a referência mais usada

em defesa do e-government é de difícil operacionalização face a sua enorme heterogeneidade e à possibilidade de existência de desequilíbrios no nível de importância atribuída aos vários stakeholders. Numa escola, por exemplo, os utentes são os alunos, mas também os professores, os próprios pais dos alunos e, em última análise, os cidadãos. Qualquer um deles poderá apresentar interesses legítimos mas sem garantia de compatibilização;

 O aumento da exigência das sociedades actuais relativamente às actividades desenvolvidas pelas organizações públicas leva à necessidade de registo e transformação de maiores quantidades de dados, maior acesso e mais informação, situação que pode não permitir uma redução do consumo de recursos tão significativa quanto aquela que poderia ser esperada;

A estruturação de processos e estandardização de software requer um nível de

sincronização e de alinhamento entre estratégia de negócio, SI e tecnologias de suporte que, face à natureza das organizações públicas, é extremamente difícil de conseguir;

 O desenvolvimento de parcerias público-privadas é também deveras complexo no

e-government face à multiplicidade de interesses envolvidos, muitas vezes completamente divergentes;

O e-government permitirá o aumento da amplitude de serviços prestados pelas

organizações públicas, permitido o aumento das economias de escalas, mas tal situação poderá traduzir-se num simples efeito de substituição de actividades, na medida em que o aumento das necessidades acarretará o aumento da complexidade de processos. Esta situação traduz o princípio de que se pode exigir sempre mais a quem mais dá, levando a um ciclo permanentemente inacabado e consolidando a perspectiva pessimista do e-government, situação que já anteriormente se mencionou.

Quer o e-government quer o e-business têm potencial para redesenhar as organizações, no sentido de as dotar de mais eficiência, nomeadamente ao reduzir custos ou ao ampliar a qualidade dos serviços prestados.

Contudo, obrigam a novas formas de pensar os processos de negócio, requerem a estruturação como condição para automatização de tarefas repetitivas, de elevado consumo de recursos e pouco, ou nenhum, valor acrescentado.

Para tal ser conseguido é fundamental compatibilizar interesses divergentes e redesenhar as organizações, no sentido de expor interesses cuja principal preocupação passa pela manutenção do seu próprio poder e que se assume poderem ser efectivos bloqueios a um novo desenho organizacional.

Se em qualquer caso a mudança é assumida como imprescindível, também em qualquer caso a mudança pode ser percepcionada como ameaça, situação que tenderá a desencadear mecanismos defensivos e a amplificar ainda mais a divergência de interesses.

Face ao que foi referido a complexidade associada ao e-government é bastante maior que aquela que está associada ao e-business.

No documento E-government na Gestão de Stakeholders (páginas 63-68)