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BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL NO SEMIÁRIDO: UMA AVALIAÇÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO POLO

2 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

partir da experiência do polo Petrolina-Juazeiro

Nesse sentido, este capítulo tem como objetivo avaliar as políticas públicas implementadas no polo Petrolina-Juazeiro, desde os anos 1960, pela via da implantação de perímetros de irrigação, em busca de lições e instrumentos que contribuam no combate ao problema da pobreza no semiárido. Para tal, procurou-se captar a forma como ocorreu a atuação pública no polo e suas con- sequências para a realidade socioeconômica da microrregião, buscando qualificar em que sentido, a partir da experiência estudada, é possível vislumbrar boas perspectivas e ferramentas para solucionar ou minorar a questão no semiárido. A escolha do polo Petrolina-Juazeiro obedeceu a critérios não apenas ligados à sua localização (semiárido nordestino), como também à sua importância, sendo este o mais dinâmico dos polos de fruticultura irrigada no Nordeste, bem como por ter sido alvo de políticas públicas de grande porte, constituindo-se, assim, como uma importante referência para análise de políticas de desenvolvimento para o semiárido.

Feita essa introdução, na sequência, o trabalho irá apresentar uma breve contextualização sobre as diferentes formas de atuação governamental relacio- nada ao desenvolvimento territorial. Na terceira parte, procurou-se descrever as principais características do semiárido, destacando seus precários indicadores socioeconômicos. Em seguida, buscou-se enquadrar o polo Petrolina-Juazeiro dentro do contexto do semiárido, apresentando, ainda na mesma seção, um levan- tamento de como foram conduzidas as políticas no polo e sua atual estruturação produtiva, resultante das intervenções e da posterior dinâmica seguida na região. Na quinta parte, recai-se sobre a evolução de alguns indicadores socioeconômicos da microrregião, com o intuito de traçar o perfil do desenvolvimento provocado no polo em função da ação governamental. Para tal, utilizaram-se dados oficiais, os quais foram agregados de modo a possibilitar a comparação entre o polo

vis-à-vis o semiárido e suas principais aglomerações. Por último, são feitas algumas

considerações finais, buscando lições que contribuam no debate sobre o combate ao problema da pobreza no semiárido.

2 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

O debate em torno do desenvolvimento, apesar de antigo, foi intensificado durante a década de 1950, com a devastação da Europa (após a Segunda Guerra) e o início da Guerra Fria.3 Nesse processo, tendo como referência os postulados

teóricos keynesianos, a participação do Estado no desenvolvimento das nações

3. Segundo Mendonça e Ortega (2005), a Guerra Fria justifica a intensificação do debate, pois, com ela, capitalistas e comunistas passaram a priorizar a busca pela prosperidade de regiões subdesenvolvidas, visando impedir o avanço de um sistema sobre o outro nessas regiões.

capitalistas assumiu um protagonismo nunca antes visto, emergindo uma série de discussões em torno do desenvolvimento regional, visando propor políticas de superação das desigualdades regionais das nações.4 No entanto, todas as

teorias derivadas desses debates apresentavam uma linha de pensamento rela- tivamente homogênea, ou seja, todas defendiam que a atuação estatal deveria ser focada basicamente no incentivo a grandes projetos de investimentos. Nesse sentido, em grande medida, a formulação e a implantação dos projetos estavam desvinculadas das diversidades econômica, social e política de cada território.

Essas teorias também influenciaram fortemente o Estado brasileiro na formulação de políticas públicas. Desse modo, o Brasil dos anos 1960/70 acabou empregando rotineiramente políticas cujo planejamento era definido de maneira centralizada, sobretudo focalizada na implantação de capital físico. Contudo, em meados da década de 1980, as estratégias de desenvolvimento territorial começaram a tomar um novo rumo, devido a cinco razões básicas: i) a reformu-

lação do papel do Estado, a partir de meados dos anos 1980, fruto de uma nova

realidade histórica de falência do sistema centralizado estatista; ii) a demanda

vinda das comunidades locais, demandando maior participação na formulação e na

implantação dos programas; iii) a promulgação da Constituição de 1988, iniciando um processo de descentralização político-administrativa com distribuição de res- ponsabilidades e poder decisório para os Estados e municípios, reduzindo, assim, o peso da União; iv) as recomendações de instituições internacionais, como Banco Mundial, que passaram a recomendar o desenvolvimento local como política de redução das obrigações dos Estados e tentativa de equilibrar as contas públicas; e v) a influência das experiências da Terceira Itália e do Programa Leader5 sobre as políticas de desenvolvimento aplicadas no Brasil.

Dessa forma, nos anos 1990 tem início um novo ciclo do modelo de desen- volvimento em que, segundo Acselrad (2002, p. 34), “substitui-se a política operada em escalas abrangentes pelos procedimentos técnicos acionados em escalas locais e fragmentárias”. Já Fisher (2002, p. 27) conclui haver uma passagem de uma configuração política “baseada na predominância da ação governamental sobre o local para um policentrismo do poder”. Enfim, desde então, as políticas de desenvolvimento deixam de se basear apenas na dotação de capital físico exógenos ao local, passando a ter um maior protagonismo dos atores locais, acar- retando, desse modo, maior respeito às vocações e às tradições existentes na região,

4. Como destacaram Mendonça e Ortega (2005), nesta época surgem diversos estudos sobre o tema – Myrdal (1960), Hirschman (1958 apud Schwartzan, 1977), entre outros.

5. Este programa, criado em 1991, buscava desenvolver as zonas desfavorecidas de alguns países europeus, promovendo a participação da população e dos agentes econômicos locais na elaboração e na gestão dos projetos, de modo que estes auxiliassem na proposição de saídas criativas para a geração de atividades que elevassem a renda e gerassem emprego nos territórios específicos (Ortega e Cardoso, 2002).

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Desenvolvimento Territorial no Semiárido: uma avaliação a partir da experiência do polo Petrolina-Juazeiro

na medida em que há um maior comprometimento da comunidade com o êxito dos programas implementados.6

Portanto, de forma abrangente, é possível resumir em duas as formas de atuação estatal com vistas ao desenvolvimento territorial: i) o de cima para baixo, cuja estratégia de desenvolvimento local é planejada de forma centralizada pela esfera federal; e ii) o de baixo para cima, em que os planos de desenvolvimento local são feitos de forma descentralizada, por meio da participação das esferas públicas e privadas. Graziano da Silva e Takagi (2004) destacam que o principal contraponto dessas duas políticas está nas suas prioridades: no “de cima para baixo”, os objetivos estão centrados no provimento de infraestrutura; enquanto no “de baixo para cima”, o objetivo concentra-se no fortalecimento da organização social.

Esse trade-off entre as duas formas de atuação apresenta-se como um problema no momento em que os formuladores de políticas públicas procuram estabelecer suas estratégias de desenvolvimento local. Além disso, dada a natureza da escassez de recursos públicos, enfatiza-se a necessidade de obtenção de máxima eficiência no emprego do orçamento. Nesse sentido, apesar de ser um desafio complexo, é fundamental se chegar à fórmula em que os melhores resultados possam ser alcançados, tanto no campo social quanto no econômico. Desse modo, acredita-se que, para se potencializar os benefícios derivados das políticas de desenvolvimento local, é necessário que haja uma combinação das estratégias “de baixo para cima” e “de cima para baixo”, ou seja, é necessário que haja uma forte atuação conjunta nas duas instâncias (local e central).

No entanto, para que a atuação pública consiga melhoria social de forma sustentável em um determinado território, é necessário não só que o Estado combine as estratégias de desenvolvimento, mas também que haja na localidade beneficiada uma forte participação da sociedade civil em torno da política adotada, ou seja, que a comunidade apresente o que se conhece como capital social.7 Isso é importante porque, quanto mais engajada está a sociedade em torno desses objetivos específicos, mais eficaz tende a ser a atuação pública em determinada localidade. Desse modo, o capital social pode explicar por que

6. Por exemplo, em 2003, o Ministério do Desenvolvimento Agrário criou o Programa de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PDSTR), com o objetivo de promover e apoiar as iniciativas da sociedade civil e dos poderes públicos, como forma de reduzir as desigualdades regionais e sociais (Brasil, 2005a). Na mesma linha, em 2008, o governo federal lançou o Programa Territórios da Cidadania (PTC), que deu sequência ao PDSTR, dando, contudo, maior enfoque à universalização de programas básicos de cidadania por meio de uma estratégia de desenvolvimento territorial sustentável (Brasil, 2009).

7. De maneira bastante ampla, pode-se conceituar o capital social como sendo as características da organização social (como, por exemplo, confiança, normas e sistemas) em torno de uma atividade produtiva local ou de algum objetivo específico (por exemplo, visando à melhoria na educação, na saúde etc.), que facilitam as ações coordenadas e, assim, contribuem para aumentar a eficiência das ações conjuntas da sociedade.

as mesmas políticas públicas dirigidas a comunidades aparentemente semelhantes apresentam resultados distintos.8

Portanto, de um modo geral, é possível afirmar que as contemporâneas teorias do desenvolvimento com enfoque territorial apontam para a necessi- dade do estímulo ao capital social das diversas comunidades, visando, assim, potencializar os benefícios das políticas públicas que tenham como objetivo o desenvolvimento local.