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UMA COMPARAÇÃO ENTRE A EXPERIÊNCIA ITALIANA E PORTUGUESA Introdução

II. TURISMO, TERRITÓRIO E CULTURA

II.1 O turismo: definição, origem e tipologias

II.1.1 Breves notas sobre a origem e o significado do turismo

O cidadão comum está familiarizado com o significado do termo “turismo”, mas algo mais complexo é procurar uma definição que tenha em conta os diversos aspetos que o compõem, sobretudo se se considerarem as diversas definições que se foram sucedendo no tempo, desde a origem do próprio vocábulo.

Como está amplamente referindo, o termo “turismo”, difundido a partir do séc. XIX, pode derivar tanto do verbo inglês to tour 22 (passear, fazer um determinado percurso), como do

verbo francês de origem medieval tourner23 (Cavallaro, Pipino, 1991), a partir do qual se

difundiu por outras línguas, mantendo quase inalterada a sua raiz24.

Existem outros termos para expor este fenómeno, mas claramente apresentam conteúdos e significados diferentes do atual conceito de turismo.

Assim, por exemplo, em italiano, existe o vocábulo “vacanza”, que provém do latim

vacare, da derivação do adjetivo latim vacuus (vazio, livre, não ocupado). A “vacanza” é a

possibilidade de passar o tempo livre (leisure, loisire), ou seja, o período de tempo que

22 A palavra inglês tourism aparece já no ano de 1811 no Oxford English Dictionary. Perez (2009), citando

Smith (1996, p.20), afirma que esta palavra nasce numa revista “Sporting Magazine”. Mais antigo, ainda, é o termo tourist, que prevalece desde 1780.

23 Derivação do verbo latino tornare (“circular em torno”, “movimentar-se em torno”) e da palavra grega

tórnos, que significa “compasso” mas também “tornio”. O conceito de turismo está, portanto, associado à ideia de “regressar”, de “girar”, de “viagem circular”, de “movimento” em torno de um ponto ou de um espaço central; relaciona-se com “partir” e “retornar” ao mesmo ponto.

24 Em italiano, surge, pela primeira vez, no ano de 1904, na forma de adjetivo “turistica”, para indicar uma

exposição dedicada ao tempo livre (Innocenti, 2001). Em português, tal termo aparece na literatura, pela primeira vez, no séc. XX (Cf. Houaiss Dicionário da língua portuguesa).

52 não é dedicado ao trabalho, ao estudo ou a qualquer outra atividade vinculativa por uma pessoa ou núcleo familiar25.

Existe, no entanto, ainda um outro meio mais simples e, simultaneamente, mais complexo para definir o turismo, aquele que se revê na origem da procura turística. De um modo geral, é possível subdividir a procura em duas partes distintas: a primeira, refere-se à ação que dá início à experiência; a segunda, por sua vez, aplica-se ao lugar de destino, onde se vivencia grande parte da experiência turística. Como será abordado mais adiante (cf. capítulo 1.1.3), com base nas caraterísticas geográficas do lugar (exemplo o mar, a montanha, o campo, etc.) é possível, também, individualizar um critério de classificação da atividade turística.

A primeira fase trata da ação de movimento, transferência, que se incorpora no significado do termo “viaggio”, em italiano e em português, “viagem”. Ambos os termos têm em comum a mesma raiz latina: viàticus26, com o significado alargado de “caminho”. Neste

grupo, podem contemplar-se todas as motivações que induziam às viagens, no passado, como por exemplo as peregrinações aos lugares sagrados, nos anos de mil e duzentos e mil e trezentos D.C.27, tão importantes na história da Europa medieval cristã, ou as

viagens para a Itália, por motivos culturais, a partir do séc. XVI - que se transformaram, posteriormente, nas conhecidas viagens escolares de jovens aristocratas ingleses da

Grand Tour28, iniciadas alguns séculos depois (Boyer, 1997).

A outra fase, que lhe sucede, faz referência ao lugar de estada, que representa a meta final da viagem. O hábito de passar o tempo em condições de repouso em lugares agradáveis, longe dos espaços da vida quotidiana tem, decerto, uma origem remota. Assim, por exemplo, na idade romana podemo-nos recordar do costume, por parte das classes mais abastadas, de passar o período de repouso em luxuosas propriedades fora dos perímetros urbanos, dando origem às feriari (da qual deriva o termo de estar de

25 Segundo Cobin (1996), a expressão de tempo livre, na cultura ocidental, é fundada sobre uma dupla

definição: a de otium, ou seja, o tempo coltivato e a de ri-creatio, a folga do trabalho. O otium é o tempo para si mesmo, da elite social, portanto, de conversa, leitura e viagens. A ri-creatio foi, por muito tempo, o repouso vivido coletivamente, primeiro controlado pela religião e, posteriormente, com o decorrer do tempo, é definitivamente secularizada. Algumas línguas europeias utilizam termos específicos, como ocio, leisure, loisir, freizeit, que não têm correspondência em italiano.

26 Mais tarde, derivado deste substantivo masculino, forma-se o substantivo neutro viàticum, com o

significado de provisões, abastecimentos para uma viagem, dinheiro para a viagem, mas também recursos, em sentido figurativo. Portanto, o conceito de viagem reflete sobre algo que o indivíduo conserva para depois consumir. Aquilo que se recolhe de importante numa viagem e se transforma em recurso não é nada mais que a experiência direta com o lugar, com as pessoas que se encontram e com as suas caraterísticas.

27 Os caminhos de fé com destino aos lugares sagrados, como a Via Francigena (do Norte da Europa até

Roma) ou como o Caminho de Santiago (da Europa Central até Santiago de Compostela), tiveram um papel importantíssimo para no desenvolvimento social e económico. Para aprofundamento, cf. Stopani, (1991).

28 Segundo De Seta, a expressão Grand Tour foi usada, pela primeira vez, na viagem em França, por Lord

53 “férias”, comum em ambas as línguas) e aos rusticari (transferir-se para a residência do campo por um período de tempo). Ambas as modalidades de passar o tempo livre espelham duas diferentes conceções filosóficas: o epicurismo e o estoicismo e, como realça Battilani (2009), estas teorias têm um outro aspeto que diz respeito aos conteúdos e aos significados sobre como considerar o repouso longe da residência habitual.

A primeira teoria defendia que o mundo avançava sem um objetivo e, sendo assim, a humanidade não pode fazer mais nada que fugir da dor, procurando o prazer (apenas espiritual) – portanto, a propriedade no campo era vista como o jardim de Epicuro, onde se pode experimentar o prazer da alma, na observação da beleza da Natureza.

O estoicismo, por sua vez, indicava, na virtus, a fonte da liberdade da humanidade: pode- se gozar da liberdade apenas afastando-se da vida mundana, dos prazeres do convívio; apenas uma vida regrada coincide com o ideal estoico (não é por acaso que Séneca foi um crente convicto da vida no campo).

A prática de passar o tempo no campo, por parte dos aristocratas europeus, reapareceu a partir do Renascimento, tal como foi demonstrado pelas refinadas residências, projetadas por artistas de renome. Basta, por exemplo, recordar as magníficas quintas em Veneto de Palladio, ou as preciosas propriedades patrícias na época renascentista, nas terras de Toscana29. A partir deste hábito, podemos ligar ao termo italiano de “villegiatura”, do latim villa rusticae, a residência no campo onde passar o tempo livre, ou então, o conceito

português posterior, “veraneio”, derivado do verbo “veranear”, passar o verão, vocábulo que apareceu, pela primeira vez, em 187430 (por sua vez, de origem no termo “verão”, do

latim vērānum).

Estes podem ser considerados os primórdios do turismo e, deste modo, referem-se a um fenómeno que abarca viagens que nem sempre são motivadas pela recreação, no sentido estrito. Estas viagens são também caraterizadas por fluxos de intelectuais e outros sujeitos, sobretudo de classes sociais elitistas (como os aristocratas, religiosos e na idade moderna, a emergente burguesia) e por alguns fluxos económicos muito reduzidos. São, ainda, caraterizadas pela ausência de estruturas e serviços especializados, com um impacto económico pequeno, ou mesmo nulo, nos locais visitados.

29 Um documento interessante da descrição dos aristocratas venezianos em villeggiatura, durante o século

XVIII, é oferecido pela Comédias de teatro "La trilogia della villeggiatura" de Carlo Goldoni (1707-1793). Nas obras, “Le smanie per la villeggiatura(A ânsia para a villeggiatura), “Le avventure della villeggiatura” (As aventuras da villeggiatura) e “Il ritorno della villeggiatura” (O regresso da villeggiatura), o autor descreve, de uma forma magistral, os caprichos, os amores de verão, os mal-entendidos, a calúnia que caraterizam vida de villeggiatura de uma família aristocrática que, a fim de fazer bem na sociedade, dissipa grandes quantias de dinheiro (Cannizzaro,2011).

54 Segundo a maior parte dos historiadores do turismo, o conceito de turismo, tal como o entendemos hoje, surge ligado à revolução industrial. Inicia-se no fim de mil e setecentos, para se desenvolver, principalmente, durante o decorrer de mil e oitocentos e nos primeiros anos de mil e novecentos, favorecido pelo crescimento paralelo das vias navegáveis e das ferrovias. Isto determinou um forte acréscimo de estruturas especializadas em lugares destinados as férias como, por exemplo, as cidades termais europeias, além do surgimento de novas profissões ligadas ao movimento turístico e, simultaneamente, à difusão de viagens organizadas com fins lúdicos. Paralelamente à evolução do turismo termal, houve uma propagação do turismo climático nas localidades marítimas, montanhosas, fluviais e, posteriormente, o turismo balnear31.

Um elemento importante na invenção do turismo moderno foi o papel dos escritores e publicistas, que contribuíram para a criação de uma mentalidade coletiva, na procura do estranho e do desconhecido. Do mesmo modo, estes escritores participaram na criação das ideias românticas de reencontro com a natureza e a história, as águas, o mar e o património cultural (Pérez, 2009).

Este tipo de literatura foi um enorme sucesso na Europa daquela altura. Autores como Stendhal (“Memórias de um turista”, 1838) ou Almeida Garret (“Viagens na minha terra”, 1846) são o fruto de um nacionalismo romântico, que deram lugar ao gosto pelo conhecimento de lugares diferentes e à escrita de guias e itinerários de viagens.

No início de mil e novecentos começou a emergir o chamado turismo branco, bem como as primeiras formas de turismo escolar e de turismo social, este último sustentado por entidades públicas e também indústrias privadas (Rocca, 2013). Tal fenómeno teve uma baixa relevância quantitativa até à metade do séc. XX.

Somente depois da II Guerra Mundial e das alterações económicas e sociais e, sobretudo, com a evolução dos sistemas de transporte, é que o turismo se tornou numa atividade humana fundamental, tanto que hoje abrange dezenas de milhões de pessoas, tendo em consideração quem viaja (os turistas) e quem torna possível a viagem (organizações e empresas turísticas)32.

De facto, mesmo nesse período, por volta da metade do século passado, surgiram as primeiras definições que descreviam tal atividade. Innocenti (2004, p. 12) defende que «as

31 Boyer (1997) esclarece que os ingleses inventaram, para além da viagem pedagógica, a estação termal

aristocrática, em Bath, os banhos de mar em Brighton e a estada em montanha em Chamonix.

32 Uma das primeiras tentativas para explicar o crescimento da procura do turismo é a Curva de Engel:

quanto mais rica é uma nação, mais baixa será a percentagem de riqueza total empenhada na compra de alimentos. Tal teoria foi muito criticada no passado, mas hoje apresenta-se como válida para explicar como, no princípio do séc. XX, o turismo se tornou um elemento caraterístico das classes altas. Mais tarde, depois da II Guerra Mundial, o turismo regressou como uma atividade normal, tanto que hoje parece ter conquistado o valor associado a uma necessidade básica, compreendida nos direitos do indivíduo.

55 primeiras definições de turismo se devem, respetivamente, a Norval (1937), a Hunziker e Kraps (1942)». O primeiro define tal atividade como «um movimento gerado por alguém que entra num país estrangeiro, permanecendo no mínimo 24 horas e fazendo transferências de dinheiro ganho noutro país», enquanto o segundo como «um conjunto de relações e de fenómenos que resultam da viagem e da estada de pessoas não residentes, desde que a sua transferência não gere um rendimento e não esteja ligado a alguma atividade lucrativa principal».

Como se pode constatar, já destas primeiras definições, emergem algumas caraterísticas próprias, que distinguem o fenómeno turístico (Bencardino, Prezioso 2007):

- a mudança a partir do local de residência;

- a duração da deslocação (superior a 24 horas, mas não superior a um ano);

- transferência de dinheiro sob a forma de despesa, não ligada à atividade lucrativa.

A partir dos anos setenta, a maioria das definições apresenta uma outra variável que explica o fenómeno turístico: o motivo que faz com que o turista viaje.

De facto, Cohen (1979) tem o mérito de ter proposto uma abordagem de estudo que coloca, no centro da experiência turística, as motivações, as práticas sociais e o comportamento dos turistas.

O mesmo autor distingue:

 Turistas existenciais, como por exemplo os peregrinos que procuram lugares de culto;

Turistas experimentais, como por exemplo os drifters (errantes, turismo de mochila), que planificam a sua própria viagem na procura de contornos exóticos e estranhos, na periferia dos destinos turísticos em massa;

 Turistas de experiência, como por exemplo os exploradores individuais que procuram fugir do turismo em massa e viver uma nova experiência;

 Turistas de diversão, que procuram mudança e diversão, desejos caraterísticos de uma sociedade avançada e materialista;

 Turistas recreativos, que são hedonistas e praticam o turismo dos quatro “S” (sun, sea, sand, sex), que representa a fase mais avançada do turismo de massa.

Mais tarde, Valene Smith (1977) estabeleceu uma classificação de acordo com o tipo de lazer escolhido pelo turista. A autora distingue:

56  Turismo recreacional: marcado pelo verão;

 Turismo cultural: os turistas que procuram o pitoresco, os velhos estilos de vida;  Turismo histórico: os turistas que revem as glorias do passado através da visita de

castelos, monumentos, ruinas, catedrais etc.;

 Turismo étnico: os turistas que procuram costumes curiosos, estando reservado a uma elite;

 Turismo meio-ambiental: baseia-se em visitas a lugares de interesse ambiental.

Estas categorias, juntamente com outras (por ex. os ecoturistas), têm um papel importante na segmentação da oferta e na procura de nichos de mercado específicos, mas também obedecem a novas formas de relacionamento entre turistas e residentes. Nestas tipologias, as variáveis sociológicas de idade, género, níveis educativos e níveis de renda são fundamentais. Em função destas variáveis, o turista procura um determinado tipo de atividade e desenvolve um tipo específico de relação com os residentes.

Posteriormente, Valene Smith (1996) definiu também o conceito dos quatro “h” (habitat, heritage, history, handicrafts), um argumento que a autora tem estudado aprofundadamente.

John Urry (1990) esclarece que existem duas formas de olhar, que o turista aplica aos residentes e aos locais de destino turístico:

 O romântico, que procura locais de destino onde pode contemplar a natureza, a arte de forma mais íntima. É o turista que foge do turismo de massas;

 O convencional, que é o turista que precisa de outros turistas onde vai fazer turismo. O que atrai o turista são outros turistas.

Mais recentemente, como sublinha Xerardo Pérez (2009), emergiram novas motivações e comportamentos, que originaram novos tipos de turistas. Sérgio Molina (2003) diferencia o turista, do pós-turista (cfr. parágrafo II.1.2 ) .

O pós-turista, para este autor, é alguém que pensa que tudo pode ser visitado, não é considerado apenas típico, livre dos constrangimentos da “alta cultura” (cfr. parágrafo I.2.1).

Enfim, uma outra categoria é o antiturista (Jacobsen, 2000), quem não se considera turista quando pratica turismo.

57 O elemento distintivo desta última categoria é o facto de não recomendar outros destinos visitados, para não saturar e destruir a tranquilidade do lugar. Os antituristas julgam que os lugares perdem o encanto com a presença de turistas.

Entre as numerosas motivações subjacentes ao turismo, aquelas relacionadas com a dimensão recreativa, o prazer, a cura de si mesmo (seja no sentido físico, seja no sentido espiritual) são as mais importantes.

Segundo as teorias clássicas (Veblen, 1971), o lazer era entendido como o período de tempo, oposto ao tempo de trabalho, em que os homens passavam sem fazer algo produtivo.

Hoje, esta perspetiva surge como redutora. A divisão dicotómica entre tempo de trabalho e tempo de lazer não era assim tão rígida.

Por exemplo, nas comunidades camponesas, o trabalho estava intimamente associado ao lazer e à festa. No entanto, o conceito de lazer, sic et simpliciter, é um conceito urbano, criado recentemente, na sociedade industrial. Segundo esta perspetiva, o lazer serviria para o descanso e a recuperação da fadiga dos trabalhadores mas, paradoxalmente, já se começou a trabalhar, também, nas viagens e nas férias, criando-se novos produtos e conceitos, como os de “turismo de congressos” ou “turismo de incentivos” (Pérez, 2009). A redução das horas de trabalho, o aumento das atividades de lazer e o desenvolvimento de novos valores culturais, associados ao tempo de lazer, seriam algumas das caraterísticas da nova sociedade do lazer.

O lazer, em termos sociais, é determinado por três funções (Dumazedier, 1967; 1975): 1. Repouso, recuperação das condições físicas, neurológicas e psíquicas, decorrente da fadiga do trabalho;

2. O divertimento e o recreio, também como forma de compensação do tédio;

3. O desenvolvimento da personalidade, facultando uma participação social mais vasta, uma cultura da sensibilidade e da razão, para além da formação prática e técnica, a integração voluntária na vida de agrupamentos recreativos, culturais e sociais.

Stockdale (1985) esclarece que o lazer pode ser entendido de três formas:

1. O lazer como tempo de escolha de atividade; 2. O lazer como tempo diferente do trabalho;

3. O lazer como tempo interpretado subjetivamente pelas pessoas.

Segundo Bourdieu (1984), os estilos de lazer estariam influenciados por alguns fatores, tais como a idade, o género, o nível de formação (por exemplo, geralmente os indivíduos

58 que têm uma boa formação preferem visitar museus ou áreas arqueológicas) e a classe social.

Contras estas posturas, aparecem outros argumentos de autores, como Linder (1970) e Rybczynski (1992), que afirmam que, na sociedade ocidental, vivemos uma perda de tempo de lazer, em relação com o crescimento económico.

Tudo isto provoca falta de tempo, que implica uma vida frenética, produtivista e de pouco relaxamento.

A pressa, a ansiedade de ver mais em menos tempo são produto de um sistema económico capitalista, que nos exige cada vez mais trabalho, mais rendimento, “mais flexibilidade”, mais competitividade, mais lucros e mais entrega ao tempo de trabalho (Pérez, 2009).

Mais recentemente, na mesma linha, o antropólogo Manuel Delgado (2002) tem afirmado que o tempo de lazer é dependente de circunstâncias específicas, como aquelas políticas ou económicas, talvez através da publicidade, que pode ser considerada uma forma de controlo da parte do establishment de todos os momentos da vida do indivíduo.

O sociólogo Domenico De Masi (1994), por sua vez, esclarece que, hoje, se trabalha menos durante a vida, do que no passado.

O autor, sublinha, também, que, hoje, trabalhamos mais com a mente e menos com o corpo, como consequência do progresso tecnológico. Porém, o mundo contemporâneo, em relação ao lazer, apresenta, também, desigualdades geográficas, pois, no “terceiro mundo”, o tempo de lazer é escasso.

Há pontos de vista opostos aos De Masi, como a visão de Manuel Castells (2000). Este autor suporta que hoje trabalhamos mais do que no passado, há mais mulheres que trabalham, em geral a taxa de desemprego é menor, o nível tecnológico das empresas é maior e são mais as horas de trabalho, por parte dos trabalhadores.

Além do debate entre mais tempo de lazer ou mais tempo de trabalho, é preciso pensar nas diferenças qualitativas no uso e significado do “lazer”.

Assim, Pérez (2009) distingue o “lazer tradicional”, do “lazer moderno”. No primeiro, o espaço público é fundamental, existindo uma agarofília que tem como base uma cultura comum e solidária.

No segundo, o espaço privado é o seu espaço por excelência. Nele, a individualização, o negócio e a reprodução através do consumo cultivam uma cultura do ego.

59 Hoje em dia, é necessário ultrapassar as dicotomias tempo livre/tempo de trabalho e tempo de lazer/tempo de trabalho, para pensar em diferentes modalidades de uso do tempo.

Por exemplo, em termo de turismo, alguns aspetos profissionais, tais como congressos, reuniões ou outras viagens de trabalho podem dar origem a formas especiais de turismo. Neste caso, podemos distinguir um turismo próprio (quando o deslocamento é impulsionado por motivos de lazer), de um turismo impróprio (por exemplo, quando a motivação principal da viagem está relacionada com razões de trabalho).

Contudo, é importante referir que, sobretudo nas últimas décadas, a distinção entre as duas categorias não está bem definida (Innocenti, 2004). Parece, aliás, que existe a tendência para ser menos clara e mais flexível (Henriques, 1996).

De facto, mais tarde, no documento realizado com o contributo de diversas organizações, sob a supervisão da ONU, intitulado “Recomendações Internacionais para as Estatísticas de Turismo 2008“ (UNWTO, 2011a), no que se refere às principais motivações das viagens realizadas pelos turistas e visitantes do dia, recomenda-se as de motivação