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DA BESTE DIVERSE À BESTA LABRADOR

95 Na Mort Artu, o rei exclama: «Ha! Mordret, or me fez tu connoistre que tu tes li serpenz que ge

1.5. Os cães, os cervos e as fadas

Na Suite, cães e cervos surgem frequentemente em cenas de caça, mas estão longe de ser simples peças de um quadro realista. É a perseguição de um grande cervo que leva Artur a afastar-se dos seus companheiros e (perdendo o cavalo, que sucumbe ao esforço de uma corrida desenfreada) a perder-se na floresta aventurosa, aproximando-se da fonte onde avista a Beste Diverse. Avatar parcialmente racionalizado do animal psicopompo dos lais feéricos, já que conduz Artur ao encontro com o sobrenatural, este cervo desempenha função idêntica à daquele que Artur, Accalon e Urien perseguem até à morte das suas montadas e que os guia até um rio onde vêem uma barca conduzida por donzelas ao serviço de Morgana, como se uma força misteriosa os tivesse levado até ali: o desenvolvimento do episódio demonstra que, ao seguir o veado e ao embarcar, os três companheiros caíram na armadilha da astuta feiticeira.119

Quanto ao cervo que Nivienne, aquando da sua primeira aparição, persegue até à grande sala onde Artur e a sua corte estão reunidos, está ainda mais próximo dos seus antepassados feéricos do que os outros dois. Antes de mais, trata-se de um cervo branco, o que o integra na categoria dos guias para o Outro Mundo da Matéria de Bretanha;120

depois, surge no momento em que Artur se prepara para comer, ou seja, no momento em que, segundo a tradição, o maravilhoso irrompe no palácio real; finalmente, é anunciado por Merlim que, imediatamente antes da sua entrada, revela que vous verrés ja avenir

chaiens .III. des mervilleuses aventures que onques veissiés.121 Na verdade, veremos que

esta cena dará a Merlim a oportunidade de incumbir Galvão, Pelinor e Tor de três

U9 Cf. supra,!, 1.1.

Cf. supra, I, 1.1.

missões que eles apenas conseguirão cumprir, com relativo sucesso, depois de vencidos muitos escolhos.122 A relação privilegiada com a floresta e um dos seus animais mais

emblemáticos, evidente no caso de Nivienne, a nova Diana,12 e implícito no caso de

Morgana, aproxima (tal como muitos outros aspectos124) as duas sábias donzelas. Se

acrescentarmos a este elenco o cervo da aventura do Padrão, cujas estreitas relações com a Beste Diverse já foram apontadas, a conclusão inevitável é que, no imaginário da Suite, o cervo faz parte do bestiário maravilhoso e está ligado a três figuras femininas que, pelo seu poder mágico ou sensual, levam ao pecado e à morte os que as amam: Nivienne, Morgana e sua irmã, a rainha de Orcanie.

Mas regressemos à aventura do Padrão do Cervo, muito útil para nos guiar na nossa interpretação dos ecos simbólicos que se estabelecem ao longo do romance já que, pelo seu carácter fantástico, inviabiliza qualquer interpretação «realista»: aqui, a associação, numa mesma cena, do cervo e dos galgos não pode, evidentemente, justificar-se como uma representação cinegética. Lembremos que, quando o cervo salta

para cima do padrão, quatro galgos brancos

ly corrent erranment et le prenent de toutez pars, si Festranglent et boivent tant de sang de luy qu'ilz sont si gros qu'ilz ne peuent en avant aler, ains se couchent dejouste luy, si enflés et si saoulx qu'a pou qu'ilz ne partaient.125

Verificámos já que o episódio do Padrão do Cervo apresenta diversos aspectos que o aproximam da cena da aparição da Beste Diverse, mas não referimos um pormenor importante: é que a precipitação dos galgos (tal como a da Besta) pode explicar-se por uma sede excessiva, que os domina e que eles têm de satisfazer a todo o custo, nem que para isso arrisquem a vida. A Beste, se bem que perseguida de perto por um excelente caçador, detém-se durante um momento para beber na fonte, enquanto os cães incham tanto por terem bebido demais, que se deixam apanhar pelo dragão que os devora.

122 Cf. Suite, §§ 259ss, pp. 214ss.

123 Sobre as afinidades entre Nivienne e a deusa Diana, vejam-se os levantamentos de G. Roussineau

(Suite, «Introduction», pp. XXIV-XXVI).

124 Recorde-se que na Suite as duas personagens têm muitos pontos em comum: ambas se tornam

discípulas de Merlim; ambas despertam nele um amor não correspondido; ambas se desfazem dele depois de aprenderem os seus segredos.

Quanto ao cervo perseguido por Artur, Urien e Accalon, não resiste a interromper a fuga para beber avidamente. Urien prevê o seu fim nestes termos:

Alons avant, que nous trouverons ja si tost une iaue grant et parfonde portant navie, ou nous trouverons, che sai je bien, le chierf noiiet. Car a chou que li chiers a grant caut et grant soif, il buvera ja tant que li cuers li partira, et ensi le couvenra a remanoir mort en la rive.126

Segundo ele, o cervo morrerá «afogado» por ter bebido demais, e não por ter caído à água grant et parfonde. A expressão le cuers li partira aproxima esta cena de duas outras já evocadas - a da Besta despedaçada pela sua ninhada na Continuation de Gerbert e a dos galgos saciados de sangue do Padrão do Cervo.127 Quanto à cena que os

três caçadores testemunham, embora não corresponda exactamente à previsão de Urien (já que o cervo ainda é encontrado com vida), confirma o excesso do animal e retoma os motivos da aventura do Padrão:

[ils] trouvèrent le chierf gisant a la rive, qui tant avoit beu qu'il ne se puet remuer. Et uns brakes estoit dejouste lui et se tenoit a sa gorge si fièrement qu'i ne li puet estordre (...).128

O cervo sedento substitui os galgos ávidos de sangue, mas o cão (que o prende pelo pescoço) continua a desempenhar o mesmo papel agressor.

Vejamos agora o breve relato da chegada de Nivienne à corte de Artur:

Et en che qu'il parloient entr'eus, il voient venir parmi le gardin un chierf les grans saus et un braket apriés, et après venoit une demoisiele a tout .XXX. muetes de chiens, si les avoit tous descouplés et les aloit huant et esmovant apriés le chierf. Li chiers estoit tous blans et li brakes autresi tous blans, mais tout li autre chien estoient noir. (...) Et li chiers se feri outre et se remet en la grant sale ou li chevalier estoient assis as tables. Et lors li saut li brakes et aert le cierf par derrière en la quisse et le tient si fort qu'il enporte la pieche. Et quant li chiers se sent navrés, il se lanche outre par dessus une table.129

Nesse momento, um cavaleiro arrebata o cão, monta no cavalo e parte a grande velocidade, enquanto o cervo continua em fuga, seguido pelos cães negros. Merlim acabara de incumbir Galvão de trazer a cabeça do cervo e os cães negros, e Tor de

126 Suite, §358,p. 313.

27 Cf. Continuation, v. 8400, p. 47 e Suite, § 481, p. 440. 128 Suite, § 358, p. 313.

procurar o cão branco, quando um segundo cavaleiro se precipita sobre a donzela caçadora, levando-a sobre a garupa do seu cavalo. O mago ordena então a Pelinor que parta em busca de Nivienne.

A cena da irrupção do cervo na corte de Artur apresenta pormenores curiosos que devem ser examinados de perto. Em primeiro lugar, o cão que morde o cervo na coxa com uma tal violência que lhe arranca um pedaço de carne faz pensar nas duas outras cenas já referidas de cervos atacados por cães. Ainda que a donzela esteja armada de arco e flechas, não utiliza as armas, limitando-se a excitar os animais que perseguem a presa. Ora, em todas as cenas de caça ao cervo do romance, ninguém lança uma única flecha, ninguém inflige um só golpe de lança, deixando-se sempre aos cães a missão de capturar e mesmo de matar130 e insistindo-se na imagem da luta entre cães e cervos, cuja

manifestação central é, evidentemente, a aventura do Padrão. Quando Galvão, tendo partido em busca do cervo, o atinge finalmente, limita-se a cortar-lhe a cabeça, já que o encontrou morto, vítima dos cães que, cumprida a missão, se deitam em redor da presa, reproduzindo a imagem dos galgos repletos de sangue em volta do cervo massacrado.

Outra particularidade: quando parte em busca do cervo e dos cães negros, Galvão encontra dois irmãos que combatem. Um dos cavaleiros explica-lhe a razão da sua desventura:

Et en che que nous trespassiens d'un chemin a autre, il avint chose que nous encontrasmes un chierf tout blanc qui .XXX. muetes de chiens cachoient, ne n'i avoit nului, ne chevalier ne veneor ne sergant nul après, ne houme qui de la cache s'entremesist fors les chiens. Quant nous veismes ceste chose, nous desimes entre nous que chou estoit des aventures qui estaient coumenchies a avenir en la Grant Bretaigne. Et je, qui estoie li aisnés, requis a mon frère qu'il m'otriast que je peusse siurre celé cache sans compaignie d'autrui. Et li dist que il ne m'otrieroit pas, mais il l'averoit, qui estoit assés mieudres chevaliers de moi. (...) Si montèrent tant entre moi et lui en tel manière les paroles qu'il mist la main a l'espee et m'assailli, et dist que par tans seroit veus ki miex devrait entrer en une grant queste.131

A comparação das cenas de caça da Suite com as do Tristan de Béroul confirma o carácter anómalo das primeiras. Veja-se o seguinte exemplo: Tristran prist l'arc, par le bois vait, / Vit un chevrel,

ancoche et trait, /El costé destre fiert forment: /Brait, saut en haut et jus decent (w. 1285-1288, in

Tristan et Iseut, pp. 80-82). Cf. ainda ibidem, w . 1606ss, pp. 96ss e Erec et Enide, w . 117-124, p. 4

(onde, apesar de perseguido pelos cães, o cervo é atacado pelos archeiros: // archier espessement traient

- v. 122).

Este cervo perseguido por cães (trinta matilhas!) que nenhum caçador conduz é evidentemente uma presa maravilhosa,132 tal como a Beste Diverse. Lembremos ainda

que a caça da Besta tinha suscitado, entre Artur e Pelinor, uma disputa semelhante à que opõe aqui os dois irmãos. Se tivermos em conta que, desde LP, uma mesma demanda é por vezes empreendida por dezenas de cavaleiros, não deixa de ser significativo que, nestas duas aventuras com tantos pontos em comum, uma demanda (o termo queste é utilizado em ambas as cenas) seja assim disputada entre dois cavaleiros.

Porém, apesar de todas as semelhanças atrás apontadas, é no momento em que Galvão avista finalmente os animais perseguidos que esta aventura se aproxima de uma forma mais evidente do episódio da Besta:

Li jour estoient lonc coume en esté et li solaus chaus et ardans comme le jour de la Magdalainne. Si n'ot mie Gavains gramment alet entre lui et sen frère quant il oïrent les brakes qui glatissoient apriés le chierf et estoient assés près d'eus.133

Antes de os ver, já Galvão ouvira a algazarra produzida pelos cães, tal como na maioria das cenas em que surge a Besta, da Suite à Demanda. Como a aparição da Besta, também a caça ao cervo tem lugar no Verão, no tempo do calor: o dia de Santa Maria Madalena, 22 de Julho, corresponde exactamente ao primeiro dia do período canicular134, que se prolonga até 23 de Agosto. Recordemos a sede que atormentava não

apenas o cervo perseguido por Artur, Urien e Accalon, mas também os galgos do Padrão do Cervo e a própria Besta: ao que parece, todas estas aventuras se produzem sob a influência da Canícula, o que justifica a presença obsessiva dos canídeos e a sua violência. Mas quanto às suas vítimas - porquê sempre os cervos?

Para tentar explicá-lo, teremos que regressar às aventuras de Nivienne, que ao longo de todo o romance caminha sobre os passos de Diana, a deusa dos bosques, a virgem casta e vindicativa. Quando entra pela primeira vez em cena, ao chegar à corte de Artur, Nivienne vem vestida de deusa caçadora: a sua saia é verde, da cor dos vestidos

Trata-se provavelmente das trinta matilhas (número fantástico) que acompanhavam Nivienne aquando da sua irrupção da corte de Artur, mas que continuam perseguindo a mesma presa apesar da donzela ter sido raptada.

133 Suite, § 266, p. 223; sublinhado nosso.

Trata-se do período do ano em que a estrela Canícula (também dita Sírio) se encontra em conjunção com o Sol.

das fadas, e demasiado curta para uma simples donzela.135 Mais tarde, quando ouve

Merlim contar-lhe a história da deusa, convertida no relato do mago em bela princesa pagã, a aprendiz de feiticeira não esconde a sua admiração por Diana e decide mesmo estabelecer o seu domínio junto do Lac Dyane, onde esta vivera e onde o seu corpo repousava.

Já abordámos a história de Diana tal como é narrada na Suite du Merlin, no capítulo I;136 retomemo-la agora sob uma outra perspectiva. Amante de Faunus, Diana

construíra para este príncipe um belo palácio sobranceiro ao lago, onde o amara longe dos homens até que se apaixonara por Felix, outro cavaleiro, e decidira ver-se livre do amante. Um dia em que Faunus chegara ferido da caça, ela ordenara-lhe que se deitasse num certo túmulo, explicando-lhe que só assim poderia curá-lo:

«Despoillés vous tous nus et entrés dedens la tombe et vous couchiés, et nous meterons la lame dessus vous. Et quant vous serés la dedens, nous vous lancherons herbes par mi le pertruis qui est en la lame, et sont les herbes de si grant forche que maintenant serés garis que vous avrés la calour endurée.»

Faunus, confiante, penetrou no túmulo que ela cobriu imediatamente, selando-o de chumbo em ebulição: assim, Faunus fu mors erraument, car maintenant li ot ar s li pions

toute la coraille. Felix, horrorizado com o relato do assassínio do seu rival, cortou a

cabeça de Diana e deitou-a, com o seu corpo, no lago que tomou assim o seu nome.

Como já vimos, a admiração que Nivienne manifesta por Diana confirma a identificação entre estas duas figurações do feminino agressivo e a morte de Faunus anuncia o fim de Merlim (encerrado, também ele, num túmulo), mas esta narrativa encaixada não se limita a estabelecer relações intratextuais. A história de Faunus é na verdade uma reescrita - habilmente adaptada ao contexto do nosso romance - do mito de Actéon, o caçador que, tendo espiado a deusa nua no banho, foi transformado em cervo e devorado pelos seus próprios cães. Do mesmo modo que utilizara o episódio que estava na origem da aventura da Besta, dividindo-o e apresentando-o em duas cenas aparentemente independentes (a aparição da Beste Diverse e a aventura do Padrão do

Cf. Suite, § 259, p. 214.

Cf. supra, I, 1.1.

Cervo), o autor da Suite retoma a história do amante morto pela caçadora com poderes sobrenaturais, conservando a alusão à caça mas eliminando a imagem do cervo devorado pelos cães, que subsiste porém, sob formas menos evidentes, noutras passagens do romance. Note-se que, tal como Actéon, Faunus (e o seu alter-ego Felix) conheceu Diana enquanto caçava: é também uma ferida de caça que está na origem da sua morte. Quanto à omnipresença do lago ao longo da narrativa em causa, compensa largamente a falta da água como cenário imediato da morte de Faunus.

Como noutras passagens deste romance, o calor e a morte estão estreitamente relacionados no relato do assassínio de Faunus. O infeliz amante morre queimado pelo chumbo em ebulição, num túmulo que Diana secara para impedir a sua salvação, já que habitualmente a sepultura continha água com poderes curativos. O contexto canicular do mito de Actéon, aliás, liga-o a todas as cenas atrás evocadas. Vejamos o que dizem Claude Gaignebet e Jean-Dominique Lajoux sobre o assunto:

Triste et paradoxal destin que celui d'Actéon (...). Fils d'Aristée - celui qui apprit précisément aux hommes à se protéger de la morsure de l'astre brûlant, le Chien ou la Chienne, la Canicule (morsure qui évoque l'image de la rage)138 - il est dévoré par ses chiens.139

O poder de evocação do autor da Suite é de uma subtileza surpreendente: mesmo se qualquer alusão à caça está ausente do relato da morte de Merlim, as cenas que o preparam, da história de Faunus (que reutiliza o mito de Actéon), à cena em que Nivienne aparece perseguindo um cervo, que ecoa no episódio da caçada ao cervo empreendida por Artur, Urien e Accalon, parecem conotar o mesmo esquema do caçador caçado. Lembremos que, aquando da sua primeira aparição, Nivienne irrompe no castelo de Artur atrás do cervo que persegue e que é raptada - caçada - por um misterioso cavaleiro. Porém, o mistério que envolve a entrada intempestiva de Nivienne e o seu desaparecimento, assim como os seus poderes, que se vão confirmando ao longo do romance, parecem sugerir que a donzela funciona antes como um isco para lançar na aventura os cavaleiros de Artur, à imagem dos cervos psicopompos dos lais feéricos e do

Pendant une peste qui dévastait les Cyclades, à la saison où l'étoile Sirius ramène les jours les plus chauds de l'année, les habitants demandèrent à Aristée de leur donner un remède à ce fléau. (...) Aristée (...) éleva un grand autel à Zeus, et offrit (...) des sacrifices à Sirius et à Zeus. Celui-ci, touché par ses prières, envoya les vents étésiens, qui raffraîchissent l'athmosphère et chassent le mauvais air.

(P. Grimai, Dictionnaire de la Mythologie grecque et romaine, Paris, PUF, 1999, 14a ed.)

cervo que conduz Artur e seus companheiros até à barca de Morgana. A Suite demonstrará que só aparentemente Nivienne poderá ser uma vítima e que, tal como a irmã de Artur, é sempre ela que domina. Pelo contrário, o mago aprisionado graças aos encantamentos que ele próprio ensinou, tal como os três companheiros que, ao perseguirem um cervo, acabam por cair na armadilha de Morgana, são transposições evidentes da imagem do caçador caçado.

Merlim e Artur, os caçadores caçados, são portanto vítimas do poder feminino, mas estão longe de ser vítimas inocentes. Ambos acabarão por sucumbir sob os seres que criaram porque ambos foram demasiado longe, entregando-se a paixões destrutivas e desagregadoras, tal como Actéon, que a paixão da caça levara a quebrar um importante interdito:

C'est dans le lac, auprès de la Dame, que le cerf trouve refuge et protection. Le chasseur excessif, entraîné par sa folle poursuite, transgresse alors un des tabous les plus sévères de la société primitive. Il passe cette ligne tracée avec force entre la terre et l'eau, la chasse et la pêche. C'est en chasseur qu'il s'était élancé sur la piste de ce gibier, il ne peut le poursuivre en pêcheur. (...) Devant cette démesure, les divinités protectrices de la forêt se retournent contre ce chasseur sauvage. (...) L'univers brusquement bascule. Le chasseur sauvage et excessif (...) devient chassé.140

Este tema do excesso fatal ao caçador já estava presente na Vita Merlini de Geoffrey of Monmouth, na passagem em que é narrada a realização de uma estranha profecia do mago:

Nam dum venatum canibus comitantibus iret, aspexit cervum nemoris sub fronde latentem dissolvitque canes, qui cervo devia viso transcendunt complentque suis latratibus auras. (...)

Hunc fera transcendit fugiens dum venit in amnem exegitque suas solito de more latebras.

Instigai juvenis montem quoque tramite recto preterit et cervum per saxa jacentia querit. Contigit interea dum duceret impetus ipsum labi quadrupedem celsa de rupe virumque forte per abruptum montis cecidisse sub amnem, ut tamen hereret pes eius in arbore quadam et submersa forent sub ilumine cetera membra. Sicque mit mersusque fuit lignoque pependit,

et fecit vatem per terna pericula verum.141

São várias as semelhanças em relação à morte de Actéon, da presença dos cães à impetuosidade do caçador, causa da sua morte, e ao local do acidente - um curso de água. Com efeito, as circunstâncias que levam à morte da personagem do Vita Merlini parecem revelar um terrível azar, como se, à imagem do caçador mítico, ele tivesse sido castigado por ter transgredido um interdito. Ora, na Vita, a ligação de Merlim com a floresta é bem mais forte do que na Suite e a realização da profecia na qual ninguém acreditara é para ele uma vitória que sugere a sua participação no trágico desfecho da caçada, como se o mago desempenhasse aqui o papel já assumido por Diana - o de