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Gudín Rodriguez-Magariños173 informa que a primeira legislação canadense sobre vigilância eletrônica surgiu em 1974 (Lei sobre Proteção da Privacidade), quando o Parlamento já demonstrava preocupação com as consequências do avanço da tecnologia.

As experiências práticas com monitoramento eletrônico no campo penitenciário foram realizadas de forma pontual e particularizada, inicialmente na Colúmbia Britânica em 1987, em seguida em Saskatchewan em 1990, depois em Newfounland (Terranova) em 1994 e em Ontário e no território de Yukon em 1996.

A experiência piloto, portanto, foi realizada em Vancouver (Colúmbia Britânica) em 1987, onde 92 infratores completaram o programa. A seleção foi feita entre aqueles que representavam mínimo risco social, prática de crime sem violência e com quatro meses de prisão remanescente. O esquema foi supervisionado por oficiais da prisão nomeados para trabalho na comunidade e durava de sete dias até quatro meses (37 dias em média). Completaram o programa com sucesso 89% dos participantes, verificando-se depois de um ano um índice de reincidência de 30%. Por volta de 1996 já havia aproximadamente 300 infratores submetidos a monitoramento eletrônico, com custo estimado em menos da metade do que o custo gerado pelos centros de custódia aberta.174

171 ESCOBAR MARULANDA, Gonzalo. Los monitores electrónicos (¿puede ser el control electrónico una

alternativa a la cárcel?). In: CID MOLINÉ, José; LARRAURI PIJOAN, Elena (Coord.). Penas alternativas a

la prisión. Op. cit., p. 211-212.

172 OTERO GONZÁLEZ, Pilar. Control telemático de penados: análisis jurídico, económico y social. Op.

cit., p. 71.

173 GUDÍN RODRÍGUEZ-MAGARIÑOS, Faustino. Sistema penitenciario y revolución telemática: ¿el fin

de los muros en las prisiones?: Un análisis desde la perspectiva del Derecho comparado. Op. cit., p. 110.

Em seguida o monitoramento eletrônico foi aplicado aos condenados a penas não superiores a seis meses de prisão, exigindo-se aceitação voluntária do tratamento vigiado e elaboração prévia de informes que justifiquem um alto grau de inserção social, além do consentimento do próprio implicado e das pessoas diretamente ligadas ao mesmo. Na questão econômica, o custo do programa de monitoramento gira em torno de 50 dólares canadenses, ou seja, aproximadamente 50% menor que o custo do interno na prisão. Inicialmente, o programa de monitoramento foi instituído com a finalidade de reforçar o arresto (prisão) domiciliar, porém, com o tempo tornou-se uma verdadeira alternativa à prisão.175

Em Newfoundland, foram monitorados infratores de risco moderado e realizados programas obrigatórios de tratamento de nove horas por semana, concentrados em abuso de substâncias e “administração da raiva”, além de aconselhamento individual e de auxílio ao emprego. O programa foi supervisionado por oficiais de probation, com tempo de monitoramento médio de 72 dias. Completaram o programa com sucesso 87% dos participantes, verificando-se depois de um ano um índice de reincidência de 32%.176

Da mesma forma, em Saskatchewan foram monitoradas noventa pessoas por dia, em média, o que fazia parte de sentenças de probation. O esquema foi supervisionado por oficiais de probation, com tempo de monitoramento médio de 139 dias. Completaram o programa com sucesso 86% dos participantes, verificando-se depois de um ano um índice de reincidência de 17%. A província tem o maior índice de aborígenes infratores do país e o programa foi desenvolvido como alternativa à prisão especificamente para esse grupo de pessoas. Os participantes de origem aborígene apresentavam níveis de risco mais alto e consistiam 65% da população prisional, o que justificava a alternativa implantada.177

Dois anos depois de iniciado o programa na Columbia Britânica (1987), Ontário também realizou experiências com monitoramento eletrônico, porém com resultados diversos. O programa foi abandonado em seguida por considerações de custo- benefício, no entanto foi retomado alguns anos mais tarde (1996) com formato mais limitado.

Interessante discussão sobre o custo do monitoramento eletrônico foi estabelecida perante o Comitê Permanente de Administração da Justiça da Assembléia

175 GUDÍN RODRÍGUEZ-MAGARIÑOS, Faustino. Sistema penitenciario y revolución telemática: ¿el fin

de los muros en las prisiones?: Un análisis desde la perspectiva del Derecho comparado. Op. cit., p. 111.

176 WHITFIELD, Dick. The Magic Bracelet: Technology and offender supervision. Op. cit., p. 69. 177 Ibid, p. 69.

Legislativa de Ontário depois que, em outubro de 1995, o Ministro de Serviços Penitenciários declarou a intenção de reintroduzir programas de monitoramento eletrônico que seriam financiados pelo fechamento de 25 albergues destinados a infratores em esquemas de ausência temporária e liberação para trabalho. Muitos diziam que o monitoramento eletrônico para infratores de baixo risco acarreta aumento de gastos e não apresenta resultados mais significativos que outras alternativas comunitárias nos índices de reincidência. A sugestão, portanto, era da utilização do monitoramento eletrônico para infratores de risco moderado e alto, com intervenções correcionais adequadas (ex. tratamento para viciados em tóxicos). Depois de várias audiências e discussões, o Comitê decidiu que o programa de monitoramento de Ontário deveria ser avaliado sob dois aspectos: efetividade de custos e ampliação da rede de controle social como resultado do uso do monitoramento acentuado por mecanismos de supervisão comunitária, e não como alternativa a esses mecanismos.178

Entretanto, a partir do ano 2000, surgiram planos apoiados pela Suprema Corte de Ontário para expandir significativamente os programas de monitoramento, o que de fato ocorreu.

Depois de alguns anos, o escritório do Procurador Geral no Canadá realizou uma pesquisa para avaliar os programas mencionados. Foram coletadas informações detalhadas da pessoa e da história criminal de 262 infratores submetidos a monitoramento eletrônico, os quais foram comparados a 240 encarcerados e trinta submetidos apenas a probation. O estudo revelou que o monitoramento eletrônico não teve impacto considerável no comportamento criminal futuro do infrator, ou seja, os índices de reincidência não foram muito diferentes daqueles verificados entre os que não se submeteram ao monitoramento. Interessante notar que os resultados realmente positivos em relação à redução do comportamento criminal (reincidência) surgiram apenas quando ao infrator também foram oferecidos programas de tratamento de alta qualidade. Além disso, a pesquisa lançou dúvidas sobre a suposta economia gerada pelo monitoramento eletrônico, mormente pelo custo do equipamento no monitoramento de infratores de baixo risco.179

A província de Quebec, por outro lado, opôs-se com veemência aos programas e não adotou a vigilância eletrônica em seu território. Considerando tratar-se de

178 WHITFIELD, Dick. The Magic Bracelet: Technology and offender supervision. Op. cit., p. 71-72. 179 Ibid, p. 70.

instrumento custoso e inútil, a província optou pelo fortalecimento dos métodos de controle clássicos como suporte para a reinserção social.180

De qualquer forma, o programa canadense continua apresentando altos índices (94%) de conclusão bem sucedida, graças a um processo seletivo rigoroso, um forte acompanhamento social dos envolvidos e um limite de tempo de monitoramento que gira em torno de três meses.181

Gudín Rodriguez-Magariños182 acrescenta que os índices de cumprimento são muito elevados porque existe um prévio e rigoroso processo seletivo das pessoas submetidas ao controle. Por outro lado, os índices de reincidência não ficaram muito abaixo dos índices de outras alternativas penais como a probation. A explicação, para o autor, estaria no fato de que os meios eletrônicos não são um fim em si mesmo, mas sim um instrumento a mais para conseguir o fim ressocializador. O Direito penitenciário, portanto, não pode deixar de lado outros instrumentos úteis como programas educativos, laborais e de desintoxicação. Além disso, os melhores resultados são verificados quando a vigilância eletrônica está acompanhada de suporte humano prestado pelo oficial da

probation, que resulta numa maior humanização no modo de gestão da vigilância

eletrônica.

Do ponto de vista jurídico, o Canadá parece ter consolidado um sistema normativo preocupado e avançado na proteção dos direitos fundamentais. Como reação positiva a uma série de decisões judiciais, o Legislativo canadense estabeleceu, em 1993, um corpo de normas para regulamentar completamente a vigilância eletrônica, de modo a proteger a vida privada do cidadão.