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CAPÍTULO IV – PARTICIPAÇÃO SOCIAL, GESTÃO DEMOCRÁTICA E AS

4.3 PARTICIPAÇÃO SOCIAL COMO ELEMENTO DA GESTÃO

4.3.2 Canais de participação existentes nas instituições escolares

A existência de canais de participação é fator primordial para a interlocução entre todas as instâncias envolvidas, direta ou indiretamente, com o processo educativo, atuando como mediador entre estes atores sociais e instrumentos de gestão democrática. Diante disso, investigamos quais os canais de participação existentes e utilizados para mobilizar a comunidade escolar visando a qualidade das ações promovidas pelas escolas.

Os canais de participação, institucionalizados, existentes nas escolas são o Conselho Escolar, a Associação de Pais e Mestres (APMF) e o Grêmio Estudantil. Sendo que, todos os gestores relataram a existência das duas primeiras instâncias

colegiadas, entretanto, com relação ao Grêmio Estudantil, três gestores apontaram que ele não está ativo na escola.

Embora tais canais estejam constituídos nas escolas, apenas oito gestores relataram que as reuniões com o Conselho Escolar ocorrem de forma periódica, no fechamento de cada trimestre, além de reuniões extraordinárias. Verificamos, também, que alguns gestores entendem esse momento como uma função burocrática, mais relacionada à obrigatoriedade do que, propriamente, com a importância decisiva e deliberativa para as ações da escola.

“Assim, a gente tem realizado aproximadamente a cada 60 dias, a gente reúne o conselho para definir questão de prestação de contas, questão de definições de calendário, de resolução de algum problema que a gente está tendo com relação a algum aluno, então a cada 60 dias a gente se reúne” (Gestor 5).

“A gente faz, tem as reuniões periódicas, tipo o conselho escolar ele sempre se reúne mensalmente que, tanto conselho escolar quanto APMF ele é mensal para análise de recurso financeiro, discussão de planejamento, regimento escolar. Então tem as reuniões ordinárias e tem as extraordinárias que, assim que surge necessidade, tipo, teve agora o movimento da greve, então teve que ser reelaborado um calendário, de reposição, aí convoca o conselho escolar” (Gestor 22). “O conselho escolar mais porque o conselho escolar o próprio sistema obriga que a gente faça reunião, é calendário escolar que você precisa do conselho, tudo documentação, então o conselho escolar a gente reúne mais” (Gestor 23).

Contrariamente ao que mostram os dados empíricos, recorremos às reflexões de Gohn (2011) sobre os conselhos gestores enquanto espaços participativos que devem funcionar como arenas decisórias e fiscalizadoras, nas quais os representantes de cada segmento discutem e deliberam, em um ambiente caracterizado por conflitos, tensões e consensos.

Os demais gestores afirmam que as reuniões ocorrem conforme as demandas da escola. Destacando as reuniões com a APMF, as quais também estão relacionadas às funções burocráticas e administrativas que envolvem recursos.

“As reuniões vai mais de acordo com a demanda, quando precisa, que daí a gente convoca eles” (Gestor 1).

“Existem sempre que a gente tiver necessidade, tipo assim, que a APMF ela tem que assinar todos documentos de prestação de contas, você não fica falando com a pessoa todos os dias, mas sempre a gente convoca eles para uma reunião. Conversa com eles pra, deixar eles, passa pra eles como que está a situação e assinar a documentação que eles tem que assinar. Tudo, tudo na escola eles assinam, se você tem uma reposição de aulas, eles tem que saber que tem reposição de aula, tudo tem que passar por documentação, e eles sempre estão presentes” (Gestor 3).

“É mais de acordo com a demanda. Sempre quando a gente precisa e a gente faz. Com a APMF ela é mais frequente, tipo regular, mensal, mais ou menos, agora o conselho escolar e o grêmio é mais quando precisa mesmo. Mas geralmente, quase sempre está precisando, aí a gente faz bem democrático. Tudo o que a gente vai decidir, eu já reúno e já faço para a gente decidir juntos, porque tem algumas decisões que eu não gosto de tomar sozinha, que se errar, erra o grupo” (Gestor 6).

“Não existem reuniões como deveriam acontecer, mas existem. Por exemplo, semana passada eu fiz uma, semana passada, geralmente quando chega recurso, demanda, como deveria não, mas acontece sim, sempre quando necessário tem acontecido” (Gestor 18).

Ademais, fica perceptível, nos depoimentos, as dificuldades na formação destas instâncias, uma vez que, de imediato as pessoas não querem participar.

“Olha a APMF tem as reuniões por causa da aprovação de contas fundo rotativo e o conselho a maioria dessas pessoas são da APMF. Junta a prestação de contas, eles assim, não gostam muito de participar, é difícil você fazer uma APMF. A escola está com uma APMF bastante boa, mas assim, eles vão, participam, mas não... assim são pessoas que trabalham, eles fazem parte, mas não tem uma participação assim... vamos dizer que nós ainda não conseguimos aqui” (Gestor 4)

“A APMF também, a gente já procurou pais assim que estão direto na escola, são pais que moram próximo da escola que a gente chama e eles vem” (Gestor 5).

Na mesma direção das informações empíricas que obtivemos, encontramos os estudos de Luck (2009, p. 74) ao afirmar que, embora todas as escolas tenham diferentes canais de participação constituídos formalmente, “o seu funcionamento nem sempre é participativo em seu sentido pleno”, uma vez que “as decisões são tomadas pela direção da escola e os pais são envolvidos/se envolvem, sobretudo, em dar aval às decisões tomadas e assinar as prestações de contas e conferi-las”.

Esse fato faz com que a participação enquanto elemento da gestão democrática não seja efetiva, destituindo o “poder real dos participantes da comunidade escolar de tomar parte ativa na gestão da escola e na promoção de seus processos educacionais, indo, portanto, muito além dos aspectos relacionados à questão financeira” (LUCK, 2009).

Na fala do gestor 5 é ressaltado o envolvimento do grêmio estudantil, enquanto um canal de participação dos alunos nas discussões do cotidiano escolar, o que pode figurar como um espaço de aprendizagem política e dos processos democráticos. Apesar disso, no que se refere as ACCs, o gestor destaca que não existe abertura, pois, como mencionamos anteriormente, é uma política que chega a escola pré-determinada por instâncias superiores.

“E de todos eles eu acho que o grêmio estudantil é o mais atuante, o grêmio nosso foi eleito agora esse ano, o pessoal do grêmio é bem atuante. Eles representam bem a escola, querem trabalhar, querem participar e ajudam bastante assim, na divulgação, na promoção de evento da escola, agora com relação aos projetos, é aquela questão, não tem abertura para isso” (Gestor 5).

A participação, nas instâncias colegiadas, é de suma importância para o processo de gestão das políticas públicas e para a qualidade das ações desenvolvidas. Isso porque, como afirma Gohn (2011, p. 105) ao falar dos conselhos gestores, “[...] ocupar espaços nos conselhos pode ser uma maneira de estar presente em arenas em que se decidem os destinos de verbas e prioridades da sua gestão de bens públicos; é uma forma de ser ouvido e de continuar lutando para transformar o Estado pela via de democratização das políticas públicas”. Ademais, Pateman (1992) já sinalizava para o fato de que a participação gera atitudes de cooperação, integração e comprometimento com as decisões.

Ainda considerando estes canais de participação constituídos, questionamos aos gestores sobre a participação e envolvimento destas instâncias com as ACCs. Verificamos que esta questão fica limitada ao âmbito informativo sobre as ações que estão sendo desenvolvidas pela escola em reuniões realizadas para tratar também de outros assuntos. E seguindo as colocações dos gestores, isso se deve, não só à gestão local das ACCs, mas também, à forma de gestão pela própria SEED, NRE e governo estadual, a qual já propõe o desenvolvimento da política de forma engessada, como verificamos no relato dos gestores.

“Não, não houve [referindo-se a participação dos pais] porque a gente que manda o papel pra casa deles, daí eles só mandam assinado. Tem alguns que vem, tem curiosidade, vem aqui pra ver como funciona, como que é, mas é bem pouco, é nessa parte aí eles... mas todos concordam” (Gestor 1).

“Na realidade, se documenta, a legislação fala que sim, mas agora você imagina, a pessoa tem tanta coisa pra fazer, mas sempre a gente nas reuniões a gente passa pra eles, mas como eles vão definir uma coisa que já veio pronta? Eles assim, não tem, não sou eu que vou definir o que a escola vai fazer. A atividade já vem pronta e não tem opção, eu decido que vai ser assim, na verdade o governo fala que é a escola que escolheu, que a comunidade que escolheu, mas não é real isso. E daí o que você vai dizer, não eu não quero que isso acontece, eu quero que aconteça outra atividade, então tem sempre, na verdade, na verdade, tudo o que a gente faz na escola já vem pronto da secretaria de educação, a gente não tem autonomia” (Gestor 3).

“É assim, é uma coisa mais interna, que a gente trata geralmente entre os professores envolvidos ali, tipo são, questão de projeto, foi solicitado assim, quando foi pra solicitar, fizemos a ata, o conselho aprovou. Foi o que o conselho pediu, mas assim, em questão, por exemplo, assim de remodelar projeto com relação a conselho escolar é algo que nós vamos precisar fazer nesse final e ano. Vamos fazer uma análise de como que está indo esse projeto, se a gente faz uma análise positiva ou uma análise negativa disso. Eu falo pra você, minha análise é em partes, eu acho que tem coisas que funcionaram mas tem coisas que precisam mudar. Então assim, a gente vai precisar reunir de repente o conselho pra ver, e já conversar com os alunos do grêmio pra ver, de repente as expectativas que eles tem pra gente remodela-lo para o ano de 2020” (Gestor 5).

“Não, eu acredito assim que é, eles sabem que existem, então no caso, por exemplo, a comunidade escolar quando tem, essas meninas jogaram aqui do lado no ginásio de esportes então foi convidado todos pra assistirem. As pessoas foram prestigiar, então no caso todo mundo sabe que existe, porque há uma cobrança, há um registro de tudo isso então eles são presentes nessas atividades que acontecem na escola” (Gestor 11).

“Eles sempre são avisados, a gente não faz nada sem avisar eles e também ter um parecer deles, fazer uma reunião apresentando as atividades pra eles” (Gestor 12).

“Olha, eu acredito que a única parte que a gente faz é a parte da escolha, de comunicar eles e depois o professor é responsável de manter. E assim, eles nos avisam quando tem algum problema, mas dizer assim que nós abrimos pra comunidade, não nunca foi feito nada em relação a isso não. É que tem tanta coisa na escola e o projeto vai ficando mais a parte mesmo. A gente cuida, sabe que ele existe, que está acontecendo, o que acontece, mas tem tantas outras

tomadas de decisões do dia a dia e a indisciplina vem cada vez mais aumentando que a gente fica mais em torno disso” (Gestor 15).

Os dados empíricos evidenciam que existe a obrigação da realização de reuniões e dos encontros envolvendo estes canais de participação que representam às instâncias colegiadas, assim como toda a comunidade escolar, no entanto, o simples fato de existirem reuniões não garante a sua qualidade e revelam uma gestão democrática completamente esvaziada dos sentidos plenos em que é inexistente o efetivo envolvimento nas decisões sobre as ACCs propostas pelas escolas. Um dos aspectos que confirmam estas evidências é que, a participação quando se aplica, ocorre somente nas últimas etapas do planejamento, ou mesmo quando as ações já estão sendo executadas, não possibilitando ações deliberativas e decisivas. Por conseguinte, o direito – e o dever – de participação se tornam meramente um ritual político que presta apoio a algo que na realidade constitui um sistema autocrático, conferindo-lhe uma falsa legitimidade.

Nesse sentido, recorremos a Paro (2013, p. 40) ao afirmar que “os próprios mecanismos de ação coletiva, como conselho de escola, a associação de pais e mestres e o grêmio estudantil, mostram-se incapazes, na maioria das vezes, de superar os obstáculos antepostos por uma estrutura avessa à participação na qual estão mergulhados”.

As circunstâncias coadunam também com as análises de Gohn (2006, p. 8),

Apesar de a legislação incluir os conselhos como parte do processo de gestão descentralizada e participativa e constituí-los como novos atores deliberativos e paritários, vários pareceres oficiais têm assinalado e reafirmado o caráter apenas consultivo dos conselhos, restringindo suas ações ao campo da opinião, da consulta e do aconselhamento, sem poder de decisão ou deliberação.

Seguindo as reflexões de Pateman (1992), os modelos de participação revelados nas falas dos gestores apontam para o que a autora denominou de participação parcial. Com isso, existe a possibilidade de influenciar nas deliberações, mas no final do processo, a prerrogativa da tomada de decisão é de quem está “no comando”, neste caso, o governo do estado, representado pela SEED e NRE. Os diferentes atores da comunidade escolar não têm igual poder sobre o resultado do que se delibera, podendo apenas influenciá-lo, mas o poder final de decidir pertence a uma só parte.