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// Ministério da Saúde / Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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// Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher: PNDS 2006

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RESUMO

Objetivo: Analisar as desigualdades socioeconô- micas e demográficas regionais dos domicílios bra- sileiros, tendo como pano de fundo para a análise os grupos mais vulneráveis, especialmente quanto ao acesso a serviços de saúde.

Métodos: Utilizando-se os dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde de 1996 e 2006, e a partir de uma análise descritiva, mostram-se as mudanças nas caracteríticas de infra-estrutura dos domicílios; apresenta-se a situação atual das famí- lias com relação ao recebimento de transferências monetárias e informações sobre rendimento total proveniente do trabalho de outros membros das famílias; avalia-se a composição da população por classes socioeconômicas a partir do Critério Brasil de 2008; e, finalmente, analisa-se a composição domiciliar e os tipos de arranjos domésticos. Conclusões: Os resultados mostram que hou- ve melhora importante nas condições de vida da população. Entre estas, pode-se citar aumento significativo na disponibilização de escoadouro e posse de sanitário nos domicílios, mas ainda parcela importante da população não dispõe dessa infraestrutura básica e o tratamento dos dejetos é praticamente inexistente na maioria das situações. Com relação ao critério de classificação econômi- ca, verificou-se que parcela importante das pessoas de classes muito pobres em 1996 migrou para classes mais elevadas. Os benefícios de programas sociais foram fortemente alocados para as regiões Nordeste e Norte, principalmente em áreas rurais, no entanto, é nestas mesmas regiões que ainda se encontram as piores condições de vida com relação aos demais indicadores analisados. Assim, as de- sigualdades regionais mostraram desvantagem do Nordeste com relação às demais macrorregiões. As diferenças entre áreas urbanas e rurais são ainda grandes, com sérios problemas de acesso aos ser- viços de infraestrutura básica nas áreas urbanas e baixos níveis socioeconômicos na área rural. Palavras-Chave: Condições socioeconômicas; Domicílios, Arranjos Domésticos; Brasil; PNDS.

ABSTRACT

Objective: The purpose of this chapter is to

analyze the regional inequalities regarding socio- economic and demographic conditions of Brazilian households, having as a background an analysis of the most vulnerable groups, especially those vulner- able in terms of access to health care.

Methods: Using data from the National Demog-

raphy and Health Survey of 1996 and 2006, and from a descriptive analysis, the paper shows the changes occurred in the characteristics of house- hold infrastructure; presents the current situation of families in relation to the money transfer received from social programs and information on total income from work for all household members; assesses the composition of the population by socioeconomic classes from the Criterion Brazil of 2008, and, finally, analyzes the composition and the types of household arrangements.

Results: Results show a significant improvement

in living conditions of the population. Among these conditions, the paper points out the signifi- cant increase in sewage and sanitation services in homes, but still an important part of the population lacks basic infrastructure. Additionally, the treatment of waste is virtually nonexistent in most situations. Regarding the criteria of socioeconomic classifi- cation, it was observed that an important part of the population from very poor segments in 1996 migrated to higher income segments. The benefits of social programs were heavily allocated to the North- east and North regions, especially in rural areas; however, these same regions remain with the worst living conditions with regard to all other indicators analyzed. Thus, the regional inequalities were more accentuated in the Northeast compared with other regions. Additionally, differences in urban and rural areas are still dramatic, with serious problems of access to basic infrastructure services in urban areas and very low socio-economic levels in rural areas.

Keywords: Socio-economic conditions; House-

holds, and family arrangements; Brazil; PNDS.

INTRODUÇÃO

A maioria dos países em desenvolvimento apresentou grandes mudanças demográficas nas últimas décadas e que ocorreram com maior velocidade do que aquelas observadas nos países da Europa. Atualmente, tem havido uma convergência de vários indicadores demográficos e um generalizado envelhecimento da estrutura etária populacio- nal nestes países em desenvolvimento. Entretanto, as desigualdades socioeconômicas ainda são realidades difíceis de superar para alguns segmentos populacionais. O aumento da pobreza e da concentração de renda acirra essas desigualdades. As políticas públicas e, particularmente, as sociais, têm um papel cada vez mais importante neste ce- nário, em que, por meio de diagnóstico, formulação, planejamento e implementação de políticas busca-se diminuir as desigualdades no acesso aos bens e serviços. Neste cenário, as características demográficas e socioeconômicas dos domicílios e das famílias têm sido utilizadas crescentemente por gestores e planejadores para promover ações dirigidas aos segmentos populacionais em maior vulnerabilidade social.

A situação do Brasil não é diferente daquela dos demais países em desenvolvimento, onde as diferenças e as desigualdades regionais são ainda muito grandes. Da mesma forma, as condições de saúde da população, que guardam estreita correlação com as condições socioeconômicas da população, também são desiguais no país. Sendo assim, o principal objetivo deste capítulo foi conhecer essa realidade de desigualdades para identificar os grupos mais vulneráveis, o que é essencial para ações na área de saúde. Ao mesmo tempo, é importante traçar um panorama das mudanças ocorridas, pois, se comparadas às condições de bem-estar do passado, a partir de outras fontes de dados, verifica-se que a população teve um enorme progresso em algumas áreas específicas (ALVES; CAVENAGHI, 2005).

As condições socioeconômicas podem ser medidas de distintas perspectivas, e aquelas mais comumente conhecidas e utilizadas são o rendimento, o gasto ou consumo, e a riqueza das famílias (também referida como ativos líquidos). Todos estes indicadores são mensuráveis se bem definidos, mas esses dados são de difícil obtenção por inumeráveis motivos. No escopo das Pesquisas de Demografia e Saúde, são utilizadas variáveis capazes de medir, ainda que de forma aproximada, as condições de bem-estar das pessoas entrevistadas, pois perguntas sobre o rendimento e consumo são reconhecidamente mais difícies de se coletar e comparar. Algumas sugestões metodológicas de como criar índices de riqueza (Wealth Index) a partir de informações coletadas nessas pesquisas foram amplamente testadas e estão disponíveis (RUTSTEIN; JOHNSON, 2004). Neste capítulo optou-se por explorar várias formas de se analisar a situação da população, para além dos índices de riqueza.

No capítulo, apresenta-se primeiramente uma seção de métodos, onde são feitos alguns esclarecimentos metodo- lógicos com relação às variáveis, indicadores e conceitos utilizados. A seção de resultados e discussão está subdivi- dida em várias subseções e apresenta uma análise descritiva das mudanças nas caracteríticas de infra-estrutura dos domicílios entre 1996 e 2006; analisa a situação atual das famílias com relação ao recebimento de transferências monetárias governamentais e do rendimento total proveniente do trabalho de outros membros de suas famílias para o ano de 2006; aplica metodologia de classificação socioeconômica a partir do Critério Brasil 2008, para os anos de 1996 e 2006; e apresenta a composição domiciliar e os arranjos domésticos. Todas estas análises buscam diferenciais macrorregionais ou por situação de residência urbana e rural.

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MÉTODOS

Na amostra da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) 2006 foram entrevistados 14.617 domi- cílios, onde residiam 56.365 pessoas. Estes valores foram expandidos para a população total, com base nos resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2006; portanto, a base populacional expandida para a PNDS 2006 corresponde a 187.227.000 habitantes. As informações sobre domicílios es- tão disponíveis para todos os domicílios entrevistados, mas os dados trabalhados neste capítulo referem-se a 13.056 domicílios, pois nestes havia pelo menos uma mulher de 15 a 49 anos. Na PNDS 1996 os dados estavam disponíveis para 13.283 domicílios e, diferentemente da pesquisa anterior, nesta não foi feita expan- são para base populacional; no entanto, os dados ponderados das duas pesquisas são comparáveis, como discutido no capítulo 3, sobre aspectos metodológicos das pesquisas.

Os domicílios foram analisados em duas dimensões: as condições socioeconômicas e a composição domiciliar e familiar. No primeiro analisaram-se fatores relacionados à infra-estrutura domiciliar, o acesso a bens e serviços, os níveis de rendimento e os níveis de riqueza. Para as comparações, utilizou-se a ponderação nas duas pesquisas, além de se considerar o plano amostral, para obtenção dos erros amostrais presentes nas estimativas.

A infra-estrutura domiciliar incluiu informações sobre eletricidade, formas de abastecimento de água, prove- niência de água para beber, presença de sanitário, forma de escoadouro sanitário, material predominante do piso, da parede e no telhado, número de cômodos usados para dormir e número médio de pessoas por cômodo para dormir. O agrupamento das categorias analisadas, para cada uma das variáveis, buscou juntar situações onde a adequabilidade da infraestrutura disponível estava no mesmo nível. O acesso a bens e servi- ços foi avaliado por sua posse ou existência no domicílio. Tanto para os dados de infra-estrutura quanto para o acesso a bens e serviços, buscou-se analisar as informações para as áreas urbanas e rurais em separado, dadas as particularidades de cada área.

Apesar das reconhecidas dificuldades para se coletar informações sobre rendimento, na PNDS 2006, além das variáveis necessárias para medir os índices de riqueza no questionário do domicílio, foram incluídas perguntas sobre recebimento: um bloco de perguntas sobre transferências monetárias não provenientes do trabalho (benefícios) com o objetivo de identificar domicílios atendidos por programas sociais, e perguntas sobre rendimento do trabalho das mulheres e total do rendimento das famílias.

Os benefícios estudados foram: Seguro-Desemprego, Aposentadoria, Pensão Alimentícia, Pensão (outro tipo), Renda Mensal Vitalícia (RMV), Aluguel, Doações de Igrejas/ONGs/Instituições, Bolsa-Família, Bolsa-Escola Municipal, Benefício de Prestação Continuada (BPC), Auxílio-gás, Cartão-Alimentação, Programa de Erradi- cação do Trabalho Infantil (PETI), Agente Jovem e Venda de produtos. Um problema conhecido na identifica- ção dos benefícios, que também parece foi o caso dos entrevistados da PNDS, diz respeito à identificação de aposentadoria do BPC. O valor das aposentadorias, tanto urbanas quanto rurais, está em torno de um salário mínimo, que também é o valor mensal do BPC e isto pode ser fonte de confusão. Portanto, a utilização destas informações na PNDS deve ser feita com cuidado.

Adicionalmente, no questionário das mulheres perguntou-se pelo rendimento individual do trabalho e o rendi- mento total (de todas as demais pessoas que moravam no domicílio) proveniente do trabalho. Nos domicílios onde foram entrevistadas mais de uma mulher1, nem sempre o valor declarado do rendimento do trabalho para

todos os integrantes da família pelas moradoras era coincidente. É de se esperar que cada morador do domicílio 1 Em alguns domicílios foram entrevistadas até seis mulheres; em 70,1% domicílios somente uma mulher foi entrevistada, em 23,2%

tenha conhecimento distinto sobre o valor recebido do trabalho pelos demais moradores. No caso de divergên- cia de renda declarada entre as mulheres elegíveis em um mesmo domicílio, considerou-se o relato da mulher mais velha, se esta era cônjuge ou a responsável pelo domicílio. Nos demais casos, por não haver motivos para acreditar que uma resposta pudesse ser mais correta que a outra, optou-se por estimar a renda domiciliar do trabalho como sendo média entre os valores válidos declarados. O rendimento total dos domicílios deveria ser estimado a partir da soma dos rendimentos de benefícios e do rendimento proveniente do trabalho.

No entanto, para muitos domicílios, verificou-se que o valor do rendimento total do trabalho não era com- patível com os valores recebidos em benefícios. Isto ocorre, pois apesar da pergunta no questionário da mulher referir-se somente aos rendimentos do trabalho, as entrevistadas consideraram o valor do seguro desemprego, da aposentadoria e da venda de produtos como sendo rendimento do trabalho. Nestes casos, a estimativa do rendimento total do domicílio ficaria sobrestimado. Para nova estimativa do rendimento total do domicílio optou-se por somar o rendimento total do trabalho e o rendimento dos benefícios quando não relacionados de certa forma com trabalho (ou falta deste). Estes dados proporcionaram uma estimativa apro- ximada da renda total do domicílio e devem ser utilizados com cuidado.

Para uma aproximação ao índice de riqueza, uma medida comumente utilizada no Brasil é a capacidade de consumo da população por meio da escala de propensão ao consumo, proposta, testada e amplamente utilizada pela área de mercado(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PESQUISA, 2008). Esta es- cala divide a população em classes ou grupos socioeconômicos e pode ser um indicador importante para análises dos resultados e comportamentos da população com relação à saúde da mulher e das crianças. Por este motivo, apresentam-se algumas questões metodológicas e alternativas para comparação dos do- micílios utilizando-se esta classificação com os dados das PNDS de 1996 e 2006.

O Critério de Classificação Econômica Brasil é uma medida baseada na posse de bens duráveis e algumas características do chefe do domicílio. A classificação tem sofrido alterações metodológicas ao longo das últimas décadas e aquela em vigor atualmente foi proposta em 20082 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EM-

PRESAS DE PESQUISA, 2008). Nela são apresentadas várias simplificações de bens de consumo considera- dos para a classificação e, adicionalmente, os cortes das classes econômicas foram ampliados com relação à metodologia proposta anteriormente. Um dos critérios básicos levados em consideração na classificação mais recente foi a inclusão de bens que não sejam tão sujeitos a mudanças de mercado em curto prazo. Todavia, é importante ressaltar que, apesar de ser comumente utilizada para identificação de classe social, a proposta recente não tem esta pretensão, conforme se explica na divulgação dos critérios: “O Critério de Classificação Econômica Brasil enfatiza sua função de estimar o poder de compra das pessoas e famílias urbanas, abandonando a pretensão de classificar a população em termos de “classes sociais”. A divisão de mercado [...] é exclusivamente de classes econômicas.” (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PES- QUISA; INSTITUTO BRASILEIRO DE OPNIÃO DE PESQUISA, [2008]).

A proposta metodológica utiliza um sistema de pontuação fixa para uma determinada lista de bens de consumo e outras características do domicílio, de forma que a pontuação total obtida pelo domicílio esteja correlacio- nada com sua capacidade de consumo. Portanto, esses valores podem ser utilizados diretamente em análises para divisão em grupos econômicos. Para definição das classes econômicas há uma proposta de agrupamentos conforme intervalos desta pontuação3, que inclui as classes de A a E e com subdiviões das classes A, B e C em

duas classes. Recomenda-se utilizar esta nova classificação para dados de qualquer ano no passado, pois os resultados são melhores que ao das classificações anteriores. Para a aplicação desta classificação com os dados 2 As variáveis utilizadas em 2008 foram: posse/número de televisão em cores, rádio, banheiro, automóvel de passeio, empregada

mensalista, máquina de lavar roupa, videocassete e/ou DVD, geladeira, freezer e grau de instrução do responsável pela família.

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da PNDS, surgem problemas metodológicos. O mais sério é a falta de informação sobre freezer nas pesquisas

anteriores a 2006. Outras questões se referem a adaptações necessárias no grupo aberto de anos de estudo em 2006 e a falta de informação em algumas variáveis. Descrevem-se a seguir as adaptações metodológicas sugeridas para aplicação aos dados da PNDS e utilizadas nas análises apresentadas aqui.

Na pontuação proposta nessa classificação, possuir freezer, independentemente do número, atribui dois pontos na escala. A partir de análises com os dados de 2006, observou-se que a probabilidade de os domicílios que tinham freezer pontuarem mais de 25 era muito alta. Assim, o critério adotado para substituir a falta da informação de fre- ezer na pesquisa de 1996 foi atribuir dois pontos a mais a todo domicílio que pontuasse 25 ou mais pontos a partir dos demais bens, serviços e características do responsável pelo domicílio. Em termos de classe socioeconômica, este procedimento incrementa valores de pontuação de domicílios que já entraram pelo menos na classe B2.

Outra questão importante na definição da classe socioeconômica é o procedimento adotado em relação aos dados faltantes em algumas entrevistas. É sempre possível fazer uma imputação de dados, baseadas nas demais informações declaradas. Em alguns casos o dado faltante ocorreu devido a falha do entrevistador em anotar a resposta dada. No entanto, o mais comum é que o entrevistado não tenha sabido ou não tenha respondido consistentemente aos itens. Nesse caso, a confiança dos dados do questionário como um todo pode estar com- prometida pelos erros introduzidos pelos próprios entrevistados. Assim, na ocorrência de dados faltantes, pode- se criar uma classe indeterminada quando algum dos itens não é conhecido. Na base de 2006, o maior número de casos faltantes ocorreu nos anos de estudos do responsável pelo domicílio, uma informação de difícil coleta. Como existe uma homogamia muito forte por anos de estudo, no caso do dado faltante para os responsáveis pelos domicílios, buscou-se substituí-los pelos anos de estudo dos cônjuges ou companheiros.

Com relação à identificação das relações familiares, na PNDS 2006, a família é entendida como todos os mem- bros, aparentados ou não, que residem no mesmo domicílio e ligados por laços de parentesco ou convivência. Considerou-se somente a chefia do domicílio e não a chefia da família, como nas pesquisas domiciliares con- duzidas pelo IBGE. Isso porque quase todas as famílias vivendo em um mesmo domicílio (famílias conviventes) são aparentadas e as variáveis de localização dos pais e do cônjuge seriam capazes de identificar uma gama maior de diferentes arranjos domésticos. A partir da informação sobre relação de parentesco com o responsável pelo domicílio, criou-se uma tipologia de arranjos domésticos, que será analisada ao final do capítulo.

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