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A tipograia customizada como elemento identitário em Sistemas de Identidades Visuais A tipograia customizada como elemento identitário em Sistemas de Identidades Visuais 01 05 10 15 20 25 30 35

3. O caráter dos caracteres 3. O caráter dos caracteres

tempos haviam mudado, e não porque ele quisesse produzir algo ‘espe- cial’, ‘pessoal’ ou ‘único’. A concepção de como uma boa tipograia deve ser simplesmente havia mudado” (tSCHICHOLD, 2001:123— tradução minha16).

Essas mudanças se intensiicaram nos séculos seguintes. O cresci- mento qualitativo e quantitativo dos tipos durante o período da Revolução Industrial do século xIx e início do século xx podem ser correlacionados tanto aos movimentos de expansão territorial de países europeus em busca de novos mercados, que colocaram a Europa em contato direto com outras culturas, como à multiplicidade de escolas e movimentos artísticos e literários que ocorriam simultaneamente (BRINGHURSt, 2005:146), não esquecendo as novas descobertas e avanços cientíicos e tecnológicos. Para o autor, tais acontecimentos tiveram ressonância imediata no universo tipográico. Um panorama bastante claro dessa diversidade é veriicado, por exemplo, nos cartazes do período vitoriano inglês em que vários tipos de diferentes estilos e tamanhos coexistem em uma compo- sição repleta e centralizada, reletindo o espírito da época, ou o zeitgeist17. Muitos desses cartazes podiam usar até nove tipos diferentes (figura 029), e possivelmente até mais do que isso. Contudo, apesar da abun- dância de formas, a maioria dos tipos converge para uma linguagem dura, impositiva, informativa e direta. Bringhurst chama essa nova maneira de conceber o design dos tipos de “realismo tipográico”, em que as referências da escrita caligráica culta é substituída pelos traços com espessura mais homogênea ou com modulação dos traços (contrastes) exagerados, serifas grossas e com pontas quadradas ou sem nenhuma serifa, construções excêntricas e adornadas, ignorando qualquer sinal de elegância e soisticação (Ibid.:147).

A expressividade dos tipos contemporâneos reforça a tese de que a tipograia é relexo de um tempo e de uma cultura no sentido mais amplo. De acordo com Ladislas Mandel (2006), a história da escrita deixa evidente que a postura do escriba, com seu gestual, atitude e espírito, conferia às formas das letras uma marca pessoal e da cultura à qual pertencia, delimitando um registro bastante especíico. Ele se recusa a

16 “If Didot did something diferent from Fleischmann, it was because times had changed, not because he wanted to produce something ‘special’, ‘personal’ ou ‘unique’. The conception of what a good typeface should look like had simply changed” (tSCHICHOLD, 2001,123).

17 Zeitgeist: espíRito de um período particular da história representado pelas ideias, crenças etc. do tempo (OxFORD, 1992:1058).

figura 029_ Cartaz de 1891 que divulga o leilão de uma fazenda. Peça da coleção do Centre for Ephemera Studies do Departamento de Tipograia e Design de Comunicação da Universidade de Reading, Inglaterra.

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3. O caráter dos caracteres 3. O caráter dos caracteres

aceitar, por exemplo, que a escrita cuneiforme dos sumérios tenha desen- volvido sua estrutura, baseada em cunhas triangulares, pela simples limi- tação tecnológica ou instrumental. Quando a produção de tipograias em escala industrial passa a difundir tipos locais em um universo mais amplo, as particularidades e sutilezas que o design dos tipos pode operar icam diluídas na comunicação de massa: “Atualmente assistimos a uma proliferação sem precedentes de escritas que não têm nenhuma ligação nem com as culturas, nem mesmo com as funções particulares do escrito, reletindo bem a confusão do mundo moderno” (MANDEL, 2006:18).

Tschichold (2001) aponta na mesma direção: “Todos os letreiramentos (leterings), especialmente os tipos, são antes de tudo uma expressão de seu tempo, assim como todo homem é um símbolo de seu tempo” (tSCHICHOLD, 2001:122). Nos anos 1920, a Nova Tipograia pretendeu eliminar qualquer registro de nacionalidade, criando tipos mais racionalizados e livres de associações históricas ou culturais (BRUMBERGER, 2003a:207) e, apesar dos esforços em “esterilizar” o desenho das letras, esse racionalismo resultou em uma expressão própria e muito presente, e os designers signatários dessa visão aceitaram que os tipos têm personalidades (personas) distintas, e que nunca poderão perder seu impacto retórico (Ibid.).

2.2 MEMÓRIA E A REAÇÃO EMOCIONAL ÀS FORMAS

TIPOGRÁFICAS

__ Em um sentido mais prático, porém muito mais

subjetivo e impalpável, o aspecto visual de uma tipograia e o efeito de sua percepção criam uma resposta emocional no leitor. Essa relação tem liga- ções com a legibilidade e com os fatores internos e externos que atuam sobre ela, inluências culturais e idiomáticas e outras condições ainda mais particulares de um grupo de indivíduos. Para Moen (2000:119), em uma época em que a informação é amplamente conduzida pelo texto e, consequentemente, pela sua forma visual tipográica, é importante que o leitor seja, de alguma forma, guiado através da imensa quantidade de informação disponível e direcionada para ele. Portanto, a escolha das fontes deve obedecer a critérios de legibilidade, de sua imagem cono- tativa, sua credibilidade e estar conectada ao tipo de comportamento e repertório visual da comunidade à qual a mensagem é destinada. Mandel (2006:171) nos lembra que elementos expressivos e emocionais fazem parte de cada traço das letras, sejam estas tipográicas ou manus- critas. Esses elementos integram uma linguagem que se sobrepõe ao

signiicado do texto, ambos percebidos e compreendidos pelo leitor. Para que a tipografia possa exercer seu potencial de expressão, é necessário ser mais “vista” do que “lida”. Estudos sobre a memorização de anúncios publicitários têm direcionado suas atenções para a estreita relação entre as porções pictórica e a verbal, especialmente para o potencial das quali- dades gráicas desse material verbal (CHILDERS e JASS, 2002:96), ou seja, as particularidades das formas tipográicas. Esse pensamento é comparti- lhado por Stöckl (2005) quando cita a palavra alemã schritbild (typeface, tipograia) ou, a síntese de escrita + imagem, que simboliza a capacidade dos leitores em abstrair a função linguística da escrita e focar em suas qualidades pictóricas, ignorando a simbologia das letras e percebendo o texto como uma superície projetada (StÖCKL, 2005:206).

Peter Walker (2007:3) airma que as palavras são codiicadas de dife- rentes maneiras durante a leitura. A percepção e o reconhecimento das formas tipográicas são processados pela conexão entre as estruturas elementares das letras, as chamadas estruturas subjacentes, e as infor- mações guardadas na memória visual de longo prazo (MVLP). Durante o processo dessa conexão entre o estímulo visual e os códigos armazena- dos, experiências podem ser ativadas, que emergem ao nível consciente (RÖGENER et al, 1995:14) gerando respostas emocionais ao estímulo, ou, no caso, às formas especíicas e particulares das letras. Moen menciona o tipógrafo Will Burton, para quem a memória visual tem um poder maior de retenção e elaboração cognitiva dos sinais porque

Quando ouvimos uma mensagem ela é logo esquecida, mas aquela que vemos e lemos é mais permanente porque penetra na memó- ria em mais de um nível e pode ser acessada por várias vezes. Isso explica a crescente importância da tipograia como uma ferramenta corporativa mundial — uma ferramenta que devemos melhorar constantemente, estudando-a e usando-a (BURTON apud MOEN, 2000:117 — tradução minha18).

18 “A message that we hear is soon forgoten, but the one that we see and read is more permanent because it penetrates memory on more than one level and can be referred to over and over again. This explains the growing signiicance of typography as a world-wide communication tool — a tool that we must improve steadily by studying it as we use it” (BURtON apud MOEN, 2000:117).

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