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O NE, do qual fiz parte, era constituído por quatro estudantes estagiários vindos de três instituições de ensino diferentes: um elemento formado no Instituto Superior da Maia (ISMAI), outro no Instituto PIAGET e, por fim, eu e outro elemento na FADEUP. Este aspeto revelou acarretar mais diferenças do que apenas os nomes das instituições, tanto a nível de conhecimentos como de métodos de trabalho e de estudo. Se, a nível de conhecimentos, essa diferença se revelou positiva, uma vez que as unidades curriculares que constituem cada plano de estudos têm algumas dissemelhanças e se uns tiveram oportunidade de estudar determinada modalidade, outros não, havendo

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partilha de conhecimentos e experiências, a nível de métodos de trabalho e de estudo, na minha opinião, os membros do núcleo formados na FADEUP são mais organizados, estão habituados a grandes cargas de trabalho e têm os seus métodos muito bem definidos. Consequentemente, os trabalhos que tiveram que ser realizados em conjunto (exemplos: modelos de estrutura do conhecimento de todas as modalidades lecionadas, organização do dia fitness, tarefas pedidas pelo PC, entre outros), causaram alguma tensão, conflito de ideias e divisão no seio do núcleo.

“Dia 12. A terceira semana fica marcada pela minha incapacidade de focar no que é importante e no que vale a pena. O Mundo não é fácil, as pessoas são todas diferentes, todas complexas e especiais pelas suas particularidades e pela tenra idade – não tão tenra assim - ou exigência a que fui habituada desde pequenina (ter um pai e avô militares traz muitos ensinamentos), há comportamentos que me tiram do sério. É tão urgente um barco no mar como manter a calma, contar até cem e respirar fundo, muito fundo, mas há coisas que me tiram do sério: incompetência, desleixo, o não querer saber, não querer ouvir, não ter opinião, aceitar tudo o que vem sem questionar, questionar tudo sem aceitar por bem, não ter espírito crítico, considerar tudo excelente, entre algumas outras coisas. Se o ano de estágio é um ano de choques com a realidade e as dificuldades existentes deveriam ser relativas aos nossos alunos, ao como ensinar, e tantas outras questões, a terceira semana foi uma semana complicada no seio do núcleo de estágio. Não gosto de falhar, de não cumprir prazos, de trabalhar sobre pressão, de esperar por ninguém... gosto ainda menos que tudo isso aconteça por causa de terceiros. (…) Não há nada como falar, e saber falar, explicar, por pontos nos i’s, não deixar que hajam mal entendidos, que as coisas se arrastem, que se criem bolas de neve, que um dia acabarão por explodir. Que os dias nasçam, que as pessoas discordem, que ideias sejam discutidas, que a compreensão não vacile, que as ironias e os sorrisos (in)sinceros morram e a paz resista. E, acima de tudo, que eu não perca a capacidade de me focar no que é importante, no que vale a pena.”

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Esta realidade foi, desde logo, notada pelo PC, que de tudo fez para que a situação fosse resolvida e o ano letivo fosse vivido através de um trabalho conjunto, tendo evocado a boa experiência do núcleo anterior. Já em 2004, Nóvoa afirmou que não se trata de acrescentar novas tarefas à longa lista de tarefas que os professores são já chamados a desempenhar, nem de desviar a atenção dos professores do trabalho pedagógico propriamente dito. Trata-se, sim, de fazer evoluir a profissão de uma dimensão individual para uma dimensão coletiva, de transformar a experiência coletiva em conhecimento profissional. E, para isso, é necessária uma teoria do coletivo e da docência como coletivo, que está ainda nos seus primeiros passos. A estratégia adotada pelo PC, numa tentativa de acabar com essa distância criada entre as duplas existentes no início do ano letivo, foi separar-nos da pessoa que estávamos mais próximos e tendo de lecionar as aulas da turma partilhada (5ºano) com um dos outros dois elementos do núcleo. Obrigados ou não, o objetivo foi cumprido: as aulas tinham que ser planeadas e lecionadas em conjunto, os problemas e as alegrias vividas durante as sessões de ensino eram também partilhados, as dificuldades de um eram colmatadas pelas facilidades do outro e, a partir de determinado momento, que não é possível caracterizar de forma cronológica, o núcleo deixou de ser constituído por duas duplas. No entanto, os objetivos de classificação a alcançar no fim do ano de estágio eram diferentes, sendo esses objetivos reajustados logo no fim do 1º período. Se alguns de nós continuaram a viver para o estágio e o objetivo continuava, e continuou, a ser o patamar de excelência, outros, face à realidade vivida durante os primeiros meses e a conciliação com outros projetos profissionais, acabaram por descer de patamar, sendo que a exigência não era tão elevada. Esta opção individual que só cada um pode tomar por si, acabou por afetar as decisões de todos, uma vez que, se uns queriam remar a tempo e a horas, nem todos sentiam essa necessidade. Nem sempre foi fácil.

Os estudos voltados para o trabalho em grupo adotam, alternadamente ou como sinônimos, os termos colaboração e cooperação para designá-lo. Costa (2005, cit. por Damiani, 2008) argumenta que, embora tenham o mesmo prefixo (co), que significa ação conjunta, os termos se diferenciam porque o verbo

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cooperar quer dizer operar, executar, fazer funcionar de acordo com o sistema – enquanto o verbo colaborar é sinónimo de trabalhar, produzir, desenvolver atividades tendo em vista determinado fim. Assim, para o autor, na cooperação há ajuda mútua na execução de tarefas, embora as suas finalidades geralmente não sejam fruto de negociação conjunta do grupo, podendo existir relações desiguais e hierárquicas entre os seus membros – como foi o caso da partilha de conhecimentos no seio do núcleo; no entanto, na colaboração, os membros de um grupo trabalham juntos e apoiam-se, visando atingir objetivos comuns negociados pelo coletivo, estabelecendo relações que tendem à não- hierarquização, liderança compartilhada, confiança mútua e co- responsabilidade pela condução das ações – como foi o caso do trabalho desenvolvido junto da turma partilhada. Segundo Araújo (2004), quando a “cultura de coletividade” é instaurada, as pessoas nela envolvida passam a reconhecer o que sabem, o que os outros sabem e o que todos não sabem - atitudes que resultam na procura de superação dos limites do grupo. Nono e Mizukami (2001,cit. por Damiani, 2008) salientam a importância da partilha de experiências entre professores, alegando que a mesma pode favorecer o desenvolvimento da destreza na análise crítica, na resolução de problemas e na tomada de decisões. Esta partilha ocorreu durante todo o ano letivo, com todos os professores com que tive o privilégio de me cruzar, desde o grupo de EF, conselhos de turma, desporto escolar e todos os outros que por mim passavam. No entanto, referindo-me apenas ao NE, o trabalho de análise crítica foi muito potenciado através da observação diária das aulas do PC, dos colegas de estágio e das reflexões após cada aula – tendo esta situação sido repetente durante os primeiros dois meses do ano letivo e, posteriormente, nas aulas calendarizadas. Observar o outro permite não só constatar o que correu mal, como o que correu bem, o que podemos fazer para que determinadas situações não aconteçam connosco, o que resulta melhor e pior, permite-nos ver o outro, invés de apenas olharmos para ele. As discussões após cada aula observada foram momentos muito ricos, não só pelas razões acima mencionadas, mas porque eram várias cabeças a pensar sobre o mesmo assunto e os problemas existentes na turma de cada um eram quase sempre

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confrontados com inúmeras soluções apresentadas pelos presentes. No entanto, o mesmo autor defende que, ao valorizar o trabalho colaborativo, não se deve negar a importância da atividade individual na docência. Deve, pelo contrário, haver uma conciliação dos dois tipos de atividades – grupais e individuais – entendendo que, qualquer uma delas sem a outra limita o potencial de trabalho dos professores.