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4.1. Área 1 – Organização e gestão do ensino e da aprendizagem

4.1.3. Realização do ensino

4.1.3.5. Relações construídas em bases sólidas

“As pessoas vivem numa rotina intensa, muita correria, prazos cada vez mais apertados e problemas para resolver a todo o instante. Tudo isso, certamente, afeta a maneira de nos relacionarmos, afeta a convivência em sociedade. Algumas pessoas não conseguem, por exemplo, prestar atenção ao que os outros dizem, porque sofrem de um transtorno chamado SPA (Síndrome do Pensamento Acelerado). Enquanto alguém fala o seu pensamento está noutro lugar, a imaginar a próxima tarefa que está por vir, a próxima meta que deve

27 “Uma situação de teste, com indicadores de performance, representa uma estratégia formal

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ser alcançada e os problemas a serem resolvidos. O momento presente não é vivido, estamos agora a pensar no amanhã. Todos têm pressa e estão na “correria”. Toda essa “correria” poderia, pelo menos, transformar-nos em atletas, mas infelizmente não é isso que ocorre. Talvez seja hora de repensar como queremos viver os nossos momentos, como transformar essa “correria” numa prazerosa caminhada rumo aos nossos objetivos” (Colle, 2013). O autor acima mencionado, através destas palavras, conseguiu, sem saber, descrever exatamente o início do meu processo de estágio, onde existiram múltiplas reuniões, documentos, tarefas, caraterizações e planos, e o fim do processo, dedicado à reflexão e escrita deste relatório de estágio, preenchido de meios- dias vividos na biblioteca intercalados com meios-dias no hospital. O RE visa a reflexão do ano de estágio e não a reflexão da sua escrita e, por isso, este sub capítulo é dedicado, exclusivamente, à primeira situação – o ano de estágio. Olhando para os últimos meses, considero que em setembro de 2014 estive numa luta contra o tempo, os meus pensamentos atropelaram-se, a necessidade de ter de controlar várias variáveis ao mesmo tempo consumiu- me e os momentos não estavam a ser vividos no presente. De repente o tempo voou e a ansiedade instalou-se a cada dia, queria que o tempo parasse para puder viver os pupilos, os “piquis” e a escola – momento em que exigi ao tempo que me desse tempo e apostei nas relações com os alunos. De acordo com

Jesus (1996, p. 9), “A relação pedagógica não pode ser concebida segundo o

modelo transmissor-receptor, isto é, limitada à relação necessária para transmitir e receber os conteúdos programáticos do processo de ensino- aprendizagem. Este modelo é reducionista quanto à análise da relação pedagógica, pois existem muitas outras variáveis envolvidas neste processo.” “No âmbito da Psicologia Social considera-se que o poder de um sujeito sobre o outro só se torna efectivo na medida em que este se lhe submete, aceitando ser influenciado” (Jesus, 1996, p. 12). Mas então o que é que leva o aluno a deixar-se influenciar pelo professor? French e Raven (1967, cit. por Jesus 1996) afirmam que é a capacidade que o professor tem para recompensar ou punir o aluno, as suas competências na área e as qualidades que possui, com que os seus alunos se identificam. Baseada na minha experiência adquirida

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após este ano letivo, acredito que o reconhecimento por parte dos discentes é consequência dos fatores acima mencionados mas também de uma relação democrática e de afeto, ou seja, apesar da diferença de papéis, há uma relação simétrica, onde todas as vozes se podem fazer ouvir e, por outro lado, uma relação repleta de afeto, onde o respeito e a amor estão presentes. Confesso que, no início do ano, a minha estratégia foi a de distanciamento e autoritarismo, de forma a proteger-me e estipular os limites necessários, mas, rapidamente, percebi que não era necessário manter essa postura tão rígida e que foi nos momentos em que soltei um elogio rasgado, lhes pedi opinião para os vários assuntos e expliquei as minhas opções, que consegui captá-los, como se reflete no seguinte excerto:

“Às 10’ 30’’ certas os discentes presentes começaram o aquecimento e logo de seguida a estafeta com caráter lúdico. Aqueles que chegaram depois da hora, apesar de estarem dentro dos cinco minutos de tolerância, realizaram corrida durante o tempo em que os colegas realizaram a estafeta. (…) Esta decisão provocou, como já era de esperar, algumas reações de desagrado, esclarecidas no final da aula. Se a preocupação de uma aluna era ter falta de atraso, não tinha tido; se a de outro aluno era achar injusto porque chegou ao espaço da aula ao mesmo tempo que os outros, foi feita a distinção entre aqueles que chegam ao pavilhão já equipados mas ainda estão a lanchar (comportamento que nem sequer é permitido pelas regras da escola) e aqueles que estão realmente prontos para começar a aula. Tendo ambos compreendido as razões apresentadas, acredito que a relação professor-aluno pode ser mais forte e sólida se assentar na democracia e no entendimento, sendo que o professor tem sempre a última palavra, prefiro que essa palavra seja, sempre que possível, de acordo entre todos.”

Reflexão nº3 de atletismo (velocidade). Espaço G3. Duração 40’. 28/12/2014 Não era uma questão de permitir tudo, mas dar-lhes espaço para participarem no seu próprio processo de ensino-aprendizagem e não era passar-lhes a mão pela cabeça em tudo o que faziam, mas levá-los ao colo quando necessário. Não existe um modelo único e universal de “bom professor” e nem todos os alunos preferem o mesmo estilo de docente, mas foi desta forma que vivi o ano de estágio e foi assim que consegui que os alunos se identificassem comigo, por atração e não por imposição, como se reflete nos seguintes excertos:

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“Contrariamente ao habitual, a aula não teve início às 10:30 em ponto mas teve um ligeiro atraso, o que, numa aula de apenas um tempo, faz toda a diferença. Se as boas práticas têm sido por mim reforçadas, as menos boas também deve ser alvo de reflexão: hoje o comportamento da turma não foi o melhor, sendo pautado por conversas e brincadeiras constantes. Se as figuras a introduzir já eram mais complexas, se eu própria já tinha mais dificuldade e os alunos também iriam ter (e tiveram), o barulho de fundo só veio prejudicar mais a sessão. (…) À hora estipulada dei a aula por terminada, não sem antes ter uma breve conversa onde foquei alguns pontos que a turma deve reter: os grupos vão ser feitos por mim e não há discussão possível, uma vez que foi a segunda aula consecutiva que chegaram à aula sem os grupos formados; a pontualidade é uma boa característica da turma que deve continuar a existir; o pouco silêncio que se fez sentir durante a aula é prejudicial para todos e o comportamento adotado deve ser o habitual.”

Reflexão nº3 de ginástica acrobática. Espaço G5. Duração 40’. 5/11/2014

“Restando 20 minutos de aula, optei por dar por encerrada a parte fundamental e realizar com a turma duas atividades: a primeira consistiu (…) a segunda atividade era uma dinâmica de grupo que consistia numa folha de papel totalmente branca colada nas costas de cada um, onde todos os alunos e professores (eu e professor cooperante) escreveram uma palavra em forma de elogio e algo de bom que o colega tem (anexo IX). Esta dinâmica foi hoje realizada tendo em conta os problemas que alguns alunos têm tido, apesar de serem fora da disciplina de educação física e, num caso, fora da escola. Todos nós travámos batalhas que os outros desconhecem, devemos ser gentis sempre, é sempre possível ser gentil. Para finalizar a aula foram entregues as cartas do dia dos namorados, sendo a turma muito pretendida. “10ºDDD.”

Reflexão nº7 e 8 de andebol. Espaço G7. Duração 90’. 13/2/2015 Desta forma, “o importante é o professor possuir instrumentos cognitivos que lhe permitam interpretar adequadamente as situações com que se confronta e ter uma flexibilidade relacional que lhe possibilite, nas situações concretas, uma resolução eficaz” (Jesus, 1996, p. 15). As qualidades relacionais do professor, de acordo com o mesmo autor, passam por atitudes que inspirem segurança e promovam, no aluno, a construção de uma auto imagem realista e positiva e a gestão da imagem pessoal do professor, refutando a ideia de que

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um “bom professor” é perfeito, nunca erra e tem que ser adorado por todos os discentes. Para Rogers (1972, cit. por Jesus, 1996), essas qualidades também assentam na criação de uma relação de agrado, adotando uma postura não diretiva (o que não significa que o professor não oriente de forma ativa as atividades). Tal como refere Bento (2003, p.108), “o ensino assume uma importância decisiva para o desenvolvimento da personalidade dos alunos; apresenta as bases para o desenvolvimento do seu comportamento moral, para a formação de interesses, de necessidades e valores; influenciar determinantemente a sua vontade, os seus sentimentos, as suas acções, a sua disponibilidade para o empenhamento e rendimento, forma o seu pensamento.”

4.1.3.6.Muitos olham, poucos veem. Muitos observam, poucos absorvem.