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O CASO DOS REPATRIADOS AÇORIANOS

3.1. A Emigração Açoriana

O boom da emigração do arquipélago dos Açores data de finais do século XVIII. Contudo, só no início do século XIX, quando as condições socio-económicas se tornaram desfavoráveis - nomeadamente para os trabalhadores rurais, que cultivavam a terra que não lhes pertencia e que mal lhes dava para subsistir - é que se assiste a um aumento do fluxo migratório.

O emigrante das primeiras gerações partia sozinho e sem instrução, apenas levando a força braçal que vai utilizar no campo ou nas fábricas americanas. Vê a América como a “terra prometida” (na América “veve- se” bem, dizem-lhe), que lhe dá o trabalho que os autóctones rejeitam. O imigrante açoriano aceita esse trabalho como dádiva, sem contestar, apostando no seu esforço e na esperança de melhorar o seu futuro e o da sua família.

À medida que as comunidades de imigrantes aumentam, geram-se laços de solidariedade que, de forma mais ou menos consciente,

funcionam como apoio aos que vão chegando.

Maria Loamis Baganha (1990) na sua pesquisa acerca da história da emigração portuguesa nos EUA, mostra claramente o papel dinâmico das redes primárias de sociabilidade (os familiares, os conterrâneos, por exemplo) como mecanismo de suporte na busca de trabalho e de

encaminhamento social.

Porém, o choque entre os modelos tradicionais de cultura e os modelos que prevalecem no país acolhedor tem, para o “emigrado”, um

significado ambivalente por estar entre dois países e duas culturas e que o leva a debater-se entre a sua conciliação, aculturando-se, ou perdendo- se numa existência de não integração, de não pertença aos locais de origem e de destino. Instala-se, então, a desilusão, a desmotivação, as vias alternativas através do desvio, da violência, da delinquência, que conduzem à marginalidade e, posteriormente à exclusão, culminando com a deportação.

Retomaremos o seu percurso em terras de acolhimento, desde a sua (des)integração até à deportação e repatriamento.

3.2. O Repatriamento para os Açores

O repatriamento dos portugueses açorianos emigrados nos EUA e Canadá por razões judiciais, tem levantado alguma polémica pela forma progressiva como se tem processado e pela amplitude que tal fenómeno tem vindo a tomar no tecido social da Região Autónoma dos Açores. É de salientar que tal situação se tenha acentuado, sobretudo, nesta região, em virtude das comunidades portuguesas naqueles países serem, na sua maioria, constituídas por açorianos.

Os Açores foram, quase sempre, marcados por fluxos migratórios, tendo por destino países como o Brasil e as Bermudas e, mais

recentemente, os EUA e o Canadá, onde reside uma boa parte da comunidade açoriana.

A emigração açoriana - responsável pelo decréscimo demográfico que se verifica na região - foi sempre de cariz familiar. Os açorianos emigravam em massa, acompanhados geralmente das famílias, com o intuito de fixarem residência nesses países, dando origem a colónias (São Francisco, Oakland e outras na California, New Bedford e Providence e ainda em Boston e Brooklin).

Embora as autoridades americanas afirmem, repetidamente, que o número de cidadãos portugueses expulsos é pouco significativo no conjunto dos deportados, tal realidade adquire uma dimensão que começa a tornar-se “preocupante”, se tivermos em conta a situação geográfica e sócio-económica dos Açores.

Se até meados da década de noventa o problema era residual (casos esporádicos de alguns indivíduos com hábitos de consumo de álcool e outras drogas, que procuravam “aclimatar-se” e integrar-se em comunidades de referência familiar), a partir de 1993, e sobretudo em 1994/95 o repatriamento começou a adquirir contornos de uma certa dimensão. Aliás, as alterações ocorridas no sistema judicial dos EUA e do Canadá fez com que o número de indivíduos repatriados aumentasse. A emergência de um grupo específico de “repatriados” deve-se a vários factores de agregação, tais como: terem todos o sentimento de “estrangeiros” (em virtude de todo o seu processo de desenvolvimento pessoal e social ter decorrido nos países para onde emigraram); a

utilização da língua inglesa (embora alguns ouvissem falar português em casa, é uma língua que mal dominam); terem os parentes mais próximos nos países que tiveram de abandonar; preferirem um quadro de

referências culturais e um ambiente físico e humano comum entre eles, às diferentes estruturas sócio-culturais dos Açores; terem passado por

períodos, mais ou menos longos, de contacto com grupos sociais problemáticos, com uma ou mais condenações aliadas, e, ainda o consumo e tráfico de drogas.

As causas da deportação destes indivíduos estão, obviamente, ligadas à prática de actos proibidos por lei sendo de salientar o facto de nunca terem requerido ou obtido a cidadania americana ou canadiana. Poder-se-á perguntar: porque não se naturalizaram os repatriados, evitando assim a sua deportação? São várias as respostas. Uma delas é que nunca sentiram necessidade de o fazer, porque quando uma pessoa

é aceite nos EUA ou no Canadá, teoricamente, se tiver família instalada e uma ocupação estável, poderá permanecer indefinidamente com esse estatuto. Também a ideia do regresso à terra-natal leva a que muitos emigrantes não se naturalizem prejudicando, assim, os filhos (que

poderão vir a ser repatriados) e, nalguns casos, eles próprios. Associado a esta ideia do regresso, também está presente o factor económico, pois muitos pensam que, não sendo naturalizados, poderão mais facilmente escapar às leis do fisco, o que lhes permite economizar mais em menos tempo, apostando num regresso mais cedo. Há também outros indivíduos que não o fizeram, por desconhecerem as leis da naturalização.

CAPÍTULO IV

A METODOLOGIA ESCOLHIDA