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CAPÍTULO III – ANÁLISE DOS PROGRAMAS ELEITORAIS DE TELEVISÃO DAS

2. Perfil e análise dos programas de 2000

2.1. Categorizações e referenciações

Para estabelecer um método de análise, será formatado um quadro88 que resume as posições dos sujeitos (João Paulo e Roberto Magalhães) nos enunciados, a partir de categorizações e referenciações elaboradas nos programas eleitorais de João Paulo em 2000. São enunciados extraídos de narrações de atores, falas em off de locutores (somente a voz, sem a imagem do locutor), textos lidos por apresentadores, depoimentos de João Paulo, do candidato a vice-prefeito Luciano Siqueira, do ex-governador do Distrito Federal, Cristóvam Buarque, do escritor Ariano Suassuna, do então presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, do então prefeito de Camaragibe, Paulo Santana, e também da população entrevistada nas ruas e nos eventos de mobilização da campanha.

As categorias não são nem evidentes nem dadas de uma vez por todas. Elas são mais o resultado de reificações práticas e históricas de processos complexos, compreendendo discussões, controvérsias, desacordos. As ciências naturais são, assim, um lugar privilegiado onde se pode observar a

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Categorização e referenciação não são estruturas utilizadas tradicionalmente pela Análise de Discurso. Mas são nomenclaturas da preferência da pesquisadora, até porque foram termos manipulados nas entrevistas para facilitar a compreensão do entrevistado, quando era o caso.

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As expressões destacadas no quadro não são, necessariamente, literais. Algumas vezes foi colocado já o sentido de expressões literais.

dinâmica da categorização e da recategorização e suas evoluções lingüísticas e cognitivas. Mais geralmente, a instabilidade caracteriza o modo normal e rotineiro de entender, descrever, compreender o mundo – e lançar, assim, a desconfiança sobre toda descrição única, universal e atemporal do mundo. (CAVALCANTE, RODRIGUES, CIULLA , 2003, p. 28)

As estratégias discursivas lançam mão de instrumentos para expressar e organizar uma atividade cognitiva sobre o mundo, sobre as pessoas, sobre os sujeitos. Vê-se que a categorização e a referenciação privilegiam a relação subjetiva e social, extraindo visões de mundo publicamente estabelecidas. E isso é refletido no texto, na atividade discursiva dos sujeitos. As categorizações e referenciações elaboradas para denominar, nomear João Paulo e Roberto Magalhães são, então, retiradas dos discursos que circulam na sociedade. As pistas de acesso são construídas a partir de enunciados que, de alguma maneira, são socialmente aceitos.

A análise conseqüente dos processos de referenciação que participam da constituição de um mundo discretizado, dotado de factividade e fazendo sentido, transforma radicalmente a questão da referência: no lugar de se referir a uma ordem de mundo ideal e universal e à sua nomeação, tentamos explicitar os diferentes níveis nos quais a referência é produzida pelos sistemas cognitivos humanos, utilizando uma ampla variedade de dispositivos e de restrições, aqueles das línguas naturais. A entrada é o reconhecimento do papel central das práticas lingüistas e cognitivas de um sujeito ‘envolvido’, social e culturalmente ancorado, assim como da multiplicidade, mais ou menos objetivada, mais ou menos solidificada, das versões do mundo que elas produzem. (CAVALCANTE; RODRIGUES; CIULLA, 2003, p. 49)

Estas categorizações e referenciações marcadas nos programas eleitorais da Frente de Esquerda do Recife foram escolhidas aqui não pelas repetições, mas porque são consideradas o ponto de partida para entender, por meio dos sujeitos, como os discursos foram sendo construídos. É como se fossem chaves discursivas para iniciar a compreensão do aprofundamento da análise.

JOÃO PAULO

- É o candidato que a criançada mais gosta. - É uma pessoa que lutou e luta pela classe pobre - É um homem de luta, de caminhada

- É trabalhador, comprometido com a luta do nosso povo, povo sofrido

administrativa na cidade do Recife - O novo tempo chega com João Paulo - Representa uma nova fase para a cidade

- É um brasileiro que, diferentemente da maioria, surgiu do Brasil Real, o Brasil do povo

- Com João Paulo a cidade será Recifeliz

- Com João Paulo todas as crianças do Recife terão um futuro melhor - João Paulo é que começa a cidadania

- Em João Paulo se pode confiar - Nasceu para a luta

- Votar em João Paulo é fazer uma declaração de amor ao Recife

- João Paulo tem propostas concretas para atender a maioria da população - É uma pessoa humilde

- Representa uma candidatura alternativa e mais próxima dos ideais evangélicos, de justiça e de moral cristã

- Representa uma nova cara para o Recife - Representa a grande virada para o Recife

- Representava a luta democrática para construir um sindicalismo novo, moderno, que defendia os interesses dos trabalhadores

- Tem a sua história marcada junto ao movimento social - É o candidato mais preparado

- É a radicalidade da democracia em Recife - É participação popular

- É a possibilidade de setores populares estarem no poder - É a certeza da democratização da cidade de Recife

- Representa uma gestão democrática com a participação das mulheres

- Tem uma vida pública marcada pela competência, pela lisura e pela defesa dos direitos dos cidadãos

- É um homem preparado, é um homem talhado para fazer uma nova experiência administrativa na cidade do Recife

ROBERTO MAGALHÃES

- Candidato que vivia a prometer... Mas não cumpria com nada - É aliado com Fernando Henrique Cardoso

- Roberto Magalhães esqueceu o primeiro emprego, esqueceu os adolescentes e agora vai querer nosso primeiro voto

- Violência e arrogância nunca combinaram com a poesia do Recife - Tem “aquele gênio danado”

- Ele tenta esconder passado - E pensa que engana de novo

- Ele agora quer vender gato por lebre - Se faz de cordeiro manso

- É pau que nasce torto, morre torto - Roberto Magalhães é descontrolado

- Roberto Magalhães é prepotente e governa de modo autoritário e fechado em gabinete - Está na contramão da história

- Já perdeu as estribeiras, já voltou ao velho tom

- Não está acostumado a ouvir, ceder, acatar, respeitar a vontade do povo - Age de maneira desrespeitosa com João Paulo

- Está desesperado - Prega o medo - Dissemina o ódio - É truculento

- Governa de costas para o povo - É desleixado

- Age com descaso, omissão - É um velho cacique

- É violento - É descuidado - É incompetente

- Ele não conhece o povo do Recife, não conhece o sofrimento do povo do Recife. - Ele reprimia o movimento operário

- É omisso com o povo pobre da cidade - É mentiroso

- Tenta enganar a opinião pública - Dá péssimos exemplos

- Não tem caráter

- Faz uma campanha de difamação contra João Paulo - Espalhando medo e o preconceito na cidade

- Ele não se conforma de ver um trabalhador ocupar a cadeira do prefeito do Recife - Joga sujo para evitar a vitória do povo.

- É um bastião da ditadura, é autoritário

Essas nomeações foram construídas pela produção de diversos gêneros discursivos (poemas, desenhos animados, depoimentos, paródias de cantigas de roda) que circularam dentro dos programas eleitorais de João Paulo. Sabendo-se que as categorizações e referenciações emergem de um contexto, que para serem geradas e entendidas dependem de conhecimentos de mundo e competências cognitivas similares e partilhadas, então essas nomeações fazem parte do jogo político, da realidade da campanha, da história política dos candidatos. Ou seja, a publicidade e o marketing político elaboram um tratamento adequado a um já-dito. São versões publicamente aceitas, ou melhor, partilhadas, que pode ser por uma maioria ou uma parcela da população. Até porque “não se pode deixar a palavra para o locutor apenas. O autor (o locutor) tem seus direitos imprescritíveis sobre a palavra, mas também o ouvinte tem seus direitos, e todos aqueles cujas vozes soam na palavra têm seus direitos (não existe palavra que não seja de alguém).” (BAKHTIN, apud BRAIT, 2005, p. 203)

Por isso, a comunicação da campanha preocupa-se em mesclar essas categorizações e referenciações entre as falas de vários sujeitos-personagens do cenário político, a fim de referendar o que é dito por vários enunciadores ou locutores. Quando se nomeia Roberto Magalhães como violento, prepotente, arrogante, por exemplo, é com base em episódios ocorridos antes e durante o período eleitoral. Foi amplamente divulgado, inclusive pela Imprensa e organizações de defesa dos Direitos Humanos, a invasão da redação do Jornal do Commercio pelo então prefeito Roberto Magalhães, no ano 2000, que, armado, supostamente chegou a ameaçar um colunista social porque publicou nota que lhe desagradou.

Também foi divulgada na Imprensa a versão da líder comunitária do Bairro de Jardim Uchôa, Maria da Penha, que teria sido agredida fisicamente pelo prefeito, antes do período eleitoral, em virtude de divergências no encaminhamento de construção de creche e escola em

uma comunidade. A líder teve espaço privilegiado no programa de João Paulo para narrar, com detalhes, o fato sob sua ótica. E, finalmente, durante um evento de campanha, ainda no primeiro turno, Roberto Magalhães foi fotografado fazendo gestos obscenos para militantes de uma candidatura oponente. Inclusive essa imagem foi exaustivamente explorada pelos programas da Frente de Esquerda do Recife no segundo turno. Como se vê, a comunicação e o marketing apenas puxaram um fio de novelo para desvendar uma memória e um discurso já em circulação.

Na outra ponta, está João Paulo com uma história que por si só comove a população: um homem de origem simples que chegou a ser deputado estadual. Sem contar que foi líder comunitário, operário, sindicalista, fundador da CUT e do PT no Estado e vereador. Pesa em seu favor o fato de ser considerado um defensor dos oprimidos, sobretudo depois que obteve projeção nacional ao quebrar costelas e ficar internado em hospital durante um embate entre policiais militares e moradores da comunidade de Sítio Grande, no bairro da Imbiribeira, no Recife, quando era deputado estadual e defendia os moradores contra ação da polícia para desapropriação de terra. E mais: João Paulo não contava com qualquer desgaste público na sua imagem. Referenciar e categorizar o petista para a construção de uma identidade positiva era mais um reforço de discurso, que, aliás, os programas souberam valorizar.

Alguns trechos dos programas abrem caminhos para entender como os dois políticos foram nomeados nos enunciados em diversos gêneros:

Depoimento do escritor Ariano Suassuna, em programa veiculado em 12/10/2000 à noite e 13/10/2000 à tarde:

“Machado de Assis dizia que no Brasil existem dois países. O país oficial e o país real. O país oficial é o país dos poderosos. João Paulo é um brasileiro que, diferentemente da maioria, surgiu do Brasil Real, o Brasil do povo. E este Brasil está precisando de tomar as rédeas da nação, para corrigir quinhentos anos da secular injustiça que tem sido cometida com o povo brasileiro. Essa, pra mim, é a grande significação da extraordinária vitória de João Paulo no Recife”.

João Paulo pertence e representa o Brasil que não é dos poderosos, é do povo. João Paulo e o povo fazem parte do “Brasil real”. O “país oficial” é o país dos que são responsáveis por “quinhentos anos da secular injustiça que tem sido cometida com o povo brasileiro”, dos que instalaram a Ditadura Militar no Brasil, enfim, dos que fazem parte do grupo representado por Roberto Magalhães, da direita. Mas João Paulo pode “corrigir isso”, tomando “as rédeas

da nação” junto com o povo. Isso dito por um intelectual, um escritor conhecido nacionalmente é bem representativo para a construção da identidade positiva de João Paulo, porque legitima o petista a administrar a cidade, mesmo sem experiência administrativa, mesmo sem escolaridade de nível superior (crítica que circulou durante a campanha, utilizada pelos adversários).

Depoimento de João Paulo, durante o programa dos dias 12.10.2000 à noite e 13.10.2000 à tarde:

“Esse segundo turno está engasgado na garganta dos poderosos. Deixou Roberto Magalhães mais descontrolado ainda. As urnas calaram a prepotência e deram um basta ao modo autoritário de se governar fechado em gabinete. Um modelo ultrapassado que vai ser enterrado de uma vez. E sabe por quê? Porque o Brasil inteiro está mudando. E o Recife não pode ficar na contramão da história. Fique tranqüilo. Estamos juntos e no caminho certo”.

João Paulo chama Roberto e o grupo dele de “poderosos”, no sentido negativo da palavra, de quem não está do lado do povo. E ficou “mais descontrolado ainda”, reforçando que um homem público não pode perder o controle das situações, ou então não está apto para administrar. “Prepotência”, “modo autoritário de se governar fechado em gabinete” são expressões que categorizam um político distanciado do povo, e as urnas ‘calaram isso’ no primeiro turno, levando ao segundo turno um candidato e que ‘vai governar com o povo’. Que vai implementar um novo modelo, não o modelo de Roberto Magalhães, que está “ultrapassado” e “vai ser enterrado de uma vez”. Isso dito pelo próprio João Paulo, como alguém que está denunciando ao povo as práticas desaprovadas do pefelista.

Depoimento de rapaz, na rua, exibido no dia 16/10/00, à noite:

“Uma grande vitória do povo trabalhador, da classe operária, dos estudantes, dos aposentados, sem vez e sem voz. Nós vamos conseguir colocar João Paulo na prefeitura. Com certeza.”

A ida de João Paulo ao segundo turno é “uma vitória do povo trabalhador, da classe operária, dos estudantes, dos aposentados, sem vez e sem voz”. É a identidade do petista como ‘homem do povo’, dito por uma pessoa simples nas ruas da cidade.

Depoimento do candidato a vice-prefeito, Luciano Siqueira, que foi ao ar no dia 13.10.2000 à noite:

“Eles não tomam jeito mesmo. Mal o guia começou e as baixarias, as mentiras tomaram conta. Estamos fazendo um programa bonito, alegre, apresentando propostas, mostrando as diferenças entre os candidatos, esclarecendo o eleitor. Mas eles insistem em baixar o nível e de maneira desrespeitosa para com João Paulo. É desespero, o medo de perder. Essa gente não está acostumada a ouvir, ceder, acatar, respeitar a vontade do povo. Não medirá esforços para caluniar. Ainda bem que você conhece João Paulo. E sabe que pode confiar. É, Roberto Magalhães disse que ia mostrar sua verdadeira cara no segundo turno. Está mostrando mesmo!”

O vice-prefeito utiliza expressões contundentes, como “baixarias”, “mentiras”,

“desespero”, “medo de perder” para recriar uma identidade negativa para Magalhães, como

um fraco, uma pessoa sem classe, sem equilíbrio. E ainda nomeia ele e seu grupo, pejorativamente, de “essa gente”, que “não está acostumada a ouvir, ceder, acatar, respeitar a vontade do povo”. Os verbos ouvir, ceder, acatar, respeitar são caros a um discurso que defende um sistema democrático de governo, que ‘não é o de Roberto Magalhães e “sua gente”’, ‘que governa de costas para o povo’(frase repetida em alguns momentos dos programas eleitorais em referência a Magalhães). Por outro lado, o mesmo texto preocupa-se em enaltecer a imagem de João Paulo e seu grupo político, nos quais se pode “confiar”, que fazem “um programa bonito, alegre, apresentando propostas, mostrando as diferenças entre os candidatos, esclarecendo o eleitor”.

Depoimento do bispo Robson Cavalcante, da Igreja Anglicana, durante encontro de religiosos em apoio a João Paulo, no programa dos dias 15/10/2000 à noite e 16/10/00 à tarde:

“Todos nós conhecemos João Paulo como uma pessoa que tem uma vida transparente, uma vida ética, coerente, sempre na mesma posição, e os cristãos reputam como sendo um aliado preferencial em razão de sua biografia e sua coerência.”

Aqui, o discurso de um religioso categoriza João Paulo como um aliado dos “cristãos”, porque tem uma vida transparente, uma vida ética, coerente”, num sentido pessoal e político.

“O desespero, né?, do do Roberto Magalhães, da Jane, dessas críticas, né?, que é puro resquício da ditadura, de um bastião da ditadura, que é Roberto Magalhães, uma pessoa autoritária.”

Há nessa fala uma categorização e referenciação explícitas para associar Roberto Magalhães à Ditadura Militar. É chamado de “bastião”, defensor, baluarte da ditadura, um “autoritário”, referendado, dessa vez, por um jovem entrevistado na rua.

Fala de João Paulo durante debate na TV Guararapes, veiculado no programa do dia 17/10/2000 à noite, sob a edição de um bloco intitulado “Incompetência”:

“Ele não conhece o povo do Recife. Não conhece o sofrimento do povo do Recife. Ele não conhece as pessoas que estão sem habitação, sofrendo. Que estão sem o saneamento básico, que estão sem o direito à saúde, porque um governo que ‘incenera’ mais de um milhão e seiscentos mil de medicamentos, por ter deixado velho, isso é na realidade é não conhecer o problema do povo.”

As repetições das palavras ‘não’ e ‘sem’ no texto, já criam, por si só, uma mensagem negativa. Quando se refere a Roberto Magalhães reforça uma identidade negativa de ‘incompetente’ e de quem ‘não conhece o povo’. Dois enunciados que são retomados em vários trechos dos programas eleitorais.

Locutor apresenta a líder comunitária Maria da Penha, que denunciou Roberto Magalhães por agressão em 2003, no programa veiculado no dia 20/10/2000:

“Esta é Maria da Penha, uma líder comunitária que já sentiu o peso da mão do violento Roberto Magalhães. Seu crime foi questionar a competência do prefeito na construção de uma escola no Jardim Uchoa. Na mesma rua da creche que apresentou rachaduras, antes mesmo de ser inaugurada. Maria da Penha foi agredida por denunciar mais uma obra sem futuro. Dinheiro jogado fora pela incompetência de Roberto Magalhães.”

Mais uma vez a estratégia discursiva de chamar o pefelista de violento e incompetente. Dessa vez por meio de uma denúncia de uma líder comunitária, alternando com imagens de jornais que publicaram a suposta agressão do então prefeito à líder comunitária.

Depoimento de Silvia Camurça (Abong/SOS Corpo), uma das participantes do evento de apoio de organizações sociais a João Paulo, que foi ao ar em 20/10/2000:

Pela linguagem proferida, vê-se que a intenção é colocar João Paulo como aliado dos movimentos sociais, que são mais exigentes quanto à adesão às teses teóricas das esquerdas. Não basta ser o popular, o humilde, o esquerdista, ele tem compromisso em instaurar um sistema político-ideológico que vai dar conta de teorias defendidas pelo socialismo, que chega a uma fase que implementa a democracia radical, ou seja, plena.

Poema veiculado no programa dos dias 12/10/2000 à noite e 13/10/2000 à tarde, narrado pelo ator Cláudio Ferrário (de forma bem descontraída):

“Eita, lá vem o seu Roberto Com aquele gênio danado Ele tenta esconder o passado E pensa que engana de novo. Pega leve, seu Roberto O povo não é besta não Já conhece a reza certa Pra não ver assombração.

Ele agora quer vender gato por lebre

Se faz de cordeiro manso e avestruz chama de porco Cuidado, seu Roberto

Essa doença dá febre

Pois pau que nasce torto, morre torto”

Ditos populares são retomados aqui para desqualificar a imagem de Magalhães, por meio de ironias, ambigüidades e metáforas: ‘ter gênio danado’, ‘vender gato por lebre’, e ainda é ‘pau que nasce torto e morre torto’. Ou seja, tem gênio danado, porque é o truculento, o violento. Vende gato por lebre, uma vez que é um advogado, mas invade a redação de jornal para supostamente ameaçar um colunista social, e também agride uma líder comunitária (como foi publicizado nos programas da Frente de Esquerda). Também vende gato por lebre porque é um político que já foi até governador, mas deixa estragar medicamentos para os pobres (denunciado por João Paulo no debate da TV Guararapes). E, finalmente, pau que nasce torto, é como o ultimato para a história política dele: não tem mais jeito (relembra o depoimento de Luciano Siqueira que fala: “temos que enterrar esse passado”). Outra expressão que categoriza o político de forma irônica, tentando ridicularizá-lo é “Seu Roberto”. É recorrente

nos textos dos programas nomeá-lo de Seu Roberto ou Doutor Roberto. A pretensa atribuição de autoridade e intimidade a sua figura é, na verdade, uma ironia. Afinal, ‘um doutor, um senhor agindo com truculência, violência, administrando mal a cidade!’. O gênero ‘poema popular’, narrado por Cláudio Ferrário, com humor, se presta bem a essa estratégia.