• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO I UM PANORAMA DA HISTÓRIA DO PARTIDO DOS

3. Poder, esquerda, PT e os discursos que circulam

Como se viu nos depoimentos dos representantes das tendências petistas, o Partido dos Trabalhadores passou (e passa) por problemas internos e externos depois que chegou ao poder. Ou melhor, quando alcançou o ápice do poder, com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência da República, depois das eleições de 2002. Não cabe a esta dissertação decifrar as causas, investigar a chamada crise do Mensalão ou os rumos e caminhos do PT. É interesse deste estudo aproveitar o momento político do Partido dos Trabalhadores – considerado o maior partido de esquerda do Brasil - para costurar um comentário mais

aprofundado sobre as possíveis mudanças de discurso do PT ou uma suposta crise de identidade das esquerdas. É importante ressaltar que a crise do PT nunca foi um dos focos desta análise, porém, foi um tema que saltou, veio à tona, nos depoimentos de praticamente todos os entrevistados. E a pesquisa não poderia desprezar esse dado. Até porque o discurso de João Paulo está entrecruzado com o discurso do PT. A prática do poder na Prefeitura pode ser considerada um micropoder em relação ao macropoder do Governo Federal. É como se fosse uma tentativa de enxergar, aqui, indícios do que pode ocorrer com um partido na passagem da oposição ao poder.

O autor Angelo Panebianco, no seu livro Organização e Poder nos Partidos Políticos (2005), elabora um estudo que tem como ponto central a constatação de que os partidos políticos são organizações e, por isso, devem ser observados, primeiramente, por meio da análise organizativa. O teórico analisou os partidos políticos europeus para sustentar as teses que defende na publicação – o que não quer dizer que invalida comparações com sistemas partidários de outros continentes. Uma dessas teses, faz entender como a análiseorganizativa permite acompanhar o comportamento das legendas ao longo de sua existência.

Um partido, como qualquer organização, é um estrutura em movimento que sofre evoluções, que se modifica no tempo e que reage às mudanças externas, à modificação dos ‘ambientes’ nos quais está inserido e atua. É possível afirmar que os fatores de maior incidência na ordem organizativa dos partidos, que explicam sua fisionomia e seu funcionamento, são a sua história organizativa (o seu passado) e as relações que ele estabelece com os seus inconstantes ambientes externos. (PANEBIANCO, 2005, p. 91)

Entende-se que é da contradição entre o seu passado (vinculado aos movimentos social e sindical, a Igreja e os partidos revolucionários) e as relações que o Partido dos Trabalhadores estabeleceu com o ambiente externo (o exercício do poder, a convivência com os partidos aliados, a conjuntura social e econômica, a relação com os poderes legislativo e judiciário, entre outros), desde a sua fundação, que resulta o seu comportamento hoje. Talvez por isso haja uma tensão permanente entre as tendências políticas mais ortodoxas, mais ligadas às suas teorias de origem, e o centro dominante do poder – que até recentemente se chamava Campo Majoritário. Porque se “as modalidades de formação de um partido, os traços que sustentam sua gênese, podem de fato exercer uma influência sobre as suas características organizativas, mesmo depois de décadas” (PANEBIANCO, 2005, p. 92), pode-se dizer, da mesma forma, que “toda organização traz consigo a marca das suas modalidades de formação e das principais decisões político-administrativas de seus fundadores, as decisões que

‘modelaram’ a organização.”(PANEBIANCO, 2005, p. 92-93). Ou seja, o PT é a sua origem e as relações e correlações de poder e ações que travou ao longo de sua história.

Numa abordagem inovadora, Panebianco (2005) diferencia “instituição forte” de “instituição fraca”, oferecendo alguns argumentos que ajudam a conhecer o posicionamento do PT durante a sua trajetória. Segundo o autor, “uma institucionalização fraca geralmente resulta numa coalizão dominante pouco coesa (subdividida em facções), enquanto uma instituição forte gera uma coalizão dominante coesa (subdividida em tendências).”(PANEBIANCO, 2005, p.111). Explicando melhor, o autor teoriza que “[...] uma institucionalização forte implica uma forte concentração do controle sobre as zonas de incerteza.[...]. Uma institucionalização fraca implica dispersão do controle sobre as zonas de incerteza e, portanto, ausência de um ‘centro’ que monopolize a distribuição de incentivos.” (PANEBIANCO, 2005, p. 111).

[...]É preciso observar que toda organização política tende a desenvolver alas divergentes: a esquerda, a direita e o centro. Isso só não acontece nos partidos monolíticos e, por um motivo simples: os militantes que divergem são expulsos ou aniquilados fisicamente. A existência de uma esquerda petista é, portanto, um fato compreensível e saudável – não só para o PT, mas para a própria democracia brasileira. Um partido que não tenha setores que elaborem a crítica interna, vai a reboque do líder ou dos líderes. E, os líderes erram. É preciso alguém para opor-lhes uma outra política e fazer- lhes ver os lados negativos da política implementada. Isso não significa que a esquerda não erre. Mas é nesse confronto político que se pode corrigir erros, de um lado ou de outro. A democracia brasileira só tem a ganhar com a esquerda petista e também com a esquerda fora do PT (eles expressam a consciência crítica em relação à política majoritária).(SILVA, 2002, p. 2) Ora, o Partido dos Trabalhadores parece ter elementos de instituição forte e fraca. A gênese do PT contou com facções que chegaram a ser consideradas ‘partidos dentro de partido’. E o PT conviveu durante muito tempo com esse estigma. Como se sabe, depois houve a expulsão da Convergência Socialista, por exemplo, que era considerada uma facção dentro do Partido, mas isso ocorreu nos anos 90. Por outro lado, o Partido é subdividido em tendências, mas, de acordo com a pesquisa realizada para este trabalho com as tendências em Pernambuco, observa-se que não há uma total coesão entre as correntes. Isto é, o que fortalece o PT pode ser o que também o fragiliza. Mais uma contradição vivida pelo Partido dos Trabalhadores.

Outro assunto levantado por Panebianco (2005) é o perfil dos partidos de oposição. De acordo com o autor, “convencionou-se que as características organizativas dos partidos que experimentam longos períodos na oposição no curso de sua história são diferentes daquelas

dos partidos que gozam de uma longa permanência no governo.”(PANEBIANCO, 2005, p. 127).

Os partidos do primeiro tipo precisam muito mais do que os segundos de uma organização forte e sólida. Esses partidos não podem se apoiar na burocracia estatal, não podem utilizar o Estado e seus aparatos[...], nem dispõem normalmente do abundante apoio financeiro que os grupos de interesse reservam aos partidos governistas. Só podem contar, ou ao menos em grande parte, consigo mesmos. Fortalecer a própria organização, colocá- la em condição de mobilizar com eficácia e continuidade os defensores do partido é o único caminho possível, na maior parte dos casos, para superar a desvantagem na disputa com os partidos governistas. Por sua vez, a situação no caso dos partidos governistas é oposta. Esses partidos têm uma multiplicidade de recursos públicos à disposição, para serem usados na disputa política, e, geralmente, esses recursos costumam ser um substituto eficaz da mobilização por meio da organização partidária. Seguindo esse raciocínio, devemos esperar, portanto, que os partidos que nascem e se consolidam na oposição tendem mais facilmente a se tornar instituições fortes. Devemos esperar também que os partidos que conquistam o governo nacional logo após a sua fundação e que, a partir dessa posição, experimentam a consolidação organizativa, tendem mais facilmente a se tornar instituições fracas. (PANEBIANCO, 2005, p. 127-128)

Por um ângulo, pode-se dizer que o PT chegou ainda muito jovem ao poder nacional. Com apenas vinte e dois anos da fundação do Partido, Lula foi eleito Presidente da República. Em contrapartida, a legenda fez história como oposição. O PT nasceu na oposição. Isso fortificou a imagem do PT como partido de esquerda em oposição à direita. Sobretudo pela sua vinculação aos movimentos social e sindical. Pela tese de Panebianco (2005), os partidos que passam muito tempo na oposição ganham em organização. O PT foi mesmo tido como partido organizado, com base popular, de massa. O que compensaria a falta de institucionalização. Por outro lado, assumiu o poder nacional. E, segundo Panebianco, os partidos governistas “têm uma multiplicidade de recursos públicos à disposição, para serem usados na disputa política, e, geralmente, esses recursos costumam ser um substituto eficaz da mobilização por meio da organização partidária”. Levanta-se a hipótese: será que ao chegaram ao poder os partidos se distanciam das bases porque prescindem delas? São questões que não cabem aqui serem respondidas, mas refletidas.

De qualquer maneira, é necessário ter em mente que os partidos políticos orbitam em realidades dinâmicas e a sua práxis envolve um elemento que está no cerne da sua razão de

ser: o poder. A idéia de ‘poder’ é como algo intangível, que muitas vezes permeia interesses temporais e atemporais, ideologias, instituições, estrutura material e financeira, vaidades, enfim, há que se olhar os partidos dentro desse universo. Como defendeu Foucault:

[...]O poder, acho eu, deve ser analisado como uma coisa que circula, ou melhor, como uma coisa que só funciona em cadeia. Jamais ele será localizado aqui ou ali, jamais está entre as mãos de alguns, jamais é apossado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona. O poder se exerce em rede e, nessa rede, não só os indivíduos circulam, mas estão sempre em posição de ser submetidos a esse poder e também de exercê-lo. Jamais eles são o alvo inerte ou consentidor do poder, são sempre seus intermediários. Em outras palavras, o poder transita pelos indivíduos, não se aplica a eles. (FOUCAULT, 2005a, p. 35)

Pela ótica de Foucault (2005), o indivíduo é protagonista e fonte do poder. Influencia e é influenciado por ele. Nesse sentido, seria pertinente dizer que, ao alcançar determinada instância de poder, o indivíduo leva consigo seu discurso e também entra numa ordem de discurso institucionalizada.

Não se deve, acho eu, conceber o indivíduo como uma espécie de núcleo elementar, átomo primitivo, matéria múltipla e muda na qual viria aplicar- se, contra a qual viria bater o poder, que submeteria os indivíduos ou os quebrantaria. Na realidade, o que faz que um corpo, gestos, discursos, desejos sejam identificados e constituídos como indivíduos, é precisamente isso um dos efeitos primeiros do poder. Quer dizer, o indivíduo não é o vis- à-vis do poder; é, acho eu, um de seus efeitos primeiros. O indivíduo é um efeito do poder e é, ao mesmo tempo, na mesma medida em que é um efeito seu, seu intermediário: o poder transita pelo indivíduo que ele constituiu. (FOUCAULT, 2005a, p. 35)

Analisando essa troca, essa reciprocidade de influências - própria do exercício do poder –, cabe aqui fazer uma breve observação sobre as esquerdas e o poder. Será que o exercício do poder pressupõe, de pronto, uma mudança de postura, no caso, do gestor? Ao trafegar da oposição ao poder, o que muda no discurso do gestor? Mas, finalmente, o que é ‘ser esquerda’? Afinal, o PT é posicionado como um partido de esquerda?

Um dos trabalhos mais consistentes sobre essa questão é o livro de Norberto Bobbio, Direita e Esquerda: Razões e Significados de uma Distinção Política (2001). Bobbio traz na publicação um comentário importante, dando conta de que, para alguns, vale a idéia de que “direita e esquerda tornaram-se hoje, pura e simplesmente, ‘recipientes’ em que se depositou um conteúdo qualquer, e portanto não são conceitos, mas apenas palavras suscetíveis de assumir diversos significados conforme o caso.”(BOBBIO, 2001, p. 9). De acordo com

Bobbio, há uma tendência natural das pessoas ou grupos em se alinhar quando existem dois lados em luta. “O alinhar-se preenche a necessidade de identificação, a formação de um ‘nós’: nós de direita, vocês de esquerda, ou vice-versa.”(BOBBIO, 2001, p. 11). Mas, claro que a distinção entre direita e esquerda não é básica assim. Nem Bobbio pretende sê-lo. Por isso ele vai além: “Num universo conflitual como o da política, que exige continuamente a idéia do jogo das partes e do empenho para derrotar o adversário, a divisão do universo em dois hemisférios não é uma simplificação, mas uma fiel representação da realidade.” (BOBBIO, 2001, p. 11). Pressupõe-se, então, que há sim uma direita e uma esquerda no jogo político. Fica, dessa forma, duvidosa a tese que prega o fim das esquerdas.

‘Direita’ e ‘esquerda’ são termos antitéticos que há mais de dois séculos têm sido habitualmente empregados para designar o contraste entre as ideologias e entre os movimentos em que se divide o universo, eminentemente conflitual, do pensamento e das ações políticas.[...] São excludentes no sentido de que nenhuma doutrina ou nenhum movimento pode ser simultaneamente de direita e de esquerda.(BOBBIO, 2001, p. 49) Para Bobbio, quando se defende que é nebuloso fazer distinção entre direita e esquerda, há no bojo dessa afirmação a chamada “crise das ideologias”. Mas “as ideologias não deixaram de existir e estão, ao contrário, mais vivas do que nunca.”(BOBBIO, 2001, p. 51).

A árvore das ideologias está sempre verde. Além do mais, como já foi diversas vezes demonstrado, não há nada mais ideológico do que a afirmação de que as ideologias estão em crise.[...] ‘Esquerda’ e ‘direita’ indicam programas contrapostos com relação a diversos problemas cuja solução pertence habitualmente à ação política, contrastes não só de idéias, mas também de interesses e de valorizações a respeito da direção a ser seguida pela sociedade, contrastes que existem em toda sociedade e que não vejo como possam simplesmente desaparecer.(BOBBIO, 2001, p. 51).

Finalmente, Norberto Bobbio (2001) toca numa questão crucial para este trabalho, que é a crise do modelo soviético, que desencadeou todo o discurso de que a esquerda não existe mais. “Após a queda dos regimes comunistas, ouve-se aflorar com a mesma malícia a pergunta inversa: ‘Mas ainda existe a esquerda?’”(BOBBIO, 2001, p. 63). E o autor continua:

A crise do sistema soviético teria tido como conseqüência, neste caso, não o fim da esquerda, mas de uma esquerda historicamente bem delimitada no tempo. Desta constatação derivaria uma outra conseqüência sobre a qual o debate está mais do que nunca aberto: não existe uma única esquerda, mas muitas esquerdas, assim como, de resto, muitas direitas. (BOBBIO, 2001, p. 64)

Citando Dino Cofrancesco, Bobbio (2001) expõe a versão de uma diferenciação ideológica entre direita e esquerda: a de que “o homem de direita é aquele que se preocupa, acima de tudo, em salvaguardar a tradição; o homem de esquerda, ao contrário, é aquele que pretende, acima de qualquer outra coisa, libertar seus semelhantes das cadeias a eles impostas pelos privilégios de raça, casta, classe etc.”(COFRANCESCO apud BOBBIO, 2001, p. 97)(grifo do autor). Ainda referindo-se a Cofrancesco, Bobbio diz:

Segundo ele, se com a dessacralização do marxismo-leninismo50 terminou para sempre a leitura maniqueísta da oposição direita-esquerda, esta não resulta inteiramente destituída de sentido: ‘a libertação do homem do poder injusto e opressivo...permanece, pensando bem, o núcleo duro da esquerda como ‘categoria do político’ capaz de resistir a todo processo de desmitificação.’ De outra parte, também a direita ‘representa uma modalidade do humano’, na medida em que exprime o ‘enraizamento no solo da natureza e da história’, a ‘defesa do passado, da tradição, da herança’. (BOBBIO, 2001, p. 95)

E o discurso do PT, onde se situa nesse universo de teorias? O cientista político pernambucano e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Túlio Velho Barreto, acredita que nas primeiras campanhas do PT, nos anos 80, o discurso de fundação do Partido estava presente. “É o que chamo de primeira fase do PT. O discurso de Lula era marcadamente de esquerda, socialista, de romper com o FMI51, de Reforma Agrária, da liberdade sindical, pela revogação da Lei de Segurança Nacional, de um partido de massa, independente, sem patrões.”(VELHO BARRETO)(informação verbal)52. Para ele, os anos 90 identificam o início do segundo ciclo do PT.

Esse discurso do PT vai mudando ao longo dos anos 90 e a mudança se consolida com a eleição de 2002. Consolida essa mudança a partir da ascensão do Campo Majoritário e do estabelecimento de uma hegemonia que é conduzida por Lula, por Zé Dirceu. E Lula foi muito claro, entre a campanha de 1998 e 2002, ele colocou claramente: ‘Eu não disputo as eleições se não for para ganhar’. Quer dizer, isso implicava em mudanças significativas e essas mudanças foram conduzidas internamente. (VELHO BARRETO)

50

“O leninismo é a interpretação teórico-prática do marxismo, em clave revolucionária, elaborada por Lenin num e para um país atrasado industrialmente, como a Rússia, onde os camponeses representavam a enorme maioria da população. Baseada nesta realidade, havia surgido uma ideologia específica, o populismo, de cuja influência nem mesmo a ala da intelligentzia, que introduziu o marxismo na Rússia, conseguiu jamais libertar-se de todo.” (BOBBIO, 2004b, p. 679)

51

Fundo Monetário Internacional 52

Túlio Velho Barreto defende que em determinado momento o PT assume um discurso mais pragmático. “Há um discurso que quer dizer ‘vamos nos preparar pra disputar o poder, para ganhar o poder e para governar. E se o custo for perder o discurso original, se o custo for abrir mão do terreno de esquerda, vamos fazer’.”(VELHO BARRETO). Ele acrescenta que houve também a incorporação no PT de diversos setores que não estavam na fundação. “Você olha pra o PT hoje e ele é muito diferente do que era.”(VELHO BARRETO)

O cientista político também acredita que o discurso das esquerdas foi afetado pela derrocada do Socialismo Real. “Setores ligados ao Partido Comunista até romperam e, a partir de um determinado momento, foram para o PT. Foi uma questão de sobrevivência política, porque a crise da queda do Muro de Berlim, o fim da União Soviética deixaram as pessoas perdidas, sem orientação política.” (VELHO BARRETO)

Acho que esses fatos tiveram influência direta no sentido de balançar essa idéia do socialismo como um objetivo a ser alcançado, atingido. Considerando que estabeleceu uma crise de paradigmas, porque o pensamento da esquerda foi atingido. A formulação mesmo, que os intelectuais faziam sobre isso, entrou em crise se leva tempo pra reelaborar, pra refletir. Embora isso tenha influência mais a longo prazo e mais geral do que direto e a curto prazo no PT. Por quê? Porque o PT foi criado contra esse modelo. Então a queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética têm um impacto muito maior sobre a esquerda comunista do que sobre o PT, diretamente e a curto prazo. Claro que tem um efeito sobre a esquerda de um modo geral, porque desorienta a militância, desoriente os intelectuais, requer uma reelaboração, porque implodiu a esquerda comunista. Apesar de que havia uma contestação já sobre o regime da União Soviética, os trotskistas, por exemplo, combatiam completamente, dizendo que é um Estado degenerado, aquilo já não era um socialismo.(VELHO BARRETO)

De acordo com o pesquisador, uma mudança de postura é uma mudança de discurso também. “Esse é um caminho que o PT trilhou, que eu acho que é irreversível. Historicamente ele não tem um modelo para dizer assim ‘olhe, ali teve um partido de esquerda que teve uma trajetória de esquerda, socialista.’”(VELHO BARRETO). Ele avalia que o PT se acomodou, de certa forma, para alcançar o poder. “Aí chegou ao poder, aí perdeu aquele perfil. Se perder a eleição vai voltar a ser oposição e a ter um perfil mais combativo.” (VELHO BARRETO). Sobre a crise do Mensalão, ele avalia que “há uma disputa política em jogo. Eu acho que o PT não cometeu um pecado original. Ele não montou nada que não existisse anteriormente. A diferença é que a mídia abriu espaço para se estabelecer uma CPI e uma investigação sobre o que aconteceu no governo.” (VELHO BARRETO).

Sobre a posição de João Paulo em relação ao que se chama ‘governo de esquerda’, Túlio Velho Barreto relata que “João Paulo é oriundo do movimento católico, sindical, então, é diferente. Dizer do comportamento na gestão é muito difícil. Há é uma incorporação de preocupações sociais, mecanismos distintos de operar os recursos, o Orçamento Participativo, a agente tem de reconhecer que é diferente.”(VELHO BARRETO)

Para o filósofo e historiador social, Michel Zaidan, também professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a crise do comunismo no Mundo, motivada por eventos como a derrocada da União Soviética e a queda do Muro de Berlim, provocou fortes reflexos na esquerda mundial. “O Muro caiu em cima dos partidos de esquerda, sobretudo dos partidos comunistas-leninistas. Influenciou muito e acho que os partidos não conseguiram se levantar, no sentido de propor realmente uma alternativa.”(ZAIDAN)(informação verbal)53. Para exemplificar, Zaidan cita os partidos comunistas com atuação no Brasil. “Veja o PPS, se perdeu na história, não sabe nem para onde vai mais. Desfigurou-se. PCdoB nem se fala. O