• Nenhum resultado encontrado

19 Maria Wanderley e Sueli de Azevedo.

4. ESTUDO DE CASO: A FAVELA NOVA JAGUARÉ

5.1 A cidade partida

Os processos econômicos e sociais que ocorrem tanto na escala global como local nas últimas décadas têm elevado o grau de contradição e conflito no espaço urbano brasileiro. O fim do modelo desenvolvimentista e o conseqüente ajuste do capitalismo internacional a partir dos anos 1980 trouxeram o aprofundamento da desigualdade econômica e social da sociedade nacional com evidentes correlações com a produção do espaço urbano.

A manifestação destes novos processos na produção urbana se evidencia na expressiva ampliação dos contrastes da diferenciação do espaço urbano e nas novas formas de segregação espacial e ambiental. A segregação espacial se realiza com as longas distâncias que separam os bairros mais pobres do centro da cidade e dos setores mais ricos, geradores de emprego e com o confinamento de setores urbanos precários nos interstícios da cidade. A segregação ambiental se expressa pela exclusão de setores

5

. TRANSFORMANDO FAVELAS

separados por muros e tecnologias de segurança. Este fenômeno é percebido pela junção, em um mesmo setor de cidade, de favelas e espaços muitas vezes elitizados. O principal instrumento deste novo padrão de segregação espacial é o que a autora chama de "enclaves fortificados", trata-se de espaços privatizados, fechados e monitorados para residência, consumo, lazer e trabalho que não interagem com os espaços públicos da cidade.

Estes enclaves fortificados, tais como condomínios residenciais fechados, centros empresariais, shopping centers, fragmentam o espaço urbano através da criação de bolsões estanques, que não se relacionam com a cidade, interrompem a continuidade do tecido urbano e comprometem o princípio da acessibilidade e da livre circulação dos fluxos urbanos. A principal justificativa destes empreendimentos tem sido o medo do crime e da violência urbana.

Não vamos discutir a questão da violência urbana, suas razões, sua intensidade, se justificam estes novos instrumentos de segregação social ou se a questão da violência urbana, nestes casos, está sendo usada de maneira a vender novos produtos imobiliários que procuram novas localizações ou inserções na cidade. Interessa-nos apenas compreender que a segregação social e espacial e a fragmentação do tecido urbano podem ser reflexo e suporte de uma sociedade que produz e reproduz violência através dos processos de exclusão social

(MARICATO, 1996).

Jorge Mário JÁUREGUI (2004) aponta que esta cisão espacial e social determina um forte trauma urbano e que, como explica Freud, as questões traumáticas remetem a uma perda primordial do sujeito em relação ao campo do outro que se manifesta na forma de angústias e medos.

5.2 Conexões

Quando nos referimos aos setores informais da cidade, especialmente as favelas, observamos que estas talvez sejam a expressão mais evidente desta ruptura, que ocorre nas dimensões físicas, sociais e culturais.

Fica claro que, para que possamos viver em uma cidade mais justa, democrática e cidadã, estes enclaves têm que ser dissolvidos. Não advogamos aqui a existência de uma cidade homogênea, totalmente planificada, transparente, mas sim uma cidade diversa, que respeite a história e a formação de cada trecho do seu tecido, sua adequação ao tempo, ao relevo, às condições econômicas e sociais, que o espaço urbano seja acessível a todos e seja o local de encontro desta diversidade. Para tanto é fundamental integrar a cidade informal à formal, fazer ou refazer conexões partidas, criar pontos de contato, interpenetrações, dissolver limites, encurtar distâncias.

Outro ponto fundamental de reconciliação é a relação da cidade ao acesso a serviços urbanos, infra-estrutura

básica, transporte, educação, lazer, etc, assim como a exclusão às localizações adequadas para a urbanização, levando a ocupação de regiões ambientalmente frágeis, tais como beiras de córrego, suscetíveis a solapamentos e enchentes, e encostas íngremes, passíveis de escorregamentos.

A segregação ambiental é uma das formas de exclusão social, sendo talvez a sua forma mais concreta (MARICATO, 1996:55), e a ilegalidade em relação à propriedade da terra, tem sido o seu principal agente. A informalidade exclui a população dos seus direitos de cidadão, dos serviços urbanos, do mercado imobiliário e a expõe às políticas populistas e clientelistas.

Na produção do espaço urbano das grandes cidades fica evidente a divisão da cidade em duas: a cidade formal e informal. O setor formal definido como o centro, subcentros e os bairros legalmente constituídos e o setor informal, caracterizado por favelas e loteamentos clandestinos e irregulares desprovidos das mínimas qualidades urbanas.

A produção informal das cidades é uma característica marcante no terceiro mundo, em especial na América Latina. Em Lima 70% da cidade é formada por favelas, em Caracas 60% da urbanização é constituída de

1

assentamentos precários e informais , no Rio de Janeiro estima-se que 20% da população viva em favelas e em São

Paulo 10% da população é favelada, mas estima-se que 30% do total da cidade é irregular em relação à propriedade

2

da terra.

Nas grandes metrópoles como São Paulo os contrastes entre setores formais e informais ficam ainda mais evidentes, têm-se observado o crescimento de novas centralidades altamente qualificadas e organizadas pelas novas tecnologias em simultaneidade com um enorme incremento de setores excluídos dos mínimos serviços básicos urbanos.

Fica evidente a produção de uma cidade cindida e fragmentada com sérias conseqüências para o urbano como um todo. Descontinuidades, desconexão, fraturas e desequilíbrio ambiental. As ocupações irregulares nas regiões dos mananciais aqüíferos, que comprometem a qualidade do abastecimento de água da cidade, e a ocupação de encostas íngremes, que erodidas vão assorear os rios causando alagamentos nos pontos mais baixos da cidade, são apenas dois exemplos destes problemas.

Mas os desequilíbrios ambientais não são causados apenas pelas populações mais pobres. Tereza Pires CALDEIRA (2000) aponta que, no processo recente de urbanização de São Paulo, sobrepõem-se ao modelo de segregação espacial denominado centro-periferia, onde pobres vivem em periferias precárias distantes dos bairros centrais, um novo modelo espacial. Neste novo modelo diferentes grupos sociais estão muitas vezes próximos,

|62| Conforme CITIES ALLIANCE, Cities without slums, 2004.

|63| Conforme avaliação de MARICATO, 1996.

separados por muros e tecnologias de segurança. Este fenômeno é percebido pela junção, em um mesmo setor de cidade, de favelas e espaços muitas vezes elitizados. O principal instrumento deste novo padrão de segregação espacial é o que a autora chama de "enclaves fortificados", trata-se de espaços privatizados, fechados e monitorados para residência, consumo, lazer e trabalho que não interagem com os espaços públicos da cidade.

Estes enclaves fortificados, tais como condomínios residenciais fechados, centros empresariais, shopping centers, fragmentam o espaço urbano através da criação de bolsões estanques, que não se relacionam com a cidade, interrompem a continuidade do tecido urbano e comprometem o princípio da acessibilidade e da livre circulação dos fluxos urbanos. A principal justificativa destes empreendimentos tem sido o medo do crime e da violência urbana.

Não vamos discutir a questão da violência urbana, suas razões, sua intensidade, se justificam estes novos instrumentos de segregação social ou se a questão da violência urbana, nestes casos, está sendo usada de maneira a vender novos produtos imobiliários que procuram novas localizações ou inserções na cidade. Interessa-nos apenas compreender que a segregação social e espacial e a fragmentação do tecido urbano podem ser reflexo e suporte de uma sociedade que produz e reproduz violência através dos processos de exclusão social

(MARICATO, 1996).

Jorge Mário JÁUREGUI (2004) aponta que esta cisão espacial e social determina um forte trauma urbano e que, como explica Freud, as questões traumáticas remetem a uma perda primordial do sujeito em relação ao campo do outro que se manifesta na forma de angústias e medos.

5.2 Conexões

Quando nos referimos aos setores informais da cidade, especialmente as favelas, observamos que estas talvez sejam a expressão mais evidente desta ruptura, que ocorre nas dimensões físicas, sociais e culturais.

Fica claro que, para que possamos viver em uma cidade mais justa, democrática e cidadã, estes enclaves têm que ser dissolvidos. Não advogamos aqui a existência de uma cidade homogênea, totalmente planificada, transparente, mas sim uma cidade diversa, que respeite a história e a formação de cada trecho do seu tecido, sua adequação ao tempo, ao relevo, às condições econômicas e sociais, que o espaço urbano seja acessível a todos e seja o local de encontro desta diversidade. Para tanto é fundamental integrar a cidade informal à formal, fazer ou refazer conexões partidas, criar pontos de contato, interpenetrações, dissolver limites, encurtar distâncias.

Outro ponto fundamental de reconciliação é a relação da cidade ao acesso a serviços urbanos, infra-estrutura

básica, transporte, educação, lazer, etc, assim como a exclusão às localizações adequadas para a urbanização, levando a ocupação de regiões ambientalmente frágeis, tais como beiras de córrego, suscetíveis a solapamentos e enchentes, e encostas íngremes, passíveis de escorregamentos.

A segregação ambiental é uma das formas de exclusão social, sendo talvez a sua forma mais concreta (MARICATO, 1996:55), e a ilegalidade em relação à propriedade da terra, tem sido o seu principal agente. A informalidade exclui a população dos seus direitos de cidadão, dos serviços urbanos, do mercado imobiliário e a expõe às políticas populistas e clientelistas.

Na produção do espaço urbano das grandes cidades fica evidente a divisão da cidade em duas: a cidade formal e informal. O setor formal definido como o centro, subcentros e os bairros legalmente constituídos e o setor informal, caracterizado por favelas e loteamentos clandestinos e irregulares desprovidos das mínimas qualidades urbanas.

A produção informal das cidades é uma característica marcante no terceiro mundo, em especial na América Latina. Em Lima 70% da cidade é formada por favelas, em Caracas 60% da urbanização é constituída de

1

assentamentos precários e informais , no Rio de Janeiro estima-se que 20% da população viva em favelas e em São

Paulo 10% da população é favelada, mas estima-se que 30% do total da cidade é irregular em relação à propriedade

2

da terra.

Nas grandes metrópoles como São Paulo os contrastes entre setores formais e informais ficam ainda mais evidentes, têm-se observado o crescimento de novas centralidades altamente qualificadas e organizadas pelas novas tecnologias em simultaneidade com um enorme incremento de setores excluídos dos mínimos serviços básicos urbanos.

Fica evidente a produção de uma cidade cindida e fragmentada com sérias conseqüências para o urbano como um todo. Descontinuidades, desconexão, fraturas e desequilíbrio ambiental. As ocupações irregulares nas regiões dos mananciais aqüíferos, que comprometem a qualidade do abastecimento de água da cidade, e a ocupação de encostas íngremes, que erodidas vão assorear os rios causando alagamentos nos pontos mais baixos da cidade, são apenas dois exemplos destes problemas.

Mas os desequilíbrios ambientais não são causados apenas pelas populações mais pobres. Tereza Pires CALDEIRA (2000) aponta que, no processo recente de urbanização de São Paulo, sobrepõem-se ao modelo de segregação espacial denominado centro-periferia, onde pobres vivem em periferias precárias distantes dos bairros centrais, um novo modelo espacial. Neste novo modelo diferentes grupos sociais estão muitas vezes próximos,

|62| Conforme CITIES ALLIANCE, Cities without slums, 2004.

|63| Conforme avaliação de MARICATO, 1996.

sociais e econômicas.

Portanto entendemos ser fundamental conhecer a forma urbana do setor de cidade a se intervir e o ferramental técnico mais apropriado parece-nos ser aquele relacionado ao desenho urbano e ao desenho da paisagem. Será necessário também aprender com estas ocupações, sabendo reconhecer suas deficiências, seus conflitos e potencialidades para poder rever conceitos de urbanização e padrões de desenvolvimento urbano.