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CAPÍTULO I. Percursos teóricos da pesquisa: a Cinesiologia Humana

1.15 A Cinesiologia Humana no contexto da Educação Física Escolar no Brasil

1.15.2 Cinesiologia Humana na educação escolar e a parte conceitual

Nossa pretensão não é a de teorizar as aulas de Educação Física, mas a de possibilitar nelas a criação de significado, ao mesmo tempo que o professor proporciona o desenvolvimento do conhecimento conceitual e não apenas do procedimental e atitudinal. A utilização e inclusão da problematização dos temas e conteúdos podem ser realizados por meio de outras estratégias como em conversas, leitura e escrita de diversos tipos textuais, ampliando o conhecimento de mundo por parte dos alunos sobre o seu movimentar-se nas mais variadas situações do cotidiano. Para Soares (2003, p. 14):

[...] a leitura e escrita desenvolverão diversas habilidades como a capacidade de ler e escrever para atingir diferentes objetivos: para informar ou informar- se, para interagir com outros, para imergir no imaginário, no estético, para ampliar conhecimentos, para seduzir e induzir, para divertir-se, para orientar- se, para apoio à memória, para catarse [...]”

A reflexão e a contextualização podem ser realizadas durante as aulas e podem ser feitas através de inúmeras estratégias de ensino, como as discussões ou por meio

[...] da leitura e escrita de textos – verbal e não verbal – de diferentes gêneros textuais (notícias, de opinião, tabela, gráfico, propaganda, charge, etc.) e que contemplem ainda uma variedade de portadores textuais (faixa, cartaz, jornal, livro científico, revista em quadrinhos, vídeo etc.). (RIBEIRO; JORGE; SALGADO, 2003, p. 4)

O ato de ler e escrever nas aulas de Cinesiologia Humana pode ser ainda um momento prazeroso e interessante, cabendo ao professor dimensionar as aulas de modo a utilizar o melhor momento para trabalhar com essas estratégias e motivar os alunos:

[...] (1) o texto deve sempre fazer parte da realidade do aluno, para que ele se identifique com o mesmo, (2) é necessário focar / explicitar, refletir conceitos sobre o movimento humano que nele apareçam; (3) selecione o gênero textual mais adequado à faixa etária; (4) elabore questões que possibilitem aos alunos ir além da compreensão do texto [...] (op.cit., p. 3)

E quanto às atividades relacionadas a jogos, ginástica, esporte, danças: onde essas manifestações culturais têm vez nas aulas de Cinesiologia Humana? Para Mariz de Oliveira (1991, p. 9):

Vejo sim o lúdico como uma estratégia riquíssima para que qualquer professor, de qualquer componente curricular, coloque em prática em suas aulas. Através do lúdico vou ensinar geografia, matemática, física, português, etc. Repito, não considero o lúdico como algo inerente, próprio, específico da Educação Física.

Dessa forma, ao lecionar sobre botânica, o professor de biologia poderá aplicar um jogo para ensinar ou até mesmo avaliar esse conteúdo com os alunos, assim como também, o professor de matemática poderá utilizar o xadrez para aprimorar o raciocínio lógico, a resolução de problemas e a tomada de decisões dos estudantes; na história e geografia são utilizados os jogos de tabuleiro para que o professor possa ensinar noções de estratégias e lidar com as conquistas e derrotas. Reconhecemos, assim, a relevância da utilização dessas atividades enquanto estratégias lúdicas30 utilizadas nas relações de ensino-aprendizagem (Figura 21).

Figura 20: Esquema representativo da utilização do jogo e brincadeira como estratégia lúdica de desenvolvimento de conteúdos escolares.

Fonte: MARIZ DE OLIVEIRA (2010)

30 O conceito de lúdico acima empregado e que tem sido amplamente utilizado é elucidado por Luckesi (2005),

que esclarece que as atividades lúdicas, por serem atividades que conduzem a experiências plenas e, consequentemente, primordiais, possibilitam acesso aos sentimentos mais indiferenciados e profundos, o que por sua vez possibilita o contato com forças criativas e restauradoras muito profundas, que existem em nosso ser. A vivência dessas experiências, vagarosamente, possibilita a restauração das pontes entre as partes do corpo, assim como a restauração do equilíbrio entre os componentes psíquicos-corporais do nosso ser. Na atividade lúdica, o ser humano, criança, adolescente ou adulto, não pensa, nem age, nem sente; ele vivencia, ao mesmo tempo, sentir, pensar e agir. Na vivência de uma atividade lúdica, como temos definido, o ser humano torna-se pleno, o que implica o contato com e a posse das fontes restauradoras do equilíbrio. O autor ainda coloca que a ludicidade é um estado interno de experiência plena, no qual importa observar que as experiências divertidas podem ser lúdicas, como também não, assim como experiências não divertidas podem ser lúdicas.

As estratégias lúdicas que poderão fazer parte do arsenal do professor para o desenvolvimento das aulas devem ser previamente selecionadas para se evitar o que afirma Cortesão (2011, p. 55), de “relações de poder, sempre complexas que se estabelecem entre grupos dominantes e minoritários”, fato corriqueiro também nas aulas de Educação Física, nas quais se propõe a competição como elemento indispensável e primordial das aulas.

Para Manoel (2017), para além da ideia de estratégias, “o fazer” atividades físicas e esportivas característico nas aulas de educação física, isto é, o mover-se, tem uma relação direta com o conhecimento, pois

Ao fazer, o executante de uma prática corporal a que, portanto, não se distingui claramente do objeto a ser conhecido: o próprio fazer e quem o faz. [...] Buscamos destacar um conhecimento articulado ao fazer, ou ainda um conhecimento que se funda no fazer. (MANOEL, 2017, p. 17)

Assim, bem elaboradas e cuidadosamente preparadas, as atividades físicas devem ser desafiadoras e motivadoras, que estimulem as vivências, a experimentação e a fruição de diversas atividades motoras nos mais variados ambientes da escola e que respeitem a participação de todos com inclusão e na diversidade, permitindo, dessa forma, a aquisição do conhecimento acerca do seu movimentar-se. Lembremo-nos dessa forma, da menção antológica de Michael Polanyi (1965) a respeito dos conceitos complexos da cinemática da física no andar de bicicleta que são contra intuitivos e, dessa forma, o aprender a pedalar não implica dominar esses conceitos teóricos na prática para pedalar.

A partir do que acabamos de colocar, ao planejar o ensino, o professor de Cinesiologia Humana deve: (1) estimar quantas aulas vai utilizar para cada assunto relacionado com os blocos temáticos, assim como deve (2) estabelecer os objetivos, (3) definir os conhecimentos que serão socializados contemplando as dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais a serem atingidas ao final de um número pré-estabelecido de aulas, e (4) selecionar as estratégias teóricas e práticas e também a verificação desse processo por meio de ferramentas de avaliação da aprendizagem.