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Clivadas foco contrastivo – sujeito e objeto

No documento Percursos em teoria da gramática (páginas 109-113)

Segundo Quarezemin (2009), a estratégia clivada sobressai significativamente à estratégia in situ nos casos de focalização contrastiva do sujeito e do objeto em PB. Os experimentos realizados pela autora mostram que os falantes do PB preferem destacar sintaticamente o constituinte focalizado a deixá-lo in situ na sentença. Esse resultado é esperado pela abordagem cartográfica que defende que um elemento com uma função discursiva específica deve estar em uma posição sintática correspondente à sua função. E as sentenças clivadas de um modo geral, clivada plena, invertida, reduzida, truncada e pseudoclivada, reservam uma posição sintática específica para o foco, seja o sujeito ou o objeto.

No que se refere às clivadas que veiculam foco contrastivo, assumimos a análise de movimento A’ do foco (KISS, 1998; MIOTO; NEGRÃO, 2007; BELLETTI, 2008a, 2008c). A cópula na clivada seleciona um CP reduzido, sem Force. Como no caso das clivadas sujeito FI, o complementizador das clivadas que envolvem contraste/exaustividade não é gerado diretamente em Foc, mas origina-se em Fin. No caso específico da pseudoclivada contrastiva, a cópula seleciona uma SC.

A clivada com sujeito FC pode ser plena, como em (15); invertida, como em (16); reduzida, como em (17); e truncada, como em (18).

(15) a. Foi A MARIA que comprou o jornal (não a Ana).

b. [TP pro[T Foi [vP <ser> [FocP A MARIAi [Foc que+F [FinP <que+F> [TP comprou ti o jornal ]]]]]]]

Nessa representação, o sujeito foco está na periferia esquerda da sentença encaixada. O complementizador vem da numeração marcado pelo traço [+F] e, por isso, sai de Fin e vai para Foc. Assim, o critério foco é satisfeito por meio da configuração Spec-núcleo.

(16) a. A MARIA foi que comprou o jornal (não a Ana).

b. [FocP A MARIAi [Foc foi+F [TP pro[T <ser+F> [vP <ser+F> [FinP que [TP comprou ti o jornal]]]]]]]

Na clivada invertida (16a), o foco alcança a periferia esquerda da sentença matriz. Esse tipo de sentença mostra que o complementizador não pode ser originado diretamente em Foc. Se assim fosse, não haveria espaço para a cópula entre os dois. A cópula também é a realização de morfema foco em PB e, em algumas sentenças, é ela, e não o complementizador, que ocupa Foc.

(17) a. Foi A MARIA.

b. [TP [T Foi [vP <ser> [FocP A Mariai [Foc [FinP que [TP comprou ti o jornal ]]]]]]

Na clivada reduzida em (17a), apenas a cópula e o foco são pronunciados. Toda a sentença encaixada é apagada. Nas clivadas reduzidas, o complementizador não sai de Fin; o critério foco é satisfeito por meio da relação de c-comando local entre a cópula e o sujeito focalizado (RIZZI; SHLONSKY, 2007).

(18) a. A MARIA que comprou o jornal (não a Ana).

b. [TP Foi [vP <ser> [FocP A Mariai [Foc que+F [FinP <que+F> [TP comprou ti o jornal]]]]]]

Na derivação de uma clivada truncada, como (18a), a cópula seleciona um CP (=FocP), mas depois ela é apagada. Não há nenhum problema com o apagamento da cópula porque ela está em posição inicial. (18a) não é derivada de uma clivada invertida, como (16a). Na clivada truncada, o foco está na posição FocP na periferia esquerda da sentença subordinada, não da sentença matriz como ocorre na clivada invertida.

Outro tipo de sentença clivada muito usada em contexto de contraste/correção sobre o sujeito é a pseudoclivada. Nessa sentença, a cópula seleciona uma SC com sujeito foco e o predicado é o complemento relativo. A representação da pseudoclivada é dividida em duas partes. Na primeira, ocorre o movimento do sujeito focalizado para FocP na periferia esquerda da sentença, e, em seguida, o movimento da relativa complemento para TopP abaixo de Foc, como em (19b). Na segunda parte

da derivação, TopP complemento de Foc sofre movimento remanescente (KAYNE, 1994) para TopP acima de FocP, como em (19c).

(19) a. Quem comprou o jornal foi A MARIA (não a Ana).

b. [TopP [FocP A MARIAi [Foc +F [TopP [CPrel Quem comprou o jornal]j [TP foi [vP <ser> [SC ti tj ]]]]]]]

c. [TopP [CPrel Quem comprou o jornal]j [TP foi[vP <ser> [SC ti tj ]k [FocP A MARIAi [Foc +F [TopP TopPk ]]]]]]

Na pseudoclivada, a cópula seleciona uma SC. Quando o foco é de informação, ele ocupa Spec FocP na periferia da cópula. No caso do sujeito foco contrastivo, ele ocupa Spec FocP na periferia esquerda da sentença matriz. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário o movimento remanescente de algum tipo; caso contrário, a ordem da sentença [relativa-cópula-foco] não é obtida. Dessa forma, propomos que o complemento relativo vai para Spec TopP abaixo de FocP; como TopP também é uma posição criterial e a relativa é a informação pressuposta da sentença, ela é congelada ali. Em seguida, todo o TopP sofre movimento remanescente para a posição acima de FocP. Nenhum princípio é desrespeitado nessa derivação. Fica por explicar por que na pseudoclivada objeto esse constituinte figura como o sujeito da SC, mas não deve ser alçado para uma posição de nominativo.

As clivadas objeto empregadas como estratégia de focalização contrastiva são de dois tipos geralmente: clivada plena e pseudoclivada. A focalização do objeto não apresenta as particularidades existentes na focalização do sujeito, próprio da assimetria entre esses dois constituintes. As línguas, de um modo geral, focalizam o objeto da mesma forma. No caso das clivadas, o objeto ocupa uma posição foco na periferia esquerda da sentença encaixada. A clivada plena objeto, diferentemente da clivada plena sujeito, apenas é empregada em contexto de contraste/correção. Não é usada para responder uma interrogativa-Wh. A representação de uma clivada objeto é como em (20).

(20) a. Foi O JORNAL que a Maria comprou (não o livro).

b. [TP pro[T Foi [vP <ser> [FocP O JORNALi [Foc que+F [FinP <que+F> [TP A Maria comprou ti ]]]]]]]

Observamos que a focalização ocorre na periferia da sentença introduzida pelo complementizador e que o CP encaixado é reduzido, sem a categoria Force. Nenhum efeito de Minimalidade Relativizada ocorre na sentença porque o objeto sai da sua posição argumental e vai para uma posição A’. Dessa forma, não há problema no fato de o objeto passar pelo sujeito em Spec TP.

A cópula na pseudoclivada objeto FC seleciona uma SC, assim como ocorre com a pseudoclivada sujeito FC. A derivação é exatamente a mesma da pseudoclivada com sujeito FC, só que o elemento que ocupa Spec FocP é o objeto.

(21) a. O que a Maria comprou foi O JORNAL (não o livro).

b. [TopP [FocP O JORNALi [Foc +F [TopP [CPrel O que a Maria comprou]j [TP foi[vP <ser> [SC ti tj ]]]]]]]

c. [TopP [CPrel O que a Maria comprou]j [TP foi[vP <ser> [SC ti tj ]k [FocP O JORNALi [Foc +F [TopP TopPk ]]]]]]

A derivação de (21a) também é dividida em duas partes: primeiro ocorre o deslocamento do objeto para Spec FocP acima de TP e o movimento do CP relativo para Spec TopP abaixo do foco (21b); em seguida, todo TopP baixo sofre movimento remanescente para a posição inicial da sentença, gerando a ordem [relativa-cópula-foco], como em (21c).

A análise das sentenças clivadas mostra que a assimetria sujeito-objeto deve ser levada em consideração quando está em jogo a focalização de constituintes. Uma análise que propõe que o sujeito FI figura em uma posição no domínio CP não pode ser mantida, uma vez que o objeto FI não alcança essa mesma posição nessa língua. Essa proposta pode ser mantida nas línguas em que tanto o sujeito FI quanto o objeto FI figuram no domínio CP, como o siciliano e o húngaro (CRUSCHINA, 2004; BELLETTI, 2008a). A assimetria sujeito-objeto

presente na focalização desses constituintes não permite um tratamento unificado para as clivadas e pseudoclivadas. Propomos uma análise para elas mesmas em virtude de aparecerem significativamente como uma estratégia de focalizar tanto o sujeito quanto o objeto em PB. Esse resultado mostra que os falantes preferem destacar sintaticamente os constituintes, colocando-os em uma posição específica conforme as suas propriedades sintáticas e semânticas.

No documento Percursos em teoria da gramática (páginas 109-113)