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Organograma 1 – Estrutura da Lei de Lavagem de Dinheiro

4. ANÁLISE DE MEDIDAS DE TRATAMENTO ADMINISTRATIVO E

4.2 MEDIDAS DE ENFRENTAMENTO PROCESSUAL À LAVAGEM DE

4.2.1 Colaboração premiada

O instituto da colaboração premiada foi introduzido em nosso ordenamento jurídico a partir da promulgação da Lei dos Crimes Hediondos (Lei n.º 8.072/90), a qual trouxe, em seu art. 7º, a possibilidade de redução da pena de um a dois terços aos crimes de extorsão mediante sequestro, praticados por quadrilha ou bando, caso o coautor colaborasse com a autoridade, auxiliando na libertação do sequestrado.322 Do mesmo modo, o art. 8º da mencionada legislação trouxe a oportunidade de redução da pena de um a dois terços aos participantes e associados que denunciassem à autoridade o bando ou quadrilha.

Posteriormente, a Lei de Lavagem de Dinheiro, em seu art. 1º, §5º, estabeleceu a possibilidade de redução da pena de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe da empreitada delitiva colaborasse espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração

322 A partir desse dispositivo se acrescentou o parágrafo 4º ao art. 159, do Código Penal, que contém a seguinte

redação: Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a

das infrações penais, à identificação dos autos, coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos e valores objeto do crime.

Ocorre que, em momento algum, o legislador se preocupou em estabelecer regras procedimentais para o acordo de colaboração, nem mesmo definiu quem seria a autoridade competente para tanto ou o momento em que poderia ser realizado. Em face disso, a nova Lei de Organizações Criminosas (Lei n.º 12.850/2013) trouxe uma sistematização mais completa sobre o tema, que se aplica de forma análoga aos crimes de lavagem de dinheiro.323 E um dos fatores determinantes para isso, reside no fato de que tal legislação é mais benéfica se comparada com as outras que também tratam sobre a colaboração premiada, oferecendo as possibilidades do perdão judicial, da redução da pena de um a dois terços, além da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.324

Conceitualmente, a colaboração premiada ou “delação premiada” pode ser definida como um instrumento destinado a facilitar a obtenção de provas do concurso de pessoas em fato criminoso, próprio ou alheio, e da materialidade de delitos, servindo também para localização do proveito ou do produto de crime ou para a preservação da integridade física de vítimas de certos delitos, detendo, ainda, a finalidade de prevenir a prática de condutas penalmente ilícitas.325 Renato Brasileiro Lima acrescenta que a colaboração premiada pode ser caracterizada como uma técnica de investigação por meio da qual o coautor ou partícipe fornece aos órgãos responsáveis pela persecução penal elementos eficazes para a consecução de um dos objetivos previstos em lei, contando, é claro, com sua confissão. Em contrapartida, recebe um prêmio por sua colaboração.326

Um importante destaque que merece ser feito, é que a colaboração premiada não se trata de um meio de prova, mas, sim, de um meio de obtenção de prova.327 Ou seja: tal acordo

323 BARROS, Marco Antônio. Lavagem de Capitais: crimes, investigação, procedimento penal e medidas

preventivas. 5ª Ed. Curitiba: Juruá, 2017, p. 94.

324 BITENCOURT, Cezar Roberto; BUSATO, Paulo César. Comentários à Lei de Organização Criminosa Lei nº 12.850/2013. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 122.

325 ARAS, Vladimir. Técnicas Especiais de Investigação. In: DE CARLI, Carla (Org.) Lavagem de Dinheiro: Prevenção e Controle Penal. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011, p. 530.

326 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 4ª ed. Salvador: JusPODIVM, 2016,

p. 520.

327 Nesse sentido, Antônio Magalhães leciona que os meios de prova referem-se a uma atividade endoprocessual

que se desenvolve perante o juiz, com o conhecimento e participação das partes, visando a introdução e fixação de dados probatórios no processo. Os meios de pesquisa ou investigação dizem respeito a certos procedimentos (em geral, extraprocessuais) regulados pela lei, com o objetivo de conseguir provas materiais, e que podem ser realizados por outros funcionários (policiais, por exemplo). Com base nisso, o Código de Processo Penal italiano de 1988 disciplinou, em títulos diferentes, os ‘mezzi di prova’ (testemunhos, perícias, documentos), que se caracterizam por oferecer ao juiz resultados probatórios diretamente utilizáveis na decisão, e os ‘mezzi di

destina-se à aquisição de coisas materiais ou declarações dotadas de capacidade probatória, os quais podem ser inseridos no processo, não se confundindo, portanto, com os depoimentos prestados pelo agente colaborador durante a persecução penal. Sobre essa questão, Gustavo Henrique Bardaró explica que:

Enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática (p. ex., o depoimento de uma testemunha, ou o teor de uma escritura pública), os meios de obtenção de prova (p. ex., uma busca e apreensão) são instrumento para a colheita de elementos ou fontes de provas, estes sim, aptos a convencer o julgador (p. ex., um extrato bancário [documento] encontrado em uma busca e apreensão domiciliar). Ou seja, enquanto o meio de prova se presta ao convencimento direto do julgador, os meios de obtenção de provas somente indiretamente, e dependendo do resultado de sua realização poderão servir à reconstrução da história dos fatos.328

O Supremo Tribunal Federal, há muito tempo, aliás, assentou o entendimento de que a delação, de forma isolada, não respalda condenação329 e de que a chamada de corréus, retratada ou não em juízo, não pode servir como fundamento exclusivo da condenação, mas apenas como elemento ancilar da decisão330. Mais recentemente, a Ministra Cármen Lúcia voltou a ressaltar que a colaboração de corréu não pode servir como base decisiva para a condenação331.

A partir desses elementos, podemos afirmar que a colaboração premiada é uma via de mão dupla. De um lado, quem colaborou fará jus a benefícios na aplicação de sua pena ou até mesmo ao perdão judicial. Por outro, o Estado e o Ministério Público terão informações essenciais para a obtenção de provas relacionadas aos delitos de lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Em face das características negociais desse acordo, Fredie Didier Júnior e Daniela Bonfim o classificam como um negócio jurídico bilateral, pois envolve duas partes que

ricerca dela prova’ (inspeções, buscas e apreensões, interceptações de conversas telefônicas etc.), que não são por si fontes de conhecimento, mas servem para adquirir coisas materiais, traços ou declarações dotadas de força probatória, e que também podem ter como destinatários a polícia judiciária ou o Ministério público.

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Notas sobre a terminologia da prova – reflexos no processo penal

brasileiro. In: Estudos em homenagem à professora Ada Pellegrini Grinover. Org.: Flávio Luiz Yarshell e

Maurício Zanoide de Moraes. São Paulo: DSJ, 2005, p. 303-318.

328 BARDARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. Rio de Janeiro. Campus: Elsevier, 2012, p. 270.

329 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 75.226/MS, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco

Aurélio, DJ 19.09.1997.

330 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 90.708/BA, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda,

DJ 13.04.2007.

331

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Penal 465/DF, Tribunal Pleno, Rel. Ministra Cármen Lúcia, DJe 30.10.2014.

declaram a vontade de participar do acordo.332 O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, firmou o entendimento de que a colaboração premiada é um negócio jurídico processual333, haja vista que, além de ser qualificada pela lei como “meio de obtenção de prova”, seu objeto é a cooperação do imputado para a investigação e para o processo criminal, atividade de natureza processual, ainda que se agregue a esse negócio jurídico o efeito substancial (de direito material) concernente à sanção premial a ser atribuída a essa colaboração.334

De qualquer forma, para que seja considerado um negócio jurídico processual, é necessário o preenchimento dos pressupostos de existência, validade e eficácia335, elementos esses que constituem um negócio jurídico no plano comum. E aqui um ponto que se destaca – dentre tantos outros que as delimitações do presente trabalho não permitem abordar de forma minuciosa – é a notável posição de desigualdade das partes na persecução penal, na medida em que o Ministério Público, responsável pela acusação, detém maiores poderes do que aqueles que realizam a defesa (advogado ou Defensor Público).

Essa desigualdade, efetivamente, causa um desiquilíbrio, tornando perigosamente vulnerável a legitimidade do negócio firmado, especialmente nos casos em que o colaborador se encontra segregado preventivamente, ou quando já sentenciada a condenação. Nesse sentido, Aury Lopes Júnior336 destaca as prisões cautelares vêm sendo comumente utilizadas como um meio de constrangimento situacional para obtenção de confissões ou delações premiadas, situação essa que remonta uma releitura do modelo medieval, em que se prendia

332 Os autores afirmam que a colaboração premiada prevista na Lei n. 12.850.2013 é (i) ato jurídico em sentido

lato, já́ que a exteriorização de vontade das partes é elemento cerne nuclear do seu suporte fático; (ii) é negócio jurídico, pois a vontade atua também no âmbito da eficácia do ato, mediante a escolha, dentro dos limites do sistema, das categorias eficaciais e seu conteúdo; (iii) é negócio jurídico bilateral, pois formado pela exteriorização de vontade de duas partes, e de natureza mista (material e processual), haja vista que as consequências jurídicas irradiadas são de natureza processual e penal material; (iv) é contrato, considerando a contraposição dos interesses envolvidos. DIDIER JR., Fredie; BONFIM, Daniela. Colaboração premiada (Lei n. 12.850/2013): natureza jurídica e controle da validade por demanda autônoma – um diálogo com o Direito Processual Civil. Civil Procedure Review, v.7, n.2, mai./ago.2016, p.165.

333

Otávio Luiz Rodrigues Júnior explica que é possível definir “negócio-jurídico processual” como uma

declaração de vontade, unilateral ou bilateral, dirigida ao fim específico da produção de efeitos no âmbito do processo, de que é exemplo, no processo civil, a transação em juízo. RODRIGUEZ JÚNIOR, Otávio Luiz.

Estudo dogmático da forma dos atos processuais e espécies. Revista Jurídica, nº 321, ano 52. Porto Alegre: Notadez, julho/2004, p. 53.

334 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 127.483/PR, Tribunal Pleno, Rel. Ministro Dias

Toffoli, DJe 04.02.2016.

335 De acordo com Antônio Junqueira de Azevedo, o exame do negócio jurídico deve ser feito em três planos

sucessivos: i) da existência, ou seja, a forma, o objeto, as circunstâncias negociais, os agentes, o lugar e o tempo negócio; ii) da validade, pela análise de seus requisitos legais, a fim de se verificar se o negócio existente é válido ou inválido (subdividido em nulo ou anulável); e iii) da eficácia, pela análise de seus fatores, a fim de se verificar se o negócio existente e válido é eficaz ou ineficaz em sentido estrito. AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio Jurídico: existência, validade e eficácia. 4ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 23-64.

para torturar, com a tortura se obtinha a confissão, e, posteriormente, usava-se a confissão como a rainha das provas. Gustavo Henrique Bardaró inclusive questiona se a condição de preso é compatível com a voluntariedade exigida pela lei, concluindo que ambas as expressões são antônimas e inconciliáveis entre si:

Voluntário advém do latim voluntarius,a,um, significando “que age por vontade própria”. Um agir voluntário é, portanto, um ato que se pode optar por praticar ou não. É atributo de quem age apenas segundo sua vontade. Ou, definindo negativamente: voluntário é o agir que não é forçado. Por outro lado, que prisão é coação, é o que diz a própria Constituição, assegurando o habeas corpus para quem sofre “coação em sua liberdade de locomoção”, de modo ilegal. 337

Sob essa perspectiva, não há como negar que a prisão cautelar exerce uma pressão determinante para que o partícipe na empreitada delitiva firme o acordo de colaboração premiada. Tal percepção, com efeito, parece ser clara aos órgãos de persecução, conforme registrado no parecer do Ministério Público Federal, nos autos do Habeas Corpus n.º 5029050-46.2014.404.0000 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), exarado pelo Procurador da República, Dr. Manoel Pestana, no qual o agente ministerial ressaltou que a manutenção da segregação cautelar dos pacientes se mostrava necessária, pois poderia influenciá-los na vontade de colaborar na apuração de responsabilidade, o que tem se mostrado bastante fértil nos últimos tempos.338

No que concerne ao aspecto procedimental, a Lei n.º 12.850/2013 estabelece que o acordo de colaboração premiada poderá ser requerido pelas partes a qualquer tempo: na fase investigativa (art. 4º, §§ 2º a 4º), podendo implicar discricionariedade regrada na propositura de ação penal; na fase judicial (art. 4º, caput); e quando da execução da pena (art. 4º, §5º), em que há menção do acordo após sentença condenatória.339

As negociações para formalização do acordo ocorrerão apenas entre o Delegado de Polícia, o investigado e seu defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor (art. 4º, §6º). Nesse caso, a atuação do magistrado se limitará à homologação ou não do acordo (art.

337 BADARÓ, Gustavo. Quem está preso pode delatar? Ainda sobre a delação premiada e o requisito de

voluntariedade. JOTA. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/quem-esta-preso-pode- delatar-23062015>. Publicado em 26.06.2015, às 08h58min. Acesso em 20.09.2018, às 18h30min.

338 ROCHA, Jorge Bheron. A Importância de Moro e da Lava-jato para a Democracia e para as Garantias

do Processo Penal no Brasil. Carta Capital. Disponível em:

<http://justificando.cartacapital.com.br/2016/09/28/importancia-de-moro-e-da-lava-jato-para democracia-e-para- as-garantias-do-processo-penal-no-brasil/>. Publicado em 28.09.016. Acesso em 20.09.2018, às 15h08min.

339

SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas. Aspectos penais e processuais da Lei 12.850/2013. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 53 ss.

4º, §§ e 7º), o qual deverá verificar a sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo, para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor. Aqui é necessário destacar que a homologação judicial serve como garantia da estabilidade do acordo de colaboração premiada, pois assegura, uma vez cumpridas as obrigações assumidas pelas partes, que as situações resultantes não possam ser modificadas, levando à formação de coisa julgada material, consequência jurídica que, como visto, integra o conteúdo do direito à segurança jurídica.340

Os benefícios elencados pela Lei n.º 12.850/2013341, podem ser aplicados, em maior ou menor proporção, para a persecução penal, a depender da obtenção de um ou mais dos seguintes resultados:

a) Identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;

b) revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

c) prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

d) A recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

e) a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. Sabendo que não é fácil investigar crimes que são imputados a ditas organizações, o legislador previu a possibilidade de aplicar “sanção premial” a quem, sendo coautor do delito, colaborar efetivamente para as investigações ou para o processo penal, com a previsão de leque mais amplo que outros diplomas legais que trataram do tema, tal como a Lei 9.807/1999, que cuida do programa de proteção a vítimas e testemunhas. 342

Embora latente a preocupação do legislador em determinar um rol de benefícios possíveis a serem concedidos, o que vem se observando é um total descumprimento de tais disposições, em face da homologação de acordos que extrapolam os limites impostos pela lei. Dentre os acordos de colaboração premiada firmados no decorrer da “Operação Lava Jato”, Thiago Bottino aponta que foram concedidos diversos benefícios não previstos pela Lei n.º 12.850/2013, dentre eles os seguintes:

340 DIDIER JR., Fredie; BONFIM, Daniela. Colaboração premiada (Lei n. 12.850/2013): natureza jurídica e

controle da validade por demanda autônoma – um diálogo com o Direito Processual Civil. Civil Procedure

Review, v.7, n.2, mai./ago.2016, p. 165.

341 Destacam-se os seguintes benefícios: (i) perdão judicial; (ii) redução em até 2/3 (dois terços) da pena

privativa de liberdade ou (iii) substituí-la por restritiva de direitos; (iv) possibilidade de o Ministério Público deixar de oferecer denúncia se colaborador não for líder da organização criminosa ou, ainda, se for o primeiro a prestar efetiva colaboração; e (v) o direito de cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados.

342 ALENCAR, Rosmar Antonni Rodrigues Cavalcanti de. Estrutura normativa dos meios para obtenção de

elementos de informação e os limites à investigação do crime organizado. Revista dos Tribunais, vol. 8, nov/dez, 2014, p. 255.

a) A substituição da prisão cautelar pela prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica;

b) a limitação do tempo de prisão cautelar comum (prisão preventiva), independentemente da efetividade da colaboração, em 30 (trinta) dias, contados da celebração do acordo;

c) fixação do tempo máximo de cumprimento da pena privativa de liberdade, independentemente das penas cominadas em sentença, em 2 (dois) anos, a ser cumprida em regime semiaberto;

d) cumprimento do restante da pena, qualquer que seja seu montante, em regime aberto;

e) fixação do tempo máximo de cumprimento de pena privativa de liberdade, independente das penas cominadas em sentença, em no mínimo 3 (três) e no máximo 5 (cinco) anos, a ser cumprida em regime fechado, com progressão automática para o regime aberto, mesmo que não estejam presentes os requisitos legais;

f) a permissão de utilização, pelas filhas do colaborador, de bens que são, declaradamente, produto de crime, durante o tempo em que ele estiver preso em regime fechado;

g) a liberação de quatro imóveis e um terreno, que seriam destinados ao juízo a título de multa compensatória, caso os valores recuperados com o auxílio do colaborador superem em 50 vezes o valor dos imóveis;

h) a liberação de um imóvel em favor da ex-mulher do colaborador e de outro imóvel em favor das filhas do colaborador, sem que esteja claro se tais imóveis são oriundos de crime ou não.343

Por óbvio, tal questão divide a doutrina. De um lado, uma parcela defende que o rol prêmios e benefícios previstos pela Lei das Organizações Criminosas é meramente exemplificativo, não havendo qualquer restrição legal para aplicação de outras benesses. Aderindo a este entendimento, Andrey Borges de Mendonça344 afirma que ser possível que sejam ofertados e aplicados benefícios não elencados em lei, desde que não haja vedação expressa ao benefício concedido. Já outra parte da doutrina adota a concepção de que a colaboração premiada deve obedecer aos critérios estabelecidos em lei, em atenção do princípio da legalidade. Nesse sentido, Vinícius Gomes de Vasconcellos345 ressalta que a colaboração premiada trata-se de uma “oportunidade regrada”, cujos limites impostos servem como um controle objetivo dos acordos firmados.

Com efeito, nos parece que essa expansão dos espaços negociais que extrapolam os limites legais traz certa insegurança jurídica aos acordos firmado, em face da imprevisibilidade das cláusulas que serão futuramente firmadas nos acordos. Além do mais, é

343 BOTTINO, Thiago. Colaboração premiada e incentivos à cooperação no processo penal: uma análise crítica

dos acordos firmados na “Operação Lava Jato”. RBCCRIM, vol. 122, ago. 2016, p. 18.

344 MENDONÇA, Andrey Borges de. A colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado. Custus

Legis – Revista Eletrônica do Ministério Público Federal, v. 04, 2013.

345

VASCONCELLOS, Vinícius Gomes de. Colaboração Premiada no Processo Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017.

inaceitável a ideia de que familiares de um colaborador sejam agraciados com imóveis sem que nem mesmo aclarada a necessidade de comprovação da licitude dos bens.