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Outro ponto se refere à colocação da estrutura partidària, especialmente na República Velha, com o status de elite, juntamente com as posições oficiais no

No documento Revolução de 30: seminário internacional (páginas 102-105)

governo, no Poder Legislativo, no Poder Judiciàrio. Ora, sabidamente, na República Velha, no periodo mais importante e afirmativo do coronelismo, não havia independência do partido em face do governo. Partido e governo, comumente, eram a mesma coisa. O governador do estado escolhia os membros da comissão executiva; os membros da comissão executiva, por indicação do

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Seminário Internacional

governador do Estado, escolhiam o sucessor do mesmo; e assim por diante. Então, na verdade, não eram duas elites. Havia uma duplicação de posições na mesma elite. Era tudo farinha do mesmo saco. Portanto, não era uma posição que conduzia à outra. As posições eram mais ou menos as mesmas.

OutTO aspecto para0 qual eu pediria atenção é o da mencionada continuidade entre 1 930 e

1 937. Sou mais velho do que quase todos os presentes. Lembro-me

bem de que, na justicativa do Estado Novo, em

1 937,

Francisco Campos classificou a Revolução de

1 932

como anti-3D. Era uma contra-revolução, porque contrária a Getúlio. E a Constituição de

34,

ou o regime de 34, que nascera da Revolução de 32 - a Constituinte só foi convocada em conseqüência da Revolução de

32, como forma de conciliar os desavindos dessa revolução - era considerilda

uma continuação de

32,

ponanto, uma contra-revolução . Glaramente, Francisco Campos dizia, em outras palavras: Trinta e dois e

34

são a contra-revolução. POITanto,

37

é a

continuação

de 30. A revolução retoma o seu caminho.

Isso me parece ter sido muito mais uma justificativa do que uma análise do grande advogado e politico que foi Francisco Campos - que nestas horas fazia menos ciência do que politica. Ele era um ideólogo do poder. Ninguém neste pais acreditou mais no poder do que ele. A única experiência politica de Francisco Campos fora do poder foi quando se candidatou a deputado federal com cédula avulsa, como então se permitia, e foi derrotado, derrotado no estado natal. Cenamente, não poderia ter, da democracia representativa, uma experiência

favorável. Chegou a desempenhar funções parlamentares com grande brilho, porque era uma das mais lúcidas inteligências que este pais já produziu e tinha cultura excepcional. Mas, no esquema da República Velha, ele era fruto ,da "politica dos governadores", vinha na chapa do governo estadual. Depois, com a Revolução de 30, chegou a ministro de Estado, porque Minas fez a revolução e era ele uma das figuras mais eminentes desse estado. Mas nunca disputou posição eletiva por conta própria, salvo naquela malfadada experiência. No entanto, quando tinha o poder na mão, e porque sÓ acreditava no poder, Francisco Campos achava que podia fazer milagres. E a este respeito, quanto a

1937, alguma coisa

talvez possa ser explicada em termos de personalidades. Trinta e sete, na Constituição, é uma coisa; na prática getuliana, outra coisa completamente diferente. Basta ver que a Constituição de 37 previa um plebiscito para legitimar o novo regime, e Getúlio nunca se preocupou em conVOCar esse plebiscito. Q.uando da emergência da guerra, um dos proveitos que Getúlio tiTOU da situação foi suspender, em agosto de

1942, em virtude da declaração do estado de guerra, um

anigo da Constituição "quanto ao curso do prazo", Pasmem os senhores; esse anigo, que ficou suspenso quanto ao curso do prazo é o que fixava em seis anos o perlodo presidencial. Assim, o curso ficava suspenso pela emergência da guerra, e os mesmos seis anos continuariam a ser contados a panir do final da guerra!

Getúlio tinha uma visão pessoal, até personalista, do poder, o que talvez se explica"e, naturalmente, pela sua formação castilhista - influência que passaria de

A Revolução de 30 105 Júlio de Castilhos para Borges de Medeiros. A esse respeito, Getúlio era um gaúcho autêntico cioso da continuidade do poder. Mesmo o prazo de seis anos, previsto na Constituição de 37, foi Getúlio - segundo depoimento que recolhi certa vez de Carlos Medeiros Silva - quem recomendou a Chico Campos, pois este havia proposto quatro ou cinco. Getúlio tinha uma noção tão pessoal, e de ceno modo comodista, do governo que, quando Chico Campos lhe trouxe a exposição que haveria de ler no rádio para justificar o golpe de estado de 1 937, o presidente folheou-a por alto e disse: "Está um pouco grande". Campos respondeu: "Presidente, isso se faz uma vez na vida". Getúlio retrucou: "Mesmo assim, está um pouco grande" .

Ponanto, é preciso compreender 37, em grande pane, no recorte getuliano,já que ele era, incontestavelmente, o chefe polltico da nação. Se pudesse prolongar o seu periodo presidencial por mais tempo, depois que terminou a guerra, ele o teria feito. E assim o tentou. Tentou com o Uqueremis'mo"; tentou com o movimento "Constituinte com Getúlio" etc. Não o conseguiu por circunstâncias diversas.

Por tudo isso, não me parece muito correto, em tennos científicos,. explicar lodos os acontecimentos políticos em função de um enquadramento rigorosamente sociológico. A este respeito, tenho posição já externada mais de uma vez. Cenas explicações, em plano puramente social e econômico, são mais compreensíveis nos grandes lapsos da história, quando os acontecimentos menores, tudo aquilo que poderiamos chamar de micropolltica fica esmaecido, perde sentido diretivo e só aparecem as cordilheiras dos acontecimentos históricos. Mas, quando se vai estudar um periodo de dois, três ou quatro anos - o que só pode ser feito ao nivel da micropolitica -, as considerações de ordem sociológica são sem dúvida importantes. Sem elas, não se compreende o contexto econômico nem o social, que são fatores ou limitações da ação politica. Mas a ação política, em si, nesses perlodos mais reduzidos, tem muito mai� autonomia do que à primeira vista se supõe, quando se cuidada in/luência desses fatores gerais sobre a atuação concreta dos homens públicos. Se assim não o fosse, os homens públicos não difeririam tanto na sua biografia, a história não revelaria tanta disparidade entre as grandes figuras politicas. Todos estariam procedendo mais ou menos, dentro dos mesmos padrões, que seriam comandados pelo detenninismo social.

No documento Revolução de 30: seminário internacional (páginas 102-105)

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