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Comentários sobre a fundamentação teórica e os resultados

Neste subitem discute-se a força e capacidade da perspectiva social de redes, com a base teórica apresentada e os resultados das análises.

Nos estudos sobre redes aparecem basicamente três paradigmas, o social, o racional, o econômico. O presente estudo afirma que o paradigma social pode ser capaz de explicar fenômenos complexos encontrados em redes de economia solidária e de negócios, no qual as relações sociais criam as condições da governança relacional e essa, por sua vez, norteia os processos da rede e o comportamento das pessoas.

A teoria de base da governança selecionada no trabalho advém de modelos que incorporam a incerteza ambiental e comportamental, criando sistemas de regras de controle e de incentivos. Realizada a revisão bibliográfica, concluiu-se que são raros os modelos que integram as incertezas com a governança, embora existam muitas afirmativas a respeito.

Na análise interorganizacional, alguns poucos exemplos confirmaram as afirmativas teóricas. Na rede da qual a ASSCAVAG faz parte, por exemplo, havia a tarefa de contratar um professor e a associação acordou com a empresa apoiadora do projeto para contratar um professor familiarizado com a história de catadores. Na rede de que o Shopping Popular faz parte, o exemplo foi o de se discutir um acordo entre a Associação do Shopping Popular com a prefeitura sobre o espaço que foi construído o Shopping. Os casos citados retratam afirmativas de que a governança em relações interorganizacionais necessita de ajustes que ultrapassam contratos formais (GRANOVETTER, 1985; POPPO e ZENGER, 2002; UZZI, 1997).

Quando se considera a análise intraorganizacional das duas redes, as respostas encontradas confirmam as afirmativas de Granovetter (1985) com os conceitos de imersão, que colocam os fatores econômicos e tecnológicos influenciados e imersos em relações sociais tendo em vista os atores da rede colocarem as relações sociais como principal caminho para a resolução dos problemas, para desenvolver as ações em prol do grupo. Ou seja, os mecanismos de coordenação e de controle das redes foram construídos a partir das relações sociais, como de confiança, desenvolvidas nas redes pesquisadas.

O modelo de governança (Figura 1), adaptado do modelo de Jones e colaboradores (1997), apresenta a governança relacional a partir dos encontros dos atores, buscando seus problemas coletivos. Essa governança nasce na dinâmica do grupo. Com essa origem social e com a função de resolver os problemas que surgem no grupo, a governança torna-se a ponte entre os processos, resultados, custos e outras racionalidades da rede; com a dinâmica social e a teia social de relações.

As análises intraorganizacionais das redes, as quais a ASSCAVAG e o Shopping Popular integram, confirmam o modelo de Jones et. al. (1997), tendo em vista os sinais de governança relacional nascerem de acordos dentro do grupo, buscando defesas contra os efeitos das incertezas ambientais e exercendo um grau de controle nessas incertezas do comportamento dos atores. Além disso, o fato de os associados da ASSCAVAG estarem em constante convívio, tendo a possibilidade de criar e fortalecer as relações, quando se compara com os encontros ocasionais entre atores de organizações da rede, é mais um fator que sustenta o modelo, especialmente na parte que se afirma o surgimento da governança relacional a partir de encontros regulares.

O entendimento de Grandori (2006), seguido neste estudo, que afirma que a governança relacional pode ser considerada uma solução viável em condições de incertezas, foi em sua maior parte confirmado nas redes intraorganizacionais, tendo em vista o comportamento dos atores serem norteados por um controle social e o conjunto de regras terem sido criadas socialmente.

A análise indicou que a afirmativa de Grandori (2006) sobre a necessidade de complemento em contratos formais, nem sempre se sustenta. O acordo entre a ASSCAVAG e o Instituto Gama não dá margem a ajustes. Ou se segue a regra, ou não se obtém o auxílio. Uma interpretação possível é que as afirmativas de Grandori

(2006) advêm de pesquisas sobre negócios: entretanto, quando se trata de ações sociais com o governo participando, talvez a formalização seja mais inflexível.

No que diz respeito à interface ente a governança relacional e as incertezas, importa citar Koka, Madhavan e Prescott (2006) que também escreveram sobre essa correspondência afirmando que os efeitos ambientais exercem influência nas mudanças das redes. Essa afirmativa foi sustentada somente pelas respostas encontradas nas redes intraorganizacionais.

O resultado indicou que na rede de material reciclável, cuja organização foco foi a ASSCAVAG, a conclusão é de que se pode estabelecer uma relação entre governança relacional e as incertezas ambientais e comportamentais a partir da análise intraorganizacional, já que os mecanismos de governança relacional estão resolvendo a maioria dos problemas surgidos no grupo. A mesma conclusão é afirmada para o caso da rede de negócios, cuja organização foco foi o Shopping Popular, a partir da análise intraorganizacional. Entretanto, nas duas análises interorganizacionais, os mecanismos formais e as regras de mercado predominaram, com pouca margem para arranjos entre as partes, não dando respaldo para se estabelecer a relação entre governança relacional e as incertezas ambientais e comportamentais.

Ao final do trabalho, após ficar evidenciada a diferença entre análise inter e intraorganizacional, realizou-se nova busca bibliográfica e não se encontraram artigos que discutiram essa diferença. O que se encontrou foram alguns autores que dividiram o estudo da governança em interorganizacional ou macrogovernança e intraorganizacional ou microgovernança, como é o caso de Provan e Kenis (2007) e Albers (2005). Conforme entendimento de Albers (2005), a governança em redes interorganizacionais pode ser caracterizada como coordenação interna das redes, ou estudo dos elementos internos da rede. E também alguns autores, como Lazega, Jourda, Mounier e Stofer (2008) que afirmaram a existência de uma similaridade na análise de relações internas de uma organização com a análise de relações externas ente as organizações, ou seja, a análise entre os indivíduos de uma organização é igual a uma análise entre as organizações. Essa linha de pensamento difere da resposta encontrada no trabalho.