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No dia 02 de maio de 2001, a Mesa da Câmara apresentou o projeto de resolução n° 151, que criava a Comissão de Legislação Participativa (CLP), a qual seria de caráter permanente. A proposta assinada pelo então presidente da Casa, o deputado Aécio Neves, tem sua justificativa baseada - conforme exposição do congressista encontrada no “Diário da

Câmara” de 05/05/200156

- em romper com o “descompasso” entre “as preocupações mais

prementes do cidadão” e o que é discutido no Congresso. Pela leitura das transcrições da

votação dessa proposta conclui-se que a criação desta Comissão constava no programa de campanha do deputado quando das eleições para a presidência da Casa. O congressista Fernando Coruja, do PDT/SC, assim expõe: “Estava no seu programa de ação: concordávamos com isso. Votamos, é claro, no Deputado Aloizio Mercadante, mas concordávamos com esse item de seu programa. É fundamental que V. Ex.ª esteja cumprindo

esse aspecto do seu plano de campanha”57

, conforme consta no periódico oficial da Câmara. Interessante notar o caráter incremental, porém, não inovador que a CLP apresenta, segundo o próprio deputado. A Comissão surge em um contexto de abertura da Câmara para a sociedade. Como argumenta o então deputado Aécio Neves, a existência da TV e da Rádio Câmara, inauguradas em 1998 e 1999, respectivamente, já representaram um grande avanço na busca por aproximar representantes de seus representados. Entretanto, o parlamentar salienta que a CLP é ainda mais importante, uma vez que possibilita ao cidadão participação

57 Diário da Câmara dos Deputados de 31/05/2001, p. 18577. Disponível em:

direta no processo legislativo, indo além da “comunicação unilateral” que os outros dois

canais viabilizam.

Reforçando as afirmações do então presidente da Casa, tem-se o fato de no mesmo ano, em 2001, também ter sido criada a Ouvidoria, como se comprova pela consulta da resolução que a instaurou. Ademais dessa inovação, a instauração da Comissão tem como objetivo eliminar barreiras que dificultavam a utilização do mecanismo da iniciativa popular, estabelecendo requisitos mais simples para que a população participe do processo legislativo. Como afirma Aécio Neves58:

O projeto complementa com perfeição o instrumento constitucional da iniciativa popular, sobretudo, ao retirar as muitas barreiras que tornaram este último um mecanismo de difícil acesso à população. As exigências de subscrição de no mínimo um por cento da população nacional, distribuído por, pelo menos, cinco Estados, para que a iniciativa popular possa ser exercida no âmbito da Câmara, praticamente inviabilizaram este instrumento de participação popular no processo legislativo.

Entretanto, o deputado aponta o fato de que um instrumento como esse não é novidade, seja no Brasil ou mesmo no mundo. De acordo com ele, ao menos por três vezes o parlamento brasileiro já teve as chamadas Comissões de Petições, criadas com esse mesmo objetivo. Além disso, cita a Comissão de Petições do Parlamento Europeu como exemplo de

“versão moderna” desse canal de participação.59

A tramitação do projeto de resolução que instituía a CLP se desenvolveu de forma bastante acelerada, em especial quando se considera os padrões dos lapsos temporais do processo legislativo brasileiro. Desde sua proposição até sua aprovação foram apenas 29 dias. Após quinze dias da apresentação do projeto, os líderes, autores da proposição, solicitaram urgência para a deliberação, o que foi aprovado rapidamente. Em seguida, neste mesmo dia, após a manifestação favorável dos deputados, o projeto de resolução foi votado.60

A votação da proposta que criou a CLP não alcançou unanimidade. Apesar de não ser possível contabilizar quantos e quem se posicionou a favor ou contra, uma vez que a votação foi simbólica, dentre as manifestações orais, transcritas no “Diário da Câmara”61, encontra-se como voz dissonante o posicionamento do deputado Gerson Peres, do PPB/PA. Em meio às

58 Diário da Câmara dos Deputados de 05/05/2001, p.18533. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD05MAI2001.pdf#page=66>. Acesso em: 28 abr. 2014.

59

Câmara dos Deputados. Diário da Câmara dos Deputados, 31/05/2001, p.25570. Disponível em: <http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD31MAI2001.pdf#page=334>. Acesso em: 28 abr. 2014.

60 Tramitação PRC 151/2001. Disponível em:

<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=28321>. Acesso em: 28 abr. 2014.

61 Câmara dos Deputados. Diário da Câmara dos Deputados, 31/05/2001, p.25571. Disponível em:

manifestações de pleno apoio à instituição da Comissão, o congressista coloca em dúvida a constitucionalidade do projeto.

A fundamentação para tal afirmação reside, segundo ele, no fato de ser o Brasil uma democracia representativa, e o cenário naquele momento, ainda sem a existência da CLP, já ser bastante adverso aos representantes eleitos, uma vez que sofrem com a concorrência do

Poder Executivo, que “...legisla 70%, 80% sobre a competência privativa dos Deputados.”

Diante dessa realidade, Gerson conclui que a CLP enfraquecerá ainda mais a atividade dos congressistas eleitos, dado que receberão muitos projetos, os quais assumirão preponderância na apreciação por conta da pressão popular, fazendo com que as propostas dos parlamentares

tenham “importância secundária”. Portanto, o deputado pediu para que o projeto de resolução

fosse retirado da pauta para ser melhor analisado, apontando que a votação estava se dando às pressas, sem o parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação. De acordo com Gerson:

[...] retire de pauta esse projeto, a fim de avaliarmos com mais responsabilidade e não transformemos esta Casa num reservatório de iniciativas populares aqui formalizadas. [...] Vamos ter problemas muito sérios, inclusive entre nós, ao ver na pauta dos trabalhos iniciativa de meia dúzia de pessoas, interessadas em determinadas situações, em detrimento dos originários de parlamentares e investigados pelas Comissões Técnicas.62

Como se pode perceber, a manifestação desse deputado segue a mesma linha daqueles que se manifestaram contra a inclusão da iniciativa popular na CF durante a Assembleia Constituinte, como se viu no início deste capítulo.

O autor da proposição, o deputado Aécio Neves, rebateu as críticas. Além de destacar que o deputado Mendes Ribeiro Filho, do PMDB/RS, analisou a proposta e concluiu pela sua constitucionalidade, juridicidade e boa técnica legislativa, esclareceu também que a CLP não é um atalho:

[...] as Comissões Permanentes - a ideia é essa - funcionariam, como no Parlamento Europeu, de forma extremamente positiva, como comissão de triagem, feita por parlamentares, que enviariam as matérias que recebessem parecer favorável à tramitação normal, adequada, inclusive na maioria das vezes acoplada a projetos de Parlamentares.63

62 Câmara dos Deputados. Diário da Câmara dos Deputados, 31/05/2001, p.25571. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD31MAI2001.pdf#page=334>. Acesso em: 29 abr. 2014.

63 Câmara dos Deputados. Diário da Câmara dos Deputados, 31/05/2001, p. 25569. Disponível em:

E, realmente, é assim que se configura a CLP. Após a aprovação do projeto, a agora então resolução 21/2001 incluiu no Regimento Interno da Câmara a existência de mais uma Comissão permanente. Ao lado da Iniciativa Popular de lei, das petições, das representações, e da audiência pública, o envio de sugestões pelos cidadãos passa a ser parte do Título VII do

RICD, “Da participação da sociedade civil”.

Nesse conjunto normativo, as atribuições da CLP vêm assim disciplinadas:

Art. 254. A participação da sociedade civil poderá, ainda, ser exercida mediante o oferecimento de sugestões de iniciativa legislativa, de pareceres técnicos, de exposições e propostas oriundas de entidades científicas e culturais e de qualquer das entidades mencionadas na alínea a do inciso XII do art. 32.

§ 1º As sugestões de iniciativa legislativa que, observado o disposto no inciso I do artigo 253, receberem parecer favorável da Comissão de Legislação Participativa serão transformadas em proposição legislativa de sua iniciativa, que será encaminhada à Mesa para tramitação.

§ 2º As sugestões que receberem parecer contrário da Comissão de Legislação Participativa serão encaminhadas ao arquivo.

§ 3º Aplicam-se à apreciação das sugestões pela Comissão de Legislação Participativa, no que couber, as disposições regimentais relativas ao trâmite dos projetos de lei nas Comissões.

§ 4º As demais formas de participação recebidas pela Comissão de Legislação Participativa serão encaminhadas à Mesa para distribuição à Comissão ou Comissões competentes para o exame do respectivo mérito, ou à Ouvidoria, conforme o caso.64

No mesmo ano da criação, mais especificamente em 12/09/2001, foi aprovado um conjunto de normas para regular os trabalhos, o que foi denominado Regulamento Interno da CLP65. Este já foi alterado por duas vezes, nomeadamente pelas Resoluções Internas n° 01 de 2004, e n° 01 de 2008. Assim, desde o seu início a Comissão de Legislação Participativa já tinha seu funcionamento organizado por regras, o que gera maior segurança na relação que será estabelecida com os legitimados a apresentarem sugestões. Os proponentes destas ficam cientes de quais eram os seus deveres, as obrigações dos parlamentares para com eles, além de estarem cientes das normas que conduziriam a tramitação da sugestão, desde a iniciativa até a decisão de sua aprovação ou arquivamento.

Atualmente, conforme seu Regulamento Interno (RICLP), a CLP tem como arcabouço as seguintes regras:

1 Legitimidade para propor: 1 - associações, 2 - órgãos de classe, 3 - sindicatos, 4 - entidades organizadas da sociedade civil, exceto Partidos Políticos.

64

BRASIL. Câmara dos Deputados. Regimento Interno, Resolução n°17 de 1989.

Não são aceitas sugestões cujos autores sejam órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta, excetuados aqueles com participação paritária da sociedade civil; e organismos internacionais (art. 3° do RICLP).

2 Requisitos para apresentar a sugestão: 1 - apresentar o registro dos atos constitutivos da entidade no competente cartório, ou em órgão do Ministério do Trabalho, 2 - documento legal que comprove a composição da diretoria efetiva e dos responsáveis, judicial e extrajudicialmente, pela entidade, à época da sugestão, 3 - ata da reunião em que se deliberou sobre a sugestão de iniciativa legislativa, pareceres técnicos, exposições e apresentações de propostas, nos termos de seu estatuto (art. 2° do RICLP).

3 Formas de apresentação: 1 - papel impresso, datilografado ou manuscrito, 2 - disquete, CD, 3 - sistema de correspondência postal, 4 - correspondência eletrônica, ou por meio de fac-símile (art. 2°, § 2° do RICLP).

4 Tipos de sugestão: 1 - proposta de emenda à Constituição, 2 - projeto de lei complementar, 3 - projeto de lei ordinária, 4 - projeto de decreto legislativo, 5 - projeto de resolução, 6 - projeto de consolidação, 7 - requerimento solicitando a realização de audiência pública, 8 - requerimento solicitando depoimento de autoridade ou cidadão que possa contribuir para os trabalhos da Comissão, 9 - requerimento de informação a Ministro de Estado, devidamente fundamentado, 10 - requerimento de convocação, devidamente fundamentado, das autoridades mencionadas no art. 50 da Constituição Federal, 11 - requerimento de criação de Comissão Parlamentar de Inquérito, devidamente fundamentado, 12 - indicação sugerindo aos Poderes Executivo ou Judiciário a adoção de providência, a realização de ato administrativo ou de gestão, ou o envio de projeto sobre matéria de sua iniciativa exclusiva, 13 - emenda às proposições, 14 - emenda ao projeto de lei do plano plurianual, será denominada Sugestão, 15- emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias, 16 - emenda ao parecer preliminar do projeto de lei orçamentária anual, 18 - emenda ao projeto de lei orçamentária anual (art. 4° RICLP).

Após se verificar o cumprimento dos requisitos formais, a sugestão então será distribuída pelo Presidente da Comissão para ser analisada por esta. Importante destacar que o regulamento estipula em dez sessões o prazo para a Comissão apresentar seu parecer. Concluindo pela admissibilidade, a sugestão passa a tramitar como sendo de autoria da Comissão, e tramitará como um PL comum.

A CLP promoverá e observará, quando couber, a adequação formal da sugestão para assegurar-lhe as mínimas condições de redação e técnica que a habilitem a tramitar. Caso haja

matéria análoga ou conexa à sugestão já em análise na Casa, esta será distribuída por dependência, determinando-se seu apensamento.

Outro ponto muito relevante é que a Comissão deverá informar as entidades proponentes da sugestão a data e o horário em que sua proposta será discutida, bem como a conclusão do parecer do Relator. O presidente da Comissão poderá conceder a palavra ao representante legal da entidade ou procurador especificamente designado, pelo prazo de cinco minutos, prorrogável uma única vez por igual período. Além disso, a Comissão manterá as entidades informadas acerca da tramitação de sua sugestão.

2. A COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E A DE LEGISLAÇÃO