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Como a 1ª divisão do futebol pode fazer você ganhar um milhão matemático?

No documento Os mistérios dos números (páginas 163-166)

No meio do campeonato, seu time está oscilando na metade inferior da tabela de classificação, e você quer saber se ainda há alguma possibilidade matemática de ganhar o título. De maneira intrigante, a matemática por trás da tentativa de responder a essa pergunta está diretamente ligada ao problema de US$ 1 milhão deste capítulo.

Para descobrir se é matematicamente possível, você começa por assumir que o seu time vai vencer todos os jogos restantes, ganhando três pontos por jogo. O problema aparece quando você começa a encarar como distribuir todos os outros pontos pela tabela. É preciso que os times que estão acima do seu percam jogos suficientes para que seu time passe na frente. Mas você não pode fazer todo mundo que está em cima perder, porque esses times jogarão entre si. Isso significa que você precisa achar algum modo de distribuir esses pontos entre os resultados restantes, esperando que uma das combinações leve seu time ao topo da tabela. Decerto há um jeito mais inteligente de verificar se existe essa combinação vencedora.

O que você está procurando é um truque esperto como o de Euler para desenhar mapas sem ter de percorrer todos os cenários possíveis.

Infelizmente, até o momento não sabemos se esse truque existe. O milhão de dólares está aí para a primeira pessoa que descobri-lo ou que provar que o problema tem uma complexidade essencial, tornando a busca exaustiva a única maneira de resolvê-lo.

Curiosamente, antes de 1981 havia um programa eficiente que se podia usar no meio da temporada para verificar se seu time ainda tinha chance de ganhar a Premier League — a 1ª divisão do Campeonato Inglês. Antes de 1981, o time ganhava apenas dois pontos por vitória, e esses dois pontos eram divididos, caso a partida terminasse empatada. Matematicamente isso

era significativo, porque queria dizer que o número total de pontos jogados em cada temporada era fixo. Por exemplo, numa liga com vinte times, como a Premier League, cada time fazia 38 jogos (em casa e fora, contra os dezenove outros times da liga). Assim, havia 20 × 38 jogos, só que contamos cada jogo duas vezes. Os jogos do Arsenal contra o Manchester United, por exemplo, são os mesmos que os do Manchester United contra o Arsenal. Então temos 10 × 38 = 380 jogos no total. O sistema de pontos pré-1981 significava que o número total de pontos jogados no fim do campeonato seria 2 × 380 = 760 pontos, divididos entre vinte times. Essa era a chave para o programa eficiente usado para conferir, no meio do campeonato, se seu time ainda tinha chance de ser campeão.

Tudo mudou matematicamente em 1981. Com três pontos por vitória e apenas dois pontos (um para cada time) por empate, não se podia saber com antecedência qual o total de pontos disputados até o fim da temporada. Se todo jogo fosse empate, o total seria novamente 760. Mas se não houvesse nenhum empate, o número total seria de 1.140 pontos, e foi essa variação que contribuiu para que o problema da Premier League ficasse tão difícil de solucionar.

Há muitas versões diferentes do problema da Premier League e que você pode abordar se não for fã de futebol. O caso clássico é chamado de problema do caixeiro-viajante. Um exemplo é o seguinte desafio: você é um vendedor que precisa visitar onze clientes, cada um numa cidade diferente.

As cidades são ligadas por estradas, como mostra o mapa da Figura 3.17 — mas você só tem combustível para uma viagem de 238 quilômetros:

FIGURA 3.17: Um exemplo do problema do caixeiro-viajante. Você consegue achar um trajeto de 238 quilômetros que visite todos os pontos do mapa e volte ao ponto de origem?

A distância entre as cidades é dada pelo número na estrada que as liga.

Você consegue achar um trajeto que permita visitar todos os onze clientes e retornar para casa sem faltar combustível? (A solução está no fim do capítulo.) Nessa versão do problema, o milhão de dólares está em oferta para um algoritmo genérico ou programa de computador que produza o menor trajeto para qualquer mapa que alimentar o programa e que seja significativamente mais rápido que fazer o computador realizar uma busca exaustiva. O número de trajetos possíveis cresce exponencialmente à medida que se aumenta o número de cidades, de modo que a busca exaustiva em pouco tempo se torna praticamente impossível. Ou será que você pode provar que esse programa não é possível?

A sensação geral entre os matemáticos é que problemas desse tipo têm uma complexidade inerente, e isso significa que não há modo inteligente de encontrar a solução. Gosto de chamá-los de problemas do tipo “agulha no palheiro”, porque há um vasto número de soluções possíveis. E você está tentando achar uma em particular. O nome técnico para eles é problemas NP-completos.

Uma das características básicas desses quebra-cabeças é que uma vez encontrada a agulha, é fácil verificar que ela faz o serviço. Por exemplo, você sabe imediatamente, assim que encontra um trajeto no mapa que tenha menos de 238 quilômetros. De maneira similar, se você achar a combinação certa de resultados para o resto do campeonato de futebol, fica sabendo imediatamente se ainda é matematicamente possível seu time ser campeão.

Um problema-P é aquele em que existe um programa eficiente para achar a solução. A questão de US$ 1 milhão pode ser formulada assim: será que problemas NP-completos são na verdade problemas-P? Os matemáticos se referem a isso como NP vs. P.

Há outra propriedade curiosa ligando todos esses problemas NP-completos. Se você acha um programa eficiente que funciona para um problema, isso quer dizer que haverá um programa desses para todos os outros problemas. Por exemplo, se você achar um programa inteligente que lhe diga qual o menor trajeto do caixeiro-viajante, ele será transformado num programa eficiente para verificar se seu time pode ganhar o título. Para dar um exemplo de como isso funciona, eis mais duas “agulhas no palheiro”, ou problemas NP-completos, que parecem muito diferentes.

No documento Os mistérios dos números (páginas 163-166)