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das políticas no domínio das

defi ciências e incapacidades

A pertinência de se adoptar a Classifi cação Internacional de Funciona- lidade, Incapacidade e Saúde (Who, 2001) como um quadro operacional

para o desenvolvimento de uma Estratégia Nacional para as Defi ciên- cias e Incapacidades pode ser sustentada por um leque diversifi cado de perspectivas. Este capítulo proporciona uma breve análise destas pers- pectivas, do ponto de vista dos decisores políticos, das pessoas com de- fi ciências e incapacidades e da população em geral. A abordagem adop- tada consiste, em primeiro lugar, na exploração da visão mais adequada, tendo em vista uma sociedade inclusiva, e na análise das perspectivas da CIF face a estes critérios.

No centro da discussão sobre defi ciências e incapacidades está a ques- tão do “eles” e “nós”. Este é um assunto que se coloca sobretudo a partir de modelos de defi ciências e incapacidades que criam demarcações entre pessoas com e sem incapacidades. Se se avaliar tanto o modelo médico como o modelo social, a partir desta perspectiva, torna-se aparente que ambas as abordagens requerem a divisão da população em grupos de pes- soas com e sem incapacidades. No entanto, se se tiver uma visão ampla das defi ciências e incapacidades, não é difícil concluir que a maioria das pessoas na sociedade irá experimentar incapacidades em algum momen- to da sua vida. É também evidente que muitas pessoas estão actualmen- te, a qualquer momento, em vias de adquirirem uma determinada inca- pacidade. Assim, o argumento a favor da caracterização das defi ciências e incapacidades como uma dinâmica contínua, em vez de um conjunto de estados discretos e estáveis, é extremamente forte.

Muitos argumentos têm sido esgrimidos contra a adopção de um mo- delo de interacção dinâmica das defi ciências e incapacidades, no quadro das políticas que as regulamentam, mas a maioria levanta questões de viabilidade e exequibilidade, ou resulta de perspectivas e posições insti- tucionalizadas de vários interesses em campo. Um dos principais facto- res na inibição da adopção da abordagem à implementação e desenvolvi- mento desta política, reside no facto dos mecanismos de administração, fi nanciamento e regulação serem previstos por um modelo dicotómico da defi ciência. Isto ocorre, em parte, por ser essencial deslocar os escas- sos recursos no sector das defi ciências para os que deles mais necessitam e, por outro lado, porque é útil para os responsáveis pelo funcionamento do sistema, tais como políticos, gestores, prestadores de serviços e agên- cias de regulação.

para a resolução deste dilema tentaram basear os critérios de elegibilida- de na noção de que a defi ciência é um estado ou condição relativamente estável e permanente. No entanto, as conclusões retiradas após análise destas defi nições de defi ciências e incapacidades, supostamente objec- tivas, indicam diferenças entre Estados-membros ou jurisdições, e dife- renças na defi nição de defi ciências e incapacidades dentro das mesmas jurisdições, dependendo da intenção do instrumento legal em relação aos recursos e objectivos. Por exemplo, a elegibilidade para pagamento de reformas e pensões a longo prazo, por questões de defi ciências e inca- pacidades, tende a ser muito mais rigorosa do que a elegibilidade para o acesso a programas de reabilitação ou inclusão social. Ambos diferem frequentemente na defi nição usada no âmbito da legislação anti-discri- minação. De facto, parece claro que as autoridades competentes acei- taram implicitamente que as defi ciências e incapacidades existem num continuum, de ligeiras a severas, e isto refl ecte-se no estabelecimento de critérios sociopolíticos para a elegibilidade das pessoas no âmbito dos di- versos programas e fi nanciamentos.

Quando a ligação existente entre a questão da elegibilidade e o signifi - cado de defi ciências e incapacidades for cortada, restarão muito poucos argumentos a favor da adopção de um modelo dicotómico das defi ciên- cias e incapacidades como uma base para a criação e implementação de políticas. Mais, quando se decidir aceitar o facto de que as defi ciências e incapacidades ocorrem num continuum dinâmico, existirá apenas um quadro coerente capaz de identifi car e caracterizar este fenómeno de um ponto de vista prático e político: a CIF.

A CIF oferece uma descrição híbrida e útil de defi ciências e incapaci- dades que pode ser usada por decisores políticos, investigadores, pessoas com defi ciências e incapacidades, prestadores e gestores, para chegarem a um entendimento comum do signifi cado de defi ciências e incapacida- des e que responde a muitas das críticas, quer do modelo médico, quer do modelo social. Proporciona ainda um referencial abrangente para opera- cionalizar essa descrição.

Nas palavras de Rachel Hurst (2001), uma britânica que é activista in- ternacional das defi ciências e incapacidades e que participou no desen- volvimento da CIF:

“A CIF, se usada adequadamente, suporta o modelo dos direitos relativo às defi ciências e incapacidades e irá ajudar-nos a colher as provas que mostram como a nossa vida realmente é. Também afi rma ofi cialmente que a incapacidade decorre do impacto que os factores ambientais têm na defi ciência e funcionalidade”.

A CIF pode ser usada para desenvolver uma matriz de indicadores mensuráveis de desenvolvimento sustentável e uma sociedade baseada na celebração da diferença, assegurando direitos para todos, e uma socie- dade onde os direitos das pessoas com defi ciências e incapacidades são sustentados e a dignidade humana respeitada. Uma sociedade que pode ser apoiada pela CIF. Então porque não trabalhar nesse sentido?

A CIF é uma classifi cação que permite a descrição abrangente e deta- lhada da experiência de defi ciência e incapacidade, incluindo as barreiras e facilitadores ambientais que têm impacto na funcionalidade de uma pessoa. O reconhecimento do papel central que os factores ambientais desempenham mudou o locus do problema e, assim, o foco de intervenção do indivíduo para o ambiente em que este vive.

As defi ciências e as incapacidades já não são mais entendidas como uma funcionalidade do indivíduo, mas antes como o resultado de uma interacção das características de uma pessoa com os factores ambientais. A adopção do modelo interactivo e dos impactos dos factores ambientais em todos os aspectos da saúde e funcionalidade constitui um passo em frente (Schneidert et al., 2003).

O uso apropriado dos factores ambientais dentro da CIF assegurará políticas, sistemas e serviços ajustados, proporcionando indicadores men- suráveis do estado da saúde e do desenvolvimento humano, e sustentará o reconhecimento de que as defi ciências e incapacidades constituem uma questão de direitos humanos (Hurst, 2003).

A CIF possui, assim, um conjunto de funcionalidades que a torna útil ao nível das políticas. Tem a capacidade de incorporar, quer os aspectos médicos, quer os aspectos sociais do fenómeno das defi ciências e incapaci- dades. É uma classifi cação coerente e sistemática que pode ser usada para descrever e documentar as complexidades do fenómeno das defi ciências e incapacidades. Adicionalmente, existe um conjunto de outras característi- cas úteis que a tornam num instrumento ideal para conceber e implemen-

Características-chave da CIF do ponto de vista