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Um dos desafi os ao nível do sucesso de uma estratégia é o da sua transpo- sição para a acção concreta. Apoiando essa operacionalização, é apresen- tada de seguida, para cada orientação de política, a natureza das acções que deveriam ser concebidas e executadas para potenciar os resultados, e exemplifi ca-se, com duas medidas por cada tipo de acção da dotação de qualidade de vida, como essas poderiam cobrir a diversidade dos domí- nios de qualidade de vida.

Este exercício foi desenvolvido com a noção do risco que comporta esta exemplifi cação, se for confundida com um esboço de plano de acção. Apenas se apresentam duas medidas por tipo de acção para a dotação de qualidade de vida, consideradas relevantes e paradigmáticas, não se avançando com a sistematização do conjunto das medidas a empreender, papel que deve caber aos planos de acção que venham a ser desenvolvidos no âmbito da estratégia.

A escolha dos exemplos baseia-se na leitura crítica da experiência an- terior e actual efectuada pela equipa e pelo conjunto das pessoas e enti- dades que acompanharam a realização do Estudo.

Os contributos recolhidos convergem para a ideia de que há um con- junto de domínios de intervenção prioritários, que se refl ectem na es- colha dos exemplos, sem prejuízo de estes incluírem outros. Constituem domínios prioritários:

· A educação e formação ao longo da vida, dado que os cidadãos com defi ciências e incapacidades em Portugal têm níveis extremamente baixos de habilitação escolar e acedem a qualifi cações profi ssionais igualmente baixas, tornando-se este obstáculo num impedimento real e num factor de legitimação da sua exclusão ou da sua integração no mercado de trabalho em profi ssões pouco qualifi cadas, com situações profi ssionais precárias e que proporcionam baixos rendimentos.

· O trabalho e emprego, uma vez que o diferencial entre os níveis de emprego dos cidadãos com defi ciências e incapacidades, em especial de alguns tipos de defi ciência, é enorme, refl ectindo difi culdades de

acesso ao emprego, de desenvolvimento de carreiras profi ssionais e de permanência no emprego, em particular no caso das defi ciências e in- capacidades adquiridas.

· O rendimento e prestações sociais, já que emerge dos dados recolhi- dos que as defi ciências e incapacidades estão associados a uma grande vulnerabilidade no domínio dos rendimentos e são um factor de empo- brecimento, com consequências que se refl ectem em múltiplos aspec- tos do acesso e uso efectivo dos direitos e na precariedade do actual estatuto social de muitos destes cidadãos.

· A activação de direitos, por resultar da investigação que há uma situa- ção de conformação generalizada dos cidadãos com defi ciências e inca- pacidades com o seu estatuto social actual, o que fragiliza o progresso do acesso real aos direitos, e requer uma intervenção forte ao nível da promoção de uma nova atitude social face às questões da defi ciência, do empowerment dos cidadãos e do apoio à activação e mobilização dos seus direitos, conferindo aos cidadãos e aos seus problemas maior visibilidade social e inconformismo, indispensáveis para que haja alte- rações estruturais na sua condição de vida e na percepção, quer deles quer dos restantes cidadãos, das suas legítimas aspirações à valoriza- ção pessoal e social.

Na escolha dos exemplos como na arquitectura de toda a estratégia, tem-se presente que um dos resultados a que a investigação conduziu é o de que Portugal dispõe de um sistema de reabilitação fragmentado por especialidade e muito orientado para as defi ciências congénitas – so- bretudo ao nível das respostas sociais – enquanto o universo dos cida- dãos com defi ciências e incapacidades se alarga a um grupo mais vasto de cidadãos que as adquirem ao longo da vida. Este último grupo parece ter menos acesso a serviços efi cazes de reabilitação, e ambos os grupos enfrentam hoje a desadequação de um modelo de intervenção fragmen- tado, face ao carácter integrado das necessidades das pessoas. Ambos os factores condicionam a efi cácia do sistema de reabilitação, por um lado por deixarem “zonas brancas” não cobertas por serviços necessários e, por outro, por haver perdas de efi ciência e qualidade dos serviços presta- dos aos cidadãos por menor racionalidade da rede de prestação de servi- ços do que a que é legítimo aspirar atingir.

Procura-se clarifi car conceptualmente o conteúdo de cada orientação de política em cada um dos objectivos estratégicos expostos e defi nir o modelo a partir do qual se podem construir planos de acção, recorrendo a

defi nição da natureza das acções a desenvolver e exemplos de medidas no âmbito do aumento da dotação de qualidade de vida, que poderiam ser inseridas nos planos de acção para a implementação da estratégia. Em relação a cada um desses exemplos é também identifi cado o domínio de qualidade de vida para cuja melhoria contribuiria.

Objectivo estratégico

“Garantir o acesso aos direitos e assegurar os mecanismos da sua efectivação plena, no reconhecimento de que as defi ciências e in- capacidades são realidades complexas, holísticas e integradas.”

No âmbito deste objectivo estratégico e da orientação de política compen-

sar os impactos das defi ciências e incapacidades, devem ser consideradas as

iniciativas que visem eliminar as difi culdades acrescidas que sejam de- vidas aos efeitos de alterações das estruturas e das funções das pessoas (Quadro 45).

Quadro 45. Natureza das acções e exemplos de medidas de dotação de

qualidade de vida no âmbito da orientação de política compensar os impactos

das deficiências e incapacidades

Orientação de política Compensar os impactos das defi ciências e incapacidades.

Natureza das acções a desenvolver Iniciativas que visam eliminar as difi culdades acrescidas que sejam devidas aos efeitos de alterações das estruturas e das funções.

Exemplos Criação de Reavaliar e reformular as prestações sociais, procurando maximizar

de medidas oportunidades a sua efectividade como: (a) instrumentos de compensação de custos

no âmbito acrescidos das pessoas em função das defi ciências e

do aumento incapacidades; (b) mecanismos de garantia de rendimentos

da dotação de necessários a uma vida com dignidade; (c) incentivos à vida autónoma,

qualidade nomeadamente à participação na vida activa e profi ssional.

de vida (Domínio do rendimento e prestações sociais)

Investir no apoio ao emprego, prioritariamente em contexto

competitivo, mobilizando, responsabilizando e apoiando as entidades empregadoras, complementado com medidas de apoio à vida

activa não enquadrada por relação de trabalho, promovendo oportunidades de realização do potencial activo dos cidadãos quando esse não é competitivo face às exigências do mercado de emprego.

(Domínio do trabalho e emprego)

Desenvolvimento Garantir o funcionamento de uma rede de qualifi cação inicial

de competências e de reabilitação profi ssional acessível a todos os cidadãos que dela careçam, integrando as respostas transversais do sistema de educação e formação profi ssional e as respostas especializadas complementares. (Domínio da educação e formação ao longo da vida)

Promover a intervenção precoce nos casos de defi ciência adquirida, por forma a reduzir ao mínimo a perda de contacto com o mercado

de trabalho, combinando reabilitação, reconversão profi ssional e readaptação ao trabalho e apoios ao emprego.

(Domínios da educação e formação ao longo da vida e do trabalho e emprego)

Transformação Criar uma certifi cação de qualidade social de empresas que tenha

de normas e como requisito a integração de cidadãos com defi ciências e

valores incapacidades e a adaptação dos postos e contextos de trabalho às

suas necessidades específi cas. (Domínio do trabalho e emprego) Defi nir objectivos de investimento em Investigação e Desenvolvimento

(I&D) em tecnologias de apoio às pessoas com defi ciências e incapacidades, por exemplo, através da existência de centros de investigação em engenharia de reabilitação e de centros de competência no apoio à mobilização da tecnologia e de dispositivos tecnológicos. (Domínio da autonomia e resiliência e todos aqueles

Os exemplos que se dão prendem-se com alguns aspectos centrais que carecem de reponderação nas políticas para a inclusão. As medidas que no passado abordavam a defi ciência pela perspectiva indemnizatória (sentido tradicional do conceito de compensação) acabavam por tender a corresponder a apoios no âmbito dos mínimos sociais e a promover a saída ou não-entrada no mercado de trabalho de muitos cidadãos com defi ciências e incapacidades com potencial para o integrarem. As presta- ções sociais devem ser concebidas, sempre que possível, como molas para a inclusão social e não o contrário, pelo que parece ser um elemento rele- vante na reorientação da política de prestações sociais para a defi ciência o aperfeiçoamento da relação das prestações sociais com rendimentos de trabalho, de modo encorajador, nomeadamente incentivando a entrada no mercado de trabalho. Assim sendo, importa privilegiar a promoção da vida activa e profi ssional, investindo recursos fi nanceiros e adoptando es- tratégias de apoio eminentemente de carácter positivo, com prejuízo da opção pelos mecanismos de garantia de rendimento, tanto quanto pos- sível e/ou através da conciliação entre rendimento do trabalho e rendi- mentos provindos das prestações sociais, dentro dos limites socialmente aceitáveis. Fomentar a integração em soluções de trabalho constitui-se também como elemento fundamental à efectiva inclusão social das pes- soas com defi ciências e incapacidades cujo potencial activo não é compe- titivo face às exigências do mercado de emprego.

Embora num campo diferente, não tão centrado na relação com o trabalho, mas com a própria liberdade de movimentos e participação no espaço público, também o aperfeiçoamento do sistema de concessão de ajudas técnicas carece de melhorias. As ajudas técnicas são um elemento de grande importância, em certos tipos de defi ciências e incapacidades, para a emancipação social e o exercício da liberdade, bem como para o tratamento com dignidade dos cidadãos. O sistema não deve ser frag- mentado e com regras distintas entre departamentos da Administração, mas integrado e com regras comuns. Como este é um domínio em que as disponibilidades de recursos são escassas face à dimensão das neces- sidades, há que reestruturar o sistema de fi nanciamento e atribuição de ajudas técnicas, defi nindo claramente a sua fi losofi a e princípios, os seus objectivos, os actores, papéis e responsabilidades, a metodologia de inter- venção e os mecanismos de coordenação e controlo. A melhor efi ciência deve ser aliada da percepção de que em situações como esta a diferencia- ção positiva é um instrumento de equidade social.

ciências e incapacidades possibilidades reais de ganharem autonomia e melhorarem a sua condição social, para o que é essencial que o sistema de reabilitação se aproxime, tão rapidamente quanto possível, da garantia de que a rede de qualifi cação e a de reabilitação profi ssional sejam realmen- te acessíveis a todos os cidadãos que careçam dessas intervenções especí- fi cas. Do mesmo modo, a intervenção precoce nos casos de defi ciências e incapacidades adquiridas tem demonstrado ser um factor importante de preservação da vinculação social e em particular da participação destes cidadãos no mercado de trabalho.

No âmbito da orientação de política criar oportunidades de desenvolvi-

mento pessoal, satisfazendo as necessidades diversas das pessoas e pro-

movendo a sua participação social, incluem-se as acções que visam di- minuir as limitações da actividade e distribuir de forma mais equitativa as oportunidades sociais e de valorização pessoal, por forma a que elas possam chegar mais e mais intensamente às pessoas com essas limita- ções (Quadro 46).

Quadro 46. Natureza das acções e exemplos de medidas de dotação de

qualidade de vida no âmbito da orientação de política criar oportunidades de

desenvolvimento pessoal, satisfazendo as necessidades diversas das pessoas e

promovendo a sua participação social

Orientação de política Criar oportunidades de desenvolvimento pessoal, satisfazendo as necessidades diversas das pessoas e promovendo a sua participação social.

Natureza das acções a desenvolver Acções que visam diminuir as limitações da actividade e distribuir, de forma mais equitativa, as oportunidades sociais e de valorização

pessoal, por forma a que elas possam chegar mais e mais intensamente às pessoas com essas limitações.

Exemplos Criação de Garantir o acesso universal a uma avaliação de necessidades

de medidas oportunidades e potenciais, aquando da sinalização das defi ciências e incapacidades,

no âmbito sejam elas congénitas ou adquiridas, a cargo de centros de competência,

do aumento que determinem as necessidades, os problemas a resolver, os potenciais

da dotação de a explorar e desenvolvam os planos individuais de habilitação/ qualidade reabilitação, utilizando a CIF como referencial analítico da avaliação. de vida (Domínio da activação de direitos)

Garantir a existência de centros locais de apoio que prestem informação, aconselhamento e advocacy, sejam um ponto de contacto

do cidadão com o sistema de reabilitação e facilitem o acesso aos serviços, através do modelo de gestão de casos, orientando a execução dos planos individuais, combinando recursos materiais e prestação de serviços, que evoluam para a elaboração de orçamentos

pessoais. (Domínio da activação de direitos)

Desenvolvimento Promover o acesso dos cidadãos com defi ciências e incapacidades a

de competências níveis mais elevados de escolarização e de qualifi cação profi ssional, designadamente garantindo percursos de educação e formação até ao 12.º ano e a escolarização até aos 18 anos, em conformidade com o desenvolvimento dos seus potenciais.

(Domínio da educação e formação ao longo da vida)

Combater a iliteracia e criar condições para o acesso a oportunidades de educação e formação ao longo da vida, no âmbito das políticas gerais de educação e formação profi ssional, designadamente a Iniciativa

Novas Oportunidades.

(Domínio da educação e formação ao longo da vida)

Transformação Sensibilizar os cidadãos, as suas famílias e os signifi cativos para a

de normas importância da integração nas redes gerais de recursos, para a sua e valores valorização e mobilização.

(Domínio da activação de direitos)

Garantir a existência de informação sobre a vida quotidiana e a vida pública em suportes adaptados aos diversos tipos de defi ciências e incapacidades.