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CAPÍTULO III A CRIAÇÃO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL E SEUS ASPECTOS INSTITUCIONAIS

3.3 Composição e administração do Tribunal Penal Internacional

O Estatuto de Roma, na sua Parte IV, que contém os artigos 34 a 52, trata da Composição e da Administração do Tribunal.

O Tribunal Penal Internacional, como as cortes internacionais criminais, possui atividades judiciais, funções investigativas e acusatórias, bem como funções administrativas. As atividades judiciais serão realizadas por juízes, as funções investigativas e acusatórias serão desenvolvidas pelo Ministério Público e as atividades administrativas pela Secretaria do Tribunal.

Os idiomas a serem utilizados pelo Tribunal foram classificados pelo Estatuto de Roma em idiomas oficiais e idiomas de trabalho. Os idiomas oficiais são o árabe, o chinês, o espanhol, o francês, o inglês e o russo. Já os idiomas de trabalho são francês e o inglês. As sentenças e outras decisões fundamentais do Tribunal será publicadas nos idiomas oficiais. Nas regras de procedimento e prova será determinado em que casos poderão ser utilizados como idiomas de trabalho outros idiomas oficiais.85

O Tribunal tem como órgãos a Presidência, uma Seção de Apelações, uma Seção de Primeira Instância, uma Seção de Questões Preliminares, o Gabinete da Promotoria e a Secretaria, sendo composto de, no mínimo, 18 juízes, todos eleitos entre indivíduos que gozem de alta consideração moral, imparcialidade e integridade e que possuam as condições exigidas para o exercício das mais altas funções em seus respectivos países.

Os juízes do Tribunal exercerão suas funções em regime de dedicação exclusiva e deverão estar à disposição para o exercício de suas atividades na sede do Tribunal assim que forem eleitos.

O Estatuto ressalva que os juízes que compuserem a Presidência exercerão suas atividades em regime de dedicação exclusiva na sede do Tribunal, tão logo sejam eleitos. Vê-se,

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portanto, que há divergência nas disposições relativas aos juízes, sendo certo que somente os membros da Presidência irão servir permanentemente, em regime de dedicação exclusiva, na sede do Tribunal. Todavia, caso haja necessidade, a Presidência poderá decidir que os demais juízes também deverão trabalhar, em regime de dedicação exclusiva, na sede da Corte.86

A fim de preservar a independência dos juízes, o Estatuto de Roma estabelece que os magistrados não podem exercer qualquer atividade que possa interferir com o exercício das funções judiciais ou colocar em dúvida sua independência. Determina ainda que os juízes que exercem seus cargos em regime de dedicação exclusiva na sede do Tribunal não podem se dedicar a outra ocupação de natureza profissional.

Como requisito para postular o cargo, os candidatos devem ter reconhecida competência em direito penal e processual penal e a necessária experiência como juiz, promotor, advogado ou outra função similar; ou, serem reconhecidamente competentes em áreas relevantes do direito internacional, como o direito internacional humanitário ou direito internacional dos direitos humanos e grande experiência profissional em funções que tenham relação com a área fim de um tribunal. Além disso, os candidatos ao cargo de juiz devem ser fluentes em pelo menos um dos idiomas de trabalho do Tribunal. Não foi estipulado qualquer limite de idade para o exercício do cargo.

As indicações dos candidatos ao cargo de juiz podem ser feitas por quaisquer dos Estados-partes do Estatuto, sendo que cada Estado pode indicar um indivíduo, que não

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NESI, Giuseppe. The organs of the international criminal court an their functions in the Rome Statute – The assembly of states parties. In: LATTANZI, Flavia; SCHABAS William A (Org). Essays on the rome statute of

precisa necessariamente ser um nacional desse Estado, mas obrigatoriamente nacional de um Estado-parte.

No momento da eleição são elaboradas duas listas de candidatos. Uma, denominada lista A, composta dos nomes dos candidatos que tenham reconhecida competência em direito penal e processual penal e a necessária experiência como juiz, promotor, advogado ou outra função similar. A segunda lista, denominada lista B, é composta dos nomes dos candidatos reconhecidamente competentes em áreas relevantes do direito internacional, como o direito internacional humanitário ou direito internacional dos direitos humanos e grande experiência profissional em funções que tenham relação com a área fim de um tribunal. Caso um candidato preencha os requisitos exigidos nas duas listas, deverá informar qual delas deseja integrar.

Na primeira eleição, pelo menos nove candidatos são escolhidos entre os integrantes da lista A e pelo menos cinco integrantes da lista B. Nas eleições subseqüentes será mantida a proporção de Juízes constantes das duas listas.

Os juízes são eleitos por votação secreta da Assembléia dos Estados-partes, sendo que os dezoito candidatos que obtiverem o maior número de votos e pelos menos dois terços dos votos dos Estados presentes e votantes estarão eleitos.87

Não pode haver dois juízes que sejam nacionais do mesmo Estado e os Estados- partes devem levar em consideração, no momento da eleição, que o Tribunal represente os principais sistemas jurídicos do mundo, uma representação geográfica eqüitativa, e o equilíbrio

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NESI, Giuseppe. The organs of the international criminal court an their functions in the Rome Statute – The assembly of states parties. In: LATTANZI, Flavia; SCHABAS William A (Org). Essays on the rome statute of

entre homens e mulheres. Também deve ser considerada a necessidade de que os juízes do Tribunal possuam especialização em temas como violência contra mulheres e crianças, mas não se limitem a ela.88

Caso haja necessidade, em razão do aumento do volume de serviço, a Presidência do Tribunal pode propor um acréscimo no número de juízes da Corte, indicando os motivos. A Assembléia de Estados-partes analisará a proposta e pelo voto de dois terços de seus membros poderá aprovar o pedido. Caso seja concedido o aumento no número de juízes, a eleição dos demais membros será realizada na próxima seção da Assembléia de Estados-partes. O Estatuto assegura que, caso o volume de serviço não mais o justifique, seja reduzido o número de juízes à medida que expirem os mandatos, nunca podendo ser inferior a dezoito.89

Os juízes podem exercer um mandato de, no máximo, nove anos, não podendo concorrer à reeleição. Contudo, na primeira eleição, um terço dos juízes foi escolhido, por sorteio, para cumprir um mandato de três anos, um terço foi sorteado para o cumprimento de um mandato de seis anos e os demais cumprem um mandato de nove anos. O Estatuto assegurou que um juiz sorteado para cumprir um mandato de três anos, pode ser reeleito para o exercício de um mandato completo.90

O Tribunal é composto de três seções, quais sejam, a Seção de Apelações, a Seção de Julgamento e a Seção de Pré-julgamento. A composição das turmas se dará de acordo com a natureza das funções a serem exercidas, bem como das qualificações dos magistrados, sendo certo que cada seção contém uma combinação de juízes oriundos da lista A e da lista B. 88 Art. 36 (7) 89 Art. 36 (2) 90 Art. 36 (8)(a)(b)(c)

Todavia, a Seção de Julgamento e a Seção de Pré-julgamento devem ser compostas predominantemente por juízes que tenham experiência em processo penal.91

O Tribunal Penal Internacional encontra-se, atualmente, composto dos onze magistrados e sete magistradas abaixo indicados, com a respectiva nacionalidade:

a) Adrian Fulford (Reino Unido);

b) Akua Kuenyehia (Gana);

c) Anita Usacka (Letônia);

d) Calude Jorda (França);

e) Elizabeth Odia Benito (Costa Rica);

f) Irkki Kourula (Finlândia);

g) Fatoumata Dembele Diarra (Mali);

h) Georghios M. Pikis (Chipre);

i) Hans-Peter Kaul (Alemanha);

j) Karl T. Hudson-Philips (Trinidad e Tobago);

k) Moureen Harding Clark (Irlanda);

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l) Mauro Politi (Italia);

m) Nabanethem Pillay (África do Sul);

n) Philippe Kirsch (Canadá);

o) René Blattmann (Bolívia);

p) Sang-Hyun Song (Coréia do Sul);

q) Sylvia Steiner (Brasil); e

r) Tuiloma Neroni Slade (Samoa).

O Ministério Público92 é independente do Tribunal e responsável pela investigação e eventual acusação sobre crimes que sejam da competência do Tribunal.

Caberá ao Ministério Público receber notitia criminis e outras informações sobre crimes que estejam enquadrados em suas atribuições. O Promotor poderá ser auxiliado por um ou mais Promotores Substitutos93, que serão por ele indicados, todos trabalhando em tempo integral na sede do Tribunal. O Promotor e os Promotores Substitutos não poderão ser da mesma nacionalidade, devendo gozar da mais alta consideração moral, alto nível de competência e extensa experiência prática na persecução ou julgamento de causas penais. Todos deverão dominar de forma excelente pelo menos um dos idiomas oficiais do Tribunal.

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Office of the Prosecutor

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O Promotor e os Promotores Substitutos serão eleitos em votação secreta e pela maioria absoluta dos Estados-partes. Após a eleição do Promotor(a), deverá ele(a) indicar três nomes para cada uma das vagas de Promotor(a) Auxiliar. O mandato do Promotor e dos Promotores Substitutos será de nove anos, a não ser que no momento da eleição seja estabelecido outro período, e não poderão ser reeleitos.

Está vedada a atuação do Promotor ou dos Promotores Substitutos em qualquer atividade ou função que coloque em dúvida suas independências, bem como a dedicação a outra ocupação de natureza profissional.

Facultou-se ao Promotor a indicação de auxiliares com experiência em assuntos específicos como violência sexual e violência contra crianças.

O Ministério Público possui as seguintes atuações funcionais94:

a) Analisar casos em que um ou mais crimes da competência do Tribunal tenham sido noticiadas ao Promotor pelo Conselho de Segurança ou por Estado-parte.

b) Analisar a seriedade de uma informação recebida e, para este fim, solicitar a cooperação dos Estados, das Nações Unidas, de organizações intergovernamentais ou não governamentais, ou outras fontes que considere válidas e confiáveis, bem como colher depoimentos escritos ou orais na sede do Tribunal.

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NESI, Giuseppe. The organs of the international criminal court an their functions in the Rome Statute – The assembly of states parties. In: LATTANZI, Flavia; SCHABAS William A (Org). Essays on the rome statute of

c) Conduzir investigações questionando suspeitos, vítimas e testemunhas, coletando e examinando provas, conduzindo investigações no território de um Estado (com ou sem o consentimento deste Estado), adotando as medidas de proteção necessárias no que diz respeito ao segredo de informações ou proteção das pessoas.

d) Decidir quando submeter à Câmara de Questões Preliminares um pedido de autorização para investigação.

e) Iniciar investigações proprio motu tomando por base informações da prática de crimes da competência do Tribunal.

f) Postular a revisão de uma decisão ou responder a um pedido de revisão feito pela Defesa, baseado em prova recentemente descoberta.

g) Recorrer de um julgamento ou de uma sentença da Câmara de Julgamento para a Câmara de Apelações e responder um recurso da Defesa.

Ao realizar a atividade de análise de dados que antecedem uma investigação formal, caso o Ministério Público entenda que não dispõe de informações que justifiquem a formalização de um pedido de instauração de um procedimento formal, determinará o arquivamento das informações, cientificando os interessados. Aludida postura não fica sujeita a qualquer controle jurisdicional.

Como bem registra Maria Leonor Machado Esteves de Campos e Assunção, ao comentar a atuação do Ministério Público estabelecida pelo Estatuto de Roma:

“Sujeita-se, não obstante, a sua actuação a um sistema apertado de fiscalização que, se de uma parte, faz depender a legitimidade para investigar de queixa a efectuar por um Estado Parte ou pelo Conselho de Segurança, de outra parte, nos casos em que a investigação é efectuada por iniciativa do Procurador com base em informação recolhida através de uma heterogeneidade de fontes, organizações intergovernamentais, organizações não governamentais, órgãos das Nações Unidas, ou outras (aqui se incluindo vítimas e testemunhas), condiciona o desencadear do processo investigatório a autorização do Tribunal (ou Câmara) de Audiência Preliminar[...]”95

A Secretaria é o órgão responsável pelos aspectos não judiciais da administração e serviços do tribunal e é encabeçada pelo Secretário.96 A Secretaria é composta pelo Secretário97 e, caso seja necessário, por recomendação do Secretário, pelo Secretário Auxiliar98.

O Secretário realizará suas atividades sob a autoridade do Presidente do Tribunal e será eleito pela maioria absoluta dos juízes, em votação secreta, levando-se em consideração recomendação da Assembléia dos Estados-partes. O mandato do Secretário é de cinco anos, podendo ser reeleito uma vez.

O Secretário e o eventual Secretário Auxiliar deverão gozar da mais alta consideração moral, possuir alto nível de competência e dominar perfeitamente pelo menos um dos idiomas de trabalho do Tribunal.

Por determinação legal, o Secretário instalará uma Unidade de Vítimas e Testemunhas, que, em acordo com o Ministério Público, adotará medidas protetivas e prestará

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ASSUNÇÃO, Maria Leonor Machado Esteves de Campos. De como o estatuto do tribunal internacional penal certifica um novo modelo de direito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo,v. 12, n. 30, p. 35-36 maio/jun. 2004

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JARASCH, Frank. Estabelecimento, organização e financiamento do CIC e as cláusulas finais (partes I, IV, XI e XIII). In: SCHABAS, WILLIAM A. “Princípios Gerais de Direito Penal”. CHOUKR, Fauzi Hasan, AMBOS, Kai (Org.).Tribunal penal internacional. São Paulo: RT, 2000, p. 88.

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The Registrar

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assessoria e assistência às testemunhas e vítimas que estejam sob ameaça em razão de suas declarações. A Unidade também será composta de pessoas com experiências em traumas, incluídos os produzidos em razão de crimes com violência sexual.99

Considerando que o Tribunal Penal Internacional foi criado por um tratado, o Estatuto de Roma estabelece que cada Estado-parte poderá ter um representante na Assembléia de Estados-partes, assegurando aos Estados que não fazem parte do Estatuto terem observadores durante a Assembléia.

A Assembléia dos Estados-partes terá uma Secretaria, composta de um Presidente, dois Vice-Presidentes, e dezoito membros, eleitos pela Assembléia, para um mandato de três anos.

A Assembléia deverá reunir-se uma vez por ano, podendo realizar reuniões extraordinárias, sendo que o Presidente do Tribunal, o Promotor e o Secretário, ou seus representantes, poderão participar das reuniões.

Cada Estado-parte terá um voto, devendo a Assembléia envidar todos os esforços para que as votações sejam realizadas mediante consenso. Caso não seja alcançado o consenso e se o Estatuto não dispuser de maneira contrária, as decisões se darão mediante aprovação de dois terços dos presentes e votantes, desde que constitua maioria absoluta dos Estados-partes. Não terá direito a voto o Estado-parte que esteja em atraso com suas contribuições financeiras, caso o montante devido seja igual ou superior a um período de dois anos completos.

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O Estatuto de Roma dispõe que as despesas do Tribunal e da Assembléia dos Estados-partes serão custeadas por contribuições dos Estados-partes, bem como por fundos procedentes das Nações Unidas, sujeitos à aprovação da Assembléia Geral. Também fica assegurado que o Tribunal poderá receber e utilizar contribuições voluntárias de governos, organismos internacionais, particulares, empresas e outras entidades, de acordo com os critérios adotados pela Assembléia dos Estados-partes.

O rateio das contribuições dos Estados-partes se dará com base em uma escala, que tomará por fundamento a escala adotada pelas Nações Unidas para o seu orçamento.