• Nenhum resultado encontrado

Compromissos internacionais e nacionais para a conservação da biodiversidade

Compromissos e programas políticos nacionais e internacionais impulsionam novas frentes de pesquisa e reforçam a relevância das ações práticas realizadas por iniciativas voltadas à CDI, envolvendo atores para o cumprimento dos objetivos transversais articuláveis às macropolíticas. As ações integradas entre diferentes setores da sociedade, níveis jurisdicionais e influência geográfica podem desdobrar melhores sistemas e formas de uso de recursos da flora nativa, criando e/ou ajustando novas configurações produtivas para a CDI. No cenário internacional, a proposição e a assinatura da Convenção da Diversidade Biológica (CDB) por 167 países durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro em 1992 (Eco-92), incluindo o Brasil (CONGRESSO NACIONAL, 1994), tornou-se um dos maiores marcos no esforço intergovernamental para assegurar o desenvolvimento sustentável, a conservação e o uso sustentável da biodiversidade e a divisão equitativa de benefícios advindos de recursos genéticos. No entanto, apesar dos compromissos assumidos, as metas de 2010 para a redução da perda da biodiversidade não foram alcançadas, como reconhecido na Décima Conferência das Partes (COP-2010) em Nagoya/Japão.

A partir disto, planos estratégicos com objetivos, metas35 e prazos para o cumprimento foram estabelecidos em nível internacional, como as metas de Aichi para serem atingidas até 202036 e as metas para a recuperação e restauração de ecossistemas, como o Desafio Bonn (Bonn Chalenge), que somam e reforçam os compromissos nacionais e regionais (e.g. Política Nacional da Biodiversidade - BRASIL, 2002; Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, PROVEG - BRASIL, 2017; Pacto pela Restauração da Mata Atlântica – CALMON et al., 2011). Dentre as prioridades reforçadas pela CDB, a

35 20 metas "SMART" (Specific, Measurable, Ambitious, Realistic, Time-bound: específicas, mensuráveis,

ambiciosas, realistas e tempo-limitadas).

36 Essas foram estabelecidas no reconhecimento do fracasso no cumprimento das metas 2010, e deverão ser

atualizadas como metas 2030 (pois tampouco foram alcançadas), alinhando-se à Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e ao Acordo de Paris.

importância da definição de múltiplos indicadores foi destacada para o acompanhamento da execução das metas, para o qual encontros e negociações foram promovidos, culminando no estabelecimento da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos - IPBES37 (PERRINGS et al., 2011). A IPBES foi projetada para, entre outras coisas, desenvolver de forma proativa as avaliações necessárias para atender demandas políticas e apoiar a capacitação social (capacity building) entre escalas e temas relacionados aos objetivos estratégicos da CDB (DÍAZ et al., 2015).

O Brasil, como grande detentor da diversidade biológica e nação de diversos povos e comunidades tradicionais em nível mundial (WWF, 2000; JOLY et al., 201838), possui e assume responsabilidades de peso para o desenvolvimento de estratégias que mantenham e favoreçam cada elemento que compõe a rica diversidade biológica e sociocultural (BRASIL, 1998). A partir dos anos 1990, com o estabelecimento de convenções e acordos internacionais desdobrados da Eco-92, políticas públicas nacionais vêm sendo desenhadas em resposta às demandas e necessidades emergentes da sociedade em relação ao meio ambiente, especialmente frente à intensa perda da biodiversidade e dos preocupantes cenários de mudanças climáticas. Além disso, diversas câmaras técnicas foram formadas no âmbito da Comissão Nacional de Biodiversidade – CONABIO (Deliberação CONABIO N° 49, de 30/08/2006) e das Metas Nacionais de Biodiversidade para 2020, que internalizam as Metas Globais de Biodiversidade 2020 (Resolução CONABIO N°6, de 03/09/2013). Inclusive, em 2015, foi lançada a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos - BPBES39, seguindo o mesmo padrão do IPBES, enquanto iniciativa instrumental para atuar e investigar as questões da biodiversidade e serviços ecossistêmicos associados em nível nacional (SCARANO et al., in review).

O papel de destaque exercido pelo Brasil e sua adesão à CDB conduziram ao estabelecimento da Política Nacional de Biodiversidade e à obrigação de tratar e definir os aspectos legais para a proteção e o acesso à biodiversidade e ao conhecimento tradicional associado, refletido na Lei Federal N°13.123/2015 e seu Decreto regulador N° 8.772/2016 (MMA, 2000; BRASIL, 1998, 2002, 2015, 2016). A “Lei da Biodiversidade”, como

37

IPBES: Intergovernmental Platform on Biodiversity and Ecosystem Services (https://www.ipbes.net/).

38 O Sumário para Tomadores de Decisão da BPBES traz que a “diversidade cultural é tão rica quanto a

biológica” no Brasil, sendo 25 milhões de brasileiros pertencentes a comunidades tradicionais, que ocupam ¼ do território nacional, com 305 etnias e 274 línguas (JOLY et al., 2018).

39

BPBES: Brazilian Platform on Biodiversity and Ecosystem Services - www.bpbes.net.br; https://www.facebook.com/BPBES2017/.

popularmente chamada, pretende criar condições para estimular o desenvolvimento socioeconômico integrado à conservação da biodiversidade e à valorização e provisão de benefícios às comunidades tradicionais, definindo as obrigações para o acesso e repartição de benefícios aos recursos genéticos e conhecimentos associados (BRASIL, 2015, 2016).

A valorização da agrobiodiversidade40 e dos produtos da sociobiodiversidade tem aumentado nos últimos anos, a partir dos marcos legais e dos estímulos a experiências locais de uso e conservação dos recursos genéticos (e.g. MMA, MDA & MDS, 2008; CORADIN et al., 2012; ICMBIO, 2018). O manejo de raças e variedades locais, tradicionais ou crioulas, por exemplo, é estimulado por políticas integradoras, como a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável41 dos Povos e Comunidades Tradicionais (BRASIL, 2007) e a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (BRASIL, 2012a). Excepcionalmente transversal às questões ambientais e socioculturais, o Programa Nacional da Sociobiodiversidade foi proposto em 2009 para aproximação de múltiplos objetivos socioambientais pelo Plano Nacional de Promoção das Cadeias de Produtos da Sociobiodiversidade (PNPSB), fomentando o desenvolvimento de Cadeia Produtiva da Sociobiodiversidade (CPSBio)42. Planos de aproveitamento de recursos da biodiversidade associados à recuperação e à manutenção de serviços ecossistêmicos também são transversais a outras políticas socioambientais que apresentam objetivos sobrepostos ou complementares43 e, consequentemente, potencial articulação em prol de CPs justas e sustentáveis. Nessas, a produção, distribuição e aplicações atendem demandas sociais, materiais e culturais (imateriais) em compasso à manutenção dos benefícios ambientais e ecológicos (com base em BERKES & ADHIKARI, 2006; BRONDÍZIO, 2008; ICMBIO, 2018).

40 “Agrobiodiversidade: é definida na CDB como um termo amplo que inclui todos os componentes da

biodiversidade que têm relevância para a agricultura e alimentação, bem como todos os componentes da biodiversidade que constituem os agroecossistemas: as variedades e a variabilidade de animais, plantas e de microrganismos, nos níveis genético, de espécies e de ecossistemas os quais são necessários para sustentar os agroecossistemas, suas estruturas e processos. Num conceito mais sintético, a agrobiodiversidade pode ser compreendida como a parcela da biodiversidade utilizada pelo homem na agricultura, ou em práticas correlatas, na natureza, de forma domesticada ou semi-domesticada” (MMA, 2018).

41

“Desenvolvimento Sustentável: o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras”, conforme definição do Decreto N° 6.040/07 (BRASIL, 2007).

4242

CPSBio é definida como “um sistema integrado, constituído por atores interdependentes e por uma sucessão de processos de educação, pesquisa, manejo, produção, beneficiamento, distribuição, comercialização e consumo de produto e serviços da sociobiodiversidade, com identidade cultural e incorporação de valores e saberes locais e que asseguram a distribuição justa e equitativa dos seus benefícios” (MDA, 2009).

43

A Política Nacional de Biodiversidade tem articulação potencial com a Política Nacional de Mudanças do Clima (BRASIL, 2009a), o Programa Nacional de Florestas (BRASIL, 2000a), entre outros.

As iniciativas baseadas no aproveitamento sustentável de recursos da flora nativa podem combinar múltiplos objetivos e atender demandas locais sem o prejuízo das funções dos ecossistemas, mantendo a biodiversidade e a prestação de serviços, beneficiando múltiplas escalas espaciais, inclusive, em nível global (e.g. FAO, 1999; BRONDÍZIO, 2008; SCARIOT et al., 2014). Segundo Scariot et al. (2014), o crescimento no número de iniciativas que buscam associar a exploração econômica de PFNM por comunidades locais foi notável nas últimas décadas, como um esforço coletivo para conservação das florestas tropicais (e.g. NEPSTAD & SCHARTZMAN, 1992; ABRANTES, 2002; SCARIOT et al., 2014). O aproveitamento de PFNM dentro de um plano de gestão sustentável, considerando fatores socioecológicos, para além das taxas de reposição das espécies e produção de baixo impacto ao ecossistema, apresenta-se como base de modelo econômico alternativo para o desenvolvimento social (e.g. FAO, 1999, 2007; ABRANTES, 2002; BRONDÍZIO et al., 2002; SIMÕES & LINO, 2003; KLINK & MACHADO, 2005; BRASIL, 2012; INGRAM et al. 2012; SCARIOT et al., 2014). A agregação de valor econômico aos PFNM, por vezes confere grande rendimento monetário (e.g. ABRANTES, 2002; SIMÕES & LINO, 2003; SCHMIDT & TICKTIN, 2012) e possui impactos negativos reduzidos para a biodiversidade e ecossistemas naturais conforme os esforços para a manutenção e/ou recuperação da vegetação

Outline

Documentos relacionados