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Capítulo 1 – Caracterização das iniciativas relacionadas ao uso e conservação de bambus nativos:

II. Perfil das organizações e a atuação das iniciativas

Os resultados abaixo referem-se primordialmente às 222 iniciativas que trabalham com bambus nativos do levantamento nacional, sendo explicitadas exceções utilizadas quando foram necessárias. O setor produtivo apresenta uma composição diversificada formada por iniciativas individuais, com profissionais independentes e empresas, e também por entidades de base comunitária, que correspondem acerca de 38% do setor (Figura 7, Tabela 2). Ainda, algumas iniciativas, sobretudo do setor produtivo, são compostas por arranjos de organizações e/ou por um formato organizacional de representação dinâmica, que utiliza o formato mais favorável como melhor convier, a critério dos interesses de seus representantes, para receber e/ou atender demandas e solicitações externas, habilitando-os às condições do fomento público ou para estabelecer relações de mercado. Podem atuar, por exemplo, ora como empresa, ora como associação sem fins lucrativos; ou como cooperativa ou como profissional autônomo. Ademais, os atores sociais individuais principalmente no setor produtivo, mas também no de PD&I, podem estar vinculados a mais de uma forma ou estrutura organizacional, articuláveis entre si, como entre uma empresa privada e associação sem fins lucrativos; um microempreendimento e uma organização social informal; um consultor independente e uma instituição pública de PD&I. Essa plasticidade, na estrutura e funcionamento, foi identificada em iniciativas do levantamento nacional e no Acre e favorecem a realização de múltiplas atividades e a interação setorial para influenciar a política, negociações e obtenção de financiamentos e/ou mercados junto a órgãos públicos e privados. Há reflexos sobre os principais objetivos das iniciativas citados pelos entrevistados (Tabela 3), pois articulam-se entre si sobretudo quando os atores demonstram maior plasticidade na estrutura de atuação, participam em diferentes iniciativas e influenciam diferentes níveis políticos, como observado no Acre.

No setor de PD&I, as estruturas coletivas que envolvem de forma duradoura um número maior de participantes são de grupos de pesquisa e extensão, entidades públicas governamentais e privadas de prestação de serviços, programas e projetos multi-institucionais

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Dois entrevistados explicitaram o reconhecimento e reforçaram a interdependência das respectivas bolsas de pesquisa diretamente com as plantas estudadas.

(Figura 7, Tabela 2). As iniciativas entrevistadas desse setor objetivam principalmente o desenvolvimento científico, atuando em Ciências Básicas ou Aplicadas, sendo menos frequente parcerias ou ações diretas para promover arranjos produtivos ou mesmo a conservação da biodiversidade (apenas em três, dentre as 11 entrevistadas no levantamento nacional). De forma geral, os entrevistados de PD&I incentivam terceiros a desenvolverem atividades comerciais ou instruem políticas de conservação. Atores do setor de PD&I com intuito comercial diretamente expresso foram identificados apenas no Acre.

Os entrevistados do levantamento nacional atuam como principais líderes, idealizadores ou condutores principais das atividades, frequentemente administrando atividades que envolvem um número variado de participantes conforme a estrutura da iniciativa. Há desde iniciativas individuais, que podem ser articuladas em pares, como observado envolvendo profissionais autônomos e microempreendedores individuais, até algumas dezenas de integrantes, como nos grupos de pesquisas previamente mencionados. Porém, a quantidade média de participantes nas iniciativas entrevistadas do levantamento nacional é de apenas seis pessoas, sendo que o envolvimento de forma direta de coletivos maiores, incluindo comunidades locais por exemplo, foi raramente verificado. Das 45 iniciativas entrevistadas, duas do setor produtivo mencionaram a participação direta de centenas de comunitários e outras duas de PD&I, sem que pudessem precisar o número exato de envolvidos. Dessas, o envolvimento de cerca de duzentos participantes foi descrito por duas associações voltadas para o desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Bambu (CPB) no país e por um micro empreendimento, que representa várias aldeias com cerca de 160 famílias indígenas. No Acre, o envolvimento das organizações de base como associações, cooperativas ligadas à Reserva Extrativista Chico Mendes e Assentamentos Rurais ampliam o número dos participantes nas iniciativas, mas poucos compõem diretamente as arenas oficiais das iniciativas em 2016.

Figura 7. Estrutura principal das iniciativas com atuação em bambus nativos. Dados das

iniciativas confirmadas do levantamento nacional, excluindo-se as redes, pois as categorias não se aplicam (n=220).

Tabela 2. Perfil das principais organizações envolvidas nas iniciativas confirmadas do levantamento nacional por setor (n=222, inclui iniciativas internacionais e redes). *Entidades de

base comunitária.

SETOR PRODUTIVO Total

n=98 Profissional autônomo (artesãos, consultores, profissionais independentes formais e

informais) 27 Comunidade tradicional* 23 Empresa 22 Associação* 8 Indeterminado 5 Organização social* 4 Associação e empresa 2

Cooperativa (formal e informal)* 2

Profissional liberal 2

Outros (Associação e profissional autônomo, Governo municipal, rede de vendas) 3

SETOR DE PD&I n= 124 Total

Universidade/instituição de pesquisa 87

Entidade privada de serviços 14

Instituição de pesquisa e extensão (agências, fundações, autarquias, grupos acadêmicos extensionistas de organizações públicas)

11

Entidade governamental estadual (secretarias, governo estadual) 4

Entidade governamental federal (ministérios, governo federal) 3

Outros (entidades municipais; associação; plataforma internacional; autônomo; rede profissional) 5 47 76 25 35 37 0 20 40 60 80 PD&I - individual PD&I - coletiva empresarial base comunitária individual Número de iniciativas E str u tur a p rin cip al d as i n iciativas Produtivo - declarado PD&I - declarado

Tabela 3. Objetivos emergentes das iniciativas entrevistadas. X: presença do objetivo em três ou

mais iniciativas por nível da pesquisa. Negrito e cinza quando identificado em 10 ou mais iniciativas.

Objetivos das iniciativas relacionadas ao recurso-foco Pesquisa nacional

Pesquisa Acre

Produção e difusão de conhecimento X X

Confecção, venda e/ou instalação de produtos X X

Manufatura de produtos e capacitação para benefício social X X

Esforço para consolidação e promoção da CPB X X

Desenvolvimento de projetos para benefícios sociais X X

Recuperação e conservação da biodiversidade X X

Promoção da sustentabilidade, projetos socioambientais X X

Promoção do plantio de bambu X X

Desenvolvimento de centro de referência X X

Valorização de recurso menosprezado X

Gestão territorial e dos recursos X

Pesquisa e/ou desenvolvimento de políticas públicas X

Inovação tecnológica X

Desenvolvimento industrial (Florestal Madeireiro e Não Madeireiro) X

Outros (não triangulados) X X

A informalidade do trabalho e/ou das relações estabelecidas com atores- colaboradores é comum entre as iniciativas individuais e de base comunitária e frequentemente resulta em ações pontuais e/ou testes iniciais envolvendo o recurso. Algumas manifestaram intenção de oficializar, registrando as organizações, apesar de oneroso e demorado, para estabelecer o uso do recurso e parcerias mais duradouras. Os dados secundários também reforçam a contribuição da sociobiodiversidade brasileira para o uso e/ou conservação de bambus nativos, embasando uma cadeia produtiva de manufaturados artesanais, representada por iniciativas de pequeno porte, predominantemente informais, voltadas à subsistência pessoal, familiar e comunitária e complementação de renda. A valorização dos bambus nativos enquanto recurso para o mercado demonstrou-se em crescimento advindo dos esforços científicos das últimas décadas e do cenário político nacional favorável com a PNMCB e o apoio às iniciativas industriais, como identificado no Acre (Figura 7; e.g. MCTI, 2016, 2017). O período aparenta ser de transição para o encadeamento de segmentos e setores, maior formalização das iniciativas e valorização econômica do recurso em médio e longo prazo.

A Figura 8 apresenta os principais segmentos de atuação das iniciativas levantadas (i.e. produção, beneficiamento, comércio e serviços), dos quais destacam-se a prestação de serviços e a ocorrência de atividades integradas envolvendo mais do que um segmento, contudo com menor representatividade das ações de mercado (Figura 8A). Considerando as principais atividades das iniciativas com ações em mais de uma categoria,

pode-se observar relação entre a produção com atividades de serviços (especialmente pelas coleções e estudos botânicos para conservação e/ou produção) e da manufatura com o mercado. A atuação em uma única categoria foi verificada apenas nas iniciativas de PD&I, sendo que as atividades de serviços são frequentemente desarticuladas do mercado, dado que as organizações envolvidas, geralmente, não possuem fins lucrativos. A interação das atividades de mercado com a produção e/ou manufatura é evidente, mas menos proeminente com prestação de serviços, sendo ainda baixo o oferecimento de cursos, treinamentos, consultorias envolvendo bambus nativos de forma específica. Ainda que reduzida, há interação entre atividades relacionadas ao mercado com de produção para venda de colmos no atacado ou varejo, ou para o próprio beneficiamento e manufatura, visando principalmente usos locais e regionais, como cercas, estacas, palitos/varas e artesanatos. Os dados indicam, portanto, a existência de uma cadeia produtiva fragmentada e informal, sem um segmento de mercado independente da produção ou da manufatura.

Quanto à atuação no mercado, vale ressaltar os dados secundários relacionados às buscas em sites de vendas online, do qual foi possível identificar que há um mercado virtual para produtos confeccionados em taquaras e tabocas, os nomes populares mais comuns dos bambus nativos identificados nas buscas online. Na página de vendas Mercado Livre69, predominam anúncios de espetos e varas e artesanatos indígenas em taquara (Número de registros encontrados: 41670). Os produtos anunciados qualificados pelos nomes populares apresentaram-se, notavelmente, mais informais, sem embalagens de origem, sem possibilidade de acessar os vendedores de forma direta, sem marcas ou mesmo sem qualquer selo de referência às comunidades artesãs, sendo tratadas comumente de forma genérica como “artesanato indígena”, em comparação ao universo de oferta de produtos utilizando o termo de busca “bambu” (N° registros: 7066) – reforçando, ainda, a existência da oferta e do consumo de manufaturados diversos. A estrutura que se apresenta ao redor dos produtos confeccionados com taquara no mercado digital online é ilustrativa por, notavelmente, apresentar em um arranjo comercial com menos atravessadores, como se constatou também em contatos estabelecidos com vendedores pela CR que relatam conhecer e atuar em parcerias com os produtores ou realizar “tudo de forma própria” (da obtenção dos colmos à manufatura e comercialização). Essa transversalidade foi verificada também nas iniciativas do setor

69 Consulta no site Mercado Livre. Disponível em: <www.mercadolivre.com.br>; Acesso em: 22 jan. 2016. 70

Contudo, pela dificuldade de exclusão, incluem-se também vendas eventuais de imóveis em localidades com toponímias relacionadas à “taquara”.

produtivo, com múltiplas atividades que vão da concepção do projeto, passando pela colheita em campo ao beneficiamento e venda de peças.

Parte expressiva das iniciativas possuem atividades vinculadas à prestação de serviços realizada por organizações de PD&I, predominantemente públicas (21, dentre as 45 entrevistadas; 124, dentre as 222 confirmadas no levantamento nacional) (Figura 8A, B). A importância das iniciativas de PD&I sobressai no que tange aos bambus nativos, sendo trabalhado por todas as iniciativas entrevistadas do levantamento nacional (exceto uma), através de investigações científicas, cursos e treinamentos, palestras, e secundariamente assessoria, desenvolvimento de projetos e promoção do desenvolvimento da CPB no país. O ensino realizado pelo setor PD&I traz o grupo enquanto componente florestal em aulas e palestras de nível técnico ou superior, difundindo conhecimentos sobre o recurso, ainda que de forma pontual e restrita. Predomina a abordagem no ensino em botânica e/ou ecologia no contexto de formação acadêmica. As iniciativas com prestação de serviços problematizaram que atividades se encontram em processos de estruturação inicial, ou que são interrompidas pelas demandas serem pontuais e descontínuas. O retorno financeiro foi descrito como nulo ou insignificante pelas iniciativas que prestam serviço, sendo inclusive relatado o oferecimento de palestras, consultorias e assessorias de forma gratuita em prol do mercado e da cultura do bambu no país. A prestação de serviços também foi identificada no setor produtivo, inclusive com a realização de pesquisa, seja independente e/ou em parceria, formal ou informal predominantemente com universidades, além de consultoria, assessoria e divulgação. Parte das iniciativas de PD&I vinculadas a órgãos públicos apresentaram colaborações e relacionam-se a ações extensionistas junto ao setor produtivo para o aproveitamento econômico de espécies lenhosas, como em SP e no AC.

A

B

Figura 8. Principais segmentos de atuação das iniciativas que trabalham com bambus nativos. A.

Dados das 222 iniciativas do levantamento nacional (Setor produtivo n=98; PD&I n=124; incluindo iniciativas sediadas em outros países e redes). B. Dados das 45 iniciativas entrevistadas (22 do levantamento nacional e 23 do Acre).

Sobre a atuação na conservação e desenvolvimento, o Quadro 2 apresenta o número total de iniciativas em cada categoria, sendo emergente a importância de organizações de PD&I, governamentais e comunidades locais para a conservação. Contudo, no levantamento nacional, ações para a conservação de espécies nativas in situ, ex situ, a restauração e recuperação de ecossistemas naturais foram observadas em 131 iniciativas frequentemente sob sérias limitações à continuidade dos trabalhados e/ou demonstrando problemáticas sérias. O objetivo da conservação dos recursos nativos e seus ecossistemas não foi explicitado por participantes da CR dos dois setores atuantes na temática ampla do bambu, onde há maior ênfase às espécies exóticas, sendo visto por alguns como ponto passível de reflexão (n=3, dentre 10 entrevistados da CR).

13 13 1 2 20 3 12 6 2 6 20 1 1 118 4 0 50 100 150 Todos Todos exceto serviços Todos exceto beneficiamento Todos exceto produção Serviços Mercado Beneficiamento e mercado Produção e serviços Produção e mercado Produção e beneficiamento Produção de clar ado

Número de iniciativas confirmadas do levantamento nacional

S egm en to d e atuação das in iciativas (Cha ve de a ti vidade s) Produtivo PD&I Setor 10 9 8 8 10 10 10 11 12 2 9 2 0 10 20 30 40 50 D. Serviços C. Mercado B. Beneficiamento A. Produção

Número de iniciativas entrevistadas

S egm en to d e atuação das in iciativas (Cha ve de a ti vidade s) Produtivo (Nacional) Produtivo (Acre) PD&I (Nacional) PD&I (Acre)

Quadro 2. Iniciativas por categoria de atuação em conservação e desenvolvimento. Dados das

222 iniciativas confirmadas do levantamento nacional e 23 do Acre. As iniciativas do levantamento nacional demonstraram atuação em mais do que uma categoria em 84 casos e foram contabilizadas de forma independente.

I. Iniciativas voltadas à pesquisa (e.g. botânicas, ecologia, agrotecnologia, distribuição para zoneamento e diagnósticos produtivos) geridas predominante por órgãos de PD&I públicos federais e estaduais (Levantamento Nacional: 119; Levantamento no Acre: n=6).

II. Iniciativas voltadas à conservação integral: predomina o arranjo de unidades de conservação integral administradas por órgãos ambientais federais, estaduais e municipais e em áreas verdes de acesso restritos para a conservação in situ de espécies e ecossistemas nativos, sendo pouco expressivas as atividades diretamente relacionadas ao recurso (Levantamento Nacional: 6 - intenção declarada para conservação do grupo71; Levantamento no Acre: n=2).

III. Iniciativas voltadas à conservação e desenvolvimento: envolve produção florestal por comunidades locais predominantemente relacionadas, ou em parceria, com instituições de PD&I apoiadas por instâncias superiores e/ou governamentais (Levantamento Nacional: 46; Levantamento no Acre: 5).

IV. Iniciativas voltadas ao desenvolvimento social: produção florestal ou de plantios, manufatura artesanal para comércio local ou externo por produtores e comunidades locais predominantemente associadas a instituições públicas de PD&I (Levantamento Nacional: 108; Levantamento no Acre: 7). V. Iniciativas voltadas ao desenvolvimento industrial: relacionadas à implementação de polos industriais do setor madeireiro (para painéis mistos em bambu e bambu e madeira) e desenvolvimento da cadeia produtiva de bambu para maior atendimento do mercado (independente das espécies e origens: organizações em nível nacional frequentemente enfatizam espécies exóticas, com abertura relativa declarada aos nativos) (Levantamento Nacional: 27, inclui atuação mista com outros recursos e iniciativas em concepção ou interrompidas; Levantamento no Acre: 3, destacam-se pela ênfase da industrialização com nativas72).

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