• Nenhum resultado encontrado

CONCEÇÕES DOS ALUNOS E MUDANÇAS CONCEPTUAIS

No processo de ensino e aprendizagem é crucial que o professor (ou outro educador) tenha a preocupação de conhecer as conceções prévias dos seus alunos, as suas formas de pensar, de agir e as suas dificuldades, para orientar a prática pedagógica de acordo com um modelo de aprendizagem construtivista. Tal como Ausubel afirma “Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um

único princípio, diria isto: o fator singular mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele sabe e baseie nisso os seus ensinamentos” (Ausubel et al., 1980: folha de rosto).

2.5.1. As Conceções dos Alunos e o Processo de Ensino e Aprendizagem

A escola não se constrói a partir do zero, nem os alunos são uma “tábua rasa”, uma mente vazia. Quando chegam à escola as crianças sabem já muitas coisas, questionam-se e elaboram respostas que as satisfazem provisoriamente.

Na realidade, há já algumas décadas que a Psicologia se tem mostrado interessada no estudo teórico e empírico das representações do mundo da criança. Os primeiros trabalhos mais significativos nesta área foram preconizados nas décadas de 60 por Piaget (2000) e Ausubel (1980), contudo muitos outros autores se têm debruçado sobre este assunto, como é o caso de Vygotsky (1994), Driver (1989), Santos (1991), De Vecchi e Giordan (2002), Clément (2000 e 2006, cit. in Anastácio, 2007), Perrenoud (2000), entre outros.

Todos os autores expostos defendem uma ideia comum, na medida em que realçam a necessidade do processo de ensino e aprendizagem partir dos conhecimentos que os alunos transportam. Os autores citados têm mostrado que não é possível nem desejável menosprezar as

conceções prévias dos alunos, uma vez que essas conceções fazem parte de um sistema de representações que tem a sua coerência e as suas funções de explicação do mundo.

Neste sentido, Ausubel (1980) focalizou a sua atenção para a explicação do funcionamento das representações que o sujeito já possui, enquanto “estruturas de acolhimento” de novas ideias veiculadas pelo ensino formal. Para o autor, as conceções prévias adquiridas representam a verdadeira pedra basilar para a interiorização e compreensão dos novos significados.

Vygotsky (1994), nos seus trabalhos, defende que a criança aprende melhor quando é confrontada com tarefas que impliquem um desafio cognitivo não muito discrepante, ou seja, que se situe naquilo a que o psicólogo soviético chama de zona de desenvolvimento próximo. De acordo com esta teoria, o professor deve proporcionar aos alunos a oportunidade de aumentarem as suas competências e conhecimento, partindo daquilo que eles já sabem e levando-os a interagir com outros alunos em processos de aprendizagem cooperativa.

No parecer de Driver (1989) os novos conhecimentos, ao partirem das conceções prévias pessoais, orientadas por modelos de pensamento muito próprios, são considerados pelo indivíduo como sensatos, úteis e significativos, pois têm uma coerência interna.

De Vecchi & Giordan (2002), à semelhança de Perrenoud (2000), dizem que as representações/conceções têm alguma estabilidade e que a aprendizagem de um novo conhecimento depende das conceções prévias, pelo que se estas não forem consideradas tendem a perdurar e a tornar-se cada vez mais fortes, fazendo com que o novo conhecimento escape aos alunos. Este “escape” foi já detetado em diversas investigações realizadas em diferentes áreas, como a física (Driver, 1989) e a biologia (Pereira, 2004; Varanda, 2005; Sousa, 2006). As investigações provaram que um aspeto importante nas conceções prévias/alternativas é o seu caráter regressivo, ou seja, as conceções são representativas de esquemas que podem perdurar para além da aprendizagem formal, mesmo depois de os alunos terem aparentado que as ultrapassaram.

Na didática da biologia Clément (2000, 2004 e 2006, cit. in Anastácio, 2007), para explicar a construção das conceções, tem desenvolvido um modelo de interação que envolve três dimensões: o conhecimento científico, os sistemas de valores e as práticas sociais e profissionais, dos indivíduos, que no âmbito do nosso estudo são os alunos. Este modelo é designado por “KVP” (Figura 2.5.1.1) e tem sido construído com o intuito de analisar não só as conceções dos alunos, mas também as dos professores, dos investigadores e de outros atores do sistema educativo (Clément, 2006 cit. in Anastácio, 2007).

Figura 2.5.1.1: Modelo “KVP”

(As conceções como uma interação entre o conhecimento científico, os sistemas de valores e as práticas sociais).

[Apresentado por Anastácio (2007) com base em Clément (2006)].

O campo dos valores (V) integra as ideologias, crenças, opiniões, etc. O conhecimento cientifico (K) engloba o conhecimento académico, que se sustenta em bases sólidas e tidas como verdadeiras. As práticas sociais (P) do modelo de Clément (2006, cit. in Anastácio, 2007) são, perante a nossa investigação, os comportamentos manifestados pelas crianças, bem como as vivências/experiências vigorantes no meio familiar/sociocultural envolvente, no que à temática da sexualidade diz respeito.

Em suma, e concordando com a visão de Pestalozzi (1825; citado por Nogueira, s/d c:20), é

importante ter a consciência que “a criança desenvolve-se de dentro para fora” e, desta forma, a

função do processo de ensino e aprendizagem não se pode resumir a uma simples transmissão de informação. Assim, um dos cuidados principais de qualquer educador é respeitar os estágios de desenvolvimento pelos quais a criança passa, dando atenção aos seus conhecimentos prévios, às suas aptidões, ao seu sistema de valores, às suas práticas sociais e às suas necessidades.

2.5.2. A Mudança conceptual numa Perspetiva Construtivista

A teoria construtivista, considerada atualmente a teoria psicológica da aprendizagem pós- estruturalista mais corrente no campo da educação, permite que a aprendizagem se construa num processo “interpretativo e recursivo” (Doll, 1993; citado por Fosnot, 1996:53), na interação com o mundo envolvente.

O construtivismo, enquanto teoria psicológica, vê a sua origem no campo das ciências cognitivas, mais especificamente nos últimos trabalhos de Piaget, nas obras sociohistóricas de Vygotsky, nos trabalhos de Brunner, de Gardner, de Godman, de Wallon, entre outros que se debruçaram sobre o papel da representação na aprendizagem (Fosnot, 1996).

C