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2.3 Lealdade

2.3.1 Conceito de lealdade à marca

O conceito de lealdade costumar referir-se, em psicologia, a um apego entre pessoas, que se origina desde o nascimento, na relação entre mãe e filho, trazendo consigo a necessidade de proximidade entre os entes envolvidos. Dessa forma, a continuidade desse relacionamento conduz ao sentimento de cumplicidade entre as partes, criando-se, assim, uma relação de lealdade (OLIVER, 1999).

No contexto empresarial, o conceito de lealdade tem sido discutido por diversos autores, encerrando colocações e interpretações diferenciadas. Na visão do consumidor, alguns autores conferem à lealdade uma condição de repetição de compras de uma mesma marca (TELLIS, 1998), ou a associam a consumidores que consideram a aquisição exclusiva de uma mesma marca, com exclusão de qualquer outra marca substituta (NEWMAN; WERBEL, 1973). Ambos os conceitos exploram a satisfação do cliente em repetir a compra após uma experiência anterior.

Dessa forma, o tema tem sido intensamente pesquisado, possibilitando a presunção de que lealdade não está associada somente à satisfação do cliente relativamente à marca, produto ou serviço, mas que, nesse processo de decisão de escolha, outros fatores podem intervir como estímulo ao vínculo do consumidor com a marca/produto/serviço.

Dick e Basu (1994) reforçam o quão relevante é medir a lealdade em todas as suas formas, condições e dimensões, de modo a contribuir para o gerenciamento efetivo de marca,

produto, serviço e ou loja. Jacoby e Chestnut, em 1978 (apud DICK e BASU, 1994), aportaram novos condicionantes psicológicos ao estudo da lealdade. Em seu estudo, os autores põem em destaque que a lealdade ao produto só existiria se não houvesse um produto substituto com atributos semelhantes. Porém, para inferir melhor sobre o conjunto completo de motivações que influenciariam o consumidor a decidir sobre a escolha de uma determinada marca, seria necessário incluir outras variáveis ou aspectos antecedentes da lealdade, como: variáveis cognitivas (crenças e percepções sobre as características do produto), variáveis afetivas (sentimento de gostar da marca) e variáveis conativas (intenção de continuar comprando). Segundo os autores mencionados, o conceito prevalecente nas pesquisas sobre lealdade à marca tem sido submetido a uma substancial mudança na sua orientação e no redirecionamento quanto à forma de mensuração. Partindo de uma abordagem comportamental macro, gradualmente se procede à transição para uma compreensão predominantemente micro dos mecanismos cognitivos subjacentes ao comportamento de escolha. Se a lealdade à marca está para ser gerenciada e não apenas medida, será necessária a elaboração de uma descrição mais detalhada dos elementos cognitivos (JACOBY; CHESTNUT, 1978 apud DICK; BASU, 1994).

Dick e Basu (1994) desenvolveram um trabalho procurando avaliar os aspectos mencionados e acrescentando um novo elemento de análise, a “atitude relativa”. Eles introduzem esse novo aspecto como a avaliação de uma determinada marca em contraposição a outra marca, levando em consideração a influência das três variáveis ou aspectos. O modelo, representado na Figura 7, sintetiza a estrutura esquemática desenhada pelos dois autores.

Figura 7 – Um modelo esquemático (framework) de lealdade do consumidor Fonte: Adaptado de Dick e Basu (1994)

Nos modelos tradicionais, a atitude relativa é dividida em três categorias, a cognitiva (relacionada a informações sobre o objeto); emocional (relacionada às emoções em relação à marca) e “conativas” (relacionada à atitude perante a marca). O Quadro 3 traz a relação dos antecedentes da atitude relativa.

Quadro 3 - Antecedentes da atitude relativa

Aspectos Antecedente Descrição

Cognitivos

Acessibilidade Facilidade de um consumidor reter e acessar na memória uma atitude passada;

Confiança

Quanto maior for a confiança, maior será a probabilidade de que haja uma “atitude relativa” positiva em relação à marca;

Centralidade Associação entre a “atitude relativa” de um consumidor e os seus conjuntos de valores pessoais;

Clareza Ocorre quando o indivíduo considera uma marca como sendo a única aceitável.

Emocionais/ Emotivos

Emoções Fazem o indivíduo reter sua atenção em alvos específicos e modificam o seu comportamento.

Estado Emocional

O estado emocional influencia a fidelidade na medida em que ele melhora ou piora a acessibilidade, tornando o conhecimento associado ao estado atual mais presente na memória do consumidor. Norma Social Fatores Situacionais Atitude Relativa Repetição de Compra Antecedentes Afetivos: 1.Emoção 2. Estado emocional 3.Afeição primária 4.Satisfação Consequências: 1.Motivação para procura 2. Resistência à concorrência 3.Boca a boca Antecedentes Cognitivos: 1.Acessibilidade 2. Confiança 3.Centralidade 4.Claridade Antecedentes Conativos: 1.Custo de mudança 2. Custos irrecuperáveis 3.Expectativas

Afeto Primário É um estimulo que influencia a relação entre a atitude e o comportamento do indivíduo.

Satisfação

A satisfação exerce grande influência nos relacionamentos de fidelidade. proporcionando uma motivação maior para a recompra e aumentando a divulgação boca a boca.

“Conativos”

Custos de mudança

Relacionados aos custos incorridos quando se muda de fornecedor.

Custos não recuperáveis

São custos já incorridos e que não podem ser recuperados.

Expectativas

Refletem o ajuste entre as ofertas presentes e futuras do mercado e as necessidades dos consumidores (expectativas).

Fonte: adaptado de Dick e Basu (1994)

Oliver (1999) acrescenta um novo aspecto, inercial, caracterizando, assim, quatro modalidades de lealdade, consideradas pelo autor como fases: lealdade cognitiva, lealdade afetiva (emocional), lealdade conativa e lealdade inercial. Na ótica do autor, trata-se de um sistema (lealdade) subdividido em subsistemas nos moldes de fases, cada um dos quais incluindo o anterior. Dessa forma, a lealdade inercial compreende todas as demais presentes no sistema hierárquico das fases. O Quadro 4 apresenta as fases ou os subsistemas de fases do construto lealdade, descrevendo as características que identificam cada uma delas, acrescentando ainda suas respectivas vulnerabilidades.

Quadro 4 - As fases da lealdade Fases da

lealdade

Características para Identificação

Vulnerabilidades

Cognitiva Lealdade à informação (preço, atributos etc.)

Vantagens reais ou imaginárias das marcas concorrentes em termos de preço e atributos. Incentivos à procura de outras marcas (experimentação).

Afetiva Lealdade ao gosto (“eu compro porque gosto”)

Aumento da sensação de gostar da marca concorrente, mediante imagens e associações. Experimentação de outras marcas.

Desempenho declinante do produto .

Conativa

Lealdade a uma intenção (“eu tenho a intenção de recomprar”)

Contra argumentação persuasiva da concorrência.

Experimentação induzida (promoções em pontos de venda, amostras, descontos).

Inercial Lealdade a uma ação inercial, acompanhada de superação de obstáculos

Indisponibilidade do produto no mercado. Aumento dos obstáculos para a compra. Desempenho declinante.

Fonte: adaptado de Oliver (1999)

Contribuindo para a discussão sobre o construto lealdade, Sheth et al. (2001) consideram duas abordagens a respeito do assunto, as quais devem ser levadas em conta simultaneamente na construção da lealdade. A primeira, a lealdade comportamental, também descrita por Jones e Sasser (1995), refere-se a aspectos relativos ao comportamento de compra, ou seja, às marcas que as pessoas compram; a segunda abordagem, lealdade atitudinal, está atrelada à atitude em relação à marca, a saber, como as pessoas se sentem em relação às marcas.

No caso da lealdade comportamental, a mensuração da lealdade a marcas é feita segundo os seguintes elementos:

a) Proporção de compra: trata-se do quociente entre o número de vezes em que a marca mais frequentemente comprada é adquirida e o número total de compras;

b) Sequência de compra: diz respeito à constância em que o consumidor transita de determinada marca para outra, ou, mais especificamente, quanto tempo ele permanece com uma marca até passar para outra e quando retorna à marca anterior;

c) Probabilidade de compra: avaliação baseada no histórico de compra do cliente a longo prazo.

Na abordagem relativa à lealdade atitudinal considera-se a hipótese de o consumidor comprar a mesma marca apenas por conveniência ou por força de hábito, sem que, efetivamente, tenha preferência por essa marca comparativamente às outras. Sheth et al. (2001) admitem tratar-se de uma lealdade instável e influenciável por estímulos externos: se uma determinada marca concorrente oferecer um preço melhor, por exemplo, o cliente pode migrar facilmente para essa marca. Entretanto, a compra ocasional de outra marca não implica infidelidade do consumidor, pois a motivação para a migração pode estar ligada a um evento fortuito, como a indisponibilidade do produto que leva a marca preferida.

Em vista do exposto, infere-se que as pessoas podem apresentar um vínculo emocional com a marca de uma empresa e, a despeito disso, também se relacionar com marcas de outras empresas. E as razões que as levam a abandonar uma marca podem ser explicadas por uma multiplicidade de motivos: razões de caráter financeiro (como custo de oportunidade, preço mais baixo) e caráter emocional (insatisfação com aspecto do produto e serviço, experiência negativa, ou descontinuidade de uma marca).

Acrescente-se, ainda, que a lealdade é comumente construída e avaliada levando em consideração um longo horizonte temporal e sem a interveniência de eventos traumáticos que possam causar ruptura no relacionamento estabelecido entre cliente e empresa. Entretanto, uma questão a ser considerada seria a ocorrência de algum evento ou situação que pudesse alterar as condições em que se estabeleceram os vínculos entre as partes, provocando alguma ruptura no relacionamento e, consequentemente, afetando atitude e o sentimento de lealdade. Cite-se, por exemplo, o caso de fusão de duas empresas, cada uma das quais com suas marcas consolidadas e com clientes presumivelmente fidelizados. Eventos como esse, recorrentes em processos de fusão e aquisição, permitiriam indagar se a prevalência e a permanência de uma marca dominante, com consequente extinção ou perda de importância da marca da outra empresa, outrora concorrente, poderia trazer como um dos efeitos colaterais o estremecimento no relacionamento entre os antigos clientes da empresa que teve subtraída a marca e aquela que preservou sua marca, comprometendo o sentimento de lealdade daqueles clientes. Implicitamente, o raciocínio exposto conduz à formulação de uma hipótese sobre a influência dos antecedentes emocionais sobre a continuidade do relacionamento e, mais particularmente, sobre a influência da dimensão nostalgia, uma das variáveis integrantes dos antecedentes emocionais, sobre a lealdade à marca, em um cenário específico: extinção de marca como resultado de fusão/aquisição de empresas.