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5 A CONCILIAÇÃO E A MEDIAÇÃO DE DISPUTAS REPETITIVAS:

5.1 O TRATAMENTO ADEQUADO DE DISPUTAS REPETITIVAS

5.1.1 Atores

5.1.1.3 Conciliadores e mediadores

No Brasil, a maior parte dos programas judiciais de conciliação e mediação trabalha com conciliadores e mediadores voluntários, havendo alguns casos, como o estudado no CEJUSC-MG, em que esses conciliadores/mediadores são estagiários do próprio tribunal de justiça ou, ainda, servidores realocados na atividade dos centros de solução de conflitos, como ocorre no CEJUSC-Brasília. Já nos EUA, há uma gama bastante variada de arranjos de trabalho de mediadores: mediadores voluntários, funcionários do próprio tribunal (staff mediators) ou mediadores privados que constam de uma lista credenciada no tribunal (roster) e para quem processos judiciais são encaminhados.

Em um momento de discussões sobre o novo Código de Processo Civil e de regulamentação da mediação e da conciliação, no Brasil, convém refletir sobre possíveis formas de contratação e remuneração dos mediadores/conciliadores que atuarão na esfera judicial e acerca dos reflexos dessa escolha institucional. É pertinente, nesse sentido, a observação de Wayne Brazil e Jennifer Smith apontando a importância não só da qualidade dos terceiros que atuam em programas de solução de disputas anexos ao Judiciário, mas, também, do modelo de vínculo e remuneração escolhidos376, tendo em vista que a confiança da população no programa judicial depende de sua percepção acerca dos motivos e incentivos que levam essas pessoas a atuarem com solução de disputas377.

Como visto, foram suscitadas nas entrevistas algumas vantagens específicas dos staff mediators em situações envolvendo partes com desequilíbrio de poder de barganha, recursos ou informações. Como esses mediadores são vinculados ao tribunal, deles é exigida uma postura mais interventiva que vise a assegurar, na medida do possível, o equilíbrio entre as partes. Nesses casos, admite-se (chegando-se até mesmo a se estimular) que o mediador forneça informações à parte hipossuficiente sobre o processo ou solicite que a parte contrária que compartilhe informações sobre o caso. Ademais, esses mediadores acompanham o mesmo caso do início ao fim, mantendo uma relação de maior proximidade com as partes, o que possibilitaria também uma atuação mais interventiva378.

Além da forma de vínculo e remuneração, em se tratando de disputas repetitivas, convém indagar se o convívio entre mediadores e conciliadores com os litigantes repetitivos

376 BRAZIL, Wayne D.; SMITH, Jennifer. Choice of structures: critical values and concerns should guide format of courts ADR programs. Dispute Resolution Magazine, v. 6, p. 8-11, 1999.

377 Os autores trazem quatro modelos para prestação de serviços de solução de disputas: (a) o Judiciário emprega neutros por tempo integral (staff) – ex. Foreclosure Mediation Program of the Judicial Branch of the State of Connecticut; (b) Judiciário administra o programa e contrata organizações sem fins lucrativos que empregam neutros – ex. mediação comunitária administrada pelo Office of Alternative Dispute Resolution and Court Improvement Programs of the State of New York; (c) Judiciário contrata indivíduos ou escritórios para atuarem como neutros – ex. Foreclosure Settlement Program of the State Court of Indiana; (d) Judiciário administra services realizados por indivíduos voluntariamente – ex. Multi-door Dispute Resolution Division of the Superior Court of the District of Columbia; (e) Judiciário mantém lista de neutros (roster) ou determina que as partes indiquem neutros atuantes no mercado para atuarem no caso – ex. Complementary Dispute Resolution Division of the State Court of New Jersey. (BRAZIL, Wayne D.; SMITH, Jennifer, 1999, p. 9. Exemplos extraídos da pesquisa empírica cujos resultados são descritos no Capítulo 4). Pode-se afirmar que os programas visitados no Brasil seguem o modelo descrito no item “d”, dado que o trabalho realizado pelos mediadores e conciliadores é voluntário.

378 É necessário atentar para os riscos nessa atuação mais interventiva do staff mediator, tendo em vista as expectativas que as partes acabam muitas vezes tendo quando dentro do ambiente judicial e inseridas em um procedimento conduzido por um funcionário do Judiciário. Espera-se deste staff mediator que garanta a justiça do acordo, dando-se muito peso às sugestões e comentários realizados por este durante o processo. Esses riscos tem de ser mitigados mediante educação das partes quanto ao papel do neutro e a importância de sua autonomia no processo, restringindo-se, por outro lado, que as intervenções do mediador sejam realizadas de modo avaliativo, sempre se esclarecendo os papéis de cada um dos atores envolvidos na mediação (BRAZIL, Wayne D.; SMITH, Jennifer, 1999, p. 10).

no dia-a-dia do programa judicial afrontaria o dever de imparcialidade do mediador e do conciliador e como evitar que essa proximidade traduza-se em vantagens estratégias para o litigante repetitivo.

Segundo o Código de Ética instituído pelo Anexo III da Resolução nº 125/2010, a imparcialidade é o “dever de agir com ausência de favoritismo, preferência ou preconceito, assegurando que valores e conceitos pessoais não interfiram no resultado do trabalho, compreendendo a realidade dos envolvidos no conflito e jamais aceitando qualquer espécie de favor ou presente” (artigo 1º, inciso IV).

Nos EUA, o Uniform Mediation Act prevê que antes de aceitar uma mediação, o mediador deve perguntar às partes se há qualquer fato que poderia afetar a imparcialidade do mediador, incluindo interesses pessoais ou financeiros ou, ainda, qualquer relacionamento existente ou pretérito com uma das partes ou com interessados379.

Além das preocupações esboçadas nessas diretrizes éticas, foram levantada na pesquisa empírica a necessidade de se recrutar conciliadores e mediadores independentes, sem qualquer vínculo prévio, interesses pessoais ou financeiros relacionados com as empresas ou entes públicos que figuram como litigantes repetitivos nos programas judiciais. Também foi suscitada a possibilidade de se manter um rol rotativo de conciliadores e mediadores, para evitar que um convívio muito frequente com os litigantes mais habituais criasse situações de favoritismo. Finalmente, como já afirmado, a capacitação é tida como uma das principais formas de se conscientizar os conciliadores dos riscos dessa convivência com as partes e prepostos.