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O presente estudo teve como objetivo explorar e as perceções da satisfação entre uma classe profissional – técnicas de análise clínica - pouco estudada na literatura. Por outro lado, esta classe continua a ser pouco reconhecida no contexto nacional quanto ao seu contributo para o processo de diagnóstico e terapêutica de doenças. Mais em pormenor, o estudo visou comparar a satisfação destas profissionais em diferentes contextos de gestão – laboratório com gestão privada e laboratório com gestão pública.

Na literatura, a satisfação é reconhecida como uma atitude positiva consequente da avaliação que o indivíduo faz do seu trabalho, relativamente às suas preferências, necessidades e expetativas profissionais. No presente estudo a teoria base da satisfação foi o modelo das Características da Função de Hackman e Oldman. Este modelo assenta no pressuposto que os indivíduos podem ser estimulados e motivados por via da satisfação intrínseca que resulta do desempenho das tarefas (C. Ferreira et al., 2009). Para tal, Halckman e Oldman identificaram cinco dimensões diferentes que afetam o comportamento no trabalho e contemplam o estado psicológico dos indivíduos, as dimensões do próprio trabalho e as variáveis inerentes aos resultados: diversidade da tarefa, identidade da tarefa, significado da tarefa, autonomia e feedback.

Estabelecendo assim uma comparação entre as organizações, verificou-se que as colaboradoras do LL (grupo 1) e do LH (grupo 2) têm uma perceção clara de quais são as suas funções e responsabilidades. Logo quanto à dimensão identidade da tarefa deduz-se que as colaboradoras do LL estão mais satisfeitas que as colaboradoras do LH.

Relativamente à dimensão diversidade/variedade da tarefa, verificou-se que as colaboradoras do LL estão mais expostas a tarefas rotineiras do que as colaboradoras do grupo 2. De acordo com Ferreira (2009), quando os colaboradores realizam tarefas repetitivas e com baixa carga de trabalho, exteriorizam um sentimento de aborrecimento e baixa satisfação. Podendo assim equacionar-se que o grupo 1 quanto á dimensão em questão possuem menores níveis de satisfação relativamente ao grupo 2. No entanto, esta elevação da satisfação do grupo 2 torna-se perigosa para a gestão, visto que as colaboradoras podem atingir um estado de exaustão que pode conduzir a um défice de produtividade, apatia e desvalorização dos utentes (Coutinho, 2010; Rodrigues, 2011). Já no LL as tarefas repetitivas podem conduzir as colaboradoras a um comportamento de turnover perante uma oferta de emprego melhor quanto à variedade ou com um salário mais atrativo, visto que em situações de baixos níveis de satisfação o turnover parece apresentar uma relação elevada (Rodrigues, 2011).

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Avaliou-se a flexibilidade na gestão de tempo, progressão na careira, as relações interpessoais, remunerações, recompensas, promoções e o conhecimento dos objetivos e estratégias da organização, tudo subcategorias pertencente á dimensão do significado da tarefa. Nesta dimensão conclui-se que as colaboradoras do LL não estão satisfeitas com o sistema de remunerações e recompensas tal como acontece com as colaboradoras do LH. Conclui-se ainda que o grupo 2 de entrevistadas não se encontra satisfeito quanto à gestão das suas tarefas, visto que não são elas quem delineiam o mapeamento de execução das mesmas; afirmam, ainda, que as relações interpessoais são razoáveis de modo a permitir o convívio para execução das tarefas sem as prejudicar. No caso do grupo do LL, estas classificaram tanto a gestão de tarefas como as relações pessoais como boas e demonstraram envolvimento para com os objetivos da organização. Portanto, pode-se concluir que quanto à dimensão do significado do trabalho as colaboradoras do grupo 1 estão mais satisfeitas que as colaboradoras do grupo 2.

Nesta conclusão destaca-se ainda uma dimensão que se decidiu autonomizar (apesar de se poder ser enquadrada no significado da função) para a destacar e que se relaciona com o não reconhecimento das habilitações académicas das colaboradoras. Dimensão que foi apenas encontrada no grupo do LH.

Esta desvalorização pode orientar as colaboradoras na procura de outro emprego onde as suas formações sejam reconhecidas e respeitadas, isto é, pode conduzir à rotatividade e sentimentos de burnout (Lyons & Lapin, 2002).

Na dimensão autonomia, avaliou-se a capacidade de decisão, resolução de problemas, acesso a informação e controlo da tarefa. Nesta categoria, as colaboradoras do LL possuem capacidade de decisão e controlo na execução das suas tarefas, sentem-se capazes e autorizadas a resolver problemas que possam surgir; e possuem, ainda, acesso a todo o tipo de informação necessária tanto dos utentes como dos fornecedores e engenheiros técnicos. No caso das colaboradoras do LH a opinião da equipa foi divergente, o que pode significar que algumas colaboradoras possuem receios relativamente a um exercício autónomo da função. Tais receios assumem consequências para a organização a nível de desempenho e produtividade, visto que as colaboradoras tendem a decidir sem primeiro comunicar aos superiores o sucedido. Todavia, tal como o grupo 1 também possuem acesso a informação essencial para o correto desenvolvimento das suas funções. Parece assim ocorrer uma maior autonomia das colaboradoras do LL comparativamente com as colaboradoras do LH, o que pode ser explicado por estas últimas atuarem num ambiente mais centralizado e burocratizado.

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A dimensão feedback foi valorizada por todas as entrevistadas. Todavia se no caso das colaboradoras do LL a perceção assenta na falta de regularidade do feedback. Já no LH enfatiza- se que as chefias apenas recorrem a este tipo de transmissão de opinião na sua forma negativa. Algumas atribuem ainda um sentido pejorativo a esta atitude, afirmando que o fazem para diminuir o valor das mesmas. Outras visionam como algo positivo que as ajuda a crescer enquanto profissionais.

Neste sentido, o feedback para esta equipa de trabalho, apesar de o considerar importante, acaba por se constituir como um motivo de insatisfação.

Uma última dimensão encontrada foi as condições de trabalho.Esta dimensão não foi, todavia, considerada pelo Modelo das Características da Função. De acordo com as entrevistadas as condições do LL estão adequadas ao desempenho das funções em qualidade. Em oposição as condições do LH são um motivo de descontentamento e desconforto físico e psíquico. Estabelecendo assim uma comparação entre as duas organizações conclui-se que as entrevistadas do grupo LL não estão insatisfeitas com as condições de trabalho o que não se verifica com as entrevistadas do grupo LH.

Em súmula, o grupo do LL parece apresentar-se mais satisfeito comparativamente com o grupo do LH no que respeita às dimensões do significado da tarefa, identidade da tarefa, condições físicas e autonomia. Já o grupo do LH apresenta-se mais satisfeito que o grupo LL quanto á dimensão da variedade da tarefa. Conclui-se, ainda, que o grupo LH está insatisfeito quanto á dimensão de desenvolvimento de carreira. Quanto à dimensão do feedback verificou-se que nenhum dos grupos se sente de certo modo satisfeito.

Por conseguinte, de acordo com o pressuposto conclui-se que as colaboradoras do LL possuem menos dimensões de não satisfação o que permite inferir que relativamente às colaboradoras do LH encontram-se mais satisfeitas no trabalho.

Dado a conjuntura económica vivida atualmente em Portugal, também se pode supor que a satisfação em contexto de crise é diferente da satisfação em contexto de estabilidade económica, pois as pessoas percebem a atual situação como insegura e incerta o que as leva a aproximar as suas expectativas das características que definem a sua função e das condições que lhes são oferecidas pela organização.

O presente trabalho de investigação,vem assim contribuir para um melhor entendimento da satisfação do trabalho na classe profissional das técnicas de análises clínicas e para a

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necessidade de se ter em conta os contextos organizacionais em que estas atuam. Deferentes contextos de gestão parecem também, gerar diferentes respostas face à mesma função.

Por outro lado, o presente estudo espera ainda contribuir para que a gestão de cada um destes contextos possa desenvolver politicas e medidas de gestão de recursos humanos que permitam colmatar as limitações encontradas e potencializar as dimensões positivas no que concerne à promoção da satisfação junto das suas colaboradoras. Isto é, tomando conhecimento das conclusões do presente estudo a gestão pode adaptar ou mesmo alterar algumas das suas políticas internas de forma a conciliar as necessidades e expetativas da organização com as das suas colaboradoras. Tais adaptações, podem passar por várias medidas: a) efetuar uma análise das funções e enriquecimento das mesmas; b), aumentar ou diminuir a variedade das tarefas; c), incentivar os colaboradores a eleger um líder da equipa que represente os seus interesses; d), efetuar atividades extralaborais que permitam dinamizar a ligação interpessoal das equipas, promovendo comportamentos de cidadania organizacionais, e) promover a confiança entre a equipa e os superiores em prol do incremento da satisfação intrínseca dos colaboradores e mitigar os fatores de insatisfação; f) e promover a formação de estilos de liderança junto das chefias que promovam o feedback adequado em função das situações e das expectativas das colaboradoras.

Por último, e antes de terminarmos este texto, apresenta-se algumas limitações do presente estudo e sugestões para futuras investigações

o Limitações e sugestões para estudos futuros:

Uma das limitações do estudo que aqui foi apresentado surge logo de imediato relacionada com o que era o seu objetivo inicial. O propósito inicial era estudar o empenhamento em paralelo com a satisfação. Infelizmente, por questões burocráticas relacionadas com uma das organizações não foi possível efetuar esta articulação. Contudo, o estudo do empenhamento das equipas seria bastante enriquecedor para compreender qual o verdadeiro posicionamento das colaboradoras face à organização, ou seja, avaliar se as colaboradoras permanecem na organização por necessidade, pelo desejo de nela permanecer, ou por um sentimento de obrigação.

Uma outra limitação deste estudo foi a falta de disponibilidade e os constrangimentos organizacionais encontrados durante a realização das entrevistas. Isto é, devido aos seus

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horários e atividades pós-laborais as entrevistas decorreram nas organizações em períodos de descanso das colaboradoras, apesar de as datas e horas das entrevistas terem sido estipuladas pelas mesmas. Tais circunstâncias levaram a que as entrevistadas manifestassem algum desconforto com o tema da entrevista (satisfação) e que fossem breves nas suas respostas.

Uma outra limitação relaciona-se com o tamanho diminuto do grupo de participantes em cada organização. Saliente-se que esta foi uma das grandes limitações do presente estudo, visto que as equipas de trabalho eram relativamente pequenas. No entanto, o facto de a investigadora pertencer uma das equipas de trabalho pode ter criado algum desconforto uma vez que estavam a falar com uma investigadora que era em simultâneo colega de equipa. Apesar de tudo permitiu à investigadora um conhecimento mais profundo das dinâmicas internas de trabalho no LL o que constitui por si um ponto positivo.

Quanto às propostas para futuras investigações, refira-se que a realização de um estudo quantitativo sobre a satisfação da classe profissional dos TAC poderia permitir obter resultados mais abrangentes e padronizados. Seria igualmente interessante relacionar a satisfação desta classe profissional com os estilos de liderança das chefias, e com os comportamentos de cidadania. Ou até mesmo relacionar a satisfação dos TAC com uma variável sociodemográfica, como pe. o género, visto que no caso da amostra em estudo as equipas de trabalho eram exclusivamente do género feminino.

Uma outra sugestão relaciona-se com o facto de se ter constatado que as entrevistadas não se referiram a questões relativas ao equilíbrio entre trabalho e família. Tal omissão parece merecer uma atenção acrescida em estudos futuros, uma vez que a literatura neste âmbito (G. G. Santos & Cabral-cardoso, 2002) refere que as mulheres tendem a relacionar a falta daquele equilíbrio como fator explicativo da sua baixa satisfação no trabalho.

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