• Nenhum resultado encontrado

5. Resultados

5.2 Aspetos Associados ao Recrutamento e Retenção de Mão-de-Obra

5.2.2 Retenção de Mão-de-Obra

5.2.2.2 Concorrência entre Empresas do Setor

Os participantes indicaram a concorrência entre empresas do setor em três dimensões: na intensa concorrência na procura de trabalho, nas margens de lucro praticadas no setor, na concorrência pelo produto e ainda em termos de práticas de concorrência desleal.

Seis participantes (P. 1, P. 4, P. 5, P. 6, P. 8 e P. 9) indicaram que, pelo facto de a procura de trabalho ser superior à oferta, as condições que as empresas oferecem vão se alterando constantemente com o objetivo de atrair motoristas. Esta concorrência, presente no mercado de trabalho do setor, é também um entrave à retenção dos motoristas.

“Há muita rotatividade. Acontece diversas vezes os motoristas saírem desta empresa para irem para outra empresa ou o contrário, e até saírem e regressarem. Vão conhecendo o mercado, as condições. A concorrência entre empresas é muito aguçada, basta aumentar um bocadinho que o pessoal vai logo (…) E a exigência é mesmo do motorista, ele vem cá conhecer as condições. Nós é que estamos a ser avaliados pelos motoristas” (P. 4)

“Eu vou recebendo diariamente vários CVs de motoristas empregados à procura de melhores ofertas. Como há muito camião e poucos motoristas, há um grupo móvel no mercado que trabalha para quem der mais e melhores condições” (P. 6)

“Se antes as pessoas se mantinham durante mais tempo e até se notava que havia algum tipo de reflexão, hoje em dia, as pessoas mudam muito rapidamente de empresa, por muito pouco, por 20/30€ mudam para outra empresa (…) Nota-se que agora as pessoas não são tão agarradas a vínculos. São mais agarradas àquilo que as empresas lhes podem proporcionar no momento, quer em termos de salário como de carga horária e de funções. A segurança do vínculo no futuro já não pesa tanto” (P. 8)“Falta gente no geral. Até porque a procura de trabalho é imensa. Se não conseguem aqui, conseguem em qualquer outra empresa. As empresas estão todas a recrutar porque não há motoristas. Os motoristas acabam por ir embora e as vagas surgem, o

54

ritmo de saída é superior ao ritmo de entrada. Tanto em termos de aliciamento por parte de outras empresas como reformas. Tivemos 2 motoristas a sair para a reforma ainda este mês (…) Pelo que tenho percebido, não há grandes diferenças nos valores globais. Há formas de pagamento diferentes. Há realmente empresas que pagam acima da média mas a maneira como pagam é um pouco diferente” (P. 9)

Os participantes (P. 4, P. 5, P. 6, P. 9) apontaram a necessidade de manter o setor competitivo, nomeadamente, em termos de preço do serviço oferecido, como um dos entraves a que as políticas de recrutamento melhorem. Neste âmbito, tendo em conta que o cliente pretende sempre o valor mais baixo pelo serviço de transporte porque a estratégia empresarial passa por diminuir os custos, o setor não consegue aumentar preços de serviço e, consequentemente, não consegue aumentar salários.

“A competitividade entre as empresas não permite [aumentos de salários]. Como há tantas empresas no mercado, os preços dos fretes são muito baixos. Há muita pressão em termos de preço de serviço. Tem a ver com o valor que o cliente paga pelo serviço que é esmagado. Muitas vezes a empresa não tem lucro. E tenta compensar. Não ganha na ida, tenta ganhar o preço no retorno com outra carga e outro valor (…) O setor não pode subir preços porque o cliente não pode pagar. O tecido empresarial quer vender o produto se oferecer competitividade. Qual é essa competitividade? Qualidade e custo. Os portugueses fazem bem mas barato. Se não for barato, a produção sai daqui. Este setor alimenta-se disso, da boa vontade e do empreendedorismo dos empresários que querem e têm necessidade de colocar os produtos lá. Como? Camião. Tem de ser sempre tudo o mais barato possível (…) É um setor muito selvagem. Não é como os autocarros. Não sei se teremos de abandonar o transporte internacional e ficar só com o transporte nacional. Se deixar de ser rentável, vai deixar de haver quem faça o serviço do transporte internacional (…) É um setor de atividade onde os custos fixos são muito elevados e periódicos: combustíveis, estrutura, manutenção, salários de motoristas. A estrutura tem de existir e ser constantemente alimentada” (P. 4)

“Há a concorrência. Podemos ter uma parceria excecional e de um momento para o outro, aparece alguém que faz por menos 10€ e lá se vai a parceria. É possível? É, porque eu analisei os meus custos e tenho de os reduzir. E isto é a realidade atual (…) Encontro as margens do setor todas aceitáveis, não vejo ninguém a ganhar muito dinheiro (…) Valores mais altos não são atingíveis. Mesmo que a nossa empresa quisesse pagar salários mais altos, fazemos umas contas e é incomportável. A barreira está no dinheiro. As empresas não podem pagar mais” (P. 6)

“Mas um dos nossos problemas é que as empresas já estão tão apertadas em termos de margens, está um mercado muito competitivo. As empresas começam a pensar o que devem fazer. Pelo que vejo, seria muito complicado para as empresas subirem salários, pelo menos uma subida que tenha impacto. Também depende do número de trabalhadores e da dimensão da empresa” (P. 9)

55 Uma das questões apontadas por quatro participantes com impacto nas práticas de recrutamento e retenção dos trabalhadores prende-se com situações de concorrência desleal no setor dos transportes rodoviários de mercadorias. Neste âmbito, os participantes apontam que este é um setor onde existem práticas obrigatórias e regulamentadas, não só referentes à área da gestão de recursos humanos como também no âmbito ambiental e de segurança rodoviária, que representam custos elevados para as empresas. Neste sentido, se há empresas que não cumprem com algumas das práticas, estão a ser isentas desses custos e, portanto, terão uma maior flexibilidade para melhorar aspetos ligados ao recrutamento de motoristas e/ou preços de serviço.

“E nós aqui na nossa empresa temos uma política de manutenção exemplar. Não vemos isso numa empresa de 5 ou 6 camiões. Sempre que um camião chega, vai à oficina, repara mesmo que sejam pequenas coisas. Mesmo para lavar os carros, é tudo dentro das normas, em todas as viagens, é estrutura. Estamos a assumir um custo que muitas empresas não têm” (P. 4)

“Tenho dúvidas que o CCT está a ser executado porque eu não vejo os preços a mexer no mercado e eu garanto-lhe que se o CCT estivesse a ser aplicado, os preços tinham que aumentar” (P. 6)

“O mercado dos transportes é competitivo e desleal (…) O CCT entrou em vigor em setembro de 2018 e se calhar metade das empresas de transportes não o estão a cumprir. Há muitas empresas que não têm os custos exigidos pela lei, seja de pessoal ou outros como manutenção de veículos, legislação ambiental, etc. e então conseguem praticar preços mais baixos (…) O CCT veio definir a bitola para todos. É preciso é que se cumpra de forma transversal e isso não está a acontecer. Se acontecesse, notar-se-ia logo nos preços praticados (…) Até na manutenção dos veículos devia haver muito mais fiscalização. Vê-se muitos sítios a lavarem os camiões na via pública o que é proibido (…) É mais uma desvantagem porque nós cumprimos, temos o custo e ficamos impedidos de ter preços mais competitivos que outras empresas que não cumprem” (P. 7)

“É um setor onde existe concorrência desleal. Uma empresa como a nossa, faz os descontos devidos, paga a horas, paga impostos, há muitas empresas que pagam ordenados acima dos nossos mas fazem descontos de ordenados mais baixos. São custos que se refletem na estrutura da empresa. Se nós pagássemos X ao motorista e fizéssemos descontos dos 630€ que é o ordenado base, teríamos muito menos custos e poderíamos incentivar de outra forma” (P. 9)