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5. Resultados

5.1 Considerações Gerais do Setor

Neste âmbito, os participantes foram questionados acerca da perceção que tinham em relação à existência de escassez de motoristas no setor e na empresa que representam; os participantes foram ainda questionados em relação às características da força de trabalho dos motoristas, tanto em termos de idade como escolaridade e género, assim como quais as características que procuram quando recrutam motoristas; interligado com a crescente procura de trabalho, os participantes referiram ainda aspetos ligados a mudanças do setor que têm influência no aumento da procura de pessoal; por fim, exploraram aspetos inerentes à profissão que influenciam as condições de trabalho e as tarefas dos motoristas. Desta forma, emergiram quatro categorias:

Figura 2 - Sistema de categorias 1 “Considerações do setor”

5.1.1 Escassez de Mão-de-Obra

Quando questionados acerca da sua perceção relativa a uma potencial escassez de motoristas no setor, a totalidade dos participantes identificaram-na como uma dificuldade atual.

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“Há 20 anos eram os motoristas que vinham ter connosco e agora é o contrário. A necessidade não é tanto do trabalhador, é mais do empregador” (P. 2)

“Existe falta de motoristas mas está devidamente camuflada. Não é uma falta de motoristas. O número de transportes aumentou significativamente (…) Isto porque: 1) nosso consumo aumentou 2) organização estratégica dos transportes” (P. 5)

“Eu comecei a sentir talvez há 7 anos, desde 2012. Já se ouvia falar da falta de motoristas mas a partir de 2012 é que começamos a sentir essa falta na nossa empresa.” (P. 7)

Apesar de todos os participantes assumirem que é uma realidade do setor, apenas seis veem como uma realidade dentro da própria empresa. Três participantes afirmam que tomam medidas com o propósito de precaver situações de falta de pessoal.

“No nosso caso não padecemos da falta de motoristas, a não ser quando há booms de serviço. (…) Temos cerca de 9% de motoristas a mais, trabalham como ajudante mas recebem como motorista. Temos de contemplar férias, avarias e absentismo.” (P. 5)

5.1.2 Características da Mão-de-Obra

De forma a caracterizar a força-de-trabalho da amostra estudada e conforme sugerido pela literatura e evidência empírica, os participantes foram questionados acerca da perceção que têm do envelhecimento dos motoristas. Neste âmbito, sete participantes identificaram o envelhecimento dos motoristas como um dos maiores problemas a resolver no setor.

“Temos trabalhadores cada vez mais velhos, raramente aparece um indivíduo com menos de 40 anos” (P. 1)

A subcategoria do envelhecimento foi apresentada nas seguintes vertentes: por um lado, a causa que lhe dá origem, nomeadamente a reduzida entrada de jovens no setor; por outro lado, nas consequências que daí surgem, sobretudo, ligadas à renovação do setor e à capacidade física dos profissionais que vão envelhecendo. Assim, os participantes destacaram as seguintes dimensões de análise: as reformas que têm aumentado e são uma fonte de retirada de mão-de-obra do setor; a dificuldade em formar novos trabalhadores e a dificuldade na substituição de conhecimentos específicos; com o envelhecimento dos trabalhadores, a adaptação à mudança, tanto na integração em novas empresas como na adaptação a novos procedimentos torna-se mais complexa; a importância da destreza física necessária à profissão; e o crescimento da exposição ao risco de acidentes de trabalho.

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“Se um motorista mais velho mudar de empresa, custa-lhe mais adaptar-se a outros procedimentos e serviços” (P. 3)

“Uma pessoa de mais idade começa a ter outros tipos de problemas: dores nas costas com as cargas, por exemplo, e isto reflete-se nos acidentes de trabalho” (P. 4)

“Uma preocupação que temos neste momento é o envelhecimento dos nossos motoristas. Tenho tentado contratar pessoal mais jovem para renovar a equipa. Sabemos que as pessoas estão a chegar a uma idade que vão sair e grande parte da experiência que os nossos trabalhadores têm vai desaparecer com a saída dos mesmos. Temos de formar novos motoristas. A verdade é que não existem novos motoristas a entrar no mercado” (P. 6)

“Temos 129 motoristas, 9 de baixa médica, 22 têm mais de 60 anos, 60 têm mais de 50 anos, 34 acima de 40 anos, só temos 3 motoristas abaixo dos 40 anos” (P. 9)

A partir dos dados quantitativos requeridos aos participantes, reuniu-se informação acerca das idades dos motoristas que trabalham nas empresas participantes assim como em relação ao género e habilitações escolares dos mesmos.

Assim, construiu-se o seguinte gráfico no qual obtemos a idade média dos motoristas em funções nas empresas participantes assim como as idades dos motoristas mais novos e mais velhos de cada empresa. Assim, a idade média dos motoristas ao serviço das empresas participantes neste estudo é de 45 anos, tal que a média do motorista mais novo se fixa nos 21 anos e do mais velho nos 66 anos.

Gráfico 4 - Representação gráfica das idades dos motoristas empregados nas empresas participantes deste estudo Fonte: elaboração própria

45 45 42 45 34 45 50 46 50 32 30 37 30 21 30 28 32 33 55 60 65 62 55 65 64 61 66 0 10 20 30 40 50 60 70 P. 1 P. 2 P. 3 P. 4 P. 5 P. 6 P. 7 P. 8 P. 9

Representação Idades Motoristas

35 Em relação à representatividade de mulheres nas empresas participantes, apenas duas tinham mulheres no serviço de motorista, sendo que tal representava cerca de 1% da força de trabalho dessas empresas. Relativamente aos níveis de escolaridade dos motoristas em funções nas empresas participantes, a média de seis das nove empresas do estudo fixava-se no 9º ano, sendo que nas restantes três empresas, a média escolar dos motoristas não ia além do 7º ano.

5.1.3 Mudanças no Setor

De forma a aferir a origem da falta de motoristas, é importante verificar as alterações na procura de trabalho do setor. Neste âmbito, a necessidade de preencher um certo número crescente ou decrescente de vagas de trabalho depende das variações da atividade do setor.

Foi referido, nesta investigação empírica, que há momentos de maior procura de trabalho, sobretudo ligadas ao turismo e regresso de emigrantes.

“Não padecemos da falta de motorista, a não ser quando há booms de serviço, sobretudo junho-agosto. São 3 meses em que o volume [de carga] aumenta cerca de 25%” (P. 5)

Um dos participantes referiu também que dentro do próprio setor dos transportes e como forma de responder às exigências do mercado, aumentaram as infraestruturas e centros logísticos e, consequentemente, a procura de motoristas, conforme a seguinte passagem:

“Nós estávamos habituados, há uns anos, a ter um único centro logístico que fazia a distribuição para o resto do país. Hoje em dia há muitos centros logísticos, com distâncias e tempos de trânsito mais curtos entre eles. (…) Ao criarmos estas plataformas, por um lado, temos um posicionamento mais avançado e, por outro lado, temos estas explosões de capilaridade (mais rotas). Se antigamente eu para fazer uma entrega na Covilhã, precisava de uma viagem de 3 horas, hoje fazemos o transporte Porto-Covilhã durante a noite e de manhã cedo está o distribuidor pronto para entregar tudo de manhã. Consigo ser mais eficaz do que há 5 anos. Isto começou a mudar de há 10 anos para cá. Se aumentam as plataformas, aumenta o número de meios. E quando se criam plataformas, multiplicam-se os funcionários, há criação de postos de trabalho para cobrir o máximo de área geográfica possível” (P. 5)

Os participantes P. 4, P. 5 e P. 6 apontaram ainda que as alterações na estratégia de gestão empresarial (das empresas em geral, e não apenas do setor dos transportes) como um dos fatores que fomentam o aumento de procura de recursos humanos no setor dos transportes em duas vertentes. Por um lado, os participantes referiram que as empresas

36 subcontratam cada vez mais a área da logística de transportes, enquanto que, há uns anos, eram as próprias empresas a assumir os processos de transporte.

“Antigamente as empresas tinham frota própria. E quando não tinham carga para os seus motoristas, eles eram empregados de armazém (…) Em vez de ter os seus meios, agora subcontrata. Foca-se no que lhe é importante” (P. 5)

Por outro lado, os participantes apontaram a alteração na abordagem das estratégias de aprovisionamento de stocks das empresas como uma fonte de aumento da procura do serviço de transportes, isto é, se antigamente, as empresas acumulavam mais stocks, atualmente, preferem ter stocks reduzidos e ter um fluxo de entrada e saída de mercadoria mais intenso o que aumenta a procura por serviços de transporte.

“Eu vendi agora 5 paletes e estas 5 paletes têm de chegar ao cliente em 2 dias. O poder do camião é esse, é a flexibilidade em tempo útil. O cliente não tem stocks, tem de estar sempre a entrar e a sair” (P. 4)

“Aqui a grande estratégia é de aprovisionamento. Quanto menos se encomendar, menos dinheiro tenho parado. Não há stocks. O drop size de encomendas diminui de ano para ano. Se antes alimentávamos um cliente com 6 paletes, hoje é só com uma mas vou lá todos os dias. O serviço de aprovisionamento é muito automático. E as empresas foram tornando-se cada vez mais eficientes, antes tinham um grupo de pessoas para descarregar ao longo do dia, agora os clientes exigem que as cargas lhes vão sendo entregues a horas predefinidas e em vez de terem um grupo de pessoas, têm uma só pessoa. Essa pessoa é muito mais produtiva e barata para a empresa” (P. 5)

5.1.4 Especificidades do Setor

De forma a compreender melhor as características da profissão, os participantes apontaram algumas particularidades inerentes ao setor dos transportes rodoviários de mercadorias que têm um impacto direto nos procedimentos de trabalho dos motoristas.

Dos participantes, três indicaram que o setor possui características que tornam difícil o seu rigoroso planeamento tanto em termos de serviço como das jornadas de trabalho dos motoristas. Os participantes referiram que o serviço do setor tem um carácter de imprevisibilidade significativo e depende do trânsito, da sinistralidade rodoviária, das condições meteorológicas, do surgimento de novas cargas, de avarias de outros veículos, entre outros, que impactam diretamente fatores como a sobrecarga de trabalho e o horário dos motoristas.

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“O negócio avança pelas cargas que vão aparecendo e têm de ser aproveitadas. Às vezes, o motorista é sobrecarregado porque ele até já estava de regresso, mas há mais uma carga e é ali ao lado e ainda cabe no camião… significa mais 1 dia extra fora para o motorista. E é isso que a empresa faz, à medida que as cargas vão surgindo, aproveitar quem está perto. Olhe um contraponto com o autocarro: é igual quer apanhe 10 passageiros ou 1 ou 0 (…) As rotas estão feitas, a previsibilidade é quase total. Só que é ordenado de fábrica” (P. 4)

“Por exemplo, antigamente havia fábricas inteiras só de senhoras. Porque ali não havia nenhuma variação. As pessoas entravam aquela hora, já sabiam quanto iam produzir e a que horas iam sair. Nos transportes isso não acontece. Eu com a mesma rota, com os mesmos clientes e com a mesma carga posso chegar aqui às 17h ou às 19h. Depende do trânsito, da sinistralidade, das condições atmosféricas, há aqui uma série de circunstâncias que nós não controlamos e, portanto, o horário é catapultado para a frente” (P. 5)

“Vivemos de consertar diariamente partidas, chegadas, cargas e descargas, tempos de trânsito, atrasos (…) É muito complicado e é um setor que não é estável mesmo em termos de trabalho. Muda muito. Se um camião avaria, temos de desviar outro para fazer esse trabalho e mudam todas as rotas” (P. 6)