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CONDIÇÕES DAS PENITENCIÁRIAS

No documento Crime organizado 3 (páginas 48-51)

Capítulo 2 – A função da pena e as condições dos estabelecimentos prisionais

2.4   CONDIÇÕES DAS PENITENCIÁRIAS

Com o progressivo aumento no número de presos, o sistema prisional está com déficit no número de vagas. Porém, somente a construção de novos presídios não pode ser o componente principal das políticas prisionais. A superlotação agrava as más condições sanitárias, sendo que a grande maioria das penitenciárias têm precárias condições de habitabilidade e faltam programas de

assistência médica, psicológica, social, educacional e jurídica. É frequente a impossibilidade de o preso ter condições para trabalhar ou estudar.

Em julho de 2006, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados divulgou um relatório22 que traz uma radiografia das péssimas condições das prisões do país, denunciando superlotação, agressões, torturas e impunidade dos acusados dessas práticas, falta de tratamento médico, falta de banho de sol, má qualidade da água e da comida servida, revista vexatória e ausência de autorização para visita, inexistência de assistência jurídica aos presos e insuficiência de programas de trabalho e de ressocialização.

A superpopulação carcerária dificulta as ações voltadas para garantir os direitos fundamentais, como, por exemplo, a educação, das pessoas presas. O que vê-se atualmente são estabelecimentos carcerários sem estrutura física adequada e com insuficiência de pessoal. A superlotação do sistema prisional cria uma demanda que os serviços e a infraestrutura lá existentes não são capazes de atender.

Lourenço traz o depoimento de um experiente agente de segurança que trabalhava em uma penitenciária:

Em 1983 é. 80, começo de 83, então, eu acho que nesse período havia mais disciplina, o sistema era voltado para uma recuperação do preso, havia melhor laborterapia, havia uma preocupação realmente, se ensinando o preso desde na hora da manhã, quando ele levantava ele tinha a preocupação de aprender a cuidar da sua roupa, da sua higiene pessoal, o respeito numa hierarquia como se diz. A valorização pelo trabalho; hoje não, hoje o sistema de um modo geral, tá tudo abandonado, né? Eu digo abandonado por falta de verba, tudo que você fala, tudo o que você sugere, tudo falta, falta isso, falta aquilo, exige-se as coisas, mas condição não tem, condição de trabalho hoje é péssima.23

Pode-se verificar que as atividades identificadas com a área de reabilitação, tais como a educação, assumem uma posição secundária. As

                                                                                                               

22 Disponível em: <http://www.prsp.mpf.gov.br/prdc/area-de-atuacao/torviolpolsist/Relatorio%20situacao% 20prisional%20-%20Comissao%20de%20Direitos%20Humanos%20.pdf>.

23 LOURENÇO, Arlindo da Silva. As regularidades e singularidades dos processos educacionais no interior dos presídios e suas repercussões na escolarização de prisioneiros: uma reativização da noção de sistema penitenciário. In: ONOFRE, Elenice M. C. (Org.) Educação escolar entre as grades. São Carlos: Edufscar, 2007, p. 58.

características dos presídios dificultam a ressocialização. Existe uma nítida superposição das ações de segurança e disciplina em detrimento de outras tarefas e atividades no interior das prisões.

As estruturas carcerárias, na maioria das vezes, são autoritárias, desumanas e opressoras. As prisões promovem violência e despersonalização do indivíduo. Logo que entram em uma penitenciária, os presos são informados sobre as “regras da casa” e, ao colocar o uniforme da instituição, o indivíduo começa a perder sua identidade e começa a se sujeitar aos parâmetros ditados pelas regras institucionais. Existe controle integral sobre os indivíduos, sendo todas as suas atividades diárias programadas segundo regras superiores. Toda essa rigidez provoca a desadaptação da vida livre e adaptação aos padrões e procedimentos impostos pela instituição. Pode-se dizer que prisões são instituições marcadas pelo isolamento e pelo trancamento, além da disciplina extremamente rígida e diuturnamente controlada pelos agentes institucionais.

Infelizmente, a situação do sistema prisional não é nova. Veja o texto escrito por Oliveira em 1978:

A dificuldade estaria em enfrentar e superar os obstáculos existentes e geralmente invocados como fatores decisivos que impedem a execução de um programa desse porte: superpopulação; carência de verbas; normas impostas pela Divisão Penal (segurança e disciplina) interferindo nas áreas de trabalho, ensino e religião; ausência de recursos humanos, qualitativa e quantitativamente; despreparo dos funcionários; má vontade e descrença geral quanto à possibilidade de recuperação do presidiário; escassas oportunidades de trabalho e de instrução; assistência médica deficiente, e assistência religiosa precária. 24

A principal tarefa da prisão deveria ser a transformação dos criminosos em não-criminosos. Porém, esse objetivo jamais será alcançado enquanto a instituição funcionar apenas como instrumento punitivo e de justiça criminal. As unidades prisionais priorizam a manutenção da ordem interna da segurança e da disciplina. A ressocialização parece algo distante e irrelevante.

                                                                                                               

24 OLIVEIRA, Marina Margigo Cardoso de apud TEIXEIRA, Carlos José Pinheiro. O projeto educando para a liberdade e a política de educação nas prisões. In: CRAIDY, Carmem Maria. Educação em prisões: direito e desafio (Org.) Porto Alegre: UFRGS, 2010, p. 14.

Assim, percebe-se que encontram-se inúmeras contradições no interior das instituições prisionais. De um lado, a privação da liberdade, a exclusão social, o estigma, o desvio, as celas, os muros, a rígida disciplina, a submissão quase completa do homem encarcerado. De outro, o sonho da humanização das prisões, das políticas públicas destinadas à população reclusa.

Infelizmente, na maioria dos casos, a prisão, longe de transformar os criminosos em gente honesta, serve apenas para fabricar novos criminosos ou para afundá-los ainda mais na criminalidade25. Raríssimas foram as vezes em que a cadeia conseguiu transformar criminosos em não criminosos. A prisão não consegue recuperar ninguém e, pelo modelo de organização e funcionamento, ela é, em regra, responsável pela produção de delinquentes. A prisão não reduz os índices de criminalidade, provoca reincidência, torna crônica a delinquência, agrava e organiza a ação criminal.26

No documento Crime organizado 3 (páginas 48-51)