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MEDIDAS ASSECURATÓRIAS

No documento Crime organizado 3 (páginas 101-107)

Capítulo 4 – O processo Penal, o Perdimento de Bens em Favor do Estado e as

4.2   MEDIDAS ASSECURATÓRIAS

A condenação no processo penal traz consequências para o réu, dentre as quais o pagamento das custas e despesas processuais e a obrigação de reparação do dano causado à vítima, quando for o caso, sendo uma das principais funções do processo penal assegurar uma proteção a todos os direitos da vítima, dentre os quais o de ter reparados os prejuízos decorrentes da infração penal.

A fim de resguardar os efeitos da sentença penal condenatória, o Código de Processo Penal (CPP) previu nos artigos 125 a 144 as chamadas medidas assecuratórias, as quais destinam-se a impedir que o réu desfaça de seu

patrimônio no decorrer da investigação ou da ação penal, evitando assim prejuízo que poderia resultar da demora na conclusão da prestação jurisdicional. Assim, as medidas cautelares processuais penais têm por objetivo resguardar os efeitos da sentença penal condenatória por meio da constrição de bens.

Por ser uma medida cautelar, não se busca nem a definição, nem a satisfação de um direito, sendo seu resultado sempre voltado para o processo e não para o direito material da parte. Como toda cautelar tem como características a instrumentalidade (pois serve à tutela do processo), a acessoriedade (sempre depende de um processo principal), a autonomia (seu resultado não depende do processo principal), a provisoriedade (tem duração temporal limitada) e a revogabilidade (pode ser revogada a qualquer tempo pelo Poder Judiciário).

Para sua concessão, é necessária a demonstração do periculum in mora74 e do fumus boni iuris. A aparência do bom direito pode ser demonstrada a partir dos elementos probatórios colhidos. Já o perigo da demora, apesar de não estar expressamente previsto nessa parte de legislação, é um requisito necessário para a concessão das medidas cautelares.

Assim, o nosso sistema jurídico aponta para a dupla responsabilização do agente delituoso, penal e civil ex delicto. A responsabilização penal se dá com a aplicação das sanções penais previstas nos respectivos tipos penais (multa e perdimento, por exemplo). Já a responsabilização civil ex delicto se caracteriza pela obrigação do criminoso em reparar o dano causado à vítima ou à terceiros.

As medidas assecuratórias previstas no CPP objetivam, além de resguardar a possível reparação do dano causado à vítima, o pagamento das custas e despesas processuais e o recolhimento da multa e outras sanções impostas em eventual condenação, também garantir que o réu não obtenha lucro com o crime através do perdimento de bens, direitos e valores, nos termos do artigo 91 do Código Penal (CP).

                                                                                                               

74 Segundo uma pesquisa realizada pela FGV/RJ, disponível em <http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={DFCCBE36-4D36-4650-B6DA-E68546FD1E4E}>. 62% dos magistrados exigem o periculum in mora para aplicação de medidas assecuratórias, enquanto 38% não fazem tal exigência.  

O objeto das medidas assecuratórias são bens, direitos e valores do acusado, dentre os quais pode-se citar aqueles que advieram como produto ou proveito da atividade criminosa e aqueles utilizados como instrumentos para a pratica delitiva. Deve-se lembrar, porém, que não somente os bens de origem ilícita podem ser objeto das medidas assecuratórias, mas também bens de origem não criminosa, como será exposto abaixo.

Vale destacar que as medidas assecuratórias não podem se converter em antecipação de condenação futura. Se o réu puder apresentar garantias idôneas de cumprimento futuro da obrigação, a permanência da constrição, apenas por presunção, certamente ofenderia o princípio constitucional da presunção da inocência, bem como que todas as medidas preventivas, repressivas ou instrutórias que invadam a esfera privada ou impliquem em restrições ao exercício de direitos de quaisquer pessoas devem ser adotadas sob estrito controle judicial da sua legalidade, necessidade, proporcionalidade com a gravidade da infração ou adequação. Sempre que possível, esse controle deve ser prévio. Para garantir esse controle, a pessoa presa deve ser imediatamente informada das razões da prisão e de qualquer acusação que lhe seja imputada, através de uma formulação rápida e inteligível.

Como será exposto detalhadamente mais à frente, a utilização de tais medidas é importante meio de combate ao crime, pois tenta reduzir as consequências da pratica delituosa, garantido que o réu não permaneça com as vantagens obtidas indevidamente por meio da conduta ilícita. Porém, as mesmas estão sendo pouco utilizadas atualmente, uma vez que os aplicadores do direito priorizam a aplicação das sanções meramente penais.

Outra colocação pertinente que se faça nesse momento é que, considerando que as medidas assecuratórias são fundamentadas no fumus boni iuris e que tem como objetivo a constrição de bens do réu, a nomeação do próprio réu como depositário do bem deverá ser evitada a todo custo, uma vez que permitirá que este continue fruindo das comodidades decorrentes de sua posse e, indiretamente, beneficiando-se com o crime.

As medidas cautelares em espécie são o sequestro, a hipoteca e o arresto, os quais serão abaixo expostos.

4.2.1 Do Sequestro

O sequestro é uma medida cautelar assecuratória que está prevista nos artigos 125 a 133 do CPP. Visa garantir o patrimônio do ofendido através da reparação do dano causado, bem como não permitir que o acusado tenha qualquer vantagem com a prática do ilícito.

Essa medida pode recair sobre bens móveis ou imóveis adquiridos pelo acusado com proventos da infração, ainda que tais bens tenham sido transferidos à terceiros. Importante nesse momento salientar que aqueles bens que sejam produto direto da atividade criminosa não devem ser objeto de sequestro, mas sim de busca a apreensão75. O sequestro cabe contra os bens que são proventos da pratica criminosa ou aqueles adquiridos de forma indireta pelo crime.

Para a decretação do sequestro não há necessidade de comprovar a autoria do delito, mas somente a suspeita de procedência ilícita do bem (não basta a mera presunção, sendo necessários indícios veementes da origem ilícita). Assim, não interessa quem está na posse do bem, mas somente os indícios de sua origem ligada à atividade criminosa.

O sequestro pode ser requerido a qualquer tempo, desde a fase pré-processual até a fase de liquidação sentença. Pode ser pedida pelo ofendido, pela autoridade policial, pelo membro do Ministério Público ou concedida de ofício pelo magistrado. Se o sequestro for decretado na fase pré-processual, o prazo para a propositura da ação penal é de 60 (sessenta) dias, prazo este que pode ser renovado.76

                                                                                                               

75 No caso de bens imóveis, ainda que produto direto do crime, caberá o sequestro e não a busca e apreensão, pela própria natureza daquela medida

76 De acordo com a mesma pesquisa anteriormente citada, realizada pela FGV/RJ, e disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?Team={DFCCBE36-4D36-4650-B6DA-E68546FD1E4E}>. 60% dos magistrados do Brasil respeitam o prazo máximo de constrição, enquanto 40% não o respeitam.  

Uma vez decretado o sequestro, se recair sobre bem imóvel, há a necessidade de inscrição no Registro de Imóveis a fim de evitar o desfazimento dos bens. Se bem móvel deve-se nomear um depositário, o qual poderá inclusive ser o próprio acusado. Porém, a nomeação do próprio acusado deverá ser evitada a fim de não permitir que o mesmo se beneficie dos proventos da atividade criminosa.

Nos termos do artigo 130 do CPP, ao acusado e ao terceiro de boa-fé caberão embargos, nos quais poderá ser discutida somente a origem lícita do bem, não sendo permitida a discussão sobre autoria e materialidade do ato criminoso. O terceiro de boa-fé deverá comprovar que não sabia da origem ilícita do bem. Vale ressaltar que o sequestro pode ser levantado com o oferecimento de caução por terceiro, pela extinção de punibilidade e pela absolvição.

Havendo sentença penal condenatória, o sequestro será liquidado pelo próprio juízo criminal, que promoverá a avaliação e venda dos bens sequestrados. O saldo será destinado ao lesado, ao terceiro de boa-fé, ao pagamento de multa e custas processuais e o remanescente será encaminhado ao Tesouro Nacional.

4.2.2 Da Hipoteca Legal

A segunda medida assecuratória prevista no CPP é a Hipoteca Legal, a qual está descrita nos artigos 134 e 135 do citado diploma legal. Ela tem por objetivo somente o ressarcimento do dano causado pela atividade criminosa e não o perdimento em favor do Tesouro Nacional.

A hipoteca é um direito real de garantia que recai somente sobre bens imóveis do acusado, não podendo recair sobre bens móveis. Pode atingir qualquer bem imóvel do acusado (mesmo aqueles de origem lícita), não somente aqueles adquiridos como produto ou proveito do crime. São escolhidos bens do patrimônio do acusado que possam garantir o ressarcimento causado pela pratica do ato delituoso.

Para a decretação da hipoteca, os requisitos são a certeza da infração e indícios suficientes de autoria. Pode-se ver que, diferentemente do sequestro, não há necessidade de indícios de origem ilícita do bem, porém há a necessidade de

que sejam demonstrados indícios de autoria, uma vez que essa medida assecuratória não tem como objeto os proventos do crime, mas sim qualquer bem imóvel do acusado que seja capaz de garantir o pagamento do quantum

indenizatório oriundo da pratica criminosa. Por esse motivo não é admitida a hipoteca de bem de terceiro.

A hipoteca pode ser requerida pelo acusado ou pelo membro do

parquet em qualquer fase do processo. Não há consenso quanto a possibilidade de ser requerida durante a fase inquisitorial, uma vez que um dos requisitos da hipoteca legal é a certeza da infração e pode-se entender que somente a denúncia traria essa certeza.

Uma vez requerida a hipoteca, a contadoria elaborará cálculo estimativo do dano. Com base nos laudos, o juiz arbitrará o valor da responsabilidade e dos imóveis designados na inicial e abrirá prazo de 2 (dois) dias para requerente e acusado para manifestação. Após as manifestações o magistrado poderá alterar o valor da responsabilidade. Apurado o valor, juiz determinará o registro da hipoteca dos imóveis necessários para garantir a responsabilidade. Se o acusado oferecer caução suficiente, o juiz poderá deixar de proceder a inscrição da hipoteca legal.

Havendo sentença penal condenatória, os autos da hipoteca serão remetidos para o juízo cível para execução do quantum indenizatório devido ao ofendido. Havendo saldo remanescente, o mesmo poderá servir para ser utilizado em execução de eventual multa aplicada e o pagamento de custas processuais, mas nunca para o perdimento em favor do Tesouro.

4.2.3 Do Arresto

O arresto está previsto nos artigos 136 a 144 do CPP, cuja finalidade é atuar de forma subsidiária à hipoteca legal, reforçando a garantia de reparação do dano. O objetivo da medida é tão somente assegurar a reparação civil posterior.

Em regra, o arresto recai sobre bens imóveis (preparatório para a hipoteca legal). Porém, se o acusado não tiver bens imóveis suficientes para garantir

o valor devido, o arresto poderá incidir sobre bens móveis. O arresto dos bens móveis somente é efetivado quando as demais medidas não forem suficientes. Se a reparação civil puder ser obtida somente com o sequestro dos bens proventos da infração não há necessidade de arresto de bens de origem lícita. O arresto pode ser efetivado sobre bem de origem criminosa ou não criminosa.

Os requisitos, procedimentos e legitimidade são idênticos aos da hipoteca legal, sendo o prazo estipulado pelo CPP em 15 dias. Costuma-se dividir o arresto em provisório e subsidiário.

4.2.3.1 Arresto Provisório

Considerando que a especialização da hipoteca legal pode demandar muito tempo, o que poderia permitir ao acusado dissipar seus bens com vistas a furtar-se da reparação civil ex delicto, o arresto pode ser decretado de imediato, objetivando assegurar uma futura execução sobre determinada coisa, estando sempre relacionado com quantia certa.

4.2.3.2 Arresto Subsidiário

Recai sobre bens móveis de origem lícita, quando o imputado não possuir bens imóveis, ou estes forem insuficientes para fornecer a garantia de uma futura e eventual reparação do dano.

No documento Crime organizado 3 (páginas 101-107)