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Capítulo 2: Economia política do compromisso climático

2.2 A proposta de condicionantes do compromisso climático

2.2.3. Condicionantes de curto prazo

Esse condicionante aparece apenas marginalmente como vetor de compromisso climático na literatura avaliada nessa pesquisa (EDWARDS E ROBERTS, 2015; MEIROVICH, 2014); no entanto, a análise dos casos destaca a sua relevância. O papel do líder climático faz referência à existência de algum agente individual poderoso que se torna fundamental para explicar o processo de estabelecimento de políticas climáticas. Na avaliação do impacto desse condicionante, utilizamos ferramentas qualitativas, analisando o processo de estabelecimento de políticas climáticas em cada um dos casos por meio de documentos públicos, entrevistas e a literatura disponível.

8. Perfil de inserção internacional

Como afirma parte da literatura (FRANCHINI E VIOLA, 2013; VIOLA ET AL, 2013; TOWNSEND E MATHEWS, 2013; EDWARDS E ROBERTS, 2015), em cada um dos países, a forma de inserção internacional, os interesses gerais de política externa e a estrutura de alianças externas têm impacto sobre as posições de negociação

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internacional de clima (particularmente na Convenção) e a dinâmica da política climática doméstica. Isto é, as características da inserção internacional condicionam o nível de compromisso climático nos países. Essa hipótese causal foi confirmada por diversas entrevistas.

Sabemos da complexidade desse tópico e somos conscientes da necessidade de aprimorar a análise, refinando o conceito de inserção internacional e os indicadores que permitam analisar seu comportamento. No entanto, considerada a natureza desse esforço de inferência causal, defendemos que é possível fazer e sustentar empiricamente a seguinte hipótese: duas características gerais da inserção internacional de cada país influenciam o seu nível de compromisso climático: o alinhamento com as regras do sistema liberal internacional e sua hierarquia e, o nível de protagonismo (ou ativismo) da política externa.

Como alinhamento com as regras do sistema liberal internacional utilizamos uma aproximação similar à aquela desenvolvida por Ikemberry (2011), no sentido da existência de uma rede de instituições internacionais que condicionam o comportamento dos países nas áreas de comércio, finanças, armamento, guerra e paz, etc, de forma mais o menos independente das características do agente (dimensão lockeana). O elemento hierárquico, ao contrário, destaca a existência de uma distribuição de poder assimétrica entre os atores estatais dentro desse sistema (dimensão hobbesiana), definido por Leis e Viola (2007) como de hegemonia das democracias de mercado.

Como protagonismo da política externa entendemos a disposição de um país de participar na definição de normas internacionais ou na redefinição da estrutura de poder internacional e; os esforços por manter uma imagem de prestígio alta na comunidade internacional.

9. Percepção de custo-benefício das políticas de mitigação

Uma das nossas hipóteses na parte 2 dessa tese afirma que os primeiros movimentos de mitigação nos países de maior compromisso climático – o México, o Brasil e, em menor medida, a Colômbia – se deram nas “low hanging fruits” da mitigação, isto é, naqueles setores em que o custo – econômico e político - era menor. Na maioria dos casos, isso derivou no “empacotamento” de medidas em andamento com efeitos mitigatórios não intencionais sob a categoria de políticas climáticas (MEIROVICH, 2014). Essa hipótese descritiva leva implícita uma hipótese causal, e é que os custos percebidos são importantes na hora de decidir as estratégias de mitigação – e, consequentemente, no nível de compromisso climático.

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Nessa categoria, o nosso foco está nas percepções dos governos em relação à mitigação, porque nessa primeira fase de políticas o envolvimento do setor privado é muito baixo, como evidenciamos na parte 3 dessa tese. A noção de custos envolve basicamente um cálculo econômico, mas também um cálculo político em relação à potenciais ganhos em termos eleitorais ou de imagem, e em relação à potenciais resistências às medidas de parte de setores políticos organizados (DOLSAK, 2001). Essa hipótese tem baseamento na literatura (DOLSAK, 2001; VIOLA ET AL, 2013; TORRES, 2013; MEIROVICH, 2014) e nas entrevistas realizadas ao longo dessa pesquisa.

Finalmente, cabe destacar que esse condicionante é diferente, embora tenha óbvia conexão, da categoria “capacidade de mitigação”. Como vimos, ela faz referência a certas características estruturais da economia que tornam a transição para uma economia de baixo carbono mais ou menos custosa. No caso de percepção do custo- benefício, ele se baseia num cálculo do governo – que pode ser afetado em diversos graus pela capacidade de mitigação estrutural da economia – feito em relação à certas medidas de política plausíveis de serem apresentadas como agenda climática.

10. Acesso a financiamento internacional

O acesso a fundos internacionais pode operar como um condicionante do compromisso climático, na medida em que altera o custo de oportunidade da transição para o baixo carbono. Essa hipótese é levantada por parte da literatura (EDWARDS E ROBERTS, 2015; MEIROVICH, 2014; RONG, 2010), assim como por especialistas entrevistados.

Utilizamos para medir o acesso, o próprio nível de recursos efetivamente acessado, a leitura dos especialistas para cada um dos casos e a literatura específica, quanto existir.

Merece aqui destaque uma palavra em relação ao papel de acesso à tecnologia, que aparece em alguma literatura junto com o financiamento como potencial condicionante do compromisso climático. No entanto, nem na literatura específica dos casos nem nas entrevistas esse fator foi destacado, razão pela qual não o incluímos na nossa proposta causal, seguindo a Lieberman (2005).

11. Percepção de vulnerabilidades

Os efeitos dos impactos negativos da mudança climática aparecem como condicionantes do compromisso climático em boa parte da literatura aqui analisada (DOLSAK, 2001; BUYS ET AL, 2007; RONG, 2010; EDWARDS E ROBERTS,

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2015), no sentido de que quanto maior a vulnerabilidade, maior o compromisso com a mitigação. No entanto, a forma de definir essa categoria difere entre os autores, alguns dos quais se inclinam por definições materiais – exposição física – e outros por definições mais sociais – percepções de risco. A definição de vulnerabilidade afeta os resultados da pesquisa em relação aos seus impactos sobre a ação climática.

No nosso caso, nos inclinamos por uma definição mais próxima do segundo grupo. No entanto, testamos os efeitos de três formas de vulnerabilidade sobre o nível de compromisso climático dos nossos países: exposição física aos impactos negativos do clima; percepção da opinião pública sobre a ameaça do clima e; reações políticas medidas em termos de existência e densidade de estratégias de adaptação. Acreditamos que essa última seja uma forma mais completa de avaliar o nível de percepção de vulnerabilidades de uma sociedade, porque envolve o posicionamento das elites políticas em relação ao tema e a sua eventual expressão em ações concretas.

Finalmente, achamos necessário fazer uma breve reflexão ao redor de dois condicionantes que a literatura sugere – e que operam como explicações alternativas – mas que nessa pesquisa escolhemos controlar.

Renda per capita

Existe certa evidência de correlação entre renda per capita e compromisso climático (STEVES E TEYTELBOYM, 2013; LAPECHELLE e PATERSON, 2013). Particularmente entre os países de menor renda, onde o nível de compromisso tende a ser baixo. Isso tem certa lógica, já que esses países acostumam ter limitados recursos econômicos, institucionais e, humanos para estabelecer políticas climáticas. Nesse marco, se justifica considerar a renda per capita como condicionante potencial do compromisso climático.

No entanto, na nossa pesquisa controlamos esse fator, na medida em que os países aqui estudados apresentam níveis de renda similar e, em todo caso, todos possuíram na última década a habilidade de estabelecerem políticas demandantes em termos de recursos – com algumas variações. O fato de eles investirem ou não em políticas climáticas, sob essa ótica, reflete mais uma opção política que uma restrição estrutural.

Exigências do desenvolvimento

A literatura e a experiência internacional destacam a influência da exigência de crescimento econômico como limite às estratégias de baixo carbono (EDWARDS e ROBERTS, 2015). Isso tem ficado claro tanto na dimensão global com o impacto que a

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crise de 2008 teve sobre a prioridade da agenda do clima quanto em casos particulares, incluídos alguns dos aqui considerados.

Ainda, Edwards e Roberts (2015) destacam de forma correta como a prioridade do desenvolvimento, em forma de crescimento e emprego, afetam o comportamento climático nos países da América Latina. A necessidade crescente de recursos para mitigação e adaptação passa a competir nas nações menos desenvolvidas com os recursos para moderar os males históricos da pobreza, o atraso e a desigualdade, de forma que a adaptação, a mitigação e o desenvolvimento tornam-se desafios simultâneos (CEPAL, 2009). A própria narrativa dos países aqui estudados sustenta essa hipótese.

No entanto, argumentamos que esse condicionante deve ser controlado para essa pesquisa porque, em boa medida, os países da nossa amostra privilegiam de forma absoluta o crescimento econômico e o emprego por sobre as exigências da descarbonização. Como veremos, nenhum dos países tem, até o momento, pagado custos econômicos ou políticos para reduzir emissões ou estabelecer estratégias de mitigação. De qualquer forma, incorporamos certas características do modelo de desenvolvimento sob o condicionante “capacidade de mitigação”.

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PARTE 2: Inferência Descritiva: compromisso climático nas potências latino-