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ANOS ENCARGOS EM CONTOS Nº MÉDIO DE EMPREGADOS 1967 24 132

4. Terceira fase – 1980 a

4.6. Conflitos laborais

Como atrás explicámos (Subcapítulo 3.9.2. Abril de 1974 e depois), não cabe fazer aqui a história pormenorizada das lutas e confrontos laborais na Casa Hipólito. Optámos por registar apenas alguns testemunhos públicos sobre esta temática. São memórias que, na aparente rudeza da linguagem político-sindical, evocam a dor e o sofrimento de dezenas de famílias que viram perigar o sustento dos seus.

Sabemos que, no período anterior ao 25 de Abril de 1974, houve movimentações reivindicativas relacionadas com o aumento do custo de vida e a necessidade de actualizar os salários. Dessas lutas chegaram-nos alguns ecos difusos de recordações dos trabalhadores mais antigos mas que não são datáveis nem quantificáveis. Encontrámos testemunhos destas lutas noutras origens. É o caso de um estudo com o selo da revista

Análise Social e disponível em linha.276. No quadro descritivo da situação laboral em Portugal nos últimos anos do regime da 2ª República, os autores enumeram exaustivamente os momentos de luta laboral, as empresas em que se deram, as suas características, as formas de luta e o conteúdo reivindicativo. Na pág. 311 referem concretamente a Casa Hipólito:

CASA HIP0LITO (Torres Vedras) — Metalurgia; 1200 [trabalhadores]; trabalhadores envolvidos: cerca de 900 (21-3-1974); duração: 1 dia e meio) /concentração; greve parcial / aumentos salariais; salário mínimo (6000$) /os trabalhadores comprometem-se a retomar o trabalho se a administração revir os aumentos anunciados dentro de 4 dias. A administração vai rever os aumentos.

Por seu lado, a CGTP, no texto narrativo da sua História, pormenoriza os momentos de luta dos trabalhadores antes do 25 de Abril. Em dado passo, recorda:

Entre Junho e Outubro de 1972, fazem greve os pescadores de Portimão, os assalariados de Alpiarça, os operários da Fábrica Leão, das Conservas Alva, da Préh, no Porto, da Casa Hipólito, em Torres Vedras, e os 4 000 trabalhadores da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP).

275 Cf. FCH, ESA, p.52.

276 Cf: Maria de Lourdes Lima dos Santos, [et al.] – As lutas sociais nas empresas… pp.279 e 311. [Cons. 5 Dezembro 2016]

São referências breves, resumidas, sem análise das circunstâncias particulares nem indicação de pormenores significativos.

Depois de Abril de 1974 o relacionamento entre os trabalhadores da Casa Hipólito e a Administração pautou-se pelo ambiente geral que se vivia em Portugal naquela época e de que já demos nota mais atrás. O episódio da “fuga da Administração” para Madrid, em 1975, é hoje recordado como uma peça quase anedótica exemplificativa do clima social que então se vivia. Das muitas pessoas com quem falámos, raras são as que se lhe referem e, quando o fazem, é entre sorrisos contrafeitos e meias palavras. Pouca importância lhe dão ou remetem-se ao silêncio, talvez para não recordarem o facto de que uma delegação de trabalhadores se deslocou de avião a Madrid onde foi pedir a Vasco Parreira que regressasse à fábrica. O que ele fez, retomando pacificamente o seu lugar.

Quando a empresa entrou no turbilhão de dificuldades dos anos oitenta, os primeiros atingidos foram os seus trabalhadores. Como atrás dissemos, havia antecedentes de luta reivindicativa que vinha dos anos 70, quando o Sindicato dos Metalúrgicos de Lisboa ganhou protagonismo na defesa da Contratação Colectiva de Trabalho. No entanto, a condição de operário/camponês que caracterizava grande parte da mão-de-obra da Casa

Hipólito impunha condições especiais de abordagem sindical, bem distintas do que se

passava na chamada cintura industrial de Lisboa – de que faziam parte o Barreiro, Seixal, Sacavém, Alhandra e Amadora. É certo que havia na Hipólito um núcleo de operários

urbanos – chamemos-lhes assim - mais combativo e intransigente na defesa dos direitos

laborais. Mas eram minoria.

Estas duas tendências tinham, naturalmente, representantes sindicais com perspectivas diversas: o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica do Distrito de Lisboa, ligado à CGTP – Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical; e o SIMA - Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Afins, ligado à UGT – União Geral de Trabalhadores. O primeiro vinha do tempo de Marcelo Caetano e reivindicava maior representatividade e combatividade; o segundo, criado em 1978, surgiu na sequência das intensas lutas político-partidárias pós 25 de Abril. Como é patente nos diversos comunicados que aqueles sindicatos iam editando a propósito dos momentos mais marcantes das lutas laborais, um e outro acusavam-se de divisionismo e de lesarem os legítimos interesses dos trabalhadores. Os testemunhos orais que recolhemos, embora não atribuam a essas lutas qualquer relação

com o descalabro da empresa, sublinham que houve confrontos ideológicos nefastos e com resultados negativos na abordagem das questões laborais.

Não nos compete fazer julgamentos. Registamos apenas o que hoje nos parece mais significativo nos conflitos laborais na Casa Hipólito. A primeira verificação é que eles se agudizaram com o progressivo afastamento de Vasco Parreira da vida empresarial. O mais grave, em meados de 1981, foi o despedimento de quatro delegados sindicais e os castigos laborais aplicados a outros dois277. Os delegados despedidos tinham mais de 16 anos de casa cada um – o mais antigo tinha 23 – e outro, suspenso por 12 dias, estava na casa há 33 anos. Segundo o comunicado da USTV, os motivos são “única e exclusivamente por estarem à frente da justa luta dos trabalhadores, em defesa do seu Caderno Reivindicativo.” Para a Administração as razões eram estas: “Elaboração de um caderno reivindicativo, a marcação de um plenário, o apelo à paralisação, os prejuízos causados pela greve e a falta de respeito pela administração”278.

Naturalmente, este acontecimento teve repercussões inevitáveis, não só na empresa como na comunidade local e nos meios sindicais mais amplos do Distrito de Lisboa279. O clima de moderação nas relações laborais, até aí habitual, alterou-se significativamente. A Administração parece ter-se fechado ao diálogo, optando pela confrontação. O caso, remetido a Tribunal, arrastou-se por cinco anos. O de 1ª Instância, em Torres Vedras, deu razão à Administração, mas o da Relação e o Supremo reconheceram razão às instâncias sindicais. Em 5 de Dezembro de 1986, o Badaladas publicava um comunicado dirigido “Aos trabalhadores e à população – Finalmente!”280, o qual começava assim:

Os 4 delegados sindicais retomaram os seus postos de trabalho às 8 horas da passada 3ª feira, dia 25 / 11 / 86, passados mais de 5 anos (29 / 7 / 81) de terem sido despedidos ilegalmente pale Administração da Casa Hipólito, S.A.R.L.

O Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 10 / 11 / 86, considerou nulo o despedimento, e como consequência a reintegração imediata dos delegados sindicais, nos seus postos de trabalho.

277 Comunicado da União Sindical de Torres Vedras (USTV), publicado no Badaladas de 4 de Setembro de 1981, com o título: A todos os trabalhadores – À população – A situação da Casa Hipólito.

278 Citação no artigo de 15 de Janeiro de 1982, no Badaladas, referido na nota seguinte.

279 Veja-se o artigo no Badaladas de 15 de Janeiro de 1982, P’ra variar, falemos da Polónia, em que M.D. [Joaquim Moedas Duarte] denunciava o que considerava arbitrariedade da Administração da Casa Hipólito; e o extenso comunicado do Sindicato dos Metalúrgicos de Lisboa, no Badaladas de 8 de Abril de 1983,

Aos trabalhadores da Casa Hipólito e à população, em que refere explicitamente e em pormenor as

circunstâncias do despedimento dos Delegados Sindicais na Casa Hipólito.

280 Comunicado do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica do Distrito