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Conselhos de cultura, patrimônio cultural e meio ambiente

Certamente, não faltam apelos, exemplos e legislação que motivem, provoquem e incentivem a participação dos cidadãos na vida pública e nas ações de governo, especialmente aquelas que lhes dizem respeito mais de perto.

Para que não se perdurem dúvidas, a Constituição Brasileira reforça a necessidade de participação da população, em diferentes dispositivos, mas deixa absolutamente claro o quanto é fundamental a participação em se tratando de Patrimônio Cultural. O Art. 216, §1º da Constituição, como alhures visto e aqui revisitado, é incisivo ao estabelecer que “O Poder

Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação” [grifamos].

Não se pode ter dúvidas: não é gratuito ou apenas força de expressão, que poderia estar tisnada por certo viés demagógico, a convocação à colaboração da comunidade. Parece clara a leitura do enunciado, que garante proteção a todos os Bens que estejam revestidos de valor cultural, mas igualmente, é possível entender como implícito – uma vez que da natureza da proteção pretendida na Constituição -, o compromisso inequívoco com o princípio da solidariedade intergeracional.

Aliás, esse sentimento solidário de que não se deve pensar num mundo e num ambiente como propriedade individual, de grupos ou de gerações, ou, então, continuar abraçando a ideia de que os recursos naturais postos à disposição do Homem são infinitos, indestrutíveis, inesgotáveis e infensos à degradação e poluição, encontra respaldo no imperativo constitucional do caput do Art. 225, ao precisar que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Assente nessas e em outras disposições legais e constitucionais, mas certamente – e com justificadas razões – também tendo presente as responsabilidades, direitos e deveres da cidadania comprometida, que formam e dão sustentação ao arcabouço de compromissos comuns que mutuamente assumidos delimitam contornos de civilidade e convivência recíproca em comunidades, há de prosperar, cada vez mais, a cooperação entre o Estado e a

sociedade, consolidando a participação dos diferentes segmentos sociais, sugerindo, formulando e executando políticas públicas que lhes dizem respeito e, no caso específico, voltadas à preservação e proteção do Patrimônio Cultural.

Inúmeras e diversas são as possibilidades existentes e ao alcance dos cidadãos para que possam dar sua contribuição à causa da preservação do Patrimônio Cultural. Faz-se referência àquelas que, de uma forma ou de outra, estão reguladas na Constituição ou em legislação própria. Além de que, uma ou outra, são abordadas separadamente, no decorrer do trabalho. Destacam-se, nas relacionadas por Marcos Paulo Miranda, as seguintes:

• Participação popular no processo legislativo, desde a fase de discussões até a aprovação final do projeto (audiências públicas);

• Iniciativa popular de lei (CF/88 – art. 61, §2º); • Referendo e plebiscito;

• Direito de acesso as informações públicas (CF/88 – art. 5º, XXXIII); • Direito de petição (CF/88 – art. 5º, XXXIV);

• Ação popular (CF/88, art. 5º. LXXIII); • Ação Cível Pública (Lei 7.347/85, art. 5º);

• Atuação direta do Terceiro Setor (ações desenvolvidas por organizações não- governamentais voltadas para a proteção do patrimônio cultural);

• Instituição de Reservas Particulares do Patrimônio Natural para o desenvolvimento de atividades de cunho científico, cultural, recreativo e de lazer (Decreto 1.922, de 5 de junho de 1966).

• Participação nos Conselhos Deliberativos do Patrimônio Cultural e demais órgãos colegiados dotados de poder normativo.

A participação nos Conselhos ou em outros organismos, existentes ou específicos, que fomentam o engajamento dos cidadãos nas causas comuns que afetam o cotidiano da sociedade tem sido cada vez mais incentivada; e seus resultados testemunham positivamente à importância desta cooperação. Ao se compreender e defender a existência de instâncias de participação, não como mero ranço de revide ou cobrança simplória, mas como organismo de proposições e protagonismo efetivos, é por que

a qualidade de uma sociedade se retrata em seus canais de participação, no sentido das oportunidades e processos atuantes nela que levam ao fenômeno participativo autêntico. Nossa sociedade se caracteriza pela obstrução, muitas vezes obstinada, de tais canais, ou pelo esvaziamento discursivo, tornando direitos transcritos em letra morta (DEMO, 1988, p. 97).

Além dessa qualidade que os canais de cooperação e parceria consolidam na sociedade, o autor destaca que a organização da sociedade civil se constitui na forma mais operacional de elevar a cidadania uma vez que se fundamenta na competência dos grupos e dos cidadãos, por sua representatividade e liderança, legitimidade conferida ao processo pelas bases e planejamento participativo auto-sustentado.

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Não há que se duvidar do importante papel que os Conselhos de Cultura, de Patrimônio Cultural e do Meio Ambiente – para nomear três realidades socioculturais profundamente interligadas – podem desenvolver no contexto do Município e para atender as demandas específicas, sem perder a visão de totalidade da Cultura e da vida. Não fosse por outras razões, que seja tão somente – e já é o bastante – para cumprir sua parte na busca de uma valorização, reconhecimento e vivência da identidade cultural comunitária. A identidade cultural comunitária é indispensável por que

Para deixar a situação de objeto, o sujeito necessita de identidade. Tal identidade é construída na história cultural da comunidade. Sem isto, não há comunidade, apenas um bando de gente. Nesse sentido, a identidade cultural é a parteira da participação, porque planta a fé do grupo em seu futuro, já que viveu um passado válido (DEMO, 1988, p. 99).

Em Santa Maria existem, além de outros, esses três Conselhos em funcionamento, com atuação em áreas afins da Cultura, do Patrimônio Cultural e do Meio Ambiente.

A Lei Municipal 3.999, de 24 de setembro de 1996 que, “Dispõe sobre a proteção do

Patrimônio Histórico e Cultural do Município de Santa Maria e dá outras providências”,

criou o Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural - COMPHIC – de Santa Maria. Seu Art.4º diz: “O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Santa

Maria é órgão de assessoramento, vinculado ao Prefeito por linha de coordenação, ao qual compete: a) – Inventariar e registrar os bens cujas características ensejam preservação; b) – Cadastrar os bens cujas características ensejam tombamento emitindo parecer fundamentado; c) – Apreciar, de ofício ou requerimento, a conveniência de tombamento, emitindo parecer ao tombamento fundamentado; d) – Proceder ao tombamento definitivo; e) – Encaminhar ao Prefeito para homologação, requerimento ou proposta de tombamento definitivo; f) – Articular-se com os demais órgãos da Administração Municipal para atendimento de suas finalidades e, especialmente, para fiscalização do cumprimento da Lei.

Criados na mesma data são o Conselho Municipal de Cultura – CMC - e o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente – CONDEMA. A Lei Municipal 4.166, de 26 de junho de 1988, “Cria o Conselho Municipal de Cultura e dá outras providências”. Por sua vez, a Lei Municipal 4.167, de 26 de junho de 1998, “Cria e Regula o Conselho Municipal de

Defesa do Meio Ambiente – CONDEMA – do Município de Santa Maria e dá outras providências”.

Integrando ou não Conselhos Municipais, pertencendo ou não a instituições de classe, partidos políticos, órgãos de governo, sindicatos, associações comunitárias, escolas, igrejas,

meios de comunicação, grupos culturais e artísticos e tantas outras instituições públicas ou privadas, os cidadãos – Mulheres e Homens – não podem ficar omissos ou refusar participação nas causas coletivas. Há um direito constitucional e “um verdadeiro dever de cidadania” (MIRANDA, 2006, p. 202) conclamando à participação popular para a preservação do Patrimônio Cultural Brasileiro. Por isso, reforça-se com veemência o apelo, sintonizado com Souza Miranda (2006, p. 202):

no que tange ao patrimônio cultural, os cidadãos devem deixar de lado a posição passiva de meros espectadores e beneficiários passando a colaborar ativamente para a sua promoção e preservação, reconhecendo a sua co-responsabilidade pela gestão dos interesses da coletividade.

Concorda-se com o autor acima, ressaltando que, a partir da conscientização da importância do Patrimônio Cultural, outras questões que envolvem a cidadania também sejam valorizados e se tornem objeto de preocupação constante dos cidadãos, da coletividade e do poder público.