• Nenhum resultado encontrado

3.16 Considerações acerca da reabilitação profissional

3.16.5 Considerações acerca das empresas de vínculo

No que diz respeito à receptividade das empresas com relação às perspectivas de retorno dos segurados em Programa de Reabilitação Profissional, 75% das terapeutas ocupacionais a avaliam como regular; 12,5% a consideram ruim, 12,5%, boa, sendo que nenhuma das participantes a avalia como ótima.

Nas entrevistas houve referências, principalmente: à reduzida cooperação das empresas para reabilitar seus funcionários, devida em grande parte à ausência de obrigatoriedade legal para reinseri-los em funções compatíveis; ao auxílio da Lei 8.213 – que determina que as empresas com mais de 100 funcionários devem ter de 2% a 5% do seu quadro de funcionários composto por pessoas com deficiência e/ou segurados reabilitados pelo INSS; à desvalorização das iniciativas de reinserção profissional por parte das empresas e de seus funcionários, por desconhecimento, despreparo e/ou desinteresse diante das situações dos funcionários afastados; ao desejo de realização de intervenções da terapia ocupacional dentro das empresas, contemplando desde o incremento das análises de postos de trabalho até uma atuação para conscientização sobre os processos de retorno de funcionários afastados, incluindo-se a Reabilitação Profissional.

A Reabilitação é uma mesa com 3 pezinhos: nós, segurados e a empresa. Muitas vezes a empresa é o pezinho que não contribui muito. Aqui (...) a maioria das empresas acaba atrasando todo o processo, a gente manda ofício, manda reiteração e a resposta nunca chega (...). A gente sente muita falta (...) de colaboração das empresas, que é parte fundamental, é do que a gente mais depende (E3, p. 6).

Para os dirigentes das empresas, se não houvesse essas legislações que protegessem o trabalhador, tivesse obrigatoriedade de contratação [referindo- se à Lei de Cotas], tivesse essas questões vinculadas ao acidente de trabalho, não haveria preocupação em reinserir o trabalhador e de oferecer outras condições de trabalho para ele (...). A gente vê que existe essa recepção do trabalhador, não só dos reabilitandos, mas das pessoas com deficiências, até o momento em que essa deficiência ou essa limitação (...) não está interferindo na produtividade do trabalhador e que a empresa não precisa fazer grandes modificações para receber essa pessoa (...). Tem a questão de responder à legislação, mas tem a questão de mostrar para sociedade que a empresa está tendo objetivos sociais também (E5, p. 27-29).

A empresa, por não ter obrigatoriedade, não reabilita, não oferece função; ou aquelas que oferecem uma função extremamente inadequada, ou até uma função (...) sem sentido, que não preenche a jornada toda de trabalho e acaba empobrecendo e vulnerabilizando mais ainda essa pessoa (E4, p. 7).

Tem FAP [Fator Acidentário de Prevenção], (...) essas coisas todas que estão deixando as empresas um pouco mais preocupadas, mas tudo isso dá para burlar. Já tem empresas contratando equipes inteiras de reabilitação, (...) então elas escondem, camuflam e a população acha “nossa, que empresa sensacional, eu posso fazer minha fisioterapia lá na empresa, olha que maravilha” – uma função que faz ter que fazer fisioterapia! (...) Algumas empresas estão se esforçando para não provocar lesões, mas mesmo assim provocam (...). São empresas, empresa visa lucro. (...) o empregador não está preparado para pensar o reabilitado como um ser produtivo, ele é um estorvo, um encosto. (...) Às vezes o cara tem uma limitação, mas vai se tornar produtivo em outra área, com outro foco e nem a empresa acredita nisso, nem o trabalhador e tampouco os colegas; os colegas se sentem lesados porque vão trabalhar mais, (...) os líderes são cobrados por produtividade, (...) essa cadeia sem fim de um cobrando o outro (E2, p. 8-9).

Quando há vínculo empregatício, a possibilidade de desempenhar uma função compatível nas empresas tem sido considerada pelo Programa de Reabilitação Profissional do INSS como a melhor forma de retorno ao trabalho. Pensamos, nesse sentido, que a aproximação com as empresas, conscientizando seus dirigentes e demais funcionários acerca da legislação pertinente, das situações pelas quais passam seus funcionários afastados e de suas potencialidades, bem como oportunizando a realização de treinamentos de reabilitação profissional em funções compatíveis, onde tais potencialidades possam ser percebidas concretamente, é fundamental para o retorno ao trabalho dos segurados em atividades nas quais possa existir satisfação de ambas as partes, funcionário e empresa.

Acreditamos, também, na necessidade de uma aproximação do Instituto com o Ministério Público do Trabalho e Emprego –, prevista pelo Manual Técnico que rege as ações do Programa, para notificação, em alguns casos, de situações vivenciadas pelos segurados, para que possam ser tomadas as providências cabíveis quando do desrespeito de seus direitos de trabalhadores, além da orientação para que procurem as Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego para informação e conscientização acerca desses direitos.

Para Antunes (2008), o direito ao trabalho deve ser defendido mesmo nas condições em que este se apresenta na sociedade contemporânea, pois estar fora do trabalho para as classes trabalhadoras, principalmente do Terceiro Mundo, significa estar em condições ainda piores do que as já vivenciadas no cotidiano do trabalho, visto não contarem com

instrumentos efetivos de seguridade social em seus países. Concordamos com isso e presenciamos as repercussões negativas que o afastamento das atividades laborais pode causar aos indivíduos. Tem-se, entretanto – como também coloca esse autor ao defender uma vida cheia de sentido dentro e fora do trabalho –, o desafio da defesa desse direito de maneira digna dentro do contexto da Reabilitação Profissional do INSS, em que se prioriza o retorno às empresas de vínculo como a forma mais efetiva de exercício desse direito, sendo a que mais se aproxima, hoje, de uma possibilidade de permanência no mercado.

Eu não acho que voltar para a empresa seja necessário, acho que é mais fácil, é o que mais tem garantia de emprego já que a gente não tem essa política de reinserção; teria que haver para a gente trabalhar com mais dignidade e a pessoa se qualificar em uma coisa de que gosta, sabendo que vai ser recolocada (E2, p. 34).

Verificam-se dificuldades de várias ordens, como as mencionados pelas entrevistadas. Além disto, não podemos perder de vista a lógica que direciona o mercado de trabalho, fundamentada na produtividade e na competitividade e na qual os indivíduos que adoecem e/ou se acidentam, perdendo parte de sua capacidade laborativa, encontram reduzidos espaços para permanência e/ou reinserção. Colocamos, então, alguns questionamentos: Que qualidade do retorno ao trabalho tem sido possível a partir das ações da Reabilitação Profissional, considerando-se, dentre outros fatores, a realidade do mercado de trabalho brasileiro? O Programa tem direcionado suas intervenções ao retorno para as empresas a qualquer custo ou tem sido possível buscar um exercício profissional digno para os segurados, em que eles reconheçam a possibilidade de construção de uma nova identidade profissional e sejam valorizados por aquilo que fazem?

Para Castel (2009), uma política que objetive controlar os efeitos da degradação da condição salarial e vencer o desemprego – e aqui ampliamos para a questão da reabilitação profissional que tangencia tais efeitos, visto que os segurados do INSS constituem uma importante camada salarial brasileira – não pode se apoiar exclusivamente na dinâmica das empresas e nas virtudes do mercado, sendo necessário o desenvolvimento de novas tecnologias de intervenção, distintas das ações com objetivo reparador, corretivo e assistencial, devendo haver um processo de tomada de consciência de que os problemas apresentados por alguns não devem ser interpretados como inadaptação pessoal, levando-se em conta as situações de emprego e as condições de vida dos indivíduos.

segurados em sua preparação para o retorno a atividades profissionais, diante da ausência de garantias e da insuficiência de mecanismos de facilitação tanto de sua reinserção quanto de sua permanência no mercado de trabalho. Sabem, também, que a insegurança e a resistência de alguns segurados com relação à participação no Programa envolvem questões que ultrapassam o universo e as possibilidades do INSS, e que têm pouco a oferecer diante de suas reais demandas. E, muitas vezes, por mais que interpretem os processos de retorno ao trabalho a partir da complexidade que lhes é inerente, compreendendo, ao menos em parte, os diversos fatores que lhes atravessam, encontram como a única possibilidade a atuação restrita ao indivíduo e às suas habilidades ou capacidades de adaptação a uma nova situação de trabalho.