• Nenhum resultado encontrado

NOVOS PROCESSOS DE PATRIMONIALIZAÇÃO DA STREET ART

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A identificação patrimonial dos bens simbólicos de uma determinada comunidade parece ser um proces- so absolutamente intrínseco. Também nesse contexto, à margem do que se vai verificando num contexto institucional, são os seus elementos que criam estratégias de preservação com o objetivo de manterem as suas memórias identitárias vivas. No caso em estudo, sendo o valor de uma intervenção profissional um problema, esta acaba por ser realizada pelos seus autores originais ou pela comunidade local, resultando, frequentemente, em repintes integrais ou atualizações estéticas (SHANK, NORRIS, 2008;12), como foram os casos referidos. Por outro lado, se tentamos preservar a obra original, esta pode ficar desatualizada e

372

deixar de estar enquadrada na comunidade, ela própria em constante desenvolvimento (WEBER, 2004). As questões levantadas por vários autores, defendendo que a preservação destas manifestações artísti- cas é concretizada por meios digitais, parecem não se aplicar nestes casos, em que a simbologia do local original prevalece sobre todos os outros fatores, sendo fundamental para a sua perceção simbólica. No caso do menino, além de se encontrar num local emblemático da comunidade, é um ponto de entrada na cidade, por onde passam muitas pessoas todos os dias. A localização da pintura em memória de MS Sna- ke, num espaço muito amplo, permite a sua visualização à distância, de vários locais diferentes, contribuin- do para reforçar a sua imponência e a impressão que nos deixa, bem como marcar a fisionomia do sítio. Por aqui se verifica que este tipo de manifestação artística tem sentido no seu local original, ficando des- contextualizada na fotografia, onde há uma limitação óbvia dos sentidos de perceção face à pintura no local (SANCHIS, 2015, 4).

A remoção física de exemplares de street art e sua introdução em contexto museológico, como forma de preservação, tem também sido realizada em muitas situações. Este tipo de procedimento quebra a ligação existente entre a arte e a vida do local onde esta se encontra, da qual surge uma relação que lhe dá sig- nificado, segundo Peter Bengtsen (2016, 423). De facto, pelos exemplos analisados, vemos uma vontade indiscutível na permanência do objeto simbólico na sua localização original.

Por outro lado, como sinal de protesto contra a gentrificação dos locais, bem como da remoção e venda de peças de street art sem a autorização dos seus autores, também temos vindo a assistir à cobertura de pinturas pelos próprios artistas. Foi isto que aconteceu em duas ocasiões com o artista Blue, em Berlim e em Colónia, onde tapou pinturas como meio de marcar uma posição (CORDERO, 2015). Neste caso, o próprio autor determinou o fim da sua obra (apesar de ela continuar a existir por baixo do repinte).

REFERÊNCIAS

A Agulha Inquieta. Post 30.08.2013. [Consulta: 09.02.2017].

http://luxgood.blogspot.pt/2013/08/a-agulha-inquieta-bordados-revolucao-e.html

ALVES, Alice Nogueira. Os Valores dos Monumentos: a Importância de Riegl no Passado e no Presente. In Encontro Patrimonialização e Sustentabilidade do Património: Reflexão e Prospectiva. Lisboa: Instituto de História Contemporânea (IHC), Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, s.d. (no prelo).

ALVES, Alice Nogueira. Emerging issues of Street Art valuation as Cultural Heritage. In Lisbon Street-Arte & Urban Creativity – International Conference. Instituto de História da Arte (FCSH/UNL) e CIEBA (FBAUL), 2014, pp. 21-27.

ARM. Our tribute to our tribe. And friends. O ranhoso V.2.1. Post. 23.03.2010. [Consulta: 09.02.2017]. http://www.fotolog.com/trams_former/61138663/)

AVRAMI, Erica, MASON, Randall, TORRE, Marta de la. Report on Research. In Values and Heritage Conser- vation, Research Report. Los Angeles: The Getty Conservation Institute, 2000. [Consulta: 10.05.2014]. https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/pdf_publications/values_heritage_re- search_report.html.

BENGTSEN, Peter. Stealing from the public. The value of street art taken from the street. In Routledge Handbook of Graffiti and Street Art. S.l.: Routledge, 2016, pp. 416-428.

BERDUCOU, Marie. Discussion Group Presentation, Science for Emerging Heritage: Recognizing and Adap- ting to Changing Cultural Heritage Values. In ICCROM Forum on Conservation Science, 16-18 October 2013. [Consulta: 08.05.2014]. http://forum2013.iccrom.org/wp-content/uploads/2013/10/EMER- GING_Berducou.pdf

BRAJER, Isabelle. Reflections on the fate of modern murals: values that influence treatment – treatments that influence values. In Theory and Practice in the Conservation of Modern and Contemporary Art – Re- flections on the Roots and Perspectives, ed. Ursula Schädler-Saub and Angela Weyer. London: Archetype

373

Publications, 2010, pp. 85-100.

CAMPOS, Ricardo. Porque Pintamos a Cidade? Uma Abordagem Etnográfica do Graffiti Urbano. Lisboa: Fim de Século, 2010.

- Carta de Cracóvia 2000 – Princípios para a Conservação e Restauro do Património Construído. [Consul- ta: 09.02.2017].

www.patrimoniocultural.pt/media/uploads/cc/cartadecracovia2000.pdf

CORDERO, Ester Giner. Propriedad intelectual y arte urbano. In Mural Street Art Conservation. Madrid: Edita Observatorio de Arte Urbano. N.º 3 (abril 2016), pp. 28-31. [Consulta: 10.02.2017].

https://issuu.com/observatoriodearteurbano/docs/mural__3

DIÓGENES, Glória. Artes e intervenções urbanas entre esferas materiais e digitais: tensões legal-ilegal. In Análise Social. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Vol 217, l (4.º) (2015), pp. 682-707. [Consulta: 09.02.2017]. analisesocial.ics.ul.pt/documentos/AS_217_a01.pdf

DIÓGENES, Glória. Entre paredes materiais e digitais: eternidade e efemeridade da arte. Post 10.06.2013. [Consulta 10.02.2017].

http://antropologizzzando.blogspot.pt/2013/06/entre-paredes-materiais-e-digitais.html

GAYO, Elena García. Street art conservation: The drift of abandonment. In Street-Arte & Urban Creativity Scientific Journal – Methodologies for Research. Lisboa: Urbancreativity.org. Vol 1 (1), 2015, pp. 99-100. [Consulta: 08.02.2017].

http://www.urbancreativity.org/journal-volume-1--2015.html

HARTOG, François, Tempo e Patrimônio – Temporality and Patrimony. In VARIA HISTORIA, Belo Horizon- te. Vol 22, 36, (Jul/Dez 2006), pp. 261-273, [Consulta: 21.05.2014]. http://www.scielo.br/pdf/vh/ v22n36/v22n36a02.pdf.

LOWENTHAL, David, Stewarding the Past in a Perplexing Present. In Values and Heritage Conservation, Re- search Report. Los Angeles: The Getty Conservation Institute, 2000, pp. 18-25. [Consulta: 19.05.2014]. https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/pdf_publications/values_heritage_re- search_report.html

MARTINS, Alexandra João. Graffiters ameaçam responder à destruição de pintura de Hazul. In P3 - Cultu- ra; post 25.05.2013. [Consulta 10.02.2017]. http://p3.publico.pt/cultura/exposicoes/8041/graffiter- s-ameacam-responder-destruicao-de-pintura-de-hazul

MENESES, Ulpiano. O campo do patrimônio cultural: uma revisão de premissas. In I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural – Sistema Nacional de Património Cultural: Desafios, estratégias e experiências para uma nova gestão. Vol. 1. Ouro Preto/MG: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2009, pp. 25-39. [Consulta: 10.02.2017]. portal.iphan.gov.br/uploads/publicacao/Anais2_vol1_ForumPatrimo- nio_m.pdf

PEARCE, Susan. The Making of Cultural Heritage. In Values and Heritage Conservation, Research Report. Los Angeles: The Getty Conservation Institute, 2000, pp. 59-64. [Consulta: 19.05.2014].

https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/pdf_publications/values_heritage_re- search_report.html

POHLAD, Mark. “Marconi repaired is ready for Thursday…” Marcel Duchamp as Conservator. In Tout-fait – The Marcel Duchamp Studies Online Journal. Vol.1, 3 (December 2000). [21.01.2014].

http://www.toutfait.com/issues/issue_3/Articles/pohlad/pohlad.html RIEGL, Alois. O Culto Moderno dos Monumentos. Lisboa: Edições 70, 2013.

RAINER, Leslie. The Conservation of Outdoor Contemporary Murals. In Conservation, The GCI Newsletter. Vol. 18, 2 (2003), pp. 4-9. [Consulta: 15.05.2014].

https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/newsletters/18_2/-

SAAVEDRA, Fernando Figueroa. Lo efímero y lo perpetuo en la marginalidad cultural del muro. In Mural Street Art Conservation. Madrid: Edita Observatorio de Arte Urbano. N.º 1 (agosto 2015), p. 10. [Consulta: 10.02.2017].

https://issuu.com/observatoriodearteurbano/docs/mural__1

SANCHÍS, Javier Abarca. Conservar o no conservar el arte urbano. In Mural Street Art Conservation. Ma- drid: Edita Observatorio de Arte Urbano. N.º 2 (dezembro 2015), pp. 4-5. [Consulta: 10.02.2017].

374

SHANK, Will, NORRIS, Debbie Hess. Giving Contemporary Murals a Longer Life: The Challenges for Mura- lists and Conservators. In IIC congress Conservation and Access. London, 2008. [Consulta: 25.02.2014]. http://www.incca.org/files/pdf/resources/SHANK_W_NORRIS_D_H_Giving_Contemporary_Mural- s_a_Longer_Life.pdf

SCHILLING, Jan. Preserving art that was never meant to last. In DW – Deutsche Welle, (07.05.2012). [Consulta: 08.05.2014].

http://www.dw.de/preserving-art-that-was-never-meant-to-last/a-15933463-1

THROSBY, David. Economic and Cultural Value in the Work of Creative Artists. In Values and Heritage Con- servation, Research Report. Los Angeles: The Getty Conservation Institute, 2000, pp. 26-31. [Consulta: 19.05.2014].

https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/pdf_publications/values_heritage_re- search_report.html

WEBER, John Pitman. Politics and Practice of Community. Public Art: Whose Murals Get Saved? In Mural Painting and Conservation in the Americas (2003). Los Angeles: The J. Paul Getty Trust, 2004. [Consulta: 13.05.2014].

https://www.getty.edu/conservation/publications_resources/pdf_publications/pdf/weber.pdf

AGRADECIMENTOS

A autora deste texto agradece ao Pedro Soares Neves todas as informações partilhadas que possibilita- ram a concretização deste texto.

375

O CHAFARIZ DE S. DOMINGOS: VENTURAS E DESVENTURAS