• Nenhum resultado encontrado

LISTA DE SIGLAS

3. O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DOS ADULTOS

3.1 CONSIDERAÇÕES QUANTO AOS ESTUDOS PÓS-FORMAIS

O enfoque pós-formal tem por objetivo expandir a teoria piagetiana referente ao pensamento formal pautando-se no pressuposto de que o pensamento do adulto distingue-se do pensamento do adolescente pela capacidade de aceitação e integração de variadas verdades, por vezes até incompatíveis, ou seja, pelo caráter

dialético em considerar simultaneamente contradições. Segundo esta posição teórica o pensamento do adulto adotaria uma perspectiva mais relativista, indo além do objetivo e lógico, incorporando o subjetivo e pessoal. Assim, as descrições do pensamento pós-formal fundamentam-se na epistemologia dialética e na epistemologia da relatividade, porém não deixam claro se a construção das operações pós-formais prescinde da passagem pelo estádio formal e nem mesmo se resulta em mudanças em nível estrutural de desenvolvimento.

De acordo com esta vertente, o pensamento pós-formal, iria além do pensamento objetivo e lógico, porém, sem negá-lo. Dentro desta perspectiva, o pensamento formal limitar-se-ia a ser útil aos sujeitos até o fim de sua adolescência, uma vez que permitiria classificar as experiências de forma estável e confiável. No entanto, segundo os teóricos pós-formais, seria insuficiente para lidar com as complexidades e compromissos da vida adulta, uma vez que determinadas experiências vitais, tais como, relações amorosas ou experiências espirituais, seriam inviáveis sem os componentes cognitivos do pós-formal. Sendo assim, de acordo com esta vertente, o pensamento realmente maduro implicaria a interação entre as formas abstratas e objetivas do processamento. Outra característica da abordagem pós-formal seria a compreensão, por parte do sujeito, de que o seu ponto de vista sobre determinado fato ou fenômeno, é apenas uma das muitas visões e de que o conhecimento não é necessariamente absoluto ou invariável (ÍÑIGO, 2003).

De acordo com Marchand (2002), teorias que visavam a expandir a abordagem piagetiana do pensamento formal, fundamentadas no pressuposto de que a principal característica que distingue o pensamento do adulto em relação ao pensamento formal do adolescente seria a aceitação e integração de diversas, e por vezes incompatíveis verdades, começam a surgir por volta da década de 70, com os trabalhos de Arlin, 1975, Basseches, 1980, Case, 1992, Commons, Richards e Armon, 1984, Commons, Sinott, Richards e Armon, 1989, Kramer, 1983, 1990, Pacual-Leone, 1990, Riegel, 1973, Sinnott, 1981, 1984, 1989, Sternberg 1984, dentre outros.

Tem-se então, as principais características do pensamento pós-formal, a saber: a compreensão da natureza relativista do conhecimento, a aceitação da contradição e, a integração desta contradição em sistemas mais latos de conhecimento. Estas características, quando analisadas criticamente, podem vir a

ser questionadas a partir da compreensão de que o estádio do pensamento formal não significa estádio de pensamento concreto, o que conduziria a uma absolutização do pensamento (MARCHAND, 2002). Ao contrário, o que acontece a partir da construção das estruturas formais do pensamento é que para além do pensamento concreto, absolutista, o sujeito pode alcançar o pensamento relativista, dialético.

Neste estádio, o sujeito procura dissociar os fatores visando a interpretá-los, tentando confirmar ou negar hipóteses.

Porém, trata-se de um processo dinâmico que vai sendo, aos poucos, construído pelo sujeito, ampliando sua capacidade de abstrair, generalizar, explicar e elaborar teorias. Isto significa que é capaz de deduzir hipóteses para além da realidade concreta, para além do que ele conhece na realidade e admiti-las como verdadeiras, mesmo sem a devida comprovação prática, como visto no subcapítulo 2.3.4 deste estudo. Inhelder e Piaget (1955) introduzem à teoria piagetiana o grupo INRC (transformação idêntica; inversa/negação; recíproca e correlativa) que pressupõe que, ao resolver problemas que requerem a coordenação de uma operação inicial com sua inversa, sua recíproca e sua correlativa, os sujeitos, além de se confrontarem com situações de contradições, são capazes de integrar essas contradições. Inclusive, a perspectiva piagetiana permite a construção de novas explicações a partir de uma lógica das significações.

As características apresentadas para a constituição de um novo estádio de desenvolvimento, para além do estádio formal, devem ser analisadas cautelosamente a fim de verificar se não tratam apenas da integração das operações, já apresentadas no estádio formal, em sistemas mais latos, uma vez que Inhelder e Piaget (1955) já afirmavam que “esta forma geral de equilíbrio pode ser concebida como final na medida em que não se modifica durante a vida de um indivíduo” (Ibdi., p.121). O que os sujeitos poderão construir a partir do estádio formal implica muitos desdobramentos possíveis, originários de uma determinada compreensão, não existindo limitações para o aperfeiçoamento e construção de conhecimentos novos. O que o sujeito poderá criar a partir do formal ultrapassa o real. As principais características do avanço do pensamento formal, já apresentados no subcapítulo 2.3.4 deste estudo, em relação ao operatório concreto são: a substituição da subordinação dos possíveis ao real do concreto e, agora, no

operatório formal, a subordinação deste real ao possível, a elaboração do raciocínio proposicional e o pensamento hipotético-dedutivo.

As variações nos níveis de pensamento dos sujeitos que, muitas vezes, nos darão indicativos de raciocínio inferior ao esperado, ocorrem devido a possibilidade do pensamento formal só se apresentar em situações que envolvam as especialidades dos sujeitos (PIAGET, 1970), ou seja, em que ele qualitativamente interaja mais. Deste modo a definição de desenvolvimento pós-formal poderia ser substituída por pensamento ou cognição do sujeito adulto (MARCHAND, 2002;

COOPER et al., 2010). Os sujeitos alcançam o estádio das operações ou estruturas formais por volta dos 11-15 anos podendo, em alguns casos, alcançar o pensamento formal em torno dos 15-20 anos de idade. No entanto, Piaget sugere que cada um alcançará este estádio de desenvolvimento em diferentes áreas, de acordo com suas aptidões e especializações profissionais, cabendo salientar que a maneira como essas estruturas formais serão utilizadas não será necessariamente a mesma em todos os casos (PIAGET, 1972).

Essas diferenças, aparentemente maiores no período do pensamento formal, ocorrem devido às diferenças nas interações dos sujeitos em campos específicos. A formação das estruturas cognitivas implica um conjunto de trocas e de estimulações do meio, porém os fatores endógenos e espontâneos – que envolvem os processos de assimilação e acomodação – da construção própria de cada sujeito, devem ser necessariamente considerados. E, de acordo com a teoria piagetiana, “todos os indivíduos normais são capazes de alcançar o estádio das estruturas formais em condições em que o meio social e a própria experiência ofereçam situações de estímulo necessárias para seu desenvolvimento” (PIAGET, 1972. p. 8).

O desenvolvimento do conhecimento não é definido apenas pelo meio ou exclusivamente pelo sujeito, mas sim pela interação entre estes. As diferenças entre os sujeitos ficam evidentes e justificam-se quando se compreende como visto anteriormente, que o sujeito estudado por Piaget é o sujeito epistêmico, ou seja, o sujeito nas suas melhores possibilidades, não significando que o sujeito real (o psicológico), aquele que está na sala de aula ou no comércio, por exemplo, aja necessariamente sempre a partir deste nível de pensamento. Vale ressaltar que no plano do funcionamento, ou seja, no plano psicológico, as diferenças são significativas. Sendo assim, o adolescente, ou mesmo o adulto ou o idoso, poderá

aprimorar seu pensamento em domínios específicos, mas em outros, em que não exerça a reflexão, poderá apresentar um pensamento similar ao de uma criança.

Como no caso do adulto jovem que acredita que o banco é um grande parceiro que zela pelo seu dinheiro e lhe fornece empréstimo, acreditando ainda que o banco possa ter prejuízo se não receber o pagamento das faturas na data prevista, por contar com um dinheiro que não entrou no dia esperado (COOPER; STOLTZ, 2008a).

Os estudos de Piaget, mesmo não tendo como foco a cognição do sujeito adulto, contribuem na compreensão do seu desenvolvimento cognitivo, uma vez que descrevem o processo de desenvolvimento de suas estruturas, principalmente no que se refere às estruturas formais do pensamento e aos fatores fundamentais ao desenvolvimento.

A maneira como os sujeitos entendem e atuam na sociedade está relacionada às suas representações. Um dos pressupostos deste estudo é que os participantes revelarão formas distintas de representações referentes aos processos de obtenção de lucro das instituições financeiras, conforme variação de idade, formação, profissão e, principalmente, conforme o tipo de experiência que tenham com o cartão de crédito. O próximo capítulo discorre sobre a construção das representações sociais e a forma como se relacionam ao desenvolvimento do conhecimento social.