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3 TRABALHO DOCENTE: O ISD NO BRASIL

3.1 A CONSTITUIÇÃO DO TERMO TRABALHO

Os estudos de Machado (2007), sobre a origem do termo trabalho, demonstraram que o primeiro sentido para esse conteúdo tem relação com o que se manifestou na Bíblia, sendo o trabalho considerado como um agir humano sobre a natureza, como uma fonte de sobrevivência dos seres humanos. Na Grécia e em Roma, essas atividades de subsistência eram realizadas apenas pelos escravos.

De acordo com Machado (2007), o termo trabalho só aparece nas línguas românicas no século XI. A atribuição de um nome e a valoração positiva quanto ao seu propósito surgem com as Reformas e a ética protestante, que além de pregar a palavra de Deus e exercer as atividades com a fé, valorizava a participação em

atividades sociais e econômicas que fossem contribuir para a sociedade e para as pessoas em particular.

Contudo, foi no século XVIII que houve a consolidação desse termo, conforme os discursos que ainda hoje encontramos. Isso foi possível através da organização do processo de trabalho fabril. Conforme Machado (2007), é nesse período que surgem algumas denominações, como a divisão entre trabalho produtivo e trabalho improdutivo. O primeiro referia-se ao trabalho doméstico, já o segundo, ao intelectual.

Essas denominações para o trabalho se mantêm ao longo do século XIX. No entanto, nesse período, surgem as ideias de Engels e Marx, que contrariam essa caracterização. Esses autores conceituam o termo “como atividade universal criativa, de expressão e de realização do ser humano” (MACHADO, 2007, p. 84). À medida que o sujeito realiza o seu trabalho, “vai descobrindo e desenvolvendo plenamente a sua própria realidade” (MACHADO, 2007, p. 84).

Dessa conceptualização, surge uma distinção entre o verdadeiro trabalho e o trabalho alienado. Conforme Machado (2007, p. 84), “o „verdadeiro trabalho‟ seria aquele que engaja a totalidade do humano e potencializa o desenvolvimento de suas capacidades”. Em outras palavras, são as atividades que fazem com que o sujeito cresça enquanto pessoa e profissional. Já o “trabalho alienado” refere-se “às formas históricas de sua realização concreta na sociedade capitalista e que [...] seriam impedimentos para a realização e o desenvolvimento do trabalhador” (MACHADO, 2007, p. 84).

Com relação ao processo de realização do trabalho, foi no século XX que a organização do trabalho industrial ganha os seus primeiros contornos, a partir dos estudos de Taylor (1965), que defendia uma ciência do trabalho, a qual seria composta por técnicas e procedimentos de análise e vistoria do trabalho realizado nas fábricas, do tempo destinado e utilizado para a atividade. Com essa proposta, buscava-se adquirir um controle sobre o trabalho, bem como, almejar uma maior produtividade e lucratividade.

Nos Estados Unidos, até o final da Segunda Guerra Mundial, eram realizados estudos a fim de selecionar pessoas capazes de desempenhar determinadas tarefas. Com essa prática, buscava-se uma maior produtividade com foco nas atividades que os trabalhadores poderiam desempenhar de forma satisfatória. Com

o pós-guerra, surgem novos modelos de pensar o trabalho que, de certa forma, se distanciam das práticas até então desenvolvidas nos Estados Unidos. Nesse sentido, para os pesquisadores da França “não se tratava mais de adaptar os indivíduos ao trabalho, mas de melhorar as condições de trabalho para esses indivíduos” (MACHADO, 2007, p. 86). Sob essa visão, surge a ergonomia de vertente francesa, que buscava compreender o funcionamento global das atividades humanas, valorizando as condições de trabalho dos indivíduos.

O que se pode dizer é que a ergonomia francesa surge em resposta aos protestos e as reinvindicações dos trabalhadores franceses. Esses protestos foram realizados a fim de que as práticas do taylorismo, até então vigentes, fossem modificadas, uma vez que sob essa dimensão as tarefas eram prescritas e os trabalhadores deviam realizá-las sem pensar no trabalho real e em fatores que pudessem interferir nesse trabalho.

A partir dessa nova visão de trabalho, surgem duas noções oriundas da ergonomia francesa, que são: o trabalho prescrito e o trabalho realizado. Essas duas concepções vigoram até hoje, mesmo que reelaboradas, uma vez que hoje muitas profissões consideram o trabalhador como verdadeiro autor e não como um reprodutor de tarefas.

Entretanto, a ergonomia francesa e outras tendências que foram surgindo ao longo dos anos não enfocavam, até o final da década de 90, a questão do trabalho docente. A partir desse período, surgem novas formas de pensar o trabalho e, com isso, um novo projeto de estudo, o trabalho docente. De acordo com Machado (2007), esse processo é objeto, inicialmente, dos órgãos governamentais, através de programas e documentos que orientam o ensino na escola e auxiliam na formação dos profissionais de ensino. Para exemplificar, no Brasil, é possível destacar os Parâmetros Curriculares Nacionais, criados no ano de 1998, a fim de auxiliar as práticas desenvolvidas pelos professores.

Enquanto emergiam as políticas governamentais, também surgiram movimentos de oposição a essas propostas, contrários a um trabalho prescritivo e adeptos a uma concepção que valorizasse o trabalho do professor e práticas de ensino centradas na realidade do aluno. Para Machado (2007, p. 90), a partir dessas reações, foi encontrada “na abordagem ergonômica um instrumento adequado para

enfocarem a complexidade da atividade educacional enquanto trabalho e o real funcionamento do professor enquanto trabalhador”.

A ergonomia francesa contribuiu de forma significativa para a reflexão sobre o trabalho do professor, sobre as reais circunstâncias que envolvem o seu trabalho. No entanto, essa teoria, assim como outras, passou a apresentar diversas definições provisórias para o que vem a ser o trabalho docente, sofrendo alterações conforme as atividades exercidas pelos profissionais de ensino.

Nesse quadro de possíveis definições para o trabalho do professor, o ISD tem buscado compreendê-lo levando em consideração a realidade dessa atividade e todos os fatores que estão envolvidos nesse processo. Nesse sentido, apresentamos, na seção seguinte, as pesquisas realizadas no Brasil, a partir da perspectiva do ISD, com enfoque no trabalho docente.