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A construção de uma dogmática ambiental frente aos Conceitos jurídicos

3.5 O DEVER DE CONTROLE NO DESENVOLVIMENTO E EXECUÇÃO DE

3.5.3 A construção de uma dogmática ambiental frente aos Conceitos jurídicos

A fixação da extensão e intensidade de um conceito atormenta, a todo o momento, o jurista. Se os conceitos jurídicos fossem só descritivos, o grau de indeterminação encontrar- se-ia reduzido ou mesmo desapareceria, porém, os conceitos normativos expressam ideias de valor, que variam no tempo e no espaço, como, por exemplo, os que tratam da lealdade, da boa-fé, da dignidade da pessoa humana, do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Não obstante, o Direito ao utilizar conceitos jurídicos vagos, fluidos, imprecisos, indeterminados, protege, invariavelmente, uma zona de conteúdo mínimo indiscutível.338

Isso não impede as Instituições, como o Tribunal de Contas e o Judiciário, na definição objetiva de tais termos, diante de casos submetidos a sua análise. Quando se fala em conceitos jurídicos indeterminados, não se quer com isso pensar em liberdade de escolha de valores. Conforme Forsthoff, a aplicação dos conceitos jurídicos indeterminados é sempre um problema de interpretação e não de escolha discricionária da realização de valores, e isso quer se trate tanto de conceitos normativos como de conceitos empíricos. Os conceitos jurídicos indeterminados significam, então, a dificuldade na descoberta da solução justa dentro da abertura objetiva da lei para a sua concretização, o que deverá surgir da interpretação

337 MAURÍCIO JUNIOR, Alceu. A revisão judicial das escolhas orçamentárias. Belo Horizonte: Fórum,

2009. p. 173

338 FERRARI, Maria Macedo Nery. Normas Constitucionais Programáticas: normatividade, operatividade e

normativa, pois, como bem ensina Eros Grau, interpretar é compreender os signos linguísticos339.

Andreas J. Krell já havia alertado que “nas últimas duas décadas, cresceu consideravelmente o número de autores germânicos que não aceitam mais a distinção rígida entre conceitos indeterminados e discricionariedade”. Segundo Krell, esses autores representam talvez a maioria. Assim, seria errônea a afirmação de vários autores brasileiros de que a posição que distingue rigidamente entre conceitos jurídicos indeterminados e discricionariedade refletiria a linha da „moderna‟ doutrina alemã.340

Além disso, menciona que „grau de envolvimento ideológico do intérprete-aplicador com o ideal de proteção do meio ambiente‟, vincula-se às normas programáticas (principiológicas) que tratam da proteção ambiental, assumindo uma função de vinculação ou direção interpretativo-discricionária341.

3.5.4 Uma adequada compreensão da discricionariedade administrativa frente à implementação de políticas públicas e a possibilidade de sua judicialização

Com os esforços advindos da evolução constitucional nas últimas décadas, as normas programáticas passam a ter uma dimensão exacerbada no cenário jurídico especialmente pelo fato de serem incorporados nas constituições os direitos sociais. Nessa nova dimensão dos direitos fundamentais, o Estado passa a ter um papel modelador da própria sociedade ao exercer funções que geram benefícios e vantagens aos cidadãos.

Inobstante as normas programáticas terem como conteúdo o fim a ser atingindo, sem a determinação da conduta a ser realizada, não existem dúvidas a respeito da supremacia e dos efeitos sobre as demais normas do ordenamento jurídico e sobre a atividade da Administração, na medida em que se trata de normas constitucionais (matéria abordada no item 2.5).

Nesse contexto, as normas infraconstitucionais e toda a atividade administrativa que conflita com elas são inconstitucionais e devem ser expurgadas do sistema por qualquer das

339 FERRARI, Maria Macedo Nery. Normas Constitucionais Programáticas: normatividade, operatividade e

efetividade, p. 207.

340 KRELL, Andreas J. Discricionariedade administrativa e proteção ambiental: o controle dos conceitos

jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004. p. 31.

vias de ataque, tanto no controle difuso como no concentrado. Este é o efeito mínimo que se espera dessas normas.

Também não são olvidadas as dificuldades estruturais dos países de Terceiro Mundo, para a concreção de políticas públicas que tornem reais e concretas as determinações constitucionais decorrentes das normas programáticas.

Por isso é relevante a discussão sobre a atividade jurisdicional na sindicância da discricionariedade administrativa, mesmo com todas as críticas que sofre, em especial àquelas contrárias ao ativismo judicial, ao decisionismo, à indevida ingerência e suposta afronta ao princípio da separação dos Poderes.

Ademais, a jurisdição administrativa exercida pelos TCs também alcança a análise da gestão pública com base na implementação de normas programáticas, cabendo aferir os limites de discricionariedade do gestor frente à implementação de políticas públicas com base nesses comandos.

O que não se pode perder de vista é que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário desempenham funções, que devem estar voltadas para a concretização do direito fundamental, ao meio ambiente sadio e equilibrado e a discricionariedade na escolha dos meios adequados à persecução do fim determinado, que não mitiga a obrigatoriedade da busca de sua finalidade.

Não se pode perder de vista que o Poder Discricionário, assim como os demais poderes instrumentais, existem para dar condição de serem implementados os comandos do Estado estabelecidos na Constituição Federal.

Poderes Administrativos são “o conjunto de prerrogativas de direito público que a ordem jurídica confere aos agentes administrativos para o fim de permitir que o Estado alcance seus fins”342

.

Nesse sentido, sendo um instrumento, um meio, jamais pode desbordar da fonte que lhe dá a razão de existir, que é a Constituição Federal. Portanto, é nela que encontra o seu conteúdo e também os seus limites.

Justen define a discricionariedade como

Solução jurídica para as limitações e defeitos do processo legislativo de geração de normas jurídicas. Por isso mesmo, é da essência da discricionariedade que a

342 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19. ed., Rio de Janeiro: Lumen

autoridade administrativa formule a melhor solução possível, adote a disciplina jurídica mais satisfatória e conveniente ao interesse público343.

[...]

Quando a lei configura a discricionariedade, também pode fazê-lo pela impossibilidade de selecionar abstrata e antecipadamente todas as alternativas disponíveis para resolver um certo problema. A discricionariedade pode resultar da consideração de que a disciplina de uma relação jurídica ou de um setor da realidade social deve fazer-se segundo critérios técnico-científicos, variando as soluções inclusive em face do progresso futuro. Ou seja, formular legislativamente um elenco de soluções admissíveis corresponderia ao equívoco de delimitar o exercício da competência discricionária ao conhecimento consagrado à época da edição da lei344.

A discricionariedade está intimamente ligada ao princípio da legalidade. Origina-se na lei, porém vai um pouco além da dicção legal. Ao mesmo tempo em que se origina da lei, ela serve para pluralizar a peremptoriedade do princípio da legalidade345.

Pazzaglini Filho conceitua a discricionariedade como

O dever-poder que tem o agente público, no exercício das funções públicas de sua competência, perante a liberdade de ação advinda da norma jurídica aplicável ou dos conceitos jurídicos indeterminados de valor dela constantes que não permitem, em caso concreto, a aplicação de uma medida ou solução administrativa única ou homogenia, de escolher, segundo os princípios constitucionais (em especial os da moralidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade) que regem a Administração Pública, a medida ou solução legal que melhor atenda ao fim público que defluiu da norma346.

O estado da discricionariedade legítima consagra e concretiza o direito fundamental à boa administração pública, que pode assim ser compreendido: “trata-se do direito fundamental à administração pública eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres, com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e comissivas”347. A tal direito

corresponde o dever de a administração pública observar, nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais que a regem. A discricionariedade não é destituída de limites. O que não tem limite é arbitrário. Ela pressupõe, necessariamente, submissão ao ordenamento jurídico como consagração do Estado de Direito. E esta submissão

343 JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002.

p. 516.

344 Idem., p. 518. 345

MARQUES NETO, Floriano Azevedo. Discricionariedade Administrativa e controle judicial da Administração. Boletim de Direito Administrativo. São Paulo, p. 460-464, jun. 2002.

346 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Princípios Constitucionais Reguladores da Administração Pública:

agentes públicos, discricionariedade administrativa, extensão da atuação do Ministério Público e do controle do Poder Judiciário. São Paulo: Atlas, 2000. p. 83.

347 FREITAS, Juarez. Discricionariedade Administrativa e o Direito Fundamental à Boa Administração

permite a sindicabilidade dos atos exarados com base em tal situação, na medida em que pode conflitar com o ordenamento jurídico estabelecido de forma ampla e harmoniosa com o contexto constitucional.

Para Freitas348, pode-se conceituar a discricionariedade administrativa legítima como

a competência administrativa (não mera faculdade) de avaliar e de escolher, no plano concreto, as melhores soluções, mediante justificativas válidas, coerentes e consistentes de conveniência ou oportunidades (com razões juridicamente aceitáveis), respeitados os requisitos formais e substanciais da efetividade do direito fundamental à boa administração pública.

E segue o autor

[...] Nessa ordem de considerações, mister apontar os dois principais vícios no exercício da discricionariedade administrativa. Ei-los:

(a) [...]

(b) o vício da discricionariedade insuficiente (arbitrariedade por omissão) – hipótese em que o agente deixa de exercer a escolha administrativa ou a exerce com inoperância, inclusive ao faltar com os deveres de prevenção e de precaução. Nessa modalidade igualmente patológica, a omissão – verdadeiro dardo que atinge o coração dos objetivos fundamentais do art. 3º da CF – traduz-se como o descumprimento das diligências impositivas. Para citar palpitante exemplo, tome-se o dever público de matricular crianças em idade pré-escolar na creche. Ora, não se pode deixar de fazê-lo, por mero juízo de conveniência e oportunidade, sob pena de cometimento do mencionado vício de discricionariedade insuficiente. A propósito – bem assinala Weida Zancaner -, a ausência de escolas públicas pode “gerar a responsabilização do Poder Público, pois a educação é um dever do Estado e um direito do cidadão. Impende, apenas, que os interessados provem que a ausência de uma escola pública, naquele bairro específico, causou dano a uma criança ou a um grupo determinado de crianças.349

Ressalta-se a potencialidade da ocorrência de uma discricionariedade insuficiente na ausência de implantação de ações protetivas ambientais, quando o meio ambiente exige uma postura proativa do Gestor e da Sociedade. A não realização de políticas públicas no gerenciamento da gestão ambiental caracteriza-se como um dano perpetrado contra a sociedade.

Como se preconiza, todos os atos administrativos, ao menos negativa ou mediatamente, são juridicamente controláveis, e os vícios de omissão também precisam ser combatidos de modo vigoroso e sem condescendência. Toda a conduta administrativa

348

FREITAS, Juarez. Discricionariedade Administrativa e o Direito Fundamental à Boa Administração Pública. 2. ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2009. p. 24.

(vinculada ou discricionária) apenas se legitima, por definição, se imantada pelo primado dos princípios constitucionais em conjunto350.

Desse modo, o controle substancialista e principialista precisa deitar raízes, entre nós, sem perpetuar o império do medo, que parece assaltar os administradores. Nas relações administrativas, doravante, o império necessário é o do direito fundamental à boa administração pública, que acarreta o aprofundamento (mais que a ampliação) da sindicabilidade dos atos administrativos351.

Na mesma linha de pensamento, o Poder Discricionário deve ser entendido como

preceitua o eminente Mestre Celso Antônio Bandeira de Mello352, como um dever

discricionário, uma vez assentindo que os poderes são meros vínculos instrumentais para propiciar ao obrigado cumprir o seu dever.

Conforme preceitua Flores de Moraes353,a discricionariedade é um mero instrumento

para o Administrador exercer a sua atividade, escolhendo a melhor solução para o caso concreto.

A toda evidência deverá o ato submeter-se aos demais parâmetros estabelecidos no ordenamento jurídico de uma forma sistematizada, ou seja, deverá haver a confrontação do ato com o estabelecido na Constituição Federal, em especial no princípio da Legalidade considerado em sentido amplo, pois, do contrário, não estaríamos falando de discricionariedade, mas sim de arbitrariedade.

A margem de liberdade para a decisão do Gestor resulta do ordenamento jurídico. E a legitimação da decisão deverá restar estabelecida na motivação do ato. Quanto aos limites à discricionariedade, encontra-se na doutrina a teoria do desvio de poder ou de finalidade e a teoria dos motivos determinantes ou o princípio da motivação.

Dentro de um Estado de Direito, não há ato totalmente desvinculados de qualquer limite. Pelo contrário, há uma série de princípios que incidem e condicionam a ação administrativa, da onde são emanados os atos discricionários. Destarte, os atos administrativos são sempre condicionados quanto ao fim e à competência354.

350 FREITAS, Juarez. Discricionariedade Administrativa e o Direito Fundamental à Boa Administração

Pública. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 28.

351

Idem, p. 29.

352 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Editora

Malheiros, 2006. p. 15.

353 MORAES, Antônio Carlos Flores. Legalidade, eficiência e controle da Administração Pública. Belo

Horizonte: Fórum, 2007. p. 197.

354 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Elementos de Direito Administrativo. 3. ed. rev., ampl. e atual.

Toda a atuação da Administração Pública, mesmo envolvendo juízo discricionário do agente público, oriundo do espaço de liberdade normativa ou de seu direito-dever de avaliação dos conceitos jurídicos indeterminados de valor constantes da lei aplicável, concretizada em fatos, atos e contratos administrativos, é eternamente subordinada e limitada pelos princípios constitucionais (expressos e implícitos), bem como pelas demais normas jurídicas destes procedentes. E é sempre sindicável pelo Ministério Público e contrastável pelo Poder Judiciário355.

Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro o desvio de poder ocorre quando a autoridade usa o poder discricionário para atingir fim diferente do fixado em lei356.

Veja-se, de pronto, que dentro do ato discricionário há elementos vinculados como a finalidade, que deve ser sempre voltada para a realização do interesse público, e a competência, pois, mesmo havendo margem para a tomada de decisão, ela deve sempre ser exarada pela autoridade competente e na forma estabelecida.

Nessas situações de desconformidade do ato com o interesse público, o Judiciário está autorizado a anular o ato, tendo e vista a ocorrência de desvio de finalidade. Aos Tribunais de Contas também cabe o exame da constitucionalidade com base na Súmula 347 do STF.

A decisão proferida pelo Tribunal de Contas, com base no enunciado da Súmula 347 do STF, nos mesmos moldes daquela proferida pelo Senado Federal, com base no art. 52. X atinge o plano de eficácia da decisão. O próprio dispositivo traz a expressão “suspender a execução” de modo a caracterizar este entendimento357

. Isto tem um efeito extremamente importante, na medida em que se a lei ou o ato for considerado constitucional pelo STF volta a produzir os seus efeitos.

Caso o entendimento fosse outro, não haveria esta possibilidade.

Os atos administrativos discricionários exigem que os motivos sejam plenamente explicitados. Como o ato administrativo vinculado traz todos os elementos que ensejam a sua aplicação, são despiciendas maiores explicitações, pois já decorrem do texto normativo. Já, os atos discricionários, por exatamente darem margem a escolhas do administrador que se ajustem ao ordenamento jurídico, em especial aos princípios constitucionais, necessitam que os motivos que lhes deram ensejo estejam devidamente explicitados.

355 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Princípios Constitucionais Reguladores da Administração Pública:

agentes públicos, discricionariedade administrativa, extensão da atuação do Ministério Público e do controle do Poder Judiciário. São Paulo: Atlas, 2000. p. 119.

356

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2003. p. 211.

357 POLETTI, Ronaldo. Controle da Constitucionalidade das Leis. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

No mesmo sentido é a lição de Celso de Mello358para quem a autoridade necessita

referir não apenas a base legal em que se quer estribada, mas, também os fatos ou circunstâncias sobre as quais se apóia. Deve ser demonstrada a pertinência lógica entre o motivo elencado, ou os motivos, e a medida adotada. Só assim pode-se aferir a sua idoneidade e a potencialidade de atingir-se a finalidade pública.

Cabe referir, neste momento, a lição de García de Enterría359, para quem a

indeterminação ocorre no plano legal, normativo e não no momento de sua aplicação. Portanto, quando da aplicação de um conceito indeterminado há a sua precisão pelo aplicador. Nesse sentido, na aplicação, ocorre ou não o conceito, por exemplo, a boa-fé, ou houve ou não, o preço justo, ou é ou não é. A indeterminação do enunciado não se traduz em uma indeterminação de aplicação, as quais só permitem “uma unidade de solução justa”.

Flores de Moraes360, ao criticar a pretensão de desregulamentação por parte dos

arautos dos benefícios de uma administração gerencial, atribui a inoperância e a lentidão da Administração Pública a outros fatores como a dúvida, a insegurança e o completo desconhecimento das técnicas administrativas por parte das administrações.

E vai adiante, ao referir que “o corpo burocrático cria um novo tipo de greve (jamais estudada antes nos meios trabalhistas): prejudicar a produção, produzindo; prejudicar o trabalho, trabalhando”. Afirma que o desinteresse e o descaso da burocracia com a cidadania prejudicam mais o governo em sua atividade política do que todos os regulamentos administrativos. A crítica tem pertinência, muitas vezes ocorre o estabelecimento de critérios de desempenho e avaliação da atuação de servidores que são meramente formais, “para inglês ver”. E há servidores que realmente trabalham muito, todavia qual o sentido de se trabalhar muito se o resultado é quase nulo os de baixíssima eficácia?

O resultado é o mote de qualquer ação em matéria de Administração. Portanto, há que se verificar se está se atingido resultados úteis, sob pena de um total gasto de energia e trabalho em situações de nenhum efeito para a comunidade. A legitimidade das instituições passa a ser questionada, e com razão, pois só tem finalidade na medida em que propiciar um melhora da qualidade de vida.

As obrigações do Estado nas tarefas de proteção ambiental implicam na imposição de deveres de proteção ao Estado, que lhe retiram a sua capacidade de decidir sobre a

358 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle judicial. 2. ed. São Paulo: Editora

Malheiros, 2006. p. 97.

359 ENTERRÍA, Eduardo García de; FERNÁNDEZ, Tomás Ramon. Curso de Derecho Administrativo, 4. Ed..

Ed. Madrid: Civitas, 1983. p. 433-434.

360 MORAES, Antônio Carlos Flores. Legalidade, eficiência e controle da Administração Pública. Belo

oportunidade de agir, obrigando-o também a uma adequação permanente das medidas às situações que carecem de proteção361. Nesse sentido, há a necessidade de permanente

realização de políticas públicas de proteção ambiental. E no desenvolvimento dessas políticas a constante avaliação dos resultados obtidos, de forma a demonstrar a adequação da política adotada ou a necessidade de ajustes a fim de obter resultados mais satisfatórios.

O paradoxo que a sociedade contemporânea enfrenta é que a solução para situação atual de degradação ambiental – degradação esta que decorre das evoluções tecnológicas362as

mesmas que propiciam níveis de produção jamais pensados, e, na esteira da produção, a utilização de cada vez mais recursos naturais sem que seja possibilitada a sua renovação - só poderá vir de mais evolução tecnológica, agora já não mais voltada só para a produção, mas para a produção agregada de componentes que permitem a máxima eficiência e a mínima utilização de recursos naturais.

O Estado socioambiental, segundo Sarlet, traduz-se em, pelo menos, duas dimensões jurídico-políticas relevantes, das quais se ressalta a obrigação do Estado, em cooperação com outros Estados e cidadãos ou grupos da sociedade civil, de promover políticas públicas (econômicas, educativas, de ordenamento) pautadas pelas exigências da sustentabilidade ecológica363

. No contexto do direito administrativo pós-moderno, estrutura-se a escolha discricionária como uma margem de liberdade da Administração que surge quando sua atividade, por opção do legislador, não está plenamente definida em lei, de acordo com a conveniência e oportunidade identificadas pelo Administrador Público, e que constituem o mérito do ato, muitas vezes insindicável pelo Poder Judiciário.

A discricionariedade não surge, portanto, da mera coincidência de um espaço da liberdade da Administração Pública com relação ao legislador; ao contrário, a discricionariedade decorre da eleição feita pelo Poder Legislativo de abrir ao Poder Executivo, que está próximo do caso concreto, uma contribuição pessoal da autoridade competente no processo de determinação do interesse a ser realizado.

A função de criação do Direito, assumida pelos juízes e estimulada pela inserção nas leis de cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados, suscita o problema, de dificílima solução, da legitimação democrática para o desempenho dessas atribuições, pois, como advertia Montesquieu, se o poder de julgar estiver confundido com o poder de legislar, o

361 SARLET, Ingo Wolfgang e FENSTERSEIFER, Tiago. Estado socioambiental e mínimo existencial. Estado

Socioambiental e Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2010. p. 16.

362 Idem., p. 17. 363 Idem., p. 19.

poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário. É o “governo dos Juízes”, com