• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3: CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEM

3.4 CONSTRUÇÕES GEOMÉTRICAS

Consideramos as construções geométricas como uma ferramenta valiosa que funcionará como grande aliada no processo de ensino e aprendizagem da Geometria, mais particularmente de demonstrações. Ao se resolver problemas de construções geométricas juntamente com suas justificativas matemáticas, desenvolvem-se, também, a coordenação motora fina e o hábito de limpeza, rigor e precisão. Assim sendo, consideramos as construções geométricas como aquelas que fazem uso apenas da régua não graduada e compasso e o Desenho Geométrico como uma disciplina escolar que tem por objetivo ensinar essas construções.

Desta forma, é oportuno esclarecer como concebemos a construção geométrica nesse trabalho. Entendemos essa construção no mesmo sentido de Petersen (1967), quando diz:

Como a solução dos problemas de construções geométricas deve se traduzir por um desenho, é necessário recorrer ao emprego de alguns instrumentos. Habitualmente só usamos a régua, com auxílio da qual podemos traçar uma reta passando por dois pontos dados, e o compasso que permite descrever em torno de um centro dado uma

circunferência de raio dado. Uma solução qualquer se comporá, portanto, para nós, dessas duas operações uma ou mais vezes repetidas. É exatamente essa restrição que faz que muitos problemas de aparência simples se tornem complexos ou até mesmo sem solução, como podemos citar: trisecção do ângulo, quadratura do círculo e duplicação do cubo (PETERSEN, 1967, p. 7)

Neste sentido, um ponto ficará determinado pela intersecção de duas retas, intersecção de dois arcos de circunferência e intersecção de uma reta e um arco de circunferência. Quanto à exatidão de algumas construções, Petersen (1967, p. 8) pontua: “Em alguns casos, é preciso demonstrar que a solução é exata e discuti-la, isto é, indicar os limites entre os quais os dados devem estar compreendidos para que o problema admita, uma, duas, ou mais soluções”.

Segundo Wagner (1993), as construções geométricas estão cada vez mais ausentes dos currículos escolares, embora sejam importantes para auxiliar no aprendizado da Geometria. Nessa perspectiva, concordamos com esse autor ao afirmar que:

As construções geométricas devem, em nossa opinião, acompanhar qualquer curso de Geometria na escola secundária. Os problemas são motivadores, às vezes intrigantes e frequentemente conduzem à descoberta de novas propriedades (Ibid, p. 18).

Por outro lado, Putnoki (1988) destaca que em países como França, Espanha e Suíça, o Desenho Geométrico é naturalmente incorporado à Geometria plana, pelo próprio professor de Matemática. Afirma, ainda, que: “desde Os Elementos, de Euclides, o Desenho Geométrico se apresenta ligado à Geometria de forma indissolúvel, não com esse título, mas, com a denominação de Construções Geométricas” (Ibid, p. 13).

O autor considera de grande importância o ensino das construções geométricas com as justificativas matemáticas que as fundamentam, ou seja, com recursos à Geometria plana. Acrescenta, ainda, que “o aprendizado das construções amplia as fronteiras do aluno e facilita muito a compreensão das propriedades geométricas, pois permite uma espécie de ‘concretização’” (PUTNOKI apud ZUIN, 2001, p. 9).

É freqüente conduzir os alunos para desenvolverem atividades com régua e compasso por meio dos passos de construção. Para Zuin (2001):

A forma de apresentar as construções geométricas fica quase sempre na execução dos traçados através dos “passos de construção” que se constituem em um roteiro a ser seguido. Segundo a nossa avaliação, no Brasil é apenas com Putnoki, a partir de 1990, que existe, realmente, um rompimento com a metodologia apresentada nas décadas anteriores, quando o autor valoriza a teoria da geometria plana, trabalha com dobraduras e introduz tópicos com abordagem histórica. Este autor incorpora as tendências da educação matemática que retomam a História da Matemática e propõe trabalhos com material concreto (ZUIN, 2001, p. 184).

Quanto à retomada do ensino das construções geométricas a autora destaca que apesar de os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática indicarem um retorno ao ensino de Geometria com tópicos de construções geométricas e de coleções de livros didáticos de matemática atenderem, de alguma forma, a esta recomendação, não se tem a garantia de tal retorno nas salas de aula, pois:

ƒ Nem todos os professores estão habilitados para adotar a metodologia proposta;

ƒ As escolas que mantêm o Desenho Geométrico (como disciplina), provavelmente não exigirão que os professores de Matemática introduzam tópicos de construções geométricas em suas aulas;

ƒ Uma vez que nem todos os professores em exercício tiveram em sua formação cursos de Geometria e/ou Construções Geométricas, é necessário investir na formação continuada (ZUIN, 2001).

Ao defender as construções geométricas no ensino, Putnoki (1988) sugere alguns conteúdos e como trabalhá-los com os alunos, acrescentando que assuntos aparentemente desinteressantes para os alunos, como ângulo inscrito ou potência de um ponto em relação a uma circunferência, têm vastas aplicações nas construções geométricas. O ângulo inscrito gera o arco capaz e a potência de ponto resolve problemas de tangência. Destacando: “[...] discutir como construir, e, em seguida, construir, são etapas que se completam, sendo a segunda a própria materialização das idéias da primeira” (Ibid, p. 15).

Nesse contexto, Marmo (1964) indica que os problemas de desenho geométrico devem seguir a seguinte apresentação:

ƒ Mostra-se o que se faz, isto é, realiza-se a construção geométrica;

ƒ Explica-se porque se fez, isto é, justifica-se (demonstração pela

ƒ Discussão da solução, isto é, verifica-se o número de soluções do

problema, analisando se é realmente compatível, apresenta uma única solução, admite mais de uma solução e sobre quais condições poderia ampliar ou reduzir o número de soluções.

Com relação a aprendizagem de um teorema, o autor diz que existem três modos de “decorar” um teorema de Geometria Plana:

– Decorar as palavras do enunciado. “Num triângulo retângulo o quadrado da altura relativa à hipotenusa é igual ao produto das projeções dos catetos sobre a hipotenusa”.

– Decorar as letras da expressão. “h2 = m . n”.

– Decorar a figura; gravar a “linguagem gráfica”.

(MARMO, 1964, p. 49)

Pode-se perceber nessa citação que, de forma intuitiva, Marmo (1964) se refere aos três registros de representação semiótica que são abordados neste trabalho: o registro da língua natural, o registro simbólico e o registro figural, embora utilize a palavra “decorar”, vista nas literaturas recentes como sinônimo de memorizar. De acordo com Duval (2003), no caso desse teorema, se uma pessoa é capaz de mobilizar simultaneamente dois ou mais desses registros e/ou mudar de um para outro, terá ocorrido a compreensão do teorema em questão.

Dessa forma, se faz necessário discutir a formação de professores. Zuin (2002) destaca que eles devem conhecer construções geométricas, e pondera:

Atualmente, constata-se que alguns livros já trazem a geometria relacionada com cada conteúdo matemático, exigindo assim que o professor, além do conhecimento específico em geometria, tenha um conhecimento mais profundo de Desenho Geométrico, de modo que possa contribuir mais e melhor para a compreensão dos conhecimentos matemáticos (ZUIN, 2002, p. 3).

Já Pavanello e Andrade (2002), sugerem que o trabalho com Geometria nas licenciaturas deve contemplar, também, a formação didática inerente a esse conteúdo, e afirmam que:

Nessa abordagem não poderia faltar também um trabalho com construções geométricas, não pelas próprias construções, mas como

uma possibilidade de se estabelecerem relações entre a geometria axiomática euclidiana. Isso se concretiza a partir da busca de validação da construção efetuada ou da prova de que o objeto por meio dela obtido era aquele desejado. Além disso, as construções geométricas poderiam servir também como instrumentalização para o ensino de outros conteúdos (álgebra, etc.) (PAVANELLO e ANDRADE, 2002, p. 84).

Com base no que apresentamos, tentaremos proporcionar aos professores, em formação continuada, o desenvolvimento de conceitos geométricos por meio de problemas de construções.