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250 JARDIM, Afrânio Silva. Direito processual penal. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 337.

251 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto Universitario de La Polícia

Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 95-96. 252 Ibidem, p. 96.

O controle externo pode ser dividido em controle legislativo, controle financeiro, controle militar, controle social e participação popular e controle jurisdicional.

A respeito do controle legislativo, pode-se dizer que o Poder Legislativo é uma agência de controle inclusiva essencial, podendo exercer influência de três formas: criando condições de serviço favoráveis a um comportamento responsável, tais como salário e qualificação para indicação; sujeitando a atividade policial ao escrutínio público por meio de perguntas e investigações; e limitando recursos se a conduta não satisfaz níveis mínimos de eficácia e retidão253.

Cada país trata esse tipo de controle de forma diferente. Um exemplo de como esse tipo de controle pode ser eficiente é como ocorre o modelo de controle e supervisão legislativa implementado nos Estados Unidos sobre o FBI (Federal Bureau of Investigation), que se apoia em três bases: 1) as comissões legislativas, responsáveis pela supervisão, estão autorizadas a ter acesso total às informações tratadas pelo FBI; 2) os comitês e cada um de seus membros têm a oportunidade de obter informações sobre condutas ilegais ou inadequadas realizadas pelas diferentes agências; 3) o órgão legisla a missão e a autoridade do FBI por meio de leis, e o controle do FBI não pode operar, exceto de acordo com uma transferência de autoridade e fundos254. Dois importantes instrumentos de controle legislativo em relação ao FBI são: o poder de o Senado confirmar a nomeação do diretor e o controle do orçamento da agência policial.

No Brasil, os órgãos de segurança pública integram as estruturas administrativas do Poder Executivo da União, dos Estados e dos Municípios. No âmbito federal, as Polícias Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal estão subordinadas ao Ministério da Justiça. Nos Estados, as Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares e Políciais Civis são subordinadas aos respectivos Governadores, por intermédio das Secretarias de Segurança Pública. Alguns Municípios possuem guardas municipais (é facultativa a sua instituição), que são subordinadas aos respectivos Prefeitos255. Existem, ainda, as Polícias Legislativas,

253 BAYLEY, David H. Padrões de policiamento: uma análise internacional comparativa. Tradução de Renê Alexandre Belmonte. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2006. p. 179.

254 TAVOSNANSKA, Norberto R. Seguridad y política criminal. Argentina: Cathedra Jurídica, 2006. p. 175. 255 Sobre as guardas municipais, embora sem previsão no art. 144 da Constituição, elas podem ser criadas pelos Municípios e exercer atividades relacionadas ao poder de polícia, mesmo não sendo uma entidade policial, além de funções de proteção de bens, serviços e instalações do Município, conforme posicionamento do STF: “Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PODER DE POLÍCIA. IMPOSIÇÃO DE MULTA DE TRÂNSITO. GUARDA MUNICIPAL. CONSTITUCIONALIDADE. 1. Poder de polícia não se confunde com segurança pública. O exercício do primeiro não é prerrogativa exclusiva das entidades policiais, a quem a Constituição outorgou, com exclusividade, no art. 144, apenas as funções de promoção da segurança pública. 2. A fiscalização do trânsito, com aplicação das sanções

vinculadas ao Senado, à Câmara dos Deputados e, em alguns Estados-membros, às Assembleias Legislativas, mas são órgãos exclusivamente de segurança interna desses Poderes e dos parlamentares, que não realizam atividades policiais externas, de prevenção e repressão criminal256. Mas recentemente, por meio da Emenda Constitucional nº 104, de 04 de dezembro de 2019, que adicionou o inciso VI ao art. 144 da Constituição, foram criadas as Polícias Penais federal, estaduais e distrital, vinculadas ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencem, e que ficam responsáveis pela segurança dos estabelecimentos penais (antigos agentes penitenciários)257.

Importante frisar que, embora o vínculo administrativo das polícias e dos demais órgãos de segurança pública seja com o Poder Executivo, o Poder Legislativo (Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais), nos diferentes níveis de governo, desempenha um relevante papel de controle externo de sua atuação, com o emprego de diversos instrumentos, como a convocação ou o convite a gestores para comparecimento e esclarecimentos, os pedidos escritos de informações, as audiências públicas e as comissões parlamentares de inquérito (que possuem poderes de investigação próprios das autoridades judiciais). A Constituição também confere ao Congresso Nacional a competência para sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa (semelhante poder pode constar das Constituições Estaduais e das Leis Orgânicas dos Municípios)258.

administrativas legalmente previstas, embora possa se dar ostensivamente, constitui mero exercício de poder de polícia, não havendo, portanto, óbice ao seu exercício por entidades não policiais. 3. O Código de Trânsito Brasileiro, observando os parâmetros constitucionais, estabeleceu a competência comum dos entes da federação para o exercício da fiscalização de trânsito. 4. Dentro de sua esfera de atuação, delimitada pelo CTB, os Municípios podem determinar que o poder de polícia que lhe compete seja exercido pela guarda municipal. 5. O art. 144, §8º, da CF, não impede que a guarda municipal exerça funções adicionais à de proteção dos bens, serviços e instalações do Município. Até mesmo instituições policiais podem cumular funções típicas de segurança pública com exercício de poder de polícia. Entendimento que não foi alterado pelo advento da EC nº 82/2014. 6. Desprovimento do recurso extraordinário e fixação, em repercussão geral, da seguinte tese: é constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito, inclusive para imposição de sanções administrativas legalmente previstas.”. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 658570. Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 06/08/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-195 DIVULG 29-09-2015 PUBLIC 30-09-2015. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur322445/false. Acesso em: 28 jun. 2020).

256 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto Universitario de La Polícia

Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 98.

257 BRASIL. Emenda Constitucional nº 104, de 4 de dezembro de 2019. Altera o inciso XIV do caput do art. 21, o § 4º do art. 32 e o art. 144 da Constituição Federal, para criar as polícias penais federal, estaduais e distrital. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc104.htm. Acesso em: 26 jun. 2020.

Além disso, compete ainda ao Poder Legislativo, na sua função legislativa típica, aprovar, anualmente, a lei orçamentária que regulamenta as receitas e despesas de todos os Poderes e órgãos com autonomia constitucional reconhecida, o que ingere diretamente nos investimentos a serem realizados, bem como votar os projetos de lei de iniciativa do Poder Executivo que digam respeito à organização e estatutos dos órgãos de segurança pública e à fixação da remuneração dos seus servidores259.

Assim, percebe-se que esse conjunto de competências parlamentares confere ao Poder Legislativo um considerável poder de controle sobre as instituições policiais e suas respectivas chefias. Em outra perspectiva, pode, eventualmente, ser desvirtuado e resultar em indesejável interferência política260.

Quanto ao controle financeiro, há que se reforçar que todos os atos de gestão financeira e de pessoal de todos os órgãos da Administração Pública, nesse sentido incluídos os de segurança pública, estão também sujeitos à fiscalização financeira, orçamentária, contábil, operacional e patrimonial pelo Poder Legislativo, auxiliado pelos Tribunais de Contas, que são órgãos independentes e de natureza administrativa (e não judicial) com competência constitucional para o controle de legalidade, legitimidade e economicidade de atos administrativos, podendo, inclusive, aplicar sanções previstas em lei, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, conceder prazo para que o órgão ou entidade pública sobre controle cumpra providências necessárias ao exato cumprimento da lei ou até, em caso de descumprimento, sustar a execução do ato irregular261.

Sobre o controle militar, embora as polícias militares e os corpos de bombeiros militares serem instituições estaduais, subordinadas aos respectivos governadores, são forças auxiliares e reserva do Exército, cabendo à União legislar sobre normais gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização dessas forças estaduais, conforme disposto no art. 22, inciso XXI, da Constituição. Dessa forma, o Exército Brasileiro exerce o controle e coordenação dessas instituições por meio da Inspetoria-Geral das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares (IGPM) 262. O objetivo é conferir uniformidade organizacional às instituições militares estaduais, que se diferenciam,

259 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto Universitario de La Polícia

Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 99. 260 Ibidem, p. 99.

261 Ibidem, p. 99.

262 O órgão tem as competências estabelecidas no Decreto-lei nº 667, de 1969, regulamentado pelo Decreto nº 88.777, de 1983.

entretanto, em aspectos materiais, remuneratórios e de efetivos, uma vez que os Estados brasileiros são muito diferentes entre si, sob os aspectos geográficos, econômicos e sociais263.

O controle social e participação popular tem por fundamento o princípio republicano, que estabelece que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente (art. 1º, da Constituição). Assim, o Brasil é uma democracia simultaneamente representativa e participativa. As formas de participação dos usuários na administração pública devem ser disciplinadas na lei, conforme disposto no art. 37, §3º, da Constituição, com o objetivo de regular os seguintes aspectos: reclamações relativas à prestação dos serviços; avaliação periódica, interna e externa, da qualidade dos serviços; acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, ressalvadas as excepcionais hipóteses de sigilo; representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função. Esses mecanismos são inteiramente aplicáveis aos órgãos responsáveis pela segurança pública, ou seja, às polícias, corpos de bombeiros e guardas municipais. A Constituição Federal prevê, no capítulo que disciplina os direitos políticos (art. 14), como instrumentos da soberania popular, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, nos termos da lei264.

Um exemplo de como essa participação popular ocorre em matéria de segurança pública no Brasil foi o referendo realizado no ano de 2005, que tratou sobre o comércio legal de armas de fogo no Brasil. A Lei nº 10.826, de 2003, denominada de Estatuto do Desarmamento, proibiu a comercialização de armas de fogo em todo o território nacional, excepcionando apenas algumas entidades (Forças Armadas, polícias, guardas municipais, Agência Brasileira de Inteligência, Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, guardas prisionais e empresas de segurança privada e transporte de valores regularmente constituídas), contudo, condicionou a eficácia dessa proibição à aprovação mediante referendo popular, a ser realizado dois anos mais tarde. O referendo foi realizado no dia 23/10/2005, com a seguinte pergunta: O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil? Votaram mais de 95 milhões de eleitores, sendo que, dos votos válidos (92.442.310), 63,94% responderam “não” e 36,06% votaram “sim”, rejeitando, dessa forma, a

263 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto Universitario de La Polícia

Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 99-100. 264 Ibidem, p. 101-102.

proibição contida na lei e mantendo a possibilidade de os cidadãos adquirirem armas de fogo mediante o cumprimento dos requisitos legais265.

Há que se reconhecer que os mecanismos de controle social permitem, por si, que a Administração corrija e evite inadequações nos seus atos ou omissões, e também suscitam a atuação dos órgãos de controle. Contudo, há diferença entre a participação popular e o controle social institucionalizado. O cidadão isolado ou por meio de associações pode participar da tomada de decisões da Administração Pública, sem que se apresente aí um controle266.

Wendell Beetoven cita como exemplo para ilustrar essa situação, notadamente quanto à fiscalização da atuação policial, a previsão contida no art. 14 da lei nº 8.429, de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa), um importante instrumento de participação popular que permite a qualquer pessoa representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade, com a indicação das informações e provas de que tenha conhecimento. Além desse, outro exemplo é o da lei que regula a responsabilidade por abuso de autoridade (lei nº 13.869, de 2019), que possui dispositivo similar. Resta evidente que, atualmente, com a popularização dos meios de registro audiovisual em telefones móveis (smartphones) e outros dispositivos tecnológicos, é cada vez mais comum a gravação de cenas ou diálogos relacionados a ocorrências policiais, que são rapidamente disseminadas por redes sociais e com frequência são divulgadas pela imprensa (inclusive na internet), antes mesmo de chegarem ao conhecimento dos órgãos oficiais de controle da atividade policial, o que muitas vezes leva esses órgãos a adotarem providências imediatas, de ofício, independentemente da provocação formal de qualquer cidadão267. Um exemplo recente sobre isso foram policiais militares que foram afastados quando vídeos de agressões sofridas por alunos de uma escola estadual de São Paulo foram divulgados nas redes sociais268.

O controle social, de acordo com Vanderlei Siraque, constitui-se na possibilidade de o cidadão ter o direito público subjetivo de fiscalizar a função administrativa do Estado. Esse controle é aquele realizado facultativamente por alguém que não seja agente público no

265 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto Universitario de La Polícia

Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 102.

266 MEDAUAR, Odete. Controle da administração pública. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 176. 267 AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro, op. cit., p. 102.

268 POLÍCIA Militar afasta policiais que aparecem em vídeo agredindo alunos em escola de SP. G1, São Paulo, 19 fev. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/02/19/policia-militar-afasta- policiais-que-aparecem-em-video-agredindo-alunos-em-escola-de-sp.ghtml. Acesso em: 24 mar. 2020.

exercício da função ou órgão do Estado, ou seja, por pessoa estranha ao Estado, individualmente, em grupo ou por meio de entidades constituídas. O controle social, dessa forma, é realizado paralelamente ao controle institucional, de competência dos órgãos oficiais, e a sua finalidade é verificar se as decisões tomadas, no âmbito estatal, estão sendo executadas conforme o que foi decidido e se as atividades estatais estão sendo realizadas de acordo com os parâmetros estabelecidos pela Constituição e pelas normas infraconstitucionais269.

É evidente que a participação da sociedade na gestão da segurança pública é essencial, porque o tema da segurança, com suas diferentes facetas, não pode ser separado de uma intervenção comprometida por parte da sociedade em geral e, muito menos, longe das comunidades vizinhas em particular. O conflito em matéria de segurança não pode ser analisado apenas como uma questão que permanece nas mãos do político ou do governo em exercício, ou depende exclusivamente de profissionais ou gerentes nessas áreas, pelo contrário, a segurança deve ser uma preocupação de todos 270. Nessa mesma esteira, Cláudio Pereira Souza Neto destaca que, sendo o cidadão o destinatário do serviço de segurança pública, a concepção democrática estimula a participação popular na sua gestão e valoriza arranjos participativos que incrementam a transparência das instituições policiais271.

Ressalte-se que o controle externo da administração pública pelo exercício do direito de participação política é uma forma de efetivação da cidadania, própria do regime que assegura ao cidadão a possibilidade de interferir no processo formador de políticas públicas, passando a ser potencial a cidadania ativa, por meio da atuação isolada do cidadão (como nos processos eleitorais, nas audiências e consultas públicas, no referendum e no plebiscito ou mesmo no manejo de ações constitucionais, como a ação popular e o mandado de injunção), ou de grupos ou de categorias profissionais (como as associações, os sindicatos e outros grupos de pressão)272.

São diversos os mecanismos de controle social da administração pública em geral e especificamente no que se refere às atividades de segurança pública. Dentre eles, podemos destacar: orçamento participativo, acompanhamento da gestão orçamentária, audiência

269 SIRAQUE, Vanderlei. Controle social da função administrativa do estado: possibilidades e limites na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 85.

270 TAVOSNANSKA, Norberto R. Seguridad y política criminal. Argentina: Cathedra Jurídica, 2006. p.133. 271 SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Constitucionalismo democrático e governo das razões: estudos de

direito constitucional contemporâneo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 277.

272 ROSA, Márcio Fernando Elias. Discricionariedade e moralidade administrativa. In: GARCIA, Emerson. (Coord.). Discricionariedade administrativa. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 143-181. p. 176-177.

pública, conselhos de políticas públicas, organizações não governamentais (ONGs), sindicatos e associais profissionais, ouvidorias, meios de comunicação social273.

Por fim, o controle jurisdicional tem por fundamento a separação entre os Poderes. Nas democracias, os Poderes do Estado são independentes e harmônicos entre si e existe o mecanismo de freios e contrapesos, por meio do qual um Poder controla o outro. Esses Poderes que formam o Estado, enquanto ente político, são três, quais sejam: Executivo, Legislativo e Judiciário. Além desses Poderes, o Estado também pode ser formado por instituições autônomas que a Constituição respectiva determinar, que, no caso do Brasil, seria o Ministério Público. Nenhum desses atores, isoladamente, é soberano para fazer ou deixar de fazer o que bem entender. Dessa forma, o princípio da separação de poderes foi desenvolvido como um mecanismo de controle do exercício do poder 274.

Nessa esteira, importante frisar que nem sempre a intervenção do Poder Judiciário significa a ocorrência do controle jurisdicional. O ajuizamento de uma ação, em razão de uma pretensão resistida, não transfere para o Judiciário a responsabilidade pelo exercício do controle, apenas assegura ao controlador (oficial ou não) o direito ou prerrogativa que o controlado deixara de observar, forçando o resistente a cumprir a sua obrigação legal. Um exemplo disso é quando uma autoridade policial se recusar a prestar uma informação ou fornecer um documento requisitado pelo Ministério Público, que pode acionar o Poder Judiciário para exigir o que lhe foi indevidamente sonegado, sem prejuízo de demais providências. Nesse caso, a decisão judicial que assegura o acesso do Ministério Público à informação ou ao documento apenas reafirma o controle exercido pelo Ministério Público, já previsto no ordenamento jurídico nacional275.

Contudo, em algumas situações, o Poder Judiciário exerce diretamente o controle de atos administrativos. Exemplos desse controle jurisdicional direto e imediato são as prisões cautelares, buscas domiciliares ou interceptações de comunicações telefônicas, que apenas podem ser praticados mediante autorização judicial prévia276.

De todo modo, o Judiciário desempenha um papel imprescindível nos assuntos relacionados à segurança pública e à implementação de todos os demais direitos sociais. Sendo que, se o Estado deixa de adotar as medidas necessárias para a concretização dos

273 Para mais informações ver: AGRA, Wendell Beetoven Ribeiro. O controle da eficiência da atividade policial pelo Ministério Público. 2016. 345 f. Dissertação (Mestrado em Segurança Pública) – Instituto

Universitario de La Polícia Federal Argentina, Buenos Aires, Argentina, 2016. p. 104-118. 274 Ibidem, p. 118.

275 Ibidem, p. 119. 276 Ibidem, p. 119.

preceitos constitucionais, incidirá em violação negativa do texto constitucional, resultando em inconstitucionalidade por omissão (total ou parcial), resultando na possibilidade de controle

judicial das omissões do Poder Público. Assim, o Poder Judiciário passa a ter a função de concretizar os direitos fundamentais277.

Reforce-se que o controle judicial das omissões do Poder Público encontra fundamento no princípio constitucional da universalidade da jurisdição, que determina que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá ser subtraída à apreciação do Poder Judiciário. Já no que se refere ao controle judicial dos atos comissivos, não há controvérsias, visto que muitas vezes resulta na responsabilização administrativa, civil e criminal dos agentes que praticam a conduta ilícita e na responsabilidade civil objetiva do próprio Estado.

As principais controvérsias sobre o controle judicial das omissões na área de segurança pública são em razão da possível violação ao princípio da separação dos poderes e em razão da reserva do possível. Contudo, não se constitui a separação dos poderes em princípio de natureza absoluta e ilimitada, na medida em que as funções estatais se complementam e se limitam umas às outras, com observância do sistema de freios e contrapesos, visando à realização do bem comum278.

Quanto ao argumento da reserva do possível, nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal, mesmo reconhecendo que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais – além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização – depende, em