• Nenhum resultado encontrado

2. GUERRA FRIA E CONSOLIDAÇÃO DO ANTICOMUNISMO

2.4. Segurança Nacional Mexicana

2.4.1. Cooperação internacional

Os olhos do Estado não necessariamente recebiam salário da DFS, pelo contrário, respondiam a uma estrutura hierárquica em que o dever patriótico era prioridade. Ou seja, funcionários do PRI, jornalistas e militares, também eram fornecedores de informação de inteligência, como pudemos ver nos casos acima comentados. Por outro lado, o FBI, a CIA, o Departamento de Estado e a Embaixada dos EUA elaboravam informes sistemáticos sobre a situação mexicana, e que eram entregues diretamente à SEGOB72. Recentemente veio às claras o fato de que a cooperação entre os EUA e o México em matéria de segurança e inteligência estavam coordenadas por Winston Scott, chefe da estação da CIA na Cidade do México desde 1956 (MORLEY, 2011; AGEE, 1978).

A cooperação se estabeleceu como uma rede de espionagem: o Projeto Litempo. Pelas investigações realizadas por Jefferson Morley, biógrafo do Winston Scott, a partir de documentos recentemente abertos pelos EUA, sabemos o nome dos contatos dos importantes personagens da política mexicana que foram recrutados para Litempo. Scott utilizou a

70 El Lic. Alfonso Martínez Domínguez (1922-2002), militante do PRI, foi três vezes deputado federal. Na sua última gestão (1964-1967) trabalhou próximo do presidente Gustavo Díaz Ordaz. Este último o nomeia como presidente do Partido em 1968. Entre 1970 e 1971, foi nomeado regente do Departamento do Distrito Federal (hoje Cidade do México). Por sua suposta participação no massacre de estudantes do 10 de junho de 1971, e as acusações do presidente Echeverria no que diz respeito à liderança do grupo paramilitar Los Halcones (com o que ganhou o apelido de “Halconso”), o presidente forçou sua saída do DDF. A amizade com o presidente López Portillo, Martínez Domínguez foi indicado para ocupar a governatura do estado de Nuevo León (1979- 1985) (DÁVALOS; CARRIZALES, 2002).

71 Distrito Federal, 19-03-69, AGN, IPS, Caixa 2938, Exp. 15, folha 1. Álvaro Ríos foi um conhecido militante do movimento camponês independente do norte do país, da Unión General de Obreros y Campesinos de

México (UGOCM). Esta importante organização, criada em 1949, pretendia fazer correlação de forças com a

governista Central de Trabajadores de México (CTM). Na década de sessenta, funcionando como braço camponês do PPS, utilizou a recuperação de terras açambarcadas por latifundiários como método principal na luta camponesa (WOLDEMBERG; HUACUJA, 1991, p. 161).

72 Sergio Aguayo apresenta nas suas pesquisas os avanços mais significativos na análise dos documentos norte- americanos de inteligência sobre o México, acima de tudo, aos referentes ao movimento estudantil, o que inclui o massacre de 2 de outubro.

amizade pessoal para a realização desse projeto. Na lista encontramos:

 LITEMPO-1: Emilio Bolaños, sobrinho de Gustavo Díaz Ordaz, militante do PRI.  LITEMPO-2: Gustavo Díaz Ordaz, desde que foi secretário da SEGOB (1952-1964), e

enquanto foi presidente (1964-1970). Amigo pessoal de Scott, inclusive foi padrinho no matrimônio do norte-americano73.

 LITEMPO-4: Fernando Gutiérrez Barrios, o diretor da DFS (1965-1970)74. Dele

sabemos que requisitou apoio para o interrogatório de mexicanos que tiveram alguma relação com Lee Harvey Oswald após o assassinato do presidente Kennedy.

 LITEMPO-8: Luis Echeverría Álvarez, que, entre outras coisas, dedicava-se a atender “solicitações especiais do governo norte-americano para dar vistos para viajantes cubanos que buscavam escapar da revolução socialista de Fidel Castro” (MORLEY, 2006)75.

Nos documentos de inteligência norte-americanos recentemente abertos nos EUA existem indícios para considerar como parte dessa rede de colaboradores, Adolfo López Mateos, presidente do México entre 1952 e 1964; o delegado e posteriormente diretor da DFS (1978-1982), capitão Miguel Nazar Haro; assim como o general Luis Gutiérrez Oropeza, chefe do Estado Maior Presidencial (1964-1970). Porém, ainda não existem elementos suficientes para confirmar estas suposições (CARRASCO ARAIZAGA, 2008, p. 22).

No marco dessa rede de espionagem observamos as formas nas que a DFS mantinha um férreo controle de estrangeiros e refugiados políticos. Registravam-se minuciosamente suas atividades no território nacional, as suas relações no país, e as viagens realizadas a países socialistas. Portanto, incluíam-se neste controle os mexicanos que mantinham alguma relação com estrangeiros (CONDÉS, 2007a, p. 89-90).

A este respeito, encontramos exemplar o caso dos cidadãos guatemaltecos radicados no México. Nos informes elaborados sobre Moisés Evaristo Orozco Leal, cidadão

73“O mais extraordinário [no casamento de Scott em 1962] é que suas testemunhas foram o presidente da República, Adolfo López Mateos, e o secretário de Gobernación, Gustavo Díaz Ordaz”. Aliás, a relação entre Scott e Díaz Ordaz era tão estreita que “quando este chegou a Los Pinos, um diplomata estadunidense recorda: „para Scott era mais fácil se comunicar ou ter uma reunião com o presidente mexicano que com o mesmo embaixador Fulton Freeman‟” (DEARBORN, 1998 apud AGUAYO, 2014a).

74 Fernando Gutiérrez Barrios, capitão de infantaria, chefe de controle político da DFS (1952-1958) e subdiretor da mesma agência entre 1958 e 1964. Foi nomeado diretor geral da DFS para o período de 1964-1970. Nos sexênios de Echeverría e López Portillo exerceu a função de subsecretário da SEGOB na área de segurança interna. A partir de 1982, diz o historiador Enrique Condés Lara, “começa sua conversão de policial para

político”. Dessa forma, foi Diretor Geral de Caminos y Puentes Federales; foi governador do estado de Veracruz (1986-1988); finalmente designado pelo presidente Carlos Salinas de Gortari como secretario da SEGOB na área de inteligência até 1993 (CONDÉS LARA, 2007a, p. 116).

75 Os documentos da CIA sobre o Projeto Litempo estão digitalizados, disponíveis na página web The National Security Archive: http://nsarchive.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB204/index2.htm [Último acesso em: 29-05-16]

guatemalteco refugiado no México desde 1944, são destacados vários motivos de seu asilo. Em primeiro lugar, explica-se que o pai dele foi Diretor Geral da Polícia Nacional durante a brevíssima presidência do general Federico Ponce Vaides. Estudou a educação básica no México e voltou para Guatemala em 1958, onde permanece até 1964. Simpatizante do governo do general Jacobo Arbenz, assim que este sofreu o golpe militar, em 1954, Orozco Leal decide se filiar ao Partido Guatemalteco del Trabajo (PGT)76. Durante sua permanência na Guatemala, em 1963, viaja a Cuba como convidado do Instituto Cubano de Amizade com os Povos, estabelecendo contato desde a embaixada cubana no México77.

Retornando a Guatemala, Orozco assume o cargo de Secretário Geral do Partido

Unidad Revolucionaria, “de ideologia de esquerda moderada”, motivo pelo qual, o regime militar guatemalteco começa a persegui-lo. Finalmente, decide pedir asilo na embaixada mexicana na cidade de Guatemala, em 1964. Estabelecido novamente no México, registra-se uma suposta viagem realizada por Orozco a Cuba, entre 1966 e 1967. Segundo sua declaração, a viagem devia-se ao fato de que no México permanecia desempregado e sem expectativas de encontrar trabalho78. Segundo a investigação elaborada pela DFS, depois de sua permanência de um ano na ilha, Orozco Leal pode ser considerado “uma pessoa perfeitamente bem treinada em comunismo e em teoria de guerrilhas e se lhe considera extremamente perigoso”79.

No depoimento do guatemalteco pode-se ler que o retorno para o México aconteceu pelo suposto vencimento de um contrato de trabalho na ilha. Menciona também que seu objetivo era voltar para Guatemala, aproveitando um processo de distensão em que o regime militar oferecia garantias aos exilados. O interrogado põe ênfase nas críticas públicas que realiza aos grupos armados (de esquerda e de direita), pois como assinala, o sítio que pertencia ao pai dele na Guatemala fora ocupado pela guerrilha, motivo pelo que não podia regressar. Ele garante, desta maneira, que não tem relações políticas com asilados guatemaltecos no México, e que o único motivo que tem para adquirir armas seria “para se proteger dos chamados „Mano Blanca‟ da Guatemala, os quais publicaram estender até o

76 “Memorandum. Asunto: Moisés Evaristo Orozco Leal”, Distrito Federal, 01-08-67, AGN, IPS, Caixa 1467 A, Exp. 1, folhas 1-2. Neste documento, encontramos uma anotação manuscrita, do lado superior esquerdo: “De parte Sr. Scott”. Este é o único documento consultado em que se faz menção ao chefe da CIA [fig. 10]. 77 “Declaración de Moisés Evaristo Orozco Leal”, Distrito Federal, 02-08-67, AGN, IPS, Caixa 14767 A, Exp. 1,

folhas 1-3.

78 “Declaración de Moisés Evaristo Orozco Leal”, Distrito Federal, 02-08-67, AGN, IPS, Caixa 14767 A, Exp. 1, folhas 1-3.

79 “Memorandum. Asunto: Moisés Evaristo Orozco Leal”, Distrito Federal, 01-08-67, AGN, IPS, Caixa 1467 A, Exp. 1, folhas 1-2.

México seus assassinatos contra todos aqueles guatemaltecos de ideias liberais”80.

No entanto, no sentido contrário ao depoimento de Orozco Leal, os agentes que deram seguimento ao caso garantem que, assim que o guatemalteco voltou de Cuba, estabeleceu contatos com um grupo de asilados guatemaltecos de filiação comunista, servindo como enlace entre estes e guerrilheiros cubanos. Sublinha-se o fato de que, apesar de ser militante do PGT, tornou-se um estreito colaborador das Fuerzas Armadas Rebeldes (FAR)81. Sua função se concentrou no recrutamento de homens e de armas, organizando esquemas de compra-venda no México destinadas ao grupo armado no território guatemalteco.

Um memorando constata que, em maio de 1965, o sujeito em questão participou numa reunião de dirigentes comunistas guatemaltecos no México, na casa do próprio Marco Antonio Yon Sosa82. Não encontramos mais informação sobre este caso.

Outra forma de apoio secreto da inteligência mexicana à segurança nacional dos EUA apresentava-se na forma de proteção a colaboradores ou delatores que cooperavam com o governo norte-americano. Assim, silenciosamente, longe da opinião pública, “México se converteu discretamente em refúgio de ex revolucionários arrependidos, de criminais e delatores de seus antigos correligionários que souberam seguir os canais adequados” (CONDÉS, 2007a, p. 90).

Quanto a isso, encontramos dois casos documentados. Sam Giancana, um dos líderes do crime organizado e da máfia de Chicago, firmou residência na pitoresca cidade de Cuernavaca, em Morelos, entre 1966 e 1974. Detido por agentes da DFS e “posto num avião rumo aos Estados Unidos. Aí o esperavam uns clientes com quem tinha ficado mal em certo pequeno encargo que devia ter cumprido em Cuba” (BUENDÍA, 1984, p. 39). O assassinato dele ocorreu paralelemente ao de outros mafiosos implicados num plano para assassinar Fidel Castro em 196183.

80 “Declaración de Moisés Evaristo Orozco Leal”, Distrito Federal, 02-08-67, AGN, IPS, Caixa 1467 A, Exp. 1, folhas 1-3. A “Mano Blanca” foi um esquadrão da morte paramilitar ao serviço de fazendeiros, com a faculdade, também, de interrogar e prender suspeitos de ameaçar a segurança nacional guatemalteca. Estes esquadrões atuavam sob comando e supervisão das Forças Armadas guatemaltecas (COMISIÓN PARA EL ESCLARECIMIENTO HISTÓRICO, 1999, p. 144).

81 Guerrilha guatemalteca surgida em 1962. Carlos Figueroa Ibarra avalia o período entre 1965 e 1966 como o momento de auge das FAR, quando conseguiu manter várias frentes em todo o país, realizando justiçamentos, sabotagens econômicas, emboscadas contra o exército, controle de povoados na região sudeste, propaganda armada, sequestros econômicos e políticos. As FAR resistiram várias ofensivas militares, contudo, após a morte do dirigente militar, o comandante Luis Augusto Turcios Lima, ocorrida em 1966, a guerrilha se dispersou (FIGUEROA, 2010).

82 Líder político-militar do Movimiento Revolucionario 13 de Noviembre, grupo armado cujas origens estão em 1960. Yon Sosa foi capturado e assassinado em território mexicano, em 1970 (FIGUEROA, 2010).

83 Giancana controlava casinos tanto em Las Vegas como em Havana, durante a ditadura de Batista. As teorias sobre as motivações que levaram ao assassinato de Giancana são enturvadas, quando, em 1977, Judith Campbell Esner expressa que por algum tempo foi amante, simultaneamente, do presidente Kennedy e do

Cuernavaca foi a cidade que também albergou o recém-derrocadoxá iraniano Muhammad Reza Pahlavi, em janeiro de 1979, após o golpe da revolução islâmica que instauraria o aiatolá Khomeini no poder. No entanto, o asilo outorgado ao ex-mandatário iraniano gerou uma crise diplomática entre os EUA e o México. Em novembro do mesmo ano, Reza Pahlavi traslada-se para Nova Iorque com o objetivo de atender seu precário estado de saúde. Durante sua estância nos EUA, estudantes iranianos tomaram a embaixada dos EUA em Irã fazendo vários funcionários estadunidenses reféns. Exigiam o retorno do xá. Nesse contexto, “Washington acreditava que [o xá] fosse para o México o mais rápido possível, mas o governo de López Portillo informou que não seria admitido” (AGUAYO, 2014b)84. Nas

suas memórias, o presidente Carter afirmou que esse fato o deixou “furioso [...] tinham-nos dado garantias de que o xá seria bem-vindo: [...] López Portillo é um homem sem palavra” (CARTER, 1983 apud AGUAYO, 2014b)85.

Outro aspecto no esquema de cooperação entre ambos os países estava em relação à vigilância de embaixadas, agências de informação e missões comerciais ou científicas provenientes dos países do bloco socialista instaladas no México. Dentro do grupo documental que analisamos há a estreita vigilância dos funcionários soviéticos que, aliás, “disfrutavam de um lugar privilegiado para realizar atividades de espionagem (tinha no México a missão de inteligência maior da América Latina: 35 pessoas)” (AGUAYO, 2014a).

Em suas atividades públicas, a embaixada soviética sempre foi respeitosa do governo mexicano. No relato elaborado em torno à conferência do segundo secretário da embaixada da URSS no México, V. Goncharenko sobre o tema “A política exterior da URSS”, há a transcrição de alguns pontos considerados importantes pelo agente que elaborou o informe. Os eixos da palestra realizada no Instituto de Intercambio Cultural Mexicano-Ruso giravam em torno da posição soviética sobre a paz e os esforços do governo comunista para conseguir o desarmamento. Sobre isso, o agente sublinha que:

A União Soviética simpatiza com o México em todos seus aspectos, pois até a frase do Patrício Mexicano Benito Juárez, “O respeito ao direito alheio é a paz”, a União Soviética a fez sua, e volto a repetir, lutou junto com México

próprio Giancana. Uma versão sobre o assassinato aponta que, efetivamente, o ménage a trois teria sido o motivo principal (BUENDÍA, 1984, p. 39).

84 Cabe mencionar que uma situação similar ocorreu com o asilo do guatemalteco Jacobo Arbenz, em 1954. Após a condenação pública contra o golpe de Estado, o governo mexicano negou os pedidos de asilo do general Arbenz, atendendo, dessa vez, às pressões norte-americanas (PELLICER; MANCILLA, 1978, p. 102) 85 O autor aponta que a crise dos reféns foi um fator decisivo para a derrota de Carter, em 1980, para Reagan

(única vez que as decisões mexicanas tiveram uma influência de impacto nos processos políticos norte- americanos).

pela paz na ONU e em todos os congressos que tinham ocorrido86.

Apesar destas mostras públicas de simpatia, a DFS elaborava perfis com os antecedentes dos funcionários da embaixada. Localizamos dois. O de Nikolai Seerfevich Leonov destaca as supostas atividades desenvolvidas conjuntamente com elementos comunistas mexicanos, entre 1965 e 1966. Indica-se que mantém “contato com membros da esquerda mexicana especialmente do interior, para onde viaja continuamente”. Também, que “se pode comprovar que Nikolai Leonov é o contato da embaixada da URSS para o subsídio de organismos de esquerda em Michoacán”87.

Da mesma forma, ainda que mais detalhado, é traçado o perfil de Valentín Sergeyevich Loginov, Terceiro Secretário da Seção Consular da Embaixada Soviética. Vai em destaque que é membro do Comitê para a Segurança do Estado (KGB) desde 1958. Além da sua formação, sublinha-se sua presença constante na América Latina. Entre 1960 e 1963, permaneceu em Cuba como destacado, fazendo uma pausa em 1961, quando viajou para o Panamá e o Equador acompanhando um time soviético de futebol: “Nesta viajem levou uma forte soma de dinheiro para os Partidos Comunistas de ambos os países”. No México, desde 3 de agosto de 1965, Luginov:

Substitui Oleg M. Nechiporenko, outro membro da KGB, fazendo-se cargo de todas as atribuições e contatos dele. Em janeiro de 1966, tratou de atrair um chofer da embaixada norte-americana. Luginov é um membro do serviço de inteligência, bem ativo e capaz. Em virtude de que não tem que desempenhar outros trabalhos extras, 95% de seu tempo o dedica a atividades de espionagem88.

O informe também anexa uma lista intitulada “Agentes do Serviço de Inteligência destacados no México”, incluindo nomes e cargos. É feita a distinção entre os agentes da KGB, cujo chefe é Sergei S. Konstantinov e o subchefe Aleksander V. Prirodko, que tem, debaixo de sua autoridade, vinte agentes, entre os quais se encontra Luginov. Na segunda parte da lista, citam-se onze agentes do GRU (Serviço Militar de Inteligência) sob o mando de

86 “Conferencia sustentada por el segundo secretario de la embajada de la URSS en México. – V. Goncharenko sobre el tema „la política exterior de la URSS‟”, Distrito Federal, 04-08-66, AGN, IPS, Caixa 826, Exp. 8, folhas 1-2.

87“Nikolai Serfevich Leonov. – Antecedentes”, Distrito Federal, c. 1966, AGN, IPS Caixa 1467 B, Exp. 10, folha 1.

Vladimir N. Sodilov e de Georgy A. Schuchkin 89.

Por último, quanto aos seguimentos feitos pela DFS sobre a embaixada soviética, encontramos um informe contendo a análise de uma chamada telefônica entre um tal “Carlos Blanco” (de quem não temos referências) e Valentín Luguinov, no dia 6 de dezembro de 1966. O agente relata que “Blanco indicou a Luginov que „o Comandante Carlos‟ (Carlos Casamadrid Miranda) queria ver a Pável A. Yatskov para um assunto urgente”. Casamadrid Miranda foi um oficial naval e piloto aviador formado em serviços de inteligência nos EUA, era membro da DFS. Por outro lado, Yastskov é lembrado por sua célebre reunião com Lee Harvey Oswald na embaixada soviética no México e sua negativa ao norte-americano de visto de entrada à URSS.

A partir dessa ligação, o agente que elabora o informe descreve uma janta “que pode estar relacionada com a chamada [telefônica]”. Realizada em 11 de outubro de 1965, o jantar foi entre Yatskov e um indivíduo mexicano não identificado, no restaurante “La Tablita”. Terminado o evento, “o mexicano pôs um pequeno objeto sobre a mesa. Yatskov o cobriu com seu guardanapo e logo o deslizou em seu bolso. É obvio que dito objeto lhe foi passado clandestinamente”. O agente dá atenção ao fato de que os dois sujeitos vigiados saíram separadamente, quando o mexicano abordou um carro tipo jipe que estava identificado com a legenda da Procuraduría General de Justicia del Distrito y Territorios Federales – Policía

Judicial. Motivo pelo qual, claro, “presume-se que o indivíduo presta seus serviços na Polícia

Judicial”.

O mexicano em questão é descrito como “uma pessoa de 35 anos, de aproximadamente 1,70 de estatura, 70 quilos de peso, de porte mediano, de pele morena, olhos escuros, bigode negro e vestido de forma conservadora”. Embora a descrição possa relacionar-se a uma grande parcela dos mexicanos, o agente sugere que essa descrição deva corresponder tanto a Carlos Blanco (que realizou a ligação para a embaixada) como ao comandante Casamadrid. Da mesma forma, o agente indica que há registro de várias ligações de Casamadrid à embaixada, entre março de 1965 e novembro de 1966. “Todas essas chamadas foram para concertar reuniões entre Blanco e Luguinov” [fig. 11]90.

Não temos mais informes sobre os grampos telefônicos da embaixada soviética, que constituem uma grave violação à imunidade diplomática. Também não temos indícios de reuniões entre agentes policiais ou da DFS com funcionários soviéticos. Porém, encontramos

89 Os nomes na lista são duvidosos, constatamos que vários deles estão escritos incorretamente, e muitos vêm “mexicanizados”.

informação, digamos, indireta, sobre as atividades soviéticas no México. Héctor Mariscal Martínez, proprietário da empresa Servicio Aerotécnico S.A. de C.V, abastecedora de material aeronáutico, deu parte à DFS sobre as petições feitas pelo Serviço Militar Soviético de Inteligência desde 1960. O agente informa que “durante todo esse tempo, ele [Mariscal Martínez] tem acatado nossa direção”. Afirma-se, também, que o presidente Díaz Ordaz tinha conhecimento prévio sobre a relação da empresa com a inteligência soviética.

O agente informa que Mariscal contactou a DFS, pois, resultava estranho que a petição soviética, nesta ocasião, se fizesse sobre o território fronteiriço entre México e EUA. Até 1966, as cartas aeronáuticas compradas pelos soviéticos tinham sido sobre o território norte- americano unicamente. Essa informação, indicou Mariscal, é de uso exclusivo dos governos mexicano e estadunidense, pelo que “respeitosamente se solicitam instruções sobre como proceder neste caso”91. Não encontramos nenhuma resposta.

De outro lado, a Agência de Notícias Nova China (Xinhua) também foi objeto de vigilância, e inclusive de infiltração. Num breve informe de 1966 “obtido pelos meios estabelecidos na Agencia Chinesa de Notícias”, narra-se um assunto tratado numa reunião particular entre os correspondentes chineses. O agente, obviamente infiltrado, indica que a reunião girou em torno à esquerda mexicana. Num balanço elaborado pelos chineses “fizeram referência de que no México existem muitos grupos que mantêm posições revolucionárias, porém, são uma espécie de seita, porque não formam uma corrente social”92.

Finalmente, no terreno da cooperação em matéria de segurança e inteligência, o governo mexicano possivelmente ofereceu fazer vistas grossas à utilização do território mexicano para a realização de atividades encobertas. Novamente, o jornalista Manuel