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5. CONTRAINSURGÊNCIA NO MÉXICO

5.1. O exército no campo mexicano

diretamente os movimentos sociais que radicalizaram na década de cinquenta253. Depois do frustrado assalto ao quartel de Madera, Chihuahua, o presidente Díaz Ordaz ordenou as chamadas “Maniobras Conjuntas del Ejército y la Marina” em 1966, assim como os “Ejercicios Regionales del Ejército” (ETR). Ambas ações militares consistiram na mobilização de milhares de soldados pelo treinamento para as ações antiguerrilheiras e antisubversivas (PIÑEYRO, 1985, p. 85). Postados na totalidade do território mexicano de acordo com uma melhor divisão territorial recentemente estabelecida, mantinham um controle quase absoluto de possíveis insuflações de cunho armado. Entre 1965 e 1966 foram mobilizados por volta de vinte e dois mil soldados, setecentos e trinta veículos, três mil armas automáticas, vinte aviões e nove furgões (SIERRA, 2003, p. 48).

O objetivo – além da clara demonstração da máquina bélica do Estado – era a possibilidade de conter, com maior eficiência e velocidade, os distúrbios civis, fossem estudantis, operários, sindicais ou agrários, mas, especificamente, a subversão armada. Pela primeira vez na era pós-revolucionária introduzia-se na linguagem militar as palavras “subversão”, “guerra revolucionária”, “guerra de guerrilhas”, entre outras que estavam em voga no Cone Sul. A Revista del Ejército, em 1971, elabora uma definição própria do conceito “contraguerrilha”:

Compreende uma variedade de operações militares e providências de diverso gênero encaminhadas, umas e outras, não unicamente para vencer e minar a resistência armada dos guerrilheiros ou elementos combatentes, mas também toda oposição da população civil; para tanto, tais operações abarcam e mesclam a atividade bélica e as medidas de ordem sócio-econômica, política e psicológica destinada a desalentar toda resistência ativa ou passiva de dita população e, ainda, lograr o apoio, a simpatia ou, pelo menos, a neutralidade popular, considerando que é invencível quando está bem conduzida, suficientemente estendida, e apoiada pelo povo (PIÑEYRO, 1985, p. 90).

Ou seja, o exército mexicano assume a definição elaborada pelos EUA sobre a contrainsurgência e, sobretudo, quanto à Guerra de Baixa Intensidade (GBI). O manual norte- americano Small Wars, de 1940, elaborado após a sistematização das experiências da Guardia

Nacional nicaraguense contra as guerrilhas lideradas por Augusto César Sandino, aponta que

o uso brutal da força não é de forma alguma apropriado, ou melhor, não é benéfico politicamente pensando num contexto mais amplo em que a vitória tem que ser também no

253 Durante o sexênio de Adolfo López Mateos (1958-1964), o exército teve um papel chave para sufocar as greves de maquinistas de trem (1959-1959), dos funcionários da Compañía Mexicana de Aviación, do sindicato de telegrafistas e de funcionários dos correios (1960); contra o movimento estudantil na capital, em Guerrero e em São Luis Potosí (PIÑEYRO, 1985, p. 83).

terreno político: “Nas guerras de pequena escala, tolerância, simpatia e bondade deveriam ser os aspectos cruciais em nossas relações com a maior parte da população” (CASSIDY, 2005, p. 26). Esta reflexão sobre como devia atuar o exército contra as guerrilhas populares ganha corpo após a guerra no Vietnam. Nesse aperfeiçoamento da estratégia se misturam coordenadamente a ajuda econômica, as operações psicológicas e as medidas preventivas de segurança.

No caso mexicano, a estratégia militar operou em torno da “ação cívica” (AC). Echeverría alavancou projetos em que a burocracia militar “participou no campo, não só num sentido estritamente militar, mas também como intermediário, tratando de preencher o vazio deixado pelas estruturas civis de mediação com as atividades de trabalho social” (PIÑEYRO, 1985).

O programa de AC mexicana elaborado em 1971 tinha objetivos específicos que beneficiariam a imagem da instituição militar no interior do país, inclusive internacionalmente. Para tal efeito, a meta geral foi a pacificação do território e zerar as possíveis causas que geram os brotes armados. A contribuição direta do exército é avaliada pelo governo como a garantia dos avanços do progresso nacional, pois a AC aplicada de maneira sistemática reduziria as possibilidades de que uma força guerrilheira ganhasse a simpatia da população. O coronel José Pánico Rodríguez apontou que sob essa estratégia “injeta-se variedade ao adestramento das tropas, elevando-se sua moral”. Assim, os soldados que participassem nesse tipo de estratégia teriam condições de aprender um ofício (alvenaria, marcenaria, alfabetização, entre outros). Dessa forma, seria mais simples o processo de reintegração dos soldados à vida civil. Finalmente, a corporação ganharia prestígio nacional melhorando proporcionalmente a qualidade e as condições de vida do pessoal da carreira militar.

Uma imagem nítida do funcionamento da AC pode ser acompanhada num relatório da cidade de Matamoros, Tamaulipas. O comandante da 18ª Zona Militar, general Gómez Cuevas, envia informes à DFS advertindo dos resultados da vigilância sobre dois militantes da CCI. No mesmo espaço informativo, o militar aproveita para fazer um balanço sobre a distribuição de víveres para as pessoas prejudicadas pela queda do teto de um refúgio devido à passagem de um ciclone pela região. Na mesma operação, informa o general, os cidadãos foram trasladados para uma escola, enquanto os militares reconstruíam o refúgio254.

Diante dessa imagem idealizada do exército ajudando o povo em desgraça, em 1976,

segundo o jornal Últimas Noticias, no estado de Guerrero, que concentrava o maior número de soldados na totalidade do território nacional, não existia estado de sítio. Em entrevista, o comandante da 27ª Zona Militar (com sede no porto de Acapulco) negou que a tropa estabelecida em Guerrero fosse a mais repressiva do país. O general diz:

“Os camponeses vivem tranquilos porque o exército os protege. Todos os povoados do Estado quiseram que ao menos dois soldados estivessem com eles”. Expressou o militar que “os soldados são camponeses. Daí sai o exército, igualmente, dos operários”255.